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domingo, 30 de outubro de 2011




O homem sem cuecas
o trabalho é maldição, Saturno

Mas talvez um amor sublime, que atinja o mais alto
nível de ardor, seja incompatível com a vida.
Luis Buñuel


Nunca mais repito aquela frase curta para o início, falo para mim e ninguém tem nada a ver aqui neste momento com essa pura e lisa descida para meu próprio umbigo. Me interessa muito o ponto, mas aí vem a fórmula e coloca esta curta frase sozinha dilatada do seu texto que conseguiria se estender até o fundo do poço. Cinema é cachoeira. Hoje é sexta feira, não tem futebol, então antes de ver ANO PASSADO EM MARIENBAD, continuo arengando enquanto posso para não perder a altivez. Tudo está perdido, menos a altivez. Ainda resta. A tergiversação que linda. A palavra. Aquela jovem mulher também. Ela nua então. Não sei porque escrevi essa palavra, sem dúvidas me atrapalhou mas continuo gostando dela. La premiére, agora eu é que tenho que acertar esta incisão. Antes que seja tarde. Quantos quês. Que estranha esta construção, não sei de onde veio. Sonhos e devaneios. Um soluço me persegue durante todo esse chuvoso sábado, vou comer para me esquivar dele. Alguém lá em baixo grita: olha isto, eu sei voar. Uma tremenda bobagem, provavelmente deve ter se estabacado mais embaixo ainda. Take Five. Deu tudo certo sem precisar mais sair. Hoje só volto amanhã direto para o Rio. Copacabana de novo, e por hora não tenho do que reclamar. Necessito ver por quantas anda o Leme. Ainda chove e como gosto desta chuva nesta hora com essa música. Se eu começar a falar do Dom Lope pode ser pior, deveremos ser mais sucintos? Pelo que sei ninguém está comigo, no entanto estou falando no plural. Enfim ela apagou a luz agora não me controlo mais. Começo a tocar guitarra solo, nunca soube que tocava embora sempre imaginei. E toco bem, fácil. Como sabê-la se não tê-la. Está tudo dominado ao que parece. As fotografias em preto e branco do Thomas Merton desapareceram. O grande poeta inglês rei dos aforismas dizia que quanto mais você for esculhambado melhor. Uma prateleira acima. Devemos enfrentar o medo como se fosse bom, vai ver até que é. Aqueles olhos sorrindo. Parece um convite para o fim.Vamos acreditar que é bonito. Fim. Nada além de uma ilusão. De uns tempos pra cá tenho me sentido muito estoicista, isto me põe meio cabreiro, acredito também que pode ser algum tipo de sinal, não sei se é bom ou ruim. Se bem que um sinal sempre é bom. Uma vai ser finalizada para começar outra. Este é o andamento. Se não me engano. Uma vocalização de alarme. O maestro Otávio III me ensinou que as vogais são mais importantes, as consoantes também são importantes, só que em segundo plano. Vamos nos dedicar às vogais. De novo no plural, não sei o que é isto. Deve ter alguma significação, vamos seguir a intuição. É apenas um convite. Não sei agir de outra maneira. Preciso aprender, é só o que tenho a fazer ao que parece. Me fascina ela, a aliteração e ela a música, vou atrás da imagem, da figura. Estou ferrado, tenho consciência disto. Sempre detestei as vírgulas, mudei. Já fui outros. Ainda revi e ouvi o maestro Trinca, tudo em Copacabana e vi a pedra do corte do Cantagalo em várias luzes do décimo terceiro andar, da janela só pra mim. Tenho a esperança de te ver nas linhas aéreas, aeróbicas, sem bilhete marcado ao acaso na alvorada. Loco Abreu, camisa treze. Não moro nesta comunidade, mas admiro muito. São exatamente nove e meia da noite. Voltei ao Rei do Omelete, novamente na Avenida Brasil. Vou dormir na sala do som, me encontrar e beber com os músicos e depois com a cantora. Esse é o filme.


Fábio Carvalho - cineasta

sábado, 29 de outubro de 2011

NOTÍCIAS

A continuação do roteiro “A Lenda dos Invertidos” está sendo escrito por um segundo autor e assim que estiver pronto eu publico aqui no blog.

Este poema abaixo foi musicado por Emiliano Sette e o Tiozim do Rock estará gravando esse novo sucesso.

Revoltado com a Vida

Passava pela praça
repleto de cachaça
louco pra caralho
procurava por você

Você não quer me ver
Você me mete o malho
Eu bebo pra caralho
Procurando te esquecer

Saio sempre ao fim da tarde
logo após eu acordar
durmo tarde pra caralho
como vou te encontrar

Pergunto a um
Pergunto ao outro
As horas passam de mansinho

Ninguém responde
Estou de porre!
Na noite louca, amorzinho...

Que merda é essa?

Assim vivo todo dia
buscando a doce amada
morrendo de agonia

Que vida é essa?

Entre o ser e o nada...
Enfio o pé na jaca

A cachaça me maltrata
mas de tédio eu não morro

Bebendo a nostalgia
com uma puta de uma azia

Buscando a namorada
que não vejo a mais de mês

Não pensem que eu sou
diferente de vocês...

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

ROTEIRO cont.

A LENDA DOS INVERTIDOS

SEGUNDA PARTE (5 minutos)

Cenas rápidas escolhidas da primeira parte com titulagem

Sequência 5 (PB)
Os dois chegam a uma pequena cidade vazia. Andando pelas ruas reencontram a mulher que havia passado por eles na praia. Ela agora está vestida e quando vê os dois dobrando uma esquina tenta fugir e é rendida por Franz com sua pistola. Riche, vira-se com as duas malas na mão e se aproxima da cena.

Franz: - Quem mandou você virar de frente para mim?

Riche: - Você não vai atirar em um inocente?

Franz: - Sou obrigado por você e pela sua desobediência ao que foi combinado.
Mulher: - Me solta moço! Eu não tenho nada a ver com isso...

Franz: - Não! Vamos andando até a sua casa e depois eu te solto.

Mulher: - Não moço! Sou casada e moro com meu marido...

Riche: - Solta a mulher Franz, isso só vai complicar a nossa situação.

Franz: - Cala essa boca! Nossa situação está complicada por sua irresponsabilidade. Se ela é casada, melhor, temos roupa nova para vestir e podemos sair daqui. Vamos até a sua casa e depois a deixaremos em paz.

Sequência 6

Os três entram na casa da mulher.

Franz: - Onde ficam as roupas do seu marido?

Mulher: - No meu quarto...

Franz: - Então vamos nos vestir... (aponta a arma para Riche que tenta falar alguma coisa)

Os três entram no quarto. A mulher abre o armário que está repleto de roupas e depois se afasta. A partir deste momento ela muda de atitude e começa a olhar com ternura para Riche, que se sensibiliza e se aproxima como quem fosse protegê-la de qualquer ataque de Franz que se aproxima dos dois.

Franz: - Escolhe uma roupa para ele ao seu gosto, que se deixar por conta dele nós não vamos sair daqui...

A mulher escolhe uma calça e uma camisa e dá para Riche que fica sem saber o que fazer e vai saindo para o banheiro...

Franz: - Pode trocar de roupa aqui mesmo, tenho certeza que ela já está acostumada a isso...

Riche com timidez começa a tirar à roupa rasgada vestindo a outra que lhe cabe perfeitamente. Franz aplaude a escolha e passa a orientar a mulher dizendo que gostaria de uma roupa mais sóbria, um terno escuro. Franz se veste com dificuldade pois mantém a arma apontada para os dois. Bem vestido, Franz empurra os dois para fora do quarto. Os três entram na cozinha espaçosa. Franz senta-se para comer uma fruta que enfeitava o centro da mesa. Riche e a mulher ficam em pé a observá-lo.

Franz e Riche voltam a falar na língua estrangeira com legendas:

Franz: - Riche, você só tem uma escolha que é vir comigo e cumprir nossa missão, depois com o dinheiro que sobrar pode passar o resto da sua vida aqui nesta praia deserta..., e até comprar essa mulher.

Riche: - Já te disse que não vou com você e quero agora o dinheiro que foi combinado se alguma coisa desse errado e tivéssemos que abortar a missão... E deu tudo errado, assim não tenho mais obrigação nenhuma com você...

Franz: - Você é um covarde! E você ai mulher, me diz por que a cidade está vazia?

Mulher: - Todos foram na praia ver o grande incêndio que uma bola de fogo vinda do céu provocou...

Riche: - E o seu marido..., foi também?

Mulher: - Ele é o delegado da cidade...

Franz: - Chega desse lero-lero e vamos logo resolver o que vamos fazer... Riche! Estou sendo obrigado por você a cometer um assassinato em terra estrangeira - que isso fique registrado na história!

Riche: - Quem aqui é o covarde?

Franz: - Onde está a chave do carro do seu marido?

Mulher: - O carro é meu!

Franz: - Melhor ainda, você me dá a chave que eu vou embora...

Riche: - Vai, mas deixa o meu dinheiro.

Franz: - Você me agradecer se eu lhe deixar aqui sem dinheiro, ainda mais vivo!

Mulher: - O que o senhor vai fazer com a gente?

Riche: - O covarde vai nos matar e fugir com todo o dinheiro, é isso que ele vai fazer, só está esperando o momento certo...

Mulher: - E você não vai fazer nada?

Riche: - Estou esperando o momento certo...

Franz se complica com a arma quando vai pegar as duas malas para levar para o carro . Era o momento que Riche esperava para tentar pegar o revólver e ficar senhor da situação. Riche avaça num salto para cima de Franz que deixa a arma cair no chão. Riche chuta a arma para o lado da Mulher que rapidamente a pega aponta o cano sinistro para os dois que param de brigar olhando para ela.

Mulher: - É como disse o poeta – no progresso o revólver deu ingresso pra acabar com a valentia – e agora os dois ficam quietinhos se não eu atiro... Olha que sei atirar muito bem.

Franz: - Você conseguiu me enganar com aquela carinha de santa... Enganou o Riche também, olha para a cara dele! O que vai fazer agora?
Mulher: - Vou pegar as malas e vou embora daqui e vocês se explicam para o meu marido... Tenho certeza que vocês vão gostar muito dele... (Cena do marido enfurecido no volante do seu jipe)

A Mulher quando vai pegar as duas pesadas malas comete o mesmo erro de Franz e se confunde com o revólver deixando Riche, novamente em um salto, pegá-lo de sua mão.

Riche com o revolver na mão fala para Franz: - Pega uma das malas e vamos sair daqui imediatamente que o marido dela está chegando.

Franz: - Você está novamente contratado, eu sabia que nunca trairia a pátria...

A mulher fica indecisa e anda de um lado para o outro da sala.

Mulher: - Eu sou uma boa companhia e vocês não podem me deixar aqui, eu quero ir com vocês...

Riche: - Ela vem também

Franz: Não faça isso! Ela pode comprometer toda a missão...

Riche: - Já está feito! Vamos embora!

(segue no próximo capítulo)...

