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sexta-feira, 29 de outubro de 2010

El Toro (II Parte)

Nota

Recebi hoje um telefonema do Professor Gilberto Vasconcelos me informando que havia terminado a edição do filme (vídeo) que ele fez comigo. Iniciou-se a conversa ele me passando o título pomposo “Zé Sette Sétima Arte” e a afirmação definitiva: este é o melhor filme de entrevista feito até hoje, confesso que fiquei orgulhoso com o carinho do mestre. Estou louco para assisti-lo e exibi-lo aqui no blog.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

EL TORO

“DIÁRIO DE VIAGEM” ESPANHA – EL TORO.
São vários vídeos rodados em VHS sobre as minhas viagens a Europa. O vídeo de 18 minutos está dividido em 3 partes.

PRIMEIRA PARTE

Política


Tancredo Neves, Jose Sette e João Goulart 1959
AVANÇAR
Quero um governo que devolva ao povo o direito a utopia.
Quero um governo “prá frente” que represente a vanguarda deste processo histórico que vivemos.
Quero, neste continente da esperança, um governo realizador de metas avançadas e saneadoras, pois ninguém em sã consciência quer andar para trás.
Quero um governo transformador e moderno que cuide de todas as nossas crianças, alimentando-as, educando-as e preparando-as para um futuro promissor. Quero um governo que ofereça ao país moradia, transporte, saúde e emprego de
qualidade no campo e na cidade.
Quero um governo que aprofunde as reformas sociais e culturais e que dignifique nossa identidade e nossas tradições.
Quero do governo a esperança que o continente latino-americano, aonde vivo há 62 anos, unido no mesmo propósito de independência cultural, encontre o seu verdadeiro caminho rumo ao socialismo libertário, porque só assim os nossos filhos e netos terão a possibilidade de serem felizes em um mundo menos cruel.
Pela esperança de mais um passo a frente rumo ao futuro eu voto Dilma.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

NOTAS


IDIOSSICRASIA

Estou sendo observado por pessoas que não conheço...
Eu falo e vocês não acreditam!...
Não sou paranóico! Tenho é uma mente criativa...
Mas se vocês não acreditam – fodam-se!
Meninos! Eu vi e ouvi um deles gemer a noite toda.
Os outros dançavam...
Eram gnomos redondos como uma bola de futebol.
Todos faziam parte do império dos sentidos
onde loucura pouca é bobagem.


Para quem ainda não ouviu... www.myspace.com/joseluizvieira

Estou aqui em casa com o músico José Vieira, autor de muitas trilhas para meus filmes, entre eles Amaxon, ouvindo o seu único disco de CD, produzido pela Prefeitura de Juiz de Fora, mas nunca lançado comercialmente. São cinco músicas dos mais diversos ritmos, baião, bossa e baladas, com tratamento jazzístico. Temas muito bem arranjado e com talento pelo autor. Gostaria de realçar entre todas as outras faixas o tema Ponte Nova, com a brilhante participação do sax tenor José Carlos Bigorna, do contrabaixista Luis Alves e do pianista Márcio Hallack, além do incomensurável Big Charles na bateria - é imperdível!

terça-feira, 26 de outubro de 2010

NOVIDADES




















ATENÇÃO!
EM BREVE NESTA PÁGINA “DIÁRIO DE VIAGEM” ESPANHA – EL TORO.
São vários vídeos rodados em VHS sobre as minhas viagens a Europa

AGUARDE!
_________________________________________

POR UM NOVO CINEMA

Estou colocando a venda por R$ 300,00 (trezentos reais) uma caixinha artesanal com os meus 12 filmes de longas, curtas e medias metragens em DVD. Vem acompanhando um libreto com a discrição sobre todos os filmes e apresentação do seu diretor. Pedidos deverão ser feitos com e-mail para josesetteb@yahoo.com.br

domingo, 24 de outubro de 2010

AMIGOS

Santeiro, Noilton e ...
Obrigado
de Sergio Santeiro.

Queria agradecer por ainda estar vivo. Mas a quem se em nada creio. Do pó viemos e para o pó iremos. Vamos nos desfazer em nada. Certamente a meus pais que nunca me faltaram até mesmo velhos eles e eu. Mesmo sem entender sempre sustentaram meus delírios e tolices enquanto viveram.Uma vez dediquei um dos meus filmes: "A meus pais que me deram a vida mais de uma vez". Meu pai ficou comovido e me disse: Mas filho como é que pode dar a vida mais de uma vez? Já minha mãe que se foi mais cedo que ele foi autora de uma de suas tiradas para mim favorita. Ao me ver desesperado por algum ou nenhum motivo disse-me ela: Meu filho, eu sei que você é muito inteligente mas pra que serve tanta inteligência se você não consegue ficar tranquilo?Obrigado a mim por ter sobrevivido em episódios difíceis de que a vida se faz. Como por exemplo entrar por engano dirigindo às duas da manhã inebriado numa contramão movimentada e escapar ileso. A rapidez na locomoção põe em risco todos os locomoventes. Terá sido mero acaso?Agora estou obrigado a votar de novo. E se nessa segunda votação a maioria mudar de mãos? Isso faz sentido? Ah, mas não é a maioria simples, ela tem que ser total, absoluta, como nada na vida é. Mistérios desta invenção republicana corrigida.A tal republica, a coisa de todos, proclamada aqui às escuras, uma quartelada sem vergonha, o velho marechal doente empurrado ao lombo da animária traindo a confiança do imperador que o havia posto à frente do exército nacional: deodoro da fonseca, perna fina e bunda seca como aprendi nos bancos escolares.A primeira republica foi uma coisa louca: como de costume generais ou marechais estapeando-se pra não largar o almejado osso, o topo da cadeia militar pois assim é o presidente, o comandante em chefe das fôrças da nação ainda que nem seja militar. Dá pra confiar? Não dá.Desde então, mais ou menos de trinta em trinta anos qualquer mequetrefe bota uns soldadinhos na rua para fazer do palácio e do país quartel. Manda fuzilar e perseguir outros e uns pra mostrar que manda e é o dono do pedaço. Constituições rasgadas e remendadas e malparidas dispensam o sagrado exercício do direito ao voto. Pra que votar?Mais ou menos trinta anos depois do republicano golpe vem no trem o comandante de um novo golpe. A galope dos pampas um civil mas coroné como se chama os chefetes locais amarra os burros no obelisco às portas do senado federal.Ainda chamam a quartelada de revolução como se não bastasse profanando até o vernáculo trocando letras. E senta praça longos quinze anos prendendo e arrebentando quem não se lhe sujeita. Autonomeiam-se, são os pais do povo.Mais ou menos trinta anos mais tarde depois de uns quinze do que se alcunha de normalidade democrática lá vem de novo a malta de uniforme no rastro do demente que bota a força publica na estrada e açodado não se sabe bem por que o presidente civil sem que se ouça um tiro ele próprio depõe-se antes que a definitiva noite se instale em latino américa.Sim porque não é só em brasis, tiranias contagiam-se, reforçam-se, alimentam-se, as perseguições em alguma pátria atravessam fronteiras. Podemos ser mortos por balas ou trancafiados por meganhas de terras vizinhas ou remotas. E desta, por enquanto, última vez foram mais de trinta anos de barbárie. Na cabeça generais mas as ditaduras não são só militares. O negócio é a grana.A burguesia que naquele século não fêz a sua até hoje insufla e financia com o dinheiro roubado ao trabalhador "revoluções" sempre aviltando até a nossa lingua que afinal tampouco é a nossa, é a dos que nos invadiram e nos exploraram, os de fora, que lhe garantam a mantença da roubalheira como ainda hoje se vê.E na hora da votança como nos obrigam as constituições rasgadas, remendadas e malparidas, rios de dinheiro vão pra lá e vão pra cá e então é isso. O que se vota e o que se aprova é continuarem os burgueses a nos roubar e a nos mandar. Obrigado. Muito obrigado.

Niterói, 20/10/2010. Sergio Santeiro (santeiro@vm.uff.br).

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Política

O DIABO DE SAIA
Estava no centro da cidade de Cabo Frio quando ouvi duas meninas conversando sobre os dois candidatos a presidência da república. Uma das meninas, bonita e descolada, falante, vaidosa, não sabia ainda em quem votar. A outra, feiinha, tímida, não só sabia em quem iria votar como também começou a convencer a outra dos seus motivos.
Passei a prestar atenção no desenrolar da argumentação da tímida menina que agora falava obstinadamente as suas verdades: - Você só pode votar no bem e o bem nessa eleição é o Serra, porque o mal já está representado por aquela mulher e seu vice... Neste momento eu não resisti e entrei na conversa sem conhecer os seus personagens.
- Um momento! Se me permitem, deixem-me apresentar as minhas dúvidas também nesta conversa das duas. Diga-me, novamente, quem é realmente o mal desta história? As duas ficaram a princípio assustadas com a minha abrupta aparição, mas como entrei direto no assunto e por ser bem mais velho, tudo se acomodou e a menina mais falante foi logo ao cerne da questão: - Ela está me dizendo que o vice da Dilma, tem um pacto com o diabo e que freqüenta, com o filho, uma igreja do mal em Brasília onde a Dilma é a sacerdotisa... Ela é o diabo de saia – E você acreditou? Perguntei em tom de espanto e olhando para a baixinha tímida repiquei com ênfase outra pergunta: - O que você tem contra o governo do Lula? – Eu nada! Respondeu ela se afastando, - Eu até votaria nele! Mas nesta mulher eu não voto, ela é do mal!... – Se ela é do mal, o Lula também é, não é? – Não! Ele é do bem! Ela, é uma bruxa que esta impregnada com o pecado... - Minha amiga se o Lula escolheu a Dilma é para dar continuidade ao seu governo e se você acha que ele é do bem, de onde você tirou essa conversa que Dilma e o seu vice são do mal ? Isso é uma mentira sem pé nem cabeça! A menina se afastou mais ainda e se despediu da amiga olhando amedrontada nos meus olhos como se eles fossem mensageiros do mal. – Quem é essa menina? Perguntei a outra que ficou comigo e ela me respondeu já se despedindo – Ela é minha amiga que trabalha em uma loja de sapatos... – De onde ela tirou aquela história? – Ouviu do pastor da igreja que ela freqüenta... – Ah! Ta bem, esta explicada à origem... Antes de poder me despedir ela se afastou sem dizer adeus... Depois se virou e disse alto olhando para mim: - Meu voto é da Dilma, não acredito nas bruxas...