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

ROTEIRO

Roteiro de vídeo digital para um canal do Youtube

A LENDA DOS INVERTIDOS


PRIMEIRA PARTE (5 minutos)

Sequência 1 (PB) titulagem.
Balão Zepelim (filme de época – youtube).
Cenas aéreas de terra virgem e mar bravio.

Sequência 2 (PB e COR) (EFEITO)
Zepelim PB passa baixo pela praia
Cena de um canto de praia com uma explosão colorida

Sequência 3 (COR)
Do meio de uma fumaça negra surgem dois personagens, chamuscados e rasgados, um deles é de média estatura, com cabelo liso e preto, usa bigode e chama-se Franz; o outro é mais alto, louro de cabelo liso e também usa bigode e chama-se Riche. São os sobreviventes do acidente com o balão. Os dois estão nervosos, assustados e desorientados, andam como zumbis pelas areias e dunas até chegar à beira do mar bravio.

Sequência 4 (PB e COR)
A beira mar, eles entram na água e rapidamente recuperam suas forças. Inicia-se um diálogo em uma língua estranha. (o diálogo é acompanhado por legendas).

Legendas:

Franz: - Eu te falei muitas vezes mas você não quis ouvir... E agora Riche, o que vamos fazer? Estamos longe da pátria em uma terra estranha... Você não sentiu o cheiro do gás?

Riche: - Senti, mas já era tarde... Estamos vivos... Podia ser pior!

Franz: - Morreram todos. Deveríamos estar com eles... Nada é pior do que isso! E você não fez nada para impedir. Devíamos ter morrido...

Riche: - O que eu poderia ter feito? ... E já que não morri vou seguir em frente...

Franz: - Riche! Viemos aqui em uma missão e vamos dar prosseguimento a ela...

Riche: - Franz! Eu morri e não vou dar prosseguimento em nada que ficou no passado.

Franz: - Riche este é um grande país e a nossa missão é pequena, rápida e de grande importância para a nossa pátria...

(COR) Passa por eles uma menina de biquíni fio dental. Os dois param de andar e ficam observando o balançar dos quadris.

Riche: - Franz! Não vou matar ninguém no país em que vou morar... Está resolvido!

A menina volta de sua caminhada assustada e aumenta o passo ao se aproximar dos dois. Depois corre olhando para traz. No fundo do cenário sobe uma fumaça negra.

Franz pega Riche pelo braço e fala com ele em português sem sotaque.

Franz: - Riche! Vamos sair que daqui a pouco este lugar vai encher de gente.

Riche: - Eu vou é voltar aos escombros do desastre procurar uma coisa que deixei...

Riche corre em direção da fumaça. Franz sai lentamente andando atrás do seu parceiro.

Riche sai da fumaça e vendo Franz sentado na areia com duas malas na mão se aproxima e diz:
- Como você achou tão rápido o dinheiro?

Franz: - Quando nós caímos fui o primeiro a levantar e quando vi o que tinha acontecido peguei as duas malas e escondi... Temos que completar nossa missão e sem isso tudo ficaria impossível...

Riche: - Uma dessas malas é minha ...

Dizendo isso repetidas vezes, corre em direção onde está Franz, que retira da mala uma pistola e aponta para Riche.

Franz: - Mais um passo e meto-lhe uma bala na cabeça...

Frans levanta-se da areia e pega as duas malas e entrega para Riche. Aponta a arma par ele e diz: - Vamos andando!

Os dois caminham no sol pelas areias escaldantes em direção da cidade.


SEGUNDA PARTE

(a seguir...)

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

MORTE DO CINEMA

Cinematógrafos, guardem vossas câmeras que elas serão como os toca discos de hoje peças de grande valor e sempre haverá um maluco que fabricará um negativo para filmagens especiais. Não é uma questão de morte da qualidade, mas sim um problema de linguagem que sempre irá permanecer. Se não como vou fazer um plano de cinema em homenagem a um Edgar Brasil, um Gregg Toland, se não tenho uma câmera de filmar?

Fabricantes de câmeras de cinema abandonam o filme em película

É o fim de uma era, que começou em 1888: o cinema, como imaginado pelos irmãos Lumière, está morto.

Por Henrique Cesar Ulbrich

Os três maiores fabricantes das caríssimas câmeras de cinema não
mais fabricarão modelos de película. O cinema, a partir deste 2011, será exclusivamente digital – pelo menos, no que depender de equipamento
novo.

De acordo com um artigo no site da revista Creative Cow, a alemã ARRI, a francesa Aaton e a norte-americana Panavision encerraram, sem muito
alarde, a fabricação de câmeras de cinema que usam os tradicionais
filmes “de película”. O artigo, aliás, foi apropriadamente intitulado Film Fading to Black, fazendo referência ao efeito de escurecer a cena até a tela ficar
completamente negra, normalmente usado para encerrar a história.

Bill Russel, vice-presidente de câmeras da ARRI, conta que o problema não é a diminuição gradual do uso dessas câmeras.
Em entrevista à Creative Cow, deixou claro que a coisa foi
cataclísmica: “a demanda por câmeras de película, em todo o mundo,
simplesmente desapareceu”. Segundo Russel, esse foi o motivo pelo qual a empresa, desde 2009, só monta câmeras de película sob encomenda.

Jean-Pierre Beauviala, fundador da Aaton, faz côro: “Absolutamente
ninguém compra mais essas câmeras. Por que comprar uma nova, se há
tantas usadas muito mais barato pelo mundo? Não sobreviveríamos nessa
atividade se não projetássemos nossa própria câmera digital”.

Obviamente, isso não implica que filmes em película vão parar de
ser rodados imediatamente. Por muitos anos ainda as câmeras existentes e os rolos de filme virgem (ainda fabricados) se transformação em arte.
Todavia, o fato marca o declínio indelével dessa mídia. Podemos esperar
que, em breve, Kodak e Technicolor parem também de produzir as próprias
películas, que se tornarão cada vez mais difíceis de encontrar,
manipular revelar e editar.

Como o próprio Creative Cow definiu a situação: “Alguém, em algum
lugar do mundo, tem em mãos hoje a última câmera de cinema ‘das antigas’ a sair de uma linha de produção". Ou, como resumiu o site Saloon.com: as câmeras de filmes serão para o cinema o mesmo que as máquinas de escrever são hoje para a literatura.

Mesmo o cinema digital pode, em breve, morrer, segundo o artigo da
Creative Cow. A internet conseguiu fazer o que a TV não havia
conseguido: tornar o cinema menos relevante. Quem nunca desistiu de ir à sala de projeção porque já havia visto o filme na telinha do computador – possivelmente pirateado – que atire a primeira pedra.

É triste. Mas o mundo gira. É preciso.
--

terça-feira, 25 de outubro de 2011

sábado, 22 de outubro de 2011

As duas Venezuela
Fidel Castro Ruz
18 de outubro de 2011

ONTEM falei da Venezuela aliada ao império, onde Luis Posada Carriles e Orlando Bosch organizaram a brutal sabotagem a uma aeronave em pleno voo da Cubana de Aviação, que causou a morte e o desaparecimento de todos os passageiros, inclusive do time júnior de esgrima, que conquistou todas as medalhas de ouro no Campeonato Centro-Americano e do Caribe, do qual esse país foi sede, e que hoje, quando têm lugar os Jogos Pan-Americanos em Guadalajara, são recordados com mágoa.

Não era a Venezuela de Rómulo Gallegos e Andrés Eloy Blanco, mas a do trânsfuga, traidor e venenoso Rómulo Betancourt, invejoso da Revolução Cubana, aliado ao imperialismo, que tanto cooperou com as agressões a nossa Pátria. Depois de Miami, aquela propriedade petroleira dos Estados Unidos foi o principal centro da contrarrevolução contra Cuba; cabe a ele, perante a história, uma parte importante da aventura imperialista na Baía dos Porcos, do bloqueio econômico e dos crimes contra nosso povo. Dessa maneira, deu-se início à era tenebrosa, finalizada no dia em que Hugo Chávez jurou o cargo sobre a "moribunda constituição" que o ex-presidente Rafael Caldera sustinha em suas mãos tremebundas.

Haviam já decorrido 40 anos depois da vitória da Revolução Cubana e mais de um século de saque ianque do petróleo, das riquezas naturais e do suor dos venezuelanos. Muitos deles morreram em meio à ignorância e à miséria, impostas pelas canhoneiras dos Estados Unidos e da Europa!

Felizmente, existe a outra Venezuela, a de Bolívar e Miranda, a de Sucre e uma legião de líderes e pensadores brilhantes que foram capazes de conceber a grande pátria latino-americana, da qual sentimos que fazemos parte e, pela qual, resistimos mais de meio século de agressões e bloqueios.

"... impedir a tempo com a independência de Cuba que os Estados Unidos se estendam pelas Antilhas e caiam, com essa força a mais, sobre nossas terras da América. Tudo quanto fiz até hoje, e farei, é para isso", revelou o Apóstolo de nossa independência, José Martí, na véspera de sua morte em combate.

Precisamente nestes dias, encontra-se entre nós Hugo Chávez, como quem visita um pedaço da grande pátria latino-americana e caribenha, concebida por Simón Bolívar; ele compreende melhor que o resto o princípio martiano de que "... o que ele não terminou de fazer, está ainda sem fazer até hoje: porque Bolívar tem ainda muita coisa que fazer na América".

Conversei longamente com ele ontem e hoje. Expliquei-lhe com o afã que dedico as energias que me restam aos sonhos de um mundo melhor e mais justo.

Não é difícil partilhar sonhos com o líder bolivariano, quando o império mostra já os sintomas inequívocos de uma doença terminal.

Salvar a humanidade de um desastre irreversível pode simplesmente depender da burrice de qualquer presidente medíocre, dos que dirigiram nas décadas mais recentes esse império e, inclusive, dalgum dos cada vez mais poderosos chefes do complexo militar industrial que rege os destinos desse país.

Nações amigas, com crescente peso na economia mundial por seus avanços econômicos e tecnológicos e como membros permanentes do Conselho de Segurança, como a República Popular da China e a Federação Russa, junto aos povos do chamado Terceiro Mundo, na Ásia, África e América Latina, poderiam atingir esse objetivo. Os povos das nações desenvolvidas e ricas, cada vez mais espoliados por suas próprias oligarquias financeiras, começam a desempenhar seu papel nessa batalha pela sobrevivência humana.

Entretanto, o povo bolivariano da Venezuela se organiza e se junta para enfrentar e derrotar a nojenta oligarquia a serviço do império, que pretende galgar novamente o poder nesse país.

A Venezuela, por seu extraordinário desenvolvimento educacional, cultural, social, seus enormes recursos energéticos e naturais, deverá ser um modelo revolucionário para o mundo.

Chávez, que surgiu das fileiras do Exército Venezuelano, é metódico e incansável. Eu venho observando-o há 17 anos, desde que visitou Cuba pela primeira vez. Ele é uma pessoa muito humanitária e respeitosa da Lei; jamais tentou fazer a ninguém alvo de retaliações. Os setores mais humildes e esquecidos de seu país agradecem-lhe imensamente, pela primeira vez na história, o fato de ver seus sonhos de justiça social tornados realidade.