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

NOTÍCIA

TOTONHO

Uma luz apaga a sombra, mas nenhuma sombra apaga a luz.
Fiquei muito triste com o fim do blog jornaldototonho, que com quase dois mil visitantes por dia fechou suas publicações por exclusiva falta de patrocínio e por pequenos problemas pessoais do seu editor. A cidade perde o seu melhor blogueiro - inteligente, bem informado, com grande senso de humor e invejável cultura política, ele amarrou com competência o seu público, tanto que era impossível navegar na internet e não passar pelo blog do periodista. A inteligência perde um nobre espaço. Os leitores deveriam se unir em passeata para exigir da comunidade que o professor tenha uma equipe, um belo patrocínio e, com toda a sua experiência, ele possa transformar novamente o seu blog no maior jornal eletrônico da região. Se eu tivesse a pretensão política eu contrataria esse professor de talento no bem informar para a minha equipe. É preciso fortalecer o que é bom, alimentar sua luz, pois só assim é que vamos nos tornar um povo feliz.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

METAMORFOSE

Oitavo Movimento

No mar a lua nasce cheia no horizonte. Sérgio vê sentada no caís Iracema. Pega em sua arma e se aproxima por trás. Ao chegar perto aponta sua arma para a cabeça da menina. Quando vai atirar ele ouve a voz de Jaci, que está atrás dele com um punhal em sua mão.

Jaci:
- Capitão Sérgio, lembra-se de mim?

Quando ele se vira para ver quem estava em suas costas, se depara com Jaci, que sorrindo e no lance rápido de mão, crava o punhal em seu coração. Sérgio, com olhar espremido, larga a arma que estava na sua mão e agacha-se no chão já sem força nas pernas.

Sérgio:
- Um ataque de surpresa é quase infalível, quem é você?

Jaci:
- Sou aquela que você procurava e que finalmente encontrou.

Sérgio:
- Quem é você?

Jaci:
- Sou Jaci, a mãe de santo que você matou.

Sérgio:
- Pra onde vou?

Jaci:
- Pra onde o diabo te levar...

Sérgio cai com o braço esticado para o alto. Iracema pega em sua mão e o ajuda a se deitar no chão do cais. Ele olha para Iracema, dos seus olhos corre uma lágrima, e ele diz ao seu ouvido antes de desfalecer...

Sérgio:
- Iracema dos lábios de mel, eu sou um inocente e você vai um dia pagar por isso...

Vindo pela rua, depois de dobrar uma esquina, Henri e o Padre deparam com a cena da morte de Sérgio. Iracema sai correndo quando enxerga os dois se aproximado do cais.

Henri:
- Iracema?!

Padre:
- Vai pegá-la Henri, que eu vou cuidar do Sérgio que deve estar muito ferido...

Henri fica parado e não consegue ir atrás da menina. O padre chega até Sérgio e o pega ainda com vida...

Sérgio:
- Toma cuidado... Não é a menina... É a velha.

Henri chega perto do padre que esta com o corpo de Sérgio.

Henri:
- O que ele disse?

O Padre:
- Nada não!... Preciso de sua ajuda para levar o corpo de Sérgio até a igreja. Para onde foi à menina? Você a deixouela fugir?... É a paixão... Henri, a paixão é uma infinidade de ilusões que serve de venda para os olhos e analgésico para a alma.

Começam a carregar o corpo pelo cais até a igreja.

Henri:
- No meu caso a paixão é como a ventania que enfurna a vela do meu barco, fazendo-o navegar.

Padre:
- Outras vezes pode fazê-lo naufragar.

Henri:
- Como você é pessimista, baixo astral, é por isso que estamos todos morrendo... Como pode saber de paixão se nunca teve um amor na vida, nasceu padre!

Padre:
- O amor não é senão o desejo; e assim, o desejo é o princípio original de todas as nossas paixões, por isso, sempre que o desejo de um objeto se acende no coração, pomo-nos a persegui-lo e a procurá-lo e somos levados a mil desordens.

Henri:
- Desordem é a que nós nos metemos sem hora para começar, sem tempo para terminar...

Chega ao cais o carro da reportagem. De dentro do carro eles observam a cena de Henri e o Padre carregando o corpo inerte de Sérgio em direção da igreja.

Repórter:
- Nós estamos vendo e vivendo aqui um acontecimento extraordinário, uma história da qual se poderia fazer um poema...

Cinegrafista:
- Que poema, qual nada! Esse sujeito que esta sendo carregado era um pilantra, já vai tarde!

Repórter:
- Você reconhece um mau crítico quando ele começa a falar mal do poeta e não do poema.

Cinegrafista:
- Mas que poema é esse?

Repórter:
- É aquele que está escondido, oculto, na história de uma cidade...

Cinegrafista:
- Se o cara está escondido, oculto, é porque está devendo, e quem deve tem que pagar.

Repórter:
- Você tem o cérebro de um garoto de quatro anos e eu aposto que ele ficou muito feliz por ser livrar dele.

Cinegrafista:
- Deixa de baixaria, vamos trabalhar?


O Padre e Henri entram na igreja carregando o corpo de Sérgio.

Henri:
- A filosofia que cultivo não é nem tão bárbara como a do Sérgio, nem tão inacessível como a sua, que rejeita as paixões; penso ao contrário de vocês: creio que só na paixão é que reside a doçura e a felicidade da vida.

Padre:
- A humanidade não se divide em heróis e tiranos. As suas paixões, boas e más, foram-lhe dadas pela sociedade, não pela natureza.

Henri:
- Um homem só pode compreender o pensamento de uma paixão profunda depois de ter vivido pelo menos uma parte daquilo que ela contém.

Padre:
- As paixões perdoam tão pouco quanto as leis humanas... Vamos deixar o corpo de Sérgio aqui ao lado do Brandão enquanto esperamos...

Henri:
- Desculpe-me Padre, mas não vou ficar aqui esperando... Vou atrás de Iracema... Se conseguir ainda encontrá-la...

Henri sai da igreja e o Padre fica sentado ao lado dos dois corpos sem esboçar nenhuma reação, desolado. Em uma mudança brusca de atitude, levanta-se em um salto e apressado corre atrás do altar e pega a sua pistola automática. Destrava a arma e aponta.

Padre:
- Aparece agora sua velha bruxa miserável que eu vou te mostrar quem eu sou!...

Jaci sai de trás do altar, sem que ele perceba, e como um raio surge na sua frente e crava o sexto punhal no coração do Padre que com um leve sorriso nos lábios vermelhos de sangue, olha para Jaci e cai por cima dos outros dois corpos ali estirados.

Neste momento entra na igreja a equipe de jornalismo e o cinegrafista ascende às luzes e começa a registrar a cena macabra. A repórter inicia a reportagem.

Repórter:
- Estamos aqui na cidade de Eldorado para aonde viemos buscar uma entrevista com o prefeito e sua equipe sobre o corte das verbas do petróleo e dos processos e nos deparamos com um massacre onde morreu o prefeito e de sua equipe, todos suspeitos de corrupção. Homens que dominavam política e economicamente toda essa região... É inacreditável o que estamos assistindo neste furo de reportagem... Estamos aqui sozinhos com três mortos empilhados, é uma cena macabra!... O que será que aconteceu aqui nesta pequena igreja, nesta pequena cidade de pescadores?


Movimento de Passagem Final

Henri está no seu carro andando pela cidade procurando Iracema. Está amanhecendo. Quando ele vê o carro da polícia chegando à cidade, ele vira a esquina, como se estivesse desistindo da procura de Iracema e foge em direção da estrada, do asfalto.

Chega à estrada, com o sol nascendo.

Um pouco mais na frente ele observa a silueta de uma menina andando rente ao asfalto.

Ele pára o carro e oferece uma carona.

Iracema aceita e entra no carro.

Quando ele arranca com o carro, podemos notar uma sombra (Jaci) sentada no banco de trás.

O carro se afasta na estrada sem fim.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

METAMORFOSE

Sétimo Movimento

No gabinete do prefeito estão Sérgio, Henri e o Padre. Estão em silêncio. Sérgio, o mais agitado, começa a falar...

Sérgio:
- Olham meus amigos, eu não posso acreditar que um ser invisível, uma entidade perturbada, possa nos derrotar, sem ao menos nos dar o direito da defesa... Não vamos deixar o pânico mover as nossas ações...

O Padre:
- Não tem pânico e nenhum fantasma... A coisa é simples: foi aquela menina que deixei com o Brandão na igreja quem matou o coitado...

Henri:
- A menina matou Marcos, depois matou Mario, o Souza e por fim o Brandão e tudo isso em menos de um dia? Essa história não tem lógica e nem ela é essa pessoa...

O Padre:
- O que não tem lógica é você querer defender uma menina que bem mal conheceu e se enamorou em um passeio de barco... Tenha piedade Henri!

Sérgio:
- Vamos começar a solucionar esse problema eliminando a estranha...

Sérgio retira da gaveta a sua pistola, o coldre, coloca na cintura a arma e olha-se no espelho.

Sérgio:
- Vamos à guerra!

Henri e o Padre aproximam-se de Sérgio.

Henri:
- O que você vai fazer Sérgio?

Padre:
- Vai fazer o que é correto: se for possível prender aquela menina para averiguações...

Henri:
- E se não for possível, matá-la!

Padre:
- Sim! Por que não?

Henri:
- Eu não acho justo, não pode ser ela, eu a conheci e sei quem ela é...

Padre:
- Hora do confessionário! Quem ela é meu filho?

Henri:
- Ela é a filha do santo... Ela é a santa do terreiro.

Padre:
- Ela é a Santanaz em pessoa...

Henri:
- Péssimo trocadilho!

Sérgio:
- Chega de conversa fiada! Não temos tempo a perder! Vamos invadir é por logo fim a este tormento...

Henri:
- Vamos com você!