Eu disse a Hugo: "Vejo às claras que a Revolução Bolivariana poderá criar empregos em breve tempo, não só para os venezuelanos, mas também para os irmãos colombianos, povo trabalhador, que junto a vocês todos, lutou pela independência da América, cujo 40% vive na pobreza e uma parte considerável na pobreza extrema.

A respeito desses e outros assuntos, tive a honra de conversar com nosso ilustre visitante, o ícone da outra Venezuela.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A MAIS PERFEITA CONFUSÃO

Vou assistir agora esse filme... Será que é bom?
http://www.filmesonlinegratis.net/2011/10/assistir-poucas-cinzas-salvador-dali-dublado-online.html






Aos dezesseis anos matei meu professor de lógica.
Invocando legítima defesa – e qual defesa seria mais legítima?
Campos de Carvalho em “A Lua Vem da Ásia”

O assunto é Cinema.
Fábio Carvalho




Estava em uma mesa do Bar da Tia conversando com o Márcio que é filho da tia, ou seja, o primo, quando se aproximou o Nilson, um senhor que mora ali perto na casa de um parente, para tanto é o vigia e o quebra-galhos dos serviços gerais. Naquela noite ele o Nilson chegou à nossa mesa falando algo que não entedíamos, ali sentado fiquei olhando para ele de baixo para cima e notei que se debulhava em lágrimas que canalizavam no seu bigode branco e torto até o canto da boca. O seu rosto bastante peculiar causa e provoca várias brincadeiras e as mais variadas faltas de considerações. O sumidouro do espelho. As recorrentes são: quando o médico te olhou disse “vamos devolver que esse veio incompleto”. Outra: você é feio assim mesmo ou está chupando limão? E ainda: quanto você cobra para assustar umas almas penadas que aparecem no meu barraco lá no morro? Chego a ter medo do futuro e da solidão que em minha porta bate. São todas antigas, mas acontecem. Era só ilustração. Pois bem, de volta a história senta que vem lá. Não tive aonde me segurar e mandei: qual sua emoção para tantas lágrimas? Ele não entendeu e penetrou na noite escura com todos os tambores. Algum tempo depois conseguiu sofregamente balbuciar que tinha tomado uma canjibrina, a bem da verdade deveriam ter sido várias, e ficou olhando a fotografia da sua mãe que para ele era linda e curiosamente não a conheceu. Essa visão teria o levado as lágrimas, e não ficou em casa sozinho, veio chorar em público. Grande explicação, inteiramente plausível e incontestável.

Consegui me livrar desta sequência. Enfim. Barry White. Que emoção de novo. Atingimos o faux raccord. Aos sobressaltos. Coração aos pulos. Não aceito ovos quentes. Só de manhã no hotel. Incluído na diária. Vou logo para a segunda seqüência, rápido, senão não resolvo esta questão ao tempo que me impus. O sonho de todo fotógrafo era uma Pentax 6x7. De terno escovado. No início dos anos oitenta eu me aventurava três ou quatro vezes por semana a ir ao Cinema. Cada um deles naturalmente exigia um tipo de procedimento para chegar até aquela localização na região central e adentrar a sala de projeção passando pela roleta com o porteiro e ainda antes pela ante-sala. Um ritual. Na maioria dos casos para garantir os trocados que iriam para o ônibus, preferia eu ir a pé. Era a voracidade de ver filmes e me esconder do mundinho chatinho que me enredava e a grande curiosidade de andar pelas ruas, o que me causava uma sensação naquela altura muito agradável de invisibilidade pelo movimento descontínuo. Via tudo desta posição. Ou então o prazer vinha por acreditar que via sem ser visto.

Corte. Na manhã chuvosa desse domingo de outubro fiquei sozinho no centro cultural Ricardo Miranda, entre centenas de livros e filmes. Então tive a preciosa decisão de acatar a ordem do meu mais dileto professor, o Rô, e assistir a uma das obras primas do húngaro Miklós Jancsó, VÍCIOS PRIVADOS PÚBLICAS VIRTUDES. Embora o CINEMA NUNCA MAIS não esteja terminado, me voltei inteiramente para O MONGE DEVASSO. A boca roxa de vin rouge. Temos que atacar várias frentes. Chove lá fora e germana aqui dentro, fui além depois de tal imaginação. Achei na estante DOM GIOVANNI do Mozart em filme do Joseph Losey. Com consciência expandida alcancei os píncaros da glória. O que desejar mais deste domingo? Que o Galo ganhasse. Perdeu.

Pequeno falso plano de ligação. Nestas minhas andanças para chegar até os cinemas sempre cruzava com uma figura de olhos vidrados, um demi sorriso a la Coringa e um andar lépido, invariavelmente no sentido contrário ao meu. Um dia fui ao Cine Jaques na rua Tupis, assistir não me lembro qual filme, quando antes dele passou o curta NADA ALÉM protagonizado exatamente por esse personagem dos meus caminhos. Na saída do filme em frente ao Teds quem vem e passa? Ele mesmo. Em seguida todos os filmes que fui era antecedido pelo NADA ALÉM e pelas ruas cruzava com o Dom Sérgio Lara direto de Baependi. Que estranhas e misteriosas são as ramificações que as andanças permitem. Compreendeu?

quarta-feira, 19 de outubro de 2011



AS PALAVRAS

É doce o aconchego das palavras quando elas representam verdades que docemente nos elevam a mundos superiores. Elas são fortes em alguns momentos e noutros são suavemente pronunciadas como se falássemos com os anjos e deuses. Palavras soltas no ar não formalizam a história. A palavra tem de ser sólida e cristalina em sua total perfeição. Ela tem de ser, aos meus sentidos, uma tela pintada com a mais bela imagem do entardecer de um dia quente de verão. A palavra é um dom divino ou uma aberração do mal. Não importa a forma em que ela se apresenta. A mesma palavra com um mesmo significado pode ter infinitos significantes. Uma palavra tem um só tempo, uma única batida certa em um espaço indeterminado... Não é incrível? Poderia falar por horas milhares de palavras sem nenhum sentido. Alguns chamariam isso de poesia e eu acreditaria. É preciso acreditar. Quando você relaciona duas palavras e elas transformam tabus em totens, ícones, troféu de uma revolução, ai sim é que se inicia o poderoso processo de transformação, transmutação do inconcebível no que pode ser criado. Entendeu?
“Foi ali, naquele local inóspito, que obteve seu maior troféu.”
Assim meus amigos e inimigos, que ainda aqui não os tenho, é mister entender a força que vem de uma palavra e de suas composições, de um símbolo, de uma imagem - são armas poderosas para o bem ou para o mal dependendo das circunstâncias onde foram colocadas.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Projeto Releitura

O ex-mágico da Taberna Minhota

Murilo Rubião

Inclina, Senhor, o teu ouvido, e ouve-me;
porque eu sou desvalido e pobre.
(Salmos. LXXXV, I)