Padre:
- Vamos juntos!

Sérgio:
- Soldado capelão! Isso é uma ordem! Permaneça onde esta e não se mexa enquanto eu não voltar. Quero avisá-los que me parece que não receberemos auxílio externo para essa empreitada... Também não precisamos. Vocês não acham?

Sérgio sai sorrindo do gabinete. Henri e o Padre ficam parados, sem ação, durante um tempo.

Henri:
- Você viu o que você fez? Ele vai sair matando e nós seremos co-responsáveis por mais esse massacre de inocentes... Vou sai atrás dele e tentar contê-lo.

Padre:
- Nada poderá impedi-lo de fazer justiça...

Henri:
- Justiça?!...

Os dois saem também do gabinete. Nós o acompanhamos. A rua está vazia, já é noite.


Movimento de Passagem 7

Na estrada um carro de reportagem se aproxima da cidade. No seu interior, além do motorista, uma repórter e um fotógrafo conversam.

Repórter:
- Que lugarzinho complicado essa cidade do Eldorado... Dominada por ex-policiais que se envolveram em total corrupção, essa comunidade, rica em petróleo, não criou escolas, não deu andamento aos empreendimentos sociais, não cuidou do saneamento básico da cidade, enfim não fez nada que pudesse melhorar a qualidade de vida do seu povo. A cidade não se desenvolveu e hoje, com o caos que aqui se instalou, sumiu o dinheiro, apareceram processos e cassações, os turistas abandonaram a cidade e o que antes era o folclore hoje é a miséria.

Fotógrafo:
- Como é possível ter tanto dinheiro e tanta miséria em um só lugar?

Repórter:
- Depois do grande desastre ecológico, com o vazamento de óleo que manchou a costa de Eldorado exterminando a pesca e o turismo, deixando a cidade abandonada, quem podia foi-se embora daqui.

Fotógrafo:
- E os sete homens de ouro?

Repórter:
- Quando todos comemoravam a conquista eleitoral com a reeleição do capitão Sérgio, foi descoberto um grande desfalque no caixa da prefeitura. O processo corre na justiça. E como desgraça pouca é bobagem, só hoje foram cometidos na cidade quatro assassinatos, que por coincidência ou circunstância, eram os quatro homens fortes do prefeito... Assim caminha Eldorado em direção do abismo.

Fotógrafo:
- Eu publiquei um livro de fotos das belezas naturais dessa região antes do desastre e depois outro livro com o documento fotográfico da tragédia. Você viu esses meus livros?

Repórter:
- Do momento em que peguei seu livro até que o larguei, eu não consegui mais parar de rir. Um dia, eu pretendo lê-los...

Fotógrafo:
- Não entendi a piada...

O carro reportagem entra em Eldorado e seu farol ilumina a cidade às escuras.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

METAMORFOSE

Sexto Movimento

Iracema está encostada em uma árvore no meio da mata quando, por trás, se aproxima Jaci.

Jaci:
- Iracema onde você foi? Você sabe que estamos atrasadas em nossa missão. Você não podia ter saído no barco sem a presença de Sérgio. E depois não foi a Ilha do Farol, onde eu estava te esperando. O que está acontecendo com você?

Iracema:
- Não quero mais participar desta sua vingança... Eu gostei do Henri...

Jaci:
- Foi bom você dizer a verdade, mas você não está fazendo o combinado. O dom do desaparecimento só eu possuo e eu sou o seu álibi, agora se eu desaparecer, o que poderá acontece com você?

Iracema:
- Depende do seu ponto de vista... Não gosto de ver ninguém sofrendo.

Jaci:

- Os pontos de vista na arte da vida são diferentes ainda que eles coexistam na mesma pessoa. Todos os sofrimentos que nos cercam, é necessários sofrê-los igualmente e você já sabia disso quando viemos para cá.

Iracema:
- Eu imaginava que sabia..., hoje vejo que nada sei.

Jaci:

- Do mesmo modo que a criança, através de todos os estágios da vida, se desenvolve até a velhice e até a morte, do mesmo modo nós nos desenvolvemos através de todos os sofrimentos deste mundo.

Iracema:
- Estou cansada e quero ir embora para casa.

Jaci:
- Nós terminaremos antes do dia amanhecer o que viemos até aqui fazer, não há como voltar atrás, até lá você esta presa a mim, não lhe cabe ainda o manto da liberdade.

Iracema:
- Meu corpo já não agüenta mais essa miséria de vida.

Jaci:

- Todos nós, não temos um corpo, mas um sofrimento crescente, e esse os conduzem através de todas as dores, seja sob que forma for até alcançarmos a redenção

Iracema:
- Não quero mais Jaci passar por isso! Não tenho mais força para interpretar esse papel...

Jaci:
- Não lhe faltam forças... Você tem é medo...

Iracema:
- Tenho sim! E ele está acabando comigo...

Jaci:
- Se não cessas o ter medo, olhando furtivamente tudo com o poder do teu olhar, fazendo crescer as raízes do horror em profundidade e em comprimento - nada te poderá deter em seu caminho sem volta para as terras do sem fim.