Hoje sou funcionário público e este não é o meu desconsolo maior.
Na verdade, eu não estava preparado para o sofrimento. Todo homem, ao atingir certa idade, pode perfeitamente enfrentar a avalanche do tédio e da amargura, pois desde a meninice acostumou-se às vicissitudes, através de um processo lento e gradativo de dissabores.
Tal não aconteceu comigo. Fui atirado à vida sem pais, infância ou juventude.
Um dia dei com os meus cabelos ligeiramente grisalhos, no espelho da Taberna Minhota. A descoberta não me espantou e tampouco me surpreendi ao retirar do bolso o dono do restaurante. Ele sim, perplexo, me perguntou como podia ter feito aquilo.
O que poderia responder, nessa situação, uma pessoa que não encontrava a menor explicação para sua presença no mundo? Disse-lhe que estava cansado. Nascera cansado e entediado.
Sem meditar na resposta, ou fazer outras perguntas, ofereceu-me emprego e passei daquele momento em diante a divertir a freguesia da casa com os meus passes mágicos.
O homem, entretanto, não gostou da minha prática de oferecer aos espectadores almoços gratuitos, que eu extraía misteriosamente de dentro do paletó. Considerando não ser dos melhores negócios aumentar o número de fregueses sem o conseqüente acréscimo nos lucros, apresentou-me ao empresário do Circo-Parque Andaluz, que, posto a par das minhas habilidades, propôs contratar-me. Antes, porém, aconselhou-o que se prevenisse contra os meus truques, pois ninguém estranharia se me ocorresse a idéia de distribuir ingressos graciosos para os espetáculos.
Contrariando as previsões pessimistas do primeiro patrão, o meu comportamento foi exemplar. As minhas apresentações em público não só empolgaram multidões como deram fabulosos lucros aos donos da companhia.
A platéia, em geral, me recebia com frieza, talvez por não me exibir de casaca e cartola. Mas quando, sem querer, começava a extrair do chapéu coelhos, cobras, lagartos, os assistentes vibravam. Sobretudo no último número, em que eu fazia surgir, por entre os dedos, um jacaré. Em seguida, comprimindo o animal pelas extremidades, transformava-o numa sanfona. E encerrava o espetáculo tocando o Hino Nacional da Cochinchina. Os aplausos estrugiam de todos os lados, sob o meu olhar distante.
O gerente do circo, a me espreitar de longe, danava-se com a minha indiferença pelas palmas da assistência. Notadamente se elas partiam das criancinhas que me iam aplaudir nas matinês de domingo. Por que me emocionar, se não me causavam pena aqueles rostos inocentes, destinados a passar pelos sofrimentos que acompanham o amadurecimento do homem? Muito menos me ocorria odiá-las por terem tudo que ambicionei e não tive: um nascimento e um passado.
Com o crescimento da popularidade a minha vida tornou-se insuportável.
Às vezes, sentado em algum café, a olhar cismativamente o povo desfilando na calçada, arrancava do bolso pombos, gaivotas, maritacas. As pessoas que se encontravam nas imediações, julgando intencional o meu gesto, rompiam em estridentes gargalhadas. Eu olhava melancólico para o chão e resmungava contra o mundo e os pássaros.
Se, distraído, abria as mãos, delas escorregavam esquisitos objetos. A ponto de me surpreender, certa vez, puxando da manga da camisa uma figura, depois outra. Por fim, estava rodeado de figuras estranhas, sem saber que destino lhes dar.
Nada fazia. Olhava para os lados e implorava com os olhos por um socorro que não poderia vir de parte alguma.
Situação cruciante.
Quase sempre, ao tirar o lenço para assoar o nariz, provocava o assombro dos que estavam próximos, sacando um lençol do bolso. Se mexia na gola do paletó, logo aparecia um urubu. Em outras ocasiões, indo amarrar o cordão do sapato, das minhas calças deslizavam cobras. Mulheres e crianças gritavam. Vinham guardas, ajuntavam-se curiosos, um escândalo. Tinha de comparecer à delegacia e ouvir pacientemente da autoridade policial ser proibido soltar serpentes nas vias públicas.
Não protestava. Tímido e humilde mencionava a minha condição de mágico, reafirmando o propósito de não molestar ninguém.
Também, à noite, em meio a um sono tranqüilo, costumava acordar sobressaltado: era um pássaro ruidoso que batera as asas ao sair do meu ouvido.
Numa dessas vezes, irritado, disposto a nunca mais fazer mágicas, mutilei as mãos. Não adiantou. Ao primeiro movimento que fiz, elas reapareceram novas e perfeitas nas pontas dos tocos de braço. Acontecimento de desesperar qualquer pessoa, principalmente um mágico enfastiado do ofício.
Urgia encontrar solução para o meu desespero. Pensando bem, concluí que somente a morte poria termo ao meu desconsolo.
Firme no propósito, tirei dos bolsos uma dúzia de leões e, cruzando os braços, aguardei o momento em que seria devorado por eles. Nenhum mal me fizeram. Rodearam-me, farejaram minhas roupas, olharam a paisagem, e se foram.
Na manhã seguinte regressaram e se puseram, acintosos, diante de mim.
— O que desejam, estúpidos animais?! — gritei, indignado.
Sacudiram com tristeza as jubas e imploraram-me que os fizesse desaparecer:
— Este mundo é tremendamente tedioso — concluíram.
Não consegui refrear a raiva. Matei-os todos e me pus a devorá-los. Esperava morrer, vítima de fatal indigestão.
Sofrimento dos sofrimentos! Tive imensa dor de barriga e continuei a viver.
O fracasso da tentativa multiplicou minha frustração. Afastei-me da zona urbana e busquei a serra. Ao alcançar seu ponto mais alto, que dominava escuro abismo, abandonei o corpo ao espaço.
Senti apenas uma leve sensação da vizinhança da morte: logo me vi amparado por um pára-quedas. Com dificuldade, machucando-me nas pedras, sujo e estropiado, consegui regressar à cidade, onde a minha primeira providência foi adquirir uma pistola.
Em casa, estendido na cama, levei a arma ao ouvido. Puxei o gatilho, à espera do estampido, a dor da bala penetrando na minha cabeça.
Não veio o disparo nem a morte: a máuser se transformara num lápis.
Rolei até o chão, soluçando. Eu, que podia criar outros seres, não encontrava meios de libertar-me da existência.
Uma frase que escutara por acaso, na rua, trouxe-me nova esperança de romper em definitivo com a vida. Ouvira de um homem triste que ser funcionário público era suicidar-se aos poucos.
Não me encontrava em condições de determinar qual a forma de suicídio que melhor me convinha: se lenta ou rápida. Por isso empreguei-me numa Secretaria de Estado.
1930, ano amargo. Foi mais longo que os posteriores à primeira manifestação que tive da minha existência, ante o espelho da Taberna Minhota.
Não morri, conforme esperava. Maiores foram as minhas aflições, maior o meu desconsolo.
Quando era mágico, pouco lidava com os homens -o palco me distanciava deles. Agora, obrigado a constante contato com meus semelhantes, necessitava compreendê-los, disfarçar a náusea que me causavam.
O pior é que, sendo diminuto meu serviço, via -me na contingência de permanecer à toa horas a fio. E o ócio levou -me à revolta contra a falta de um passado. Por que somente eu, entre todos os que viviam sob os meus olhos, não tinha alguma coisa para recordar? Os meus dias flutuavam confusos, mesclados com pobres recordações, pequeno saldo de três anos de vida.
O amor que me veio por uma funcionária, vizinha de mesa de trabalho, distraiu-me um pouco das minhas inquietações.
Distração momentânea. Cedo retornou o desassossego, debatia-me em incertezas. Como me declarar à minha colega? Se nunca fizera uma declaração de amor e não tivera sequer uma experiência sentimental!
1931 entrou triste, com ameaças de demissões coletivas na Secretaria e a recusa da datilógrafa em me aceitar. Ante o risco de ser demitido, procurei acautelar meus interesses. (Não me importava o emprego. Somente temia ficar longe da mulher que me rejeitara, mas cuja presença me era agora indispensável.)
Fui ao chefe da seção e lhe declarei que não podia ser dispensado, pois, tendo dez anos de casa, adquirira estabilidade no cargo.
Fitou-me por algum tempo em silêncio. Depois, fechando a cara, disse que estava atônito com meu cinismo. Jamais poderia esperar de alguém, com um ano de trabalho, ter a ousadia de afirmar que tinha dez.
Para lhe provar não ser leviana a minha atitude, procurei nos bolsos os documentos que comprovavam a lisura do meu procedimento. Estupefato, deles retirei apenas um papel amarrotado — fragmento de um poema inspirado nos seios da datilógrafa.
Revolvi, ansioso, todos os bolsos e nada encontrei.
Tive que confessar minha derrota. Confiara demais na faculdade de fazer mágicas e ela fora anulada pela burocracia.
Hoje, sem os antigos e miraculosos dons de mago, não consigo abandonar a pior das ocupações humanas. Falta-me o amor da companheira de trabalho, a presença de amigos, o que me obriga a andar por lugares solitários. Sou visto muitas vezes procurando retirar com os dedos, do interior da roupa, qualquer coisa que ninguém enxerga, por mais que atente a vista.
Pensam que estou louco, principalmente quando atiro ao ar essas pequeninas coisas.
Tenho a impressão de que é uma andorinha a se desvencilhar das minhas mãos. Suspiro alto e fundo.
Não me conforta a ilusão. Serve somente para aumentar o arrependimento de não ter criado todo um mundo mágico.
Por instantes, imagino como seria maravilhoso arrancar do corpo lenços vermelhos, azuis, brancos, verdes. Encher a noite com fogos de artifício. Erguer o rosto para o céu e deixar que pelos meus lábios saísse o arco-íris. Um arco-íris que cobrisse a Terra de um extremo a outro. E os aplausos dos homens de cabelos brancos, das meigas criancinhas.

Murilo Eugênio Rubião nasceu em Silvestre Ferraz, hoje Carmo de Minas — MG, no ano de 1916. Formado em Direito, foi professor, jornalista, diretor de jornal e de estação de rádio (Rádio Inconfidência). Foi o responsável pela organização do Suplemento Literário do Minas Gerais (1966). Publicou seu primeiro livro de contos "O ex-mágico" em 1947; "A estrela vermelha" (1953); "Os dragões e outros contos" (1965); "O pirotécnico Zacarias" e "O convidado" (1974); "A casa do girassol vermelho" (1978); e "O homem do boné cinzento e outras histórias" (1990). Teve seus principais contos traduzidos para a língua inglesa, alemã e espanhola. Foram adaptado para o cinema os contos: "A Armadilha", "O pirotécnico Zacarias", "O ex-mágico da Taberna Minhota" e "O bloqueio". Para o teatro, foram adaptados "O ex-mago", "The piranha lounge" (peça baseada no autor — diversos contos) e "O ex-mago da Taberna Minhota". Sua obra já foi objeto de dezenas de artigos publicados em jornais e revistas, além de ter sido estudada em mais de quarenta teses de doutorado e dissertações de mestrado, no Brasil e no exterior.
O escritor faleceu em Belo Horizonte, em 1991, onde residiu a maior parte de sua vida.
O texto acima foi extraído do livro "O pirotécnico Zacarias e outros contos", Editora Companhia das Letras — São Paulo, 2006, pág. 19, organização de Humberto Werneck, postfácio de Jorge Schwartz.
Leia o texto. Compre o livro.