Iracema:
- Por vezes parece que as coisas serão assim: eu tenho tal tarefa a cumprir, disponho de tantas forças quantas são necessárias para levá-la a bom termo... Mas meu Deus! Preciso criar raízes, ter filhos, eu sou uma mulher normal. Liberdade! O que mais me resta?

Jaci:
- Em virtude, não das raízes, mas da força do teu olhar, que enche o mundo enquanto mergulha nele como uma criança no banco acolchoado de uma diligência que corre atormentada através da tempestade e da noite, nós terminaremos o nosso trabalho e ambas estaremos livres de todos os compromissos... Liberdade! Com bastante tempo teu e boa vontade minha para o trabalho, onde está o obstáculo ao êxito da nossa imensa tarefa?

Iracema:
- Mas eu gostei do Henri e ele não matou ninguém...

Jaci:
- Não percas tempo a procurá-lo, talvez ele já não exista...

Iracema se vê sozinha na floresta. O sol já se esconde quando ela volta para cidade.


Movimento de Passagem

Documentário com denúncia de corrupção comandada pelos mesmos personagens político e administrativo da cidade e seus governantes.

domingo, 17 de outubro de 2010

Política

Verdades inquestionáveis

O Lula foi o melhor presidente que tivemos depois da redemocratização do país.
Antes dele só Getúlio Vargas, Juscelino e Jango, que não conseguiu terminar o seu governo reformista.

Lula trouxe de volta ao país o sentimento de orgulho de nossa nacionalidade.
Lula praticou a justiça social, teorizada por muitos.
Lula com lentidão e firmeza colocou o país no caminho do socialismo democrático.
Lula possibilitou a Petrobras descobrir o pré-sal.
Lula tem quase que 100% da aprovação popular do seu governo.

Eu pergunto ao povo brasileiro: Para que mudar o time que está ganhando?

Para ilustrar a nossa memória política vamos rever uma entrevista do Ciro Gomes em 09/09/2009 a um programa de tevê.

http://www.youtube.com/watch?v=j95_tp6GHug&feature=rec-LGOUT-exp_fresh+div-1r-3-HM

METAMORFOSE

Quinto Movimento
O barco está sendo amarrado por Henri no píer quando Iracema sai apressada caminhando sozinha até a velha igreja. Na igreja o Padre aparece vindo da sombra e assusta Iracema que está ajoelhada.
Padre:

- A morte dolorosa de uma pessoa em uma cidade tão pequena me faz desconfiar dos estranhos, mesmo ele sendo uma menina bonita..., uma menina católica, como você, de joelho, rezando, arrependida, temendo a Deus, então eu me pergunto: o que ela anda fazendo de ruim aqui sozinha em Eldorado? Por Deus! Eu sinto o demônio vazar por sua pele... Quem é você, bruxa dos infernos?
Iracema:

- Sou quem eu sou e isso você não pode mudar. Estou aqui tentando achar o caminho da minha libertação, da minha harmonia com a razão e preciso ser respeitada com o silêncio do sacerdócio...
Padre:

- A única coisa que temos de respeitar, porque ela pode nos unir, é a língua. (Mostra a língua como um objeto pornográfico) - Estes são os meus princípios. Se você não gostar deles, eu tenho outros.
Iracema:

- As suas forças dispersas, seus princípios confusos, são instrumentos que não são concebidos como uma orquestra. Por isso a sua reza desafina. Você é um fraco. Ao contrário comigo é necessário que todos os instrumentos da orquestra toquem constantemente com toda a sua força, pois a minha reza não foi destinada a ouvidos humanos e não dispõem da duração de uma noite de concerto...
Padre:

- Aqui temos uma mulher com a cabeça aberta - dá até pra sentir a brisa que vem de lá...

Brandão entra apressado na igreja..., saindo da sombra ele se aproxima com olhar flamejante para perto do Padre e depois para Iracema, que ainda permanece ajoelhada em frente do altar...

Brandão:
- Ele pode parecer um idiota e falar como um idiota, mas não se deixem enganar: ele é realmente um idiota... Marcos, Mario e o Souza, os três estão mortos e nem terminou o dia e você fica aqui pregando seus pecados para a menina... Estamos correndo perigo e precisamos marcar uma reunião aqui e agora com o Sérgio e o Henri. Vai procurá-los e eu fico aqui esperando...

O Padre sai da igreja pela sombra enquanto Brandão fica observando Iracema que começa a se levantar da posição em que estava.

Brandão:
- Por favor, senhorita, pode continuar as suas orações..., permaneça ajoelhada e reze, pois eu nunca esqueço um rosto..., mas, no seu caso, vou abrir uma exceção... Assim pode ir embora, mas não saia da cidade, pois quando tudo isso acabar eu quero falar novamente com você...

Brandão olha para o corpo da menina e depois se virando para o altar sai andando na sua direção como se ali se escondesse alguma coisa que ele procura. Atrás de Brandão está agora Jaci.

Silêncio.

Passando pela sombra do altar, Jaci sai da igreja e nós a acompanhamos pelas ruas da velha cidade. Em uma ruela passa por ela o Padre, Sérgio e Henri falando e gesticulando. Nós retornamos com os três para a Igreja. Todos gesticulam nervosamente. Henri, o mais nervoso, tenta correr desesperado. Sérgio o segura pelo braço. O padre, tenso, anda de um lado para o outro da rua e fica esperando pelos dois.