domingo, 16 de outubro de 2011

Projeto Releitura

O CAVALO QUE BEBIA CERVEJA
Guimarães Rosa
Essa chácara do homem ficava meio ocultada, escurecida pelas árvores, que nunca se viu plantar tamanhas tantas em roda de uma casa. Era homem estrangeiro. De minha mãe ouvi como, no ano da espanhola, ele chegou, acautelado e espantado, para adquirir aquele lugar de todo defendimento; e a morada, donde de qualquer janela alcançasse de vigiar a distância, mãos na espingarda; nesse tempo, não sendo ainda tão gordo, de fazer nojo. Falavam que comia a quanta imundície: caramujo, até rã, com as braçadas de alfaces, embebidas num balde de água. Ver, que almoçava e jantava, da parte de fora, sentado na soleira da porta, o balde entre suas grossas pernas, no chão, mais as alfaces; tirante que, a carne, essa, legítima de vaca, cozinhada. Demais gastasse era com cerveja, que não bebia à vista da gente. Eu passava por lá, ele me pedia: — “Irivalíni, bisonha outra garrafa, é para o cavalo…” Não gosto de perguntar, não achava graça. Às vezes eu não trazia, às vezes trazia, e ele me indenizava o dinheiro, me gratificando. Tudo nele me dava raiva. Não aprendia a referir meu nome direito. Desfeita ou ofensa, não sou o de perdoar — a nenhum de nenhuma.
Minha mãe e eu sendo das poucas pessoas que atravessávamos por diante da porteira, para pegar a pinguela do riacho. — “Dei’stá, coitado, penou na guerra…” — minha mãe explicando. Ele se rodeava de diversos cachorros, graúdos, para vigiarem a chácara. De um, mesmo não gostasse, a gente via, o bicho em sustos, antipático — o menos bem tratado; e que fazia, ainda assim, por não se arredar de ao pé dele, estava, a toda a hora, de desprezo, chamando o endiabrado do cão: por nome “Mussulino”. Eu remoia o rancor: de que, um homem desses, cogotudo, panturro, rouco de catarros, estrangeiro às náuseas — se era justo que possuísse o dinheiro e estado, vindo comprar terra cristã, sem honrar a pobreza dos outros, e encomendando dúzias de cerveja, para pronunciar a feia fala. Cerveja? Pelo fato, tivesse seus cavalos, os quatro ou três, sempre descansados, neles não amontava, nem agüentasse montar. Nem caminhar, quase, não conseguia. Cabrão! Parava pitando, uns charutos pequenos, catinguentos, muito mascados e babados. Merecia um bom corrigimento. Sujeito sistemático, com sua casa fechada, pensasse que todo o mundo era ladrão.
Isto é, minha mãe ele estimava, tratava com as benevolências. Comigo, não adiantava — não dispunha de minha ira. Nem quando minha mãe grave adoeceu, e ele ofertou dinheiro, para os remédios. Aceitei; quem é que vive de não? Mas não agradeci. Decerto ele tinha remorso, de ser estrangeiro e rico. E, mesmo, não adiantou, a santa de minha mãe se foi para as escuridões, o danado do homem se dando de pagar o enterro. Depois, indagou se eu queria vir trabalhar para ele. Sofismei, o quê. Sabia que sou sem temor, em meus altos, e que enfrento uns e outros, no lugar a gente pouco me encarava. Só se fosse para ter a minha proteção, dia e noite, contra os issos e vindiços. Tanto, que não me deu nem meio serviço por cumprir, senão que eu era para burliquear por lá, contanto que com as armas. Mas, as compras para ele, eu fazia. — “Cerveja, Irivalíni. É para o cavalo…” — o que dizia, a sério, naquela língua de bater ovos. Tomara ele me xingasse! Aquele homem ainda havia de me ver.
Do que mais estranhei, foram esses encobrimentos. Na casa, grande, antiga, trancada de noite e de dia, não se entrava; nem para comer, nem para cozinhar. Tudo se passava da banda de cá das portas. Ele mesmo, figuro que raras vezes por lá se introduzia, a não ser para dormir, ou para guardar a cerveja — ah, ah, ah — a que era para o cavalo. E eu, comigo: — “Tu espera, porco, para se, mais dia menos dia, eu não estou bem aí, no haja o que há!” Seja que, por essa altura, eu devia ter procurado as corretas pessoas, narrar os absurdos, pedindo providências, soprar minhas dúvidas. O que fácil não fiz. Sou de nem palavras. Mas, por aí, também, apareceram aqueles — os de fora.
Sonsos os dois homens, vindos da capital. Quem para eles me chamou, foi o seo Priscílio, subdelegado. Me disse: — “Reivalino Belarmino, estes aqui são de autoridade, por ponto de confiança.” E os de fora, me pegando à parte, puxaram por mim, às muitas perguntas. Tudo, para tirar tradição do homem, queriam saber, em pautas ninharias. Tolerei que sim; mas nada não fornecendo. Quem sou eu, quati, para cachorro me latir? Só cismei escrúpulos, pelas más caras desses, sujeitos embuçados, salafrados também. Mas, me pagaram, o bom quanto. O principal deles dois, o de mão no queixo, me encarregou: que, meu patrão, sendo homem muito perigoso, se ele vivia mesmo sozinho? E que eu reparasse, na primeira ocasião, se ele não tinha numa perna, embaixo, sinal velho de coleira, argolão de ferro, de criminoso fugido de prisão. Pois sim, piei prometi.
Perigoso, para mim? — ah, ah. Pelo que, vá, em sua mocidade, podendo ter sido homem. Mas, agora, em pança, regalão, remanchão, somente quisesse a cerveja — para o cavalo. Desgraçado, dele. Não que eu me queixasse, por mim, que nunca apreciei cerveja; gostasse, comprava, bebia, ou pedia, ele mesmo me dava. Ele falava que também não gostava, não. De verdade. Consumia só a quantidade de alfaces, com carne, boquicheio, enjooso, mediante muito azeite, lambia que espumava. Por derradeiro, estava meio estramontado, soubesse da vinda dos de fora? Marca de escravo em perna dele, não observei, nem fiz por isso. Sou lá serviçal de meirinho-mor, desses, excogitados, de tantos visares? Mas eu queria jeito de entender, nem que por uma fresta, aquela casa, debaixo de chaves, espreitada. Os cachorros já estando mansos amigáveis. Mas, parece que seo Giovânio desconfiou. Pois, por minha hora de surpresa, me chamou, abriu a porta. Lá dentro, até fedia a coisa sempre em tampa, não dava bom ar. A sala, grande, vazia de qualquer amobiliado, só para espaços. Ele, nem que de propósito, me deixou olhar à minha conta, andou comigo, por diversos cômodos, me satisfiz. Ah, mas, depois, cá comigo, ganhei conselho, ao fim da idéia: e os quartos? Havia muitos desses, eu não tinha entrado em todos, resguardados. Por detrás de alguma daquelas portas, pressenti bafo de presença — só mais tarde? Ah, o carcamano queria se birbar de esperto; e eu não era mais?
Demais que, uns dias depois, se soube de ouvidos, tarde da noite, diferentes vezes, galopes no ermo da várzea, de cavaleiro saído da porteira da chácara. Pudesse ser? Então, o homem tanto me enganava, de formar uma fantasmagoria, de lobisomem. Só aquela divagação, que eu não acabava de entender, para dar razão de alguma coisa: se ele tivesse, mesmo, um estranho cavalo, sempre escondido ali dentro, no escuro da casa?
Seo Priscílio me chamou, justo, outra vez, naquela semana. Os de fora estavam lá, de colondria, só entrei a meio na conversa; um deles dois, escutei que trabalhava para o “Consulado”. Mas contei tudo, ou tanto, por vingança, com muito caso. Os de fora, então, instaram com seo Priscílio. Eles queriam permanecer no oculto, seo Priscílio devia de ir sozinho. Mais me pagaram.
Eu estava por ali, fingindo não ser nem saber, de mão-posta. Seo Priscílio apareceu, falou com seo Giovânio: se que estórias seriam aquelas, de um cavalo beber cerveja? Apurava com ele, apertava. Seo Giovânio permanecia muito cansado, sacudia devagar a cabeça, fungando o escorrido do nariz, até o toco do charuto; mas não fez mau rosto ao outro. Passou muito a mão na testa: — “Lei, guer ver?” Saiu, para surgir com um cesto com as garrafas cheias, e uma gamela, nela despejou tudo, às espumas. Me mandou buscar o cavalo: o alazão canela-clara, bela-face. O qual — era de se dar a fé? — já avançou, avispado, de atreitas orelhas, arredondando as ventas, se lambendo: e grosso bebeu o rumor daquilo, gostado, até o fundo; a gente vendo que ele já era manhudo, cevado naquilo! Quando era que tinha sido ensinado, possível? Pois, o cavalo ainda queria mais e mais cerveja. Seo Priscílio se vexava, no que agradeceu e se foi. Meu patrão assoviou de esguicho, olhou para mim: “Irivalíni, que estes tempos vão cambiando mal. Não laxa as armas!” Aprovei. Sorri de que ele tivesse as todas manhas e patranhas. Mesmo assim, meio me desgostava.
Sobre o tanto, quando os de fora tornaram a vir, eu falei, o que eu especulava: que alguma outra razão devia de haver, nos quartos da casa. Seo Priscílio, dessa vez, veio com um soldado. Só pronunciou: que queria revistar os cômodos, pela justiça! Seo Giovânio, em pé de paz, acendeu outro charuto, ele estava sempre cordo. Abriu a casa, para seo Priscílio entrar, o soldado; eu, também. Os quartos? Foi direto a um, que estava duro de trancado. O do pasmoso: que, ali dentro, enorme, só tinha o singular — isto é, a coisa a não existir! — um cavalão branco, empalhado. Tão perfeito, a cara quadrada, que nem um de brinquedo, de menino; reclaro, branquinho, limpo, crinado e ancudo, alto feito um de igreja — cavalo de São Jorge. Como podiam ter trazido aquilo, ou mandado vir, e entrado ali acondicionado? Seo Priscílio se desenxaviu, sobre toda a admiração. Apalpou ainda o cavalo, muito, não achando nele oco nem contento. Seo Giovânio, no que ficou sozinho comigo, mascou o charuto: — “Irivalíni, pecado que nós dois não gostemos de cerveja, hem?” Eu aprovei. Tive a vontade de contar a ele o que por detrás estava se passando.
Seo Priscílio, e os de fora, estivessem agora purgados de curiosidades. Mas eu não tirava o sentido disto: e os outros quartos, da casa, o atrás de portas? Deviam ter dado a busca por inteiro, nela, de uma vez. Seja que eu não ia lembrar esse rumo a eles, não sou mestre de quinaus. Seo Giovânio conversava mais comigo, banzativo: — “Irivalíni, eco, a vida é bruta, os homens são cativos…” Eu não queria perguntar a respeito do cavalo branco, frioleiras, devia de ter sido o dele, na guerra, de suma estimação. — “Mas, Irivalíni, nós gostamos demais da vida…” Queria que eu comesse com ele, mas o nariz dele pingava, o ranho daquele monco, fungando, em mal assôo, e ele fedia a charuto, por todo lado. Coisa terrível, assistir aquele homem, no não dizer suas lástimas. Saí, então, fui no seo Priscílio, falei: que eu não queria saber de nada, daqueles, os de fora, de coscuvilho, nem jogar com o pau de dois bicos! Se tornassem a vir, eu corria com eles, despauterava, escaramuçava — alto aí! — isto aqui é Brasil, eles também eram estrangeiros. Sou para sacar faca e arma. Seo Priscílio sabia. Só não soubesse das surpresas.
Sendo que foi de repente. Seo Giovânio abriu de em par a casa. Me chamou: na sala, no meio do chão, jazia um corpo de homem, debaixo de lençol. — “Josepe, meu irmão”… – ele me disse, embargado. Quis o padre, quis o sino da igreja para badalar as vezes dos três dobres, para o tristemente. Ninguém tinha sabido nunca o qual irmão, o que se fechava escondido, em fuga da comunicação das pessoas. Aquele enterro foi muito conceituado. Seo Giovânio pudesse se gabar, ante todos. Só que, antes, seo Priscílio chegou, figuro que os de fora a ele tinham prometido dinheiro; exigiu que se levantasse o lençol, para examinar. Mas, aí, se viu só o horror, de nós todos, com caridade de olhos: o morto não tinha cara, a bem dizer — só um buracão, enorme, cicatrizado antigo, medonho, sem nariz, sem faces — a gente devassava alvos ossos, o começo da goela, gargomilhos, golas. — “Que esta é a guerra…” — seu Giovânio explicou — boca de bobo, que se esqueceu de fechar, toda doçuras.
Agora, eu queria tomar rumo, ir puxando, ali não me servia mais, na chácara estúrdia e desditosa, com o escuro das árvores, tão em volta. Seo Giovânio estava da banda de fora, conforme seu costume de tantos anos. Mais achacoso, envelhecido, subitamente, no trespassamento da manifesta dor. Mas comia, sua carne, as cabeças de alfaces, no balde, fungava. — “Irivalíni… que esta vida… bisonha. Caspité?” — perguntava, em todo tom de canto. Ele avermelhadamente me olhava. — “Cá eu pisco…” — respondi. Não por nojo, não dei um abraço nele, por vergonha, para não ter também as vistas lagrimadas. E, então, ele fez a mais extravagada coisa: abriu cerveja, a que quanta se espumejasse. — “Andamos, Irivalíni, contadino, bambino?” — propôs. Eu quis. Aos copos, aos vintes e trintas, eu ia por aquela cerveja, toda. Sereno, ele me pediu para levar comigo, no ir-m’embora, o cavalo — alazão bebedor — e aquele tristoso cachorro magro, Mussulino.
Não avistei mais o meu Patrão. Soube que ele morreu, quando em testamento deixou a chácara para mim. Mandei erguer sepulturas, dizer as missas, por ele, pelo irmão, por minha mãe. Mandei vender o lugar, mas, primeiro, cortarem abaixo as árvores, e enterrar no campo o trem, que se achava, naquele referido quarto. Lá nunca voltei. Não, que não me esqueço daquele dado dia — o que foi uma compaixão. Nós dois, e as muitas, muitas garrafas, na hora cismei que um outro ainda vinha sobrevir, por detrás da gente, também, por sua parte: o alazão façalvo; ou o branco enorme, de São Jorge; ou o irmão, infeliz medonhamente. Ilusão, que foi, nenhum ali não estava. Eu, Reivalino Belarmino, capisquei. Vim bebendo as garrafas todas, que restavam, faço que fui eu que tomei consumida a cerveja toda daquela casa, para fecho de engano.