Sérgio:
- Henri! A sua ignorância é a arte de procurar problemas, encontrá-lo e depois diagnosticar errado e então, quando a cagada for consumada, aplicar todos os remédios errados... Não é hora de fraquejar! Nenhum fantasma pode nos derrotar.

O Padre sai sem falar em direção da igreja.

Henri:
- Sérgio, três de nós já foram mortos da mesma maneira, uma punhalada no coração. Qual será o próximo?

Sérgio:
- Não tem próximo nenhum. Fomos pegos de surpresa, seu ignorante, fica calmo que vamos resolver tudo. Já pedi auxílio à central de polícia e uma viatura deles já está a caminho. Em poucas horas esse lugar vai está repleto de meganha. Quem está fazendo isso não vai se livrar assim tão fácil, portanto fique calmo, está tudo bem?

O Padre volta da igreja correndo, apavorado e chama os dois que estavam conversando.

Padre:
- Brandão foi assassinado com um punhal no coração aos pés do altar... Puta que o pariu! Nem o templo sagrado foi respeitado. Quem é que pode ter essa força maligna para assassinar quatro homens fortes em menos de um dia? Meu Deus! Meu Deus! Que mal horrível esses homens de bem cometeram para sofrerem tão terrível vingança?

Os três retornam a igreja e nós os acompanhamos. Quando entram podem notar o corpo do Brandão estendido no chão. Os três atônitos param na frente do corpo estendido. Sérgio se aproxima, olha para o seu relógio.

Sérgio:
- Ou ele morreu ou meu relógio parou!

Henri:
- Isso não é hora de brincar... Vamos todos morrer... Nada poderá deter esse monstro sagrado!

Sérgio:
- Morrer! Vamos todos um dia, mas não hoje...

Padre:
- Quem te garante?

Sérgio:
- Eu te garanto...

Henri:
- Foi o que você disse quando nos trouxe para esse buraco... Eu garanto!

Sérgio:
- E não garanti esses anos todos?

Padre:
- Até hoje, sim! Mas as coisas mudaram... Agora, o que foi feito da menina que estava aqui rezando?

Henri:
- Que menina?

Sérgio:
- A menina que você levou, ou não, a Ilha do Farol!

Henri:
- O que tem Iracema a ver com tudo isso?

Padre:
- Eu entrei na igreja e ela estava ali rezando, talvez arrependida dos seus crimes... Você então conhece a menina, Henri?

Henri:
- Conheço sim, por quê?

Padre:
- Não sei... Quanto menos pretendente maior o botim...

Henri:
- Não sei não... Aonde você quer chegar seu padre sacana?...

Sérgio:
- Meus amigos, calma! Proponho que abandonemos o local do crime e passemos a nossa prosa para o lado de fora. Vamos respeitar o defunto e o sagrado...

Os três caminham até a porta da igreja.

Sérgio:
- É preciso neste momento não perder a calma, fomos criados na escola dos desafortunados, já passamos por quase todos os perigos e estamos vivos, somos os mais inteligentes, os mais normais do grupo, os outros amigos que partiram eram mais broncos, encrenqueiros, retirando o Brandão, que era maluco... Havia uma desconfiança dos quatro que eu privilegiava uns, mais que outros... Vocês terão de convir que a morte dos quatro, por mais cruel que possa parecer, foi melhor para nós três...

Henri:
- Dizendo assim parece-nos que esses crimes foram encomendados por você.

Sérgio:
- Ou por você.

Padre:
- Por mim é que não foi.

Sérgio:
- O melhor que temos que fazer agora é reunirmos no gabinete da prefeitura, esperar a polícia chegar e tomarmos providência para acharmos essa garota, Iracema, que a partir dela resolveremos essa peleja.

Henri:
- Essa talvez seja a nossa última chance...


Movimento de Passagem
Documentário de TV

Uma equipe de vídeo faz gravações na cidade... Um documentário para TV. Uma reportagem com paisagens e entrevistas com as principais figuras daquela pequena cidade perdida no litoral que passa a chamar atenção da mídia com a chegada do petróleo e do dinheiro. Todos são entrevistados, principalmente Sérgio, o prefeito recém eleito. Os outros contam como chegaram à cidade e o que fazem ou o que acham que deve ser feito com a verba milionária petrolífera destinada à melhoria do município.

Imagens da cidade, suas praias, seus recantos.

Narração:
- Esta é a cidade de Eldorado, o paraíso na terra. Um dos lugares mais charmosos do nosso litoral só podia ter também uma história no mínimo curiosa. De uma antiga vila de pescadores surgiu uma pequena cidadezinha que recebeu há uns 20 anos atrás um grupo de amigos que aqui se estabeleceu e pouco a pouco foram transformando a cultura da pesca no frisson do turismo... A cidade cresceu e o mais popular do grupo, o ex-capitão Sérgio, foi eleito prefeito da recente emancipada cidade.

A equipe prepara a entrevista com o prefeito que está cercado dos seus amigos. O Padre chega por último e une-se ao grupo. Tudo é festa. Todos brincam como se fosse um time de futebol. Alegria geral.