Assustador



OS SENADORES QUEREM ACABAR COM A TV BRASIL

A cada dia nós ouvimos novas notícias da defesa intransigente dos fundamentalistas-religiosos no processo político brasileiro. Eles vêm interferindo, reivindicando privilégios e assumindo o controle de uma parte da mídia, com o firme propósito de chegar ao poder. Para isso acontecer precisam converter os desesperados, os fracos e a maioria dos trabalhadores deste país, na fé de dias melhores, a esperança dos milhões em vida ou a salvação eterna e nestas divagações ocultas continuam se enriquecendo e se promovendo a custa do trabalho e da ignorância deste povo.

É preciso lembrar aos senadores que a Arquidiocese do Rio de Janeiro tem um órgão de mídia próprio, a Rádio Catedral. A Santa Missa continua sendo transmitida em todas as manhãs de domingo pela Rede Globo. As confissões evangélicas, nem se fala: quase todos têm espaços alugados em emissoras privadas, e não custa nada lembrar da Rede Record (propriedade da Igreja Universal do Reino de Deus) e da Nossa TV (canal de TV a cabo da Igreja Internacional da Graça de Deus).

Pra que querem mais espaço na mídia? Se a ideia é dar espaço às religiões, que tal conceder espaço às que nunca o tiveram? Alguém já viu um programa de rádio ou TV das religiões afro-brasileiras? Da umbanda, macumba ou candomblé?

Senhores senadores: a TV Brasil, que os senhores querem transformar em um templo religioso, pertence ao estado brasileiro e o estado é laico como diz a constituição:

"Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;"

Mas o que são a Constituição Federal e as leis do Estado laico para os fundamentalistas de todas as religiões, que querem transformar o Brasil num Estado teocrático, regido pelos ditames da SUA religião? (O duro vai ser: qual destas religiões será a mandatária num Estado teocrático, a católica ou a evangélica? Os primeiros ainda sonham com a volta da situação dos tempos do Império e da Constituição de 1934, onde eram a religião oficial do Estado. Mas os segundos estão agindo de modo mais agressivo, e podem surpreender nesta disputa. Noites de São Bartolomeu à vista?)

É como disse um cineasta em uma lista de discussão: - O que mais me surpreende, contudo, é quem participa desta lambança fundamentalista. Que o senador da Igreja Universal Marcelo Crivella entre nisso é compreensível. Mas um homem que eu achava de esquerda como Lindbergh Farofa, digo, Farias (e do PT, porra!) entrar nisso? Que decepção!... Já sei em quem eu não vou votar mais...

sábado, 15 de outubro de 2011

NOTA

A Exibição do filme "Liberdade"
Paulo Cotias (*)
Certa vez ouvi dizer que liberdade é um termo que não temos como explicar, mas que não há uma só pessoa que não entenda. Em um momento no qual o país já estava exausto dos mandos e desmandos, do chicote e da mordaça, tão largamente usados pelo ditatorial regime militar brasileiro, surge à oportunidade de reconstruir os cacos de um tempo perdido. Às vezes a história permite que um sussurro se transforme em esperança, em grito, em bandeira e ação… Dando aos miseráveis homens ao menos um alento, quando não, uma chance única de transformação. Era a redemocratização voltando à cena, ainda tímida, frágil, embalada no colo das elites e das forças reacionárias… Mas também acalentada pelas forças progressistas, plurais, embrionárias, sabedoras da necessidade de formar uma só torre, numa Babel de falas, articulações e cores. Essa explosão se traduz em imagens pelo olhar de José Sette de Barros, cujo filme apropriadamente chamado de Liberdade, foi visto e discutido pelos acadêmicos de História da nossa Universidade Estácio de Sá.
Sette apresenta o caldeirão mineiro que fervia a sopa política, servida ainda quente para um Brasil que buscava o refrigério da repressão. Surge a personagem central do filme, Tancredo Neves, síntese da alma mineira, conciliadora por natureza, capaz de esgarçar o tecido da democracia até que se mostrem as fibras sem, no entanto, rasgá-lo. Fica o agradecimento de um amigo que aprecia sua obra, sua inteligência e sua maneira de apresentar o mundo por meio de lentes próprias, alternativas, inovadoras. É a arte ajudando a construir a história ou vice-versa, não importa… Importa sim, é a oportunidade das novas cabeças-pensantes, aprenderem a pensar. E José Sette nos proporcionou, mais uma vez, exatamente isso.
(*) Coordenador do Curso de História da Universidade Estácio de Sá.


Ao Mestre com Carinho!
Sexta-feira, 14 de Outubro de 2011
Obrigada, mestre, por compartilhar tanta sensibilidade e sabedoria com todos nós!
O documentário nos trouxe à consciência a importância das manifestações políticas, artísticas, culturais, enfim, o períodoa histórico focalizado, exaltando a liberdade e o compromisso de sua eterna vigilância.

Sua presença entre nós, a trajetória brilhante, a capacidade de transformar obstáculos em desafios, faz de você não só um cineasta admirado e aplaudido, como também uma referência de luta, competência e sucesso.

Para nós, nos primeiros passos acadêmicos, sua inestimável contribuição enriquece, dinamiza e estimula à realização dos ideais sonhados.

Beijos afetuosos,
Luciene Ciciiani

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

PÍLULAS

Quero me desculpar pelo confuso texto do terceiro parágrafo das 7 Pílulas publicadas anteriormente. Ele foi revisado e corrigido.

Hoje tive uma triste notícia. Morreu o meu conterrâneo amigo Marcelo França, produtor de cinema e diretor de tevê. O forte e disposto personagem fez parte da minha história durante um tempo, depois se distanciou. Sempre tinha notícias dele através da atriz Maria Gladys, mas eu não o via há muitos anos. No livro de ficção que estou escrevendo ele é um dos meus personagens – Marcelo!Quanto mais, mais... Vai em paz.

As crianças indígenas de Dourado, Mato Grosso do Sul, subnutridas e jogadas em barracos de uma vila miserável, bebendo água contaminada, sem serviço de saúde, sem futuro, sem nada, é um escândalo político, do prefeito, do governador e da Presidência. É um absurdo sem fim. Era preciso fazer um levantamento verdadeiro da situação das crianças em todo território nacional.

Continua a loucura financeira internacional comandada pelos donos do dinheiro, ou seja: os bancos. Um banco tentando ganhar, comer, o outro, mas, como em um banquete pantagruélico incontrolável, acabam se devorando. Nesta ganância voraz do lucro, dos juros, das bolsas, inicia-se um processo que é autofágico, a cobra comendo o próprio rabo e toda a glória, o charme da elite social, essas histórias de conto de fada e todo esse poder do dinheiro, toda essa merda, pode acabar em um vácuo social, que se bem utilizada pela juventude inconformada e orientada para não dispersarem dos seus sonhos, faça com que isso tudo, talvez, venha propiciar aos que herdarão a terra o nascimento de um novo mundo. Quem viver verá.

Eu sou fã do jazz, blues, rock, e de todas as boas manifestações da música popular estrangeira. Ouvi no rádio que mais um festival de música importada é criado, agora é Petrópolis. É uma mania de imitar que os medíocres funcionários públicos e alguns políticos incompetentes têm de valorizar a cultura estrangeira, imaginado assim que serão vistos como pessoas de bom gosto pelas elites provincianas de sua cidade ou pensam que promovendo esses encontros incentivam o turismo nos seus municípios.
Paraty não deu certo? Ouro Preto também? Por que não Petrópolis? Tudo bem! Mas é bom lembrar que existem outros tipos de festivais brasileiros que seriam, se bem organizados, grandes e maiores sucessos. Posso citar alguns: Festivais do samba, de música contemporânea, de MPB, de instrumental Brasil, de cancioneiros brasileiros, de novos compositores, etc.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Novas Pílulas

7 Pílulas

1. Ontem exibi o meu filme “Liberdade” na universidade aqui de Cabo Frio a convite do Professor Paulo Cotias para uma platéia de estudantes e professores que lotaram a sala de aula e projeção. Contei para eles o grande momento histórico que vivi e filmei em Minas Gerais durante o conturbado processo político da abertura democrática no país. Foi uma noite dedicada ao Brasil. Para os presentes valeu o filme e o encantamento que ainda persiste na alma nacional com a personagem principal do filme, o presidente Tancredo Neves. Os jovens alunos do curso de história não poderiam ter um prato mais saboroso do que este lhes apresentado nesta noite. Todos gostaram e pediram bis de outros filmes, em outra data que eu pudesse voltar... Disse a eles que na primeira exibição do meu filme mais popular “O Rei do Samba” tinha uns 30 alunos na sala, hoje temos sessenta e se continuarmos nesta progressão, na exibição do terceiro filme, teremos uma quantidade de estudantes que valeria a universidade e seus coordenadores investirem mais nesses encontros.

2. A juventude norte americana resolveu aparecer nas ruas de NY para reclamar da velha Wall Street, símbolo máximo do poder financeiro. O movimento vem num crescendo que anda assustando a mídia internacional. Lembro-me de 1968, quando também lá e no mundo, os jovens se reuniam em festivais da contracultura. O número de adeptos foi crescendo e outros movimentos mais radicais apareceram. Belos movimentos políticos culturais que foram devorados, assassinados, massacrados, pela mídia e pelo sistema e assim, no final de 2 anos, só sobraram de todos os movimentos libertários, à turma da música. Jimi Hendrix morreu em 1970, o resto dos rebeldes de outrora, na maioria dos casos, foram absorvidos pelo assustado sistema, que ganhou essa batalha, com um grande lucro, contra a liberdade e sem muito esforço. Hoje, na capital do Império do Norte, me parece que a crise é mais séria, pois o negócio é a falta do capital e a consequente e total desilusão quanto ao futuro econômico da nação mais poderosa do mundo. Será o princípio do fim da má distribuição do dinheiro; da ganância do capital especulativo; da ditadura financeira dos mais ricos que dominam a maioria pobre, aterrorizando com crises sem fins e guerras sem motivos o mundo?

3. Os movimentos que hoje explodem pelo mundo, onde é grande a participação da juventude, tem características culturais e políticas diferentes, mas a essência da revolta é a mesma em todos os países. Estamos entendendo, através da comunicação instantânea e livre da internet, as pessoas. Todos nós, pelo mundo afora, podemos nos informar lendo e vendo informações, no simples toque surge, em pouco tempo, pela direita ou pela esquerda, se você quiser, parte substancial do saber humano. As mazelas também. Podemos ver que a ganância do capitalismo globalizado neoliberal está finalmente acabando com o mudo natural, econômico, sustentável, cultural do homem. Catástrofes se anunciam. Desertificação dos solos. Envenenamento de todas as águas com produtos químicos. Fome e miséria para os desprivilegiados do sistema... A grande maioria. Todo o mundo já começa a enxergar com binóculos o que lhe reserva o futuro aos seus filhos e netos... Hoje só quem é cego não vê.

4. A grande dúvida é que não há liderança em todos esses novos movimentos; não há uma idéia e nem uma reivindicação de luta se não as mais genéricas; não há ainda personagens e pensamentos fortes nesta história e, como todas as histórias, é esse o momento certo quando pode surgir, num repente, alguém que eleve as massas nas suas abstrações intuitivas.

5. Acho que tem um componente forte e racista na briga entre os democratas e os republicanos que não passa pela política, nem pela economia, é que o sistema financeiro dominante não quer viver mais quatro anos sob o comando de um negro com o nome de um árabe. Dizem até que essa foi a maior desgraça, a doença que se abateu sobre a poderosa águia do norte e para que ela não morra é preciso de um antídoto poderoso..., dá prá creditar?

6. É preciso criar uma Universidade Política, onde os candidatos, a serem eleitos pelo voto, fossem obrigados a estudarem. Nas universidades onde se formam médicos, como engenheiros, advogados, dentistas, agora se formam também políticos. Não melhoraríamos assim os nossos quadros?

7. Essa semana começou me parecendo que tudo poderia acontecer quando recebi da Ancine o CPB (Certificado de Produto Brasileiro) do meu filme “O Rei do Samba”, liguei para a TV Brasil e passei a informação de que estava pronto para negociar com eles o filme legalizado. Foi ai que tudo mudou na semana, pois recebi deles a notícia que a verba federal para adquirir os filmes escolhidos ainda não havia sido liberada pelo governo. Ai, eu me pergunto: - pra quê corri tanto?

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Pílulas de Dúvidas

Com a chegada da tevê digital em todo território nacional, os canais abertos de pouco alcance que não terão mais as retransmissões das grandes redes nacionais de tevê analógica deveriam ser entregues aos municípios brasileiros, ao poder público, para que cada prefeitura fosse obrigada por lei federal a cuidar da difusão educativa, cultural e jornalística da sua região.

Tem certas experiências culturais que se praticam no país que nos parece de uma ingenuidade infantil. Cito aqui duas delas: por um monte de papel preenchido, assinado, documentado e legalizado, uma burocracia infernal, descola-se uma boa grana do Ministério da Cultura com a idéia de levar o nosso acervo cultural a um maior número de pessoas através do projeto chamado “Ponto de Cultura”. Talvez alguns desses “pontos” tenham difundido seus honestos trabalhos, mas sem nenhum dado na mão posso dizer que a maioria foi uma grande falácia. Outro absurdo é colocar equipamentos de vídeos profissionais na mão inexperiente de garotos das pequenas cidades do interior e ainda liberar uma boa quantia de dinheiro para eles realizarem vídeos com temas aleatórios que para nada servem. Posso garantir, não obstante os dados oficiais de proveito do Ministério da Cultura, que essas experiências, cheias de boas intenções para com os realizadores, não trouxeram, nem a eles nem ao país, nenhum proveito digno de nota.

É preciso gastar dinheiro e tempo nas coisas certas, como espalhar por todos os municípios do Brasil pequenas salas de encontros e concertos (que chamei, em um dos meus utópicos projetos, de “Ocas Culturais”, de mídia digital), onde possa se exibir a arte e a criação que existe no cinema, no teatro, na música, na dança, na poesia, na literatura, nas artes plásticas, no artesanato disso tudo, no popular cafezinho, no pão de queijo mineiro, no bate-papo inteligente e em todas outras guloseimas do paladar cultural brasileiro.

Não precisamos somente de mais salas de cinema, como está propondo a ANCINE ao governo, elas serão realizadas com o dinheiro público para levar o lixo estrangeiro às pequenas cidades que não possuem cinema. É inacreditável que isso aconteça. Ou serão essas novas salas exclusivas a exibição dos filmes brasileiros? Quem serão os programadores destas salas? Os distribuidores? O nosso interior não esta só carente de cinema, está carente da cultura brasileira, da sua identidade, que só um projeto multimídia, multicultural, como as Ocas podem oferecer.

Os assuntos da nossa cultura não deveriam ser no mínimo tratados pela mídia com toda a nobreza que ela trata o esporte?

A quem interessa a libertação do mercado alternativo de entretenimento por todo território brasileiro?

Uma boa notícia é que novas distribuidoras estão sendo propostas pelos produtores-empresários da indústria brasileira de cinema. Essa é uma boa oportunidade para se tirar as latas das prateleiras e digitalizá-las e é importante sempre lembrar que não se deve restringir o mercado só ao cinema comercial na distribuição destes filmes.

domingo, 9 de outubro de 2011

Ditadura Financeira

O DINHEIRO É UM DÉBITO MALDITO

primeira aula: omo o dinheiro foi criado
http://youtu.be/NoGZ3-CMzJg


segunda aula: como ele começou a ser criado
http://youtu.be/-h_Z6BTnVPc


terceira aula: como passou a ser multiplicado
http://youtu.be/7S2pE70Re3I


quarta aula: como mantê-lo valendo alguma coisa
http://youtu.be/sCxVLgc-2iU


última aula: como as coisas podem acabar
http://youtu.be/KFythi4sdSo



MÚSICA de TAVINHO PAES COM O A. BRANDÃO
http://youtu.be/cXc1TtB-HkU

sábado, 8 de outubro de 2011

DO LIXO AO LUXO

O universo cultural do planeta tem tudo a oferecer neste grande mercado do divertimento e muito pouco ao homem que se interessa em se elevar na busca do saber e do conhecimento. Stanley Kubrick errou ao profetizar mudanças profundas na consciência humana e na busca eterna de um sábio que em nós existe, criando a uns trinta anos passados, uma ficção futurista, poeticamente filmada e esteticamente renovadora de Uma Odisséia no Espaço. Esse filme foi um dos pilares na minha visão do novo na cinematografia universal. Veja que não sou um xenófobo. Lembro-me que todos nós cinéfilos saímos da sala de cinema estupefatos. Dez anos se passaram do ano simbólico de 2001 para cá e as coisas no universo político-cultural do homem continuam as mesmas, nada mudou, a ignorância continua grassando. No Brasil o ex-presidente Lula, que nada sabe e nada fez pela educação e pela cultura brasileira, foi contemplado com o título de doutor do saber (honoris causa) em Paris, premiado sem saber onde morreu Mario de Sá-Carneiro e onde o modernismo brasileiro foi recebido com festa e reverências históricas. Os melhores projetos do seu ex-ministro Gil, a ANCINAVE, por pressão da mídia e dos interesses políticos do partido, foram parar no ralo. A Presidenta atual também não sabe, embora ela mostre querer saber quais são os meandros políticos que envolvem as grandes fortunas deste mercado de mídia e assim, sem querer criar confusão, polêmicas, relega a importância deles para todo o país, que deseja e quer, também sem saber, uma política cultural avançada em toda a sua abrangência estratégica de identidade nacional.
Não existem reformas na política se elas não passarem pela cultura na educação e pela educação na cultura. Por conseguinte é preciso conquistar uma nova visão cultural para a mídia que desfaz, destrói e imbeciliza a cabeça brasileira. Neste meandro de labirintos reza uma só variante que vai do lixo ao luxo. Hoje o lixo ocupa 99% do mercado de mídia e não importando a sua origem somos obrigados, de uma maneira ou de outra, a digeri-los. Do luxo, da beleza estética transformadora e modernista de outrora, antropofágica, como queria Oswald de Andrade, não há mais nada a ver e nada de novo sendo feito de transformador que mereça algum crédito. Vivemos a mesmice quando não estamos voltando para o que de pior existe, para o lixo. A maioria perdida, a cada dia que passa, sem notar, anestesiada pela droga do divertir-se a qualquer custo, do consumir a qualquer preço, ingere veneno na mesa do almoço e descarrega o lixo no jantar de frente para a tevê. Será esse o luxo civilizatório que todos queremos?
Para modificar isso só são necessários alguns atos de políticas públicas que permanecem desconhecidos ou julgados de pouco interesse por aqueles que pretendem governar, governaram ou que hoje governam o país desde o golpe militar de 1964.
É preciso avançar neste campo minado com inteligência e bom senso.
Veja bem que com algumas canetadas, um bom governante coloca o saber, todo conhecimento e discernimento dos homens desta terra no eixo, procedendo às verdadeiras reformas no sistema de ensino, na difusão da educação e da nossa cultura.
Proteger e projetar o nosso produto cultural, incentivando, em novos parâmetros, a produção e a criação da arte nacional e selecionando com critério o melhor do estrangeiro, é estratégia de defesa do país contra o lixo importado. Fora com o lixo em todos os meios de exibição da mídia nacional!
Desburocratizar o Estado de tais anomalias é investir no futuro. Investir no futuro é cuidar de nossas crianças – isto é: todas as crianças do país o dia inteiro na escola, com educação integral, alimentação equilibrada, assistência médica-dentária. No currículo escolar, além das matérias fundamentais, música, teatro, cinema, literatura, dança, poesia, filosofia e tudo que se relacione ao bom conhecimento. Em 10 anos já notaríamos a diferença.
Essas necessárias reformas podem e devem começar pelos municípios brasileiros onde se elegerão (tenho ainda esperança) alguns bons prefeitos e bons vereadores que poderão dar início a esse processo de transformação do lixo em que estamos no luxo que ainda seremos.
Para que isso tudo aconteça, em um estado capitalista democrático, o povo precisa estar atento e forte para eleger quem realmente deve ser eleito.
A princípio é bom saber que em política é preciso ir avante, pois quem gosta de voltar é caranguejo de garras longas e unhas cumpridas. Política não é olimpíada, não é esporte onde o que interessa é competir. Em política o que interessa é ganhar; é avançar em cima dos seus objetivos sociais; é participar da transformação do homem em direção do saber, é buscar a felicidade no belo existir, é viver de fato e direito o devenir utópico que só a boa arte e a educação integral podem oferecer.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

TRABALHO

Resposta ao filme documento do
cineasta Luis Rosemberg
intitulado “Trabalho”


Meu querido Rosemberg
acabei de assistir o seu “Trabalho”.
Posso lhe dizer que é o vídeo mais
panfletário como linguagem e mais
anarquista como estética audiovisual
que já assisti.
Ele me fez lembrar o filme “Briths Sounds”
que o Godard fez em 1969 e que assisti
em Londres em 1970. Um discurso
alucinado, sem pausa, anárquico e marxista,
um mantra panfletário que corta a sua respiração
nas linhas de montagem das indústrias inglesas.
Falo que “Trabalho” é panfletário pois acho
o texto irônico na sua seriedade e satírico
com a sua verdade, um vulcão verborrágico
lançado para fora do tempo queimando o
rosto, os olhos, os ouvidos do espectador incauto...
A imagem fria composta em um quadro único,
simples,na parede nua da visão, mostra-nos o
seu olhar dicótomo - o homem no fino fio de uma
navalha - de um lado o equilíbrio dos
contrários e do outro a filmagem dos conflitos.
“Trabalho” é de estrema sensibilidade
cinematográfica sem ser cinema e é isso
que me encanta e me deixa honrado com
a homenagem a mim prestada.
grande abraço do amigo

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

REFORMAS DE BASE

CPB II


Quando fui morar em Londres em 1970 eu precisava de uma habilitação para dirigir e não sabia o que fazer, fui informado que era muito simples obter esta autorização para conduzir o meu carro que havia comprado em Paris. Para isso bastava remeter uma carta ao home-ofice (local onde se resolvia os problemas dos estrangeiros) informando que você sabia dirigir e era habilitado em seu país e em poucos dias eles remeteriam, via correio, o seu documento. Mesmo sendo um estrangeiro latino-americano, acreditavam em você e nas informações prestadas. Confesso que mal acostumado não acreditei neste procedimento tão simples para obter um documento tão importante e de tanta responsabilidade. Recebi a minha autorização em uma semana pelo correio. Assim é um país civilizado. Você é o único responsável por tudo aquilo que possa acontecer na condução do seu veículo (no caso um carro francês com o volante do lado esquerdo) nas ruas e estradas da Inglaterra. No Brasil, a cada ano que passa, para qualquer coisa que você queira fazer, em qualquer repartição pública, mais papeladas desnecessárias, mais burocracia confusa e autoritária, são criadas e estes são os únicos e cruéis meios de você se manter na legalidade.

Faço essa introdução para colocar duas questões que tanto vem dificultando a vida dos produtores de cinema neste nosso país. São questões que a Ancine, o Ministério da Cultura e o Governo brasileiro precisam modificar, desburocratizar, recriar com bom senso, que facilitariam bastante a vida desta tão famigerada profissão de cineasta. Se você hoje vai produzir um filme, sendo por empresa ou pessoa física, é obvio que todas as pessoas, contratadas ou não, que trabalhem na sua realização, tenham os seus direitos garantidos por lei. Sendo o produtor o único responsável para resolver os problemas que possam surgir após a exibição do mesmo nas salas de exibição disponíveis (hoje quase inexistentes para exibição do filme brasileiro) ou nas televisões (ainda praticamente restrita a produção estrangeira). Se alguém tem algo a reclamar, esse alguém vai acionar o produtor, não é assim? Se eu batesse ou atropelasse alguém na Inglaterra eu estaria na corte e ao juiz teria de dar explicação convincente se não seria condenado ou iria parar na prisão. Então eu pergunto por que não fazemos o mesmo aqui? É preciso desburocratizar o país. Todos nós sabemos disso e nada fazemos.

Outra questão que gostaria de citar é a papelada burocrática dos editais para a produção de filmes brasileiros. Pergunto: porque quando entramos em um edital precisamos de tantos itens a serem respondidos e orçamentos complicados a serem feitos, trabalho onde se gasta dinheiro e resmas de papeis preenchidos, quando sabemos que a maioria dos projetos, por não serem aprovados, serão jogados no lixo? Assim sendo proponho duas modificações burocráticas: a primeira que se acabe, ou se simplifique, esse tal de CPB (Certificado de Produto Brasileiro) que só atrasa as difíceis negociações com o exibidor e ainda custa dinheiro e a segunda que se modifique a forma de apresentação dos projetos em todos os editais dos órgãos estatais de incentivo ao cinema e que para isso seja necessário somente a remessa do roteiro, com o nome do autor e do diretor do filme e, se o mesmo for escolhido, então que se peça o resto da papelada necessária, o que pode ser feito com qualidade por pessoas ou empresas produtoras especializadas no assunto.

O CPB deveria ser transformado e passar a se chamar CPE (Certificado de Produto Estrangeiro) este sim com bastante burocracia e recolhimento de todas as taxas necessárias a exibição do mesmo em nosso país.

Ou se transforma e simplifica-se a burocracia dos órgãos públicos que financiam e legalizam o artista ou a burocracia acaba, mais uma vez, com o bom cinema e a realização da verdadeira cultura brasileira.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

MACHADIANAS

VIAGEM AO FIM DO MUNDO (1968) de Fernando Cony Campos

Recebi do meu amigo Fábio Carvalho o texto que publico abaixo. Acho que ele também está se tornando um colaborador assíduo do blog.

O FORMULÁRIO DA ELETRICIDADE

Concluo que o pensamento, através da palavra, é também imagem.
Pois não resulta da palavra uma imagem das coisas?
Manoel de Oliveira

Chega de bazófia.
Está certo que as coisas não andam bem pelo lado financeiro, embora tudo tem outro lado, às vezes mais de só um outro lado, depende do ponto de vista ou da posição da subjetiva. Qual o endereço do buraco, essa era a pergunta que a voz humana e meio robótica fazia para o meu conhecido do Bar do João. Ele me contou que perdeu as estribeiras, depois de ter tido que anotar o número do protocolo para reclamar da reclamação que ele acabara de fazer, a coitadinha da funcionária dona da voz teve que ouvir tudo o que ela não merecia, já que estava apenas cumprindo as perguntas que a mandavam fazer como essa de pedir tal endereço. Ele ainda me contou que a voz depois de ouvir agradeceu e perguntou se ele tinha outra reclamação que desejasse fazer. Claro evidente, a voz imediatamente ouviu mais impropérios ainda bem que não viu a cara dele senão, certamente, não dormiria por mais de uma semana ou talvez por meses, aterrorizada que ficaria diante da imagem de um rosto deformado pelo cubismo apoplético que às vezes pode acometer a mais zen das criaturas. Depois fui para casa e a calma nasceu sorrindo. Nada melhor do que rir da nossa desgraça cotidiana, cheguei a chorar de rir. Começa a estória vem o tédio, mas a forma pode transformar tudo, baseada na forma-ação e no conhecimento que toda lágrima deve ser respeitada. Cinergia e eletricidade, a frente da fórmula ideal, não adianta, tenho que trair algumas imposições das academias, senão a mesmice e a facilidade vão tentar me desviar de dentro de mim. Para que me fazer entender? Todo mundo concorda que é necessário para se engrenar no sistema? Senão não seria amor. A gata correu, se eu fosse ela também correria. Os felinos quando percebem que vão apanhar correm, os caninos lutam até a morte. Cães pequenos encaram os grandões, dá até preguiça. Também gosto das preliminares, podemos continuar. Tenho piorado. Só e mais um degrau acima, finalmente consegui ver VIAGEM AO FIM DO MUNDO. A fome com a vontade de comer. Juntou. A escola que bitola e estiola, fujo para o rei Bantu e pergunto quem vem lá? Que delírio na praia, uma das melhores adaptações de vários tipos de literatura já filmadas que pude ter olhos para ver. Clássico total, muito mais novo que qualquer novíssimo de agora, feito há mais de quarenta anos atrás. A digressão. Comigo é igual, não fujo do assunto, só quando vejo que vou perder. Tenho sofrido e aprendido. A vida é triste, mas é bela. Essa é do Jean Luc Godard para a Adriana Foureaux, assim diretamente. Parque Lage. Na sexta feira era uma homenagem ao Mário Carneiro, com a exibição de quatro curtas num telão armado em frente da piscina. A tela translúcida. A dor da grande noite. Inspiração geral, um filme vai terminar e outro vai começar. O homem filme sou eu? Todas as amizades de ontem e de agora presentes em várias formas. As pernas morenas terminando nos sapatos coloridos vindos passo a passo das Galeries Lafayette. Um texto é um texto, uma rosa é uma rosa. São tentativas. Nesta noite após ter constatado que junto com o Lupércio já estamos na porta, no local tornou a nascer redivivo e retumbante O MONGE DEVASSO. O elenco é o roteiro e novamente estavam todos ali claramente revelados. Por enquanto só para mim. Quem poderia acreditar. Há muito já vinham se aproximando como a meia lua que a nuvem corta no céu. Maria Madalena. Uma me livra da outra. Que imagem. Trapista. Depois que estes prazeres se transformam numa religião, como poderemos controlá-los?

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Carta-artigo de um amigo do cinema

Cenário de Osvaldo Medeiros para a minha peça de teatro intitulada "No Balanço das Horas"


Recebi do meu amigo Sérvulo um novo texto que tomei a liberdade de titular pois acho essa carta-artigo pertinente ao momento cultural do cinema brasileiro. Para minha alegria ele está se tornando um valoroso colaborador desta revista eletrônica.

O Espelho do Ecran

Continuo pensando em seu comentário. Acredito que o cinema brasileiro precisa ser capaz de produzir um modelo alternativo ao sistema dominante, como o fez com o cinema novo e o chamado cinema udigrudi, do qual você participou.
Os nossos produtores e diretores precisam esquecer por um tempo as benesses dos patrocínios – que nem sempre chegam – e procurar restabelecer uma ligação com o público, que perderam. Na verdade, em muitos casos esta ligação jamais chegou a se estabelecer porque esteve mediatizada por exibidores e distribuidores que no Brasil sempre estiveram a serviço do cinema americano.
Como correspondente no Brasil do jornal de show-business The Hollywood Reporter, eu sempre ouvi falar que o maior alvo da Motion Picture Association of America (MPAA) era a privatização da distribuidora da Embrafilme que abocanhava quase 40% do mercado, o que finalmente conseguiram com a implantação do modelo neoliberal no cinema brasileiro a partir de 1990. Ficamos então à mercê do cinema internacional, que tomou conta da distribuição, se apoderou de um setor ainda maior da exibição e conta hoje até com patrocínio oficial para produções.
Para rompermos este círculo vicioso, será necessário buscar outras formas de exibição, recorrer às novas tecnologias do data-show, pequenas salas digitais, mercados alternativos de venda de DVD’s, como se faz na Nigéria por exemplo, e até uma estrutura de camionetes equipadas que vá ao interior levar o audiovisual a quem nunca teve a possibilidade de vê-lo, como no antológico filme de Octavio Cortazar, Por Primera Vez.
Temo que esta seja uma tarefa muito difícil para o nosso contexto já que em meus já longos anos de observação jamais percebi uma grande união entre as pessoas de cinema no Brasil, a não ser quando motivada pelo interesse em atraentes recursos financeiros.
Por outro lado, também penso que o prolongado efeito da Rede Globo sobre o produto audiovisual brasileiro já tenha deformado a nossa percepção do que possa ser considerada uma expressão mais propriamente nacional. Acreditamos hoje que produzir audiovisual – que é hoje a nova forma que tomou o cinema de antigamente – consiste em criar uma imagem com uma asséptica limpeza técnica que, no entanto, não consegue camuflar em muitos casos a completa incapacidade de enquadrar, fazer um corte menos grosseiro, elaborar uma atmosfera ou despertar emoções.
Acredito, por fim, que como na pintura, na arquitetura, na música, na literatura, etc. a saída para a mediocridade que tomou conta do nosso panorama cultural é o velho e sempre estimulante recurso à criatividade, ao estudo, à pesquisa e – ouso dizer – também à humildade.
Porque é que não perguntamos, por exemplo, aos argentinos como é que eles – com menos recursos que os nossos – conseguem fazer um cinema muito mais interessante e bem feito, ou aos chilenos ou peruanos porque a sua literatura é mais criativa, ou então aos cubanos quais são as razões que tornam suas universidades tão superiores às nossas?
Se tivermos a capacidade de abandonarmos a postura sub-imperial que nos foi delegada pelos colonizadores e esta mesquinha visão das elites brasileiras de que somos superiores aos nossos vizinhos do continente, poderemos aprender algo com eles.
Aí, então, teremos a oportunidade de, finalmente, nos vermos realmente somos.



Sérvulo Siqueira



(Underground, Sérvulo?...eu não concordo com esta terminologia de escárnio cunhada pelo Glauber Rocha que sempre se mostrou contrário ao novo cinema que surgia das cinzas do cinema novo)