Repórter:
- Então Prefeito, qual é a sensação de ser eleito com apenas 1200 votos e sem concorrente?

Sérgio:
- Minha querida, a população consciente de que eu sou o melhor para a cidade, não lançou outro candidato e assim fui eleito pela maioria...

Repórter:
- Mas Prefeito, os votos brancos e nulos foram da maioria que não querem o senhor...

Sérgio:
- São uns ignorantes, querem que a cidade volte a ser a vila dos pescadores...

Repórter:
- Realmente isso não é possível, mas o senhor também é acusado de dominar financeiramente toda a comunidade e comprar eleitores...

Sérgio:
- Isso é uma mentira! Só me preocupei com o bem estar de todos... Minha filha quando cheguei aqui não havia nada... Ande pela rua e me diga, existe outra cidade onde as pessoas são mais felizes? Onde exista mais divertimento? À noite essa cidade fica fervilhando de vorazes turistas em busca de aventuras e prazer...
O dinheiro corre solto e todos vivem bem. Não temos mendigos, todos são coloridos e os trapos viram fantasias e passam a ganhar dinheiro, aliais muito dinheiro, estou pensando em criar um novo imposto...

Repórter:
- O Prefeito pode apresentar toda a sua equipe?
Sérgio:
- É claro, vamos lá: esse é o Henri, meu braço direito... (flashes de todas as cenas de ação em que Henri aparece) - Esse aqui é o nosso Padre, ele abençoa o nosso governo, o nosso povo (flashes do Padre em ação) – Esse aqui é especial... Marcos é o nosso diretor de fazenda, o homem que faz milagre com o dinheiro! (flashes) – Agora esse é o Mário que administra a cidade e é o proprietário da mais bonita pousada da nossa região... Vocês já foram lá conhecer? (flashes) – Aqui temos o Souza, é de poucas palavras mais de muita confiança. (flashes) – Deixei por último o nosso intelectual, Brandão, o nosso Sherlock, um pouco nervoso, mas ótima pessoa... (flashes). Agora vou levar a nossa bela repórter para um passeio na lancha municipal...

Repórter:
- Lancha municipal?

Sérgio:
- O presidente não tem um avião, nossa cidade é mais modesta, tem uma lancha.

Cenas da lancha navegando no mar azul.

sábado, 16 de outubro de 2010

POLÍTICA

ELEIÇÃO COM ATENÇÃO

As informações abaixo estão no livro Quem foi quem na Constituinte nasquestões de interesse dos trabalhador. Organização e pesquisa doDIAP. São Paulo, Cortez Editora, 1988, p. 621.Para o bem da verdade, a classe trabalhadora e toda a sociedade devem sabercomo se comportaram os parlamentares, deputados federais e senadores,na Assembleia Constituinte de 1988, que entrou para a história como a Constituição Cidadã.

OS VOTOS DE JOSÉ SERRA NA CONSTITUINTE DE 1988

1) votou contra o monopólio nacional da distribuição do petróleo;
2) votou contra garantias ao trabalhador de estabilidade no emprego;
3) votou contra a redução da jornada de trabalho para 40 horas;
4) votou contra a implantação de Comissão de Fábrica nas indústrias;
5) negou seu voto pelo direito de greve;
6) negou seu voto pelo abono de férias de 1/3 do salário;
7) negou seu voto pelo aviso prévio proporcional;
8) negou seu voto pela estabilidade do dirigente sindical;
9) negou seu voto para garantir 30 dias de aviso prévio;
10) negou seu voto pela garantia do salário mínimo real.
O DIAP (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) atribuiu
ao tucano a nota 3,75, em uma escala de zero a 10. Tomou bomba!

METAMORFOSE


Quarto Movimento

O barco de Henri navega nas águas azuis do atlântico. Henri está tomando um vinho com Iracema sentada em uma mesa a bombordo.
Henri:

- Não é necessário sair de casa quando viajamos em um barco deste.

(Iracema vai se levantar)

- Por favor, não se levante! Permaneça em sua mesa e ouça. Não apenas ouça, mas espere. Não apenas espere, mas fique sozinha em silêncio. Então o mundo se apresentará desmascarado. Em êxtase, se dobrará sobre os seus pés. O mar abre-nos o caminho é só traçar a rota, uma meta e podemos ser feliz.
Iracema:

- Existe uma meta, mas não há um só caminho; o que você chama de caminho não passa de hesitação e de subversão da verdade. A minha rota perdeu o norte.
Henri:

- Para nós... Perdoa-me! Para você, com sua beleza, tudo é possível... Eu só poderia encontrar a felicidade se conseguisse me fazer entrar no verdadeiro, no puro, no imutável mundo dos amantes, onde se pode ouvir o canto das sereias e navegar guiado pelas estrelas e pelo suave perfume do seu corpo.
Iracema:

- As sereias, porém, possuem uma arma ainda mais terrível do que seu canto... É o seu silêncio.
Henri:

- Pensando assim a vida não faz nenhum sentido... Estou enamorado de você, uma paixão desenfreada explode no meu peito, a vida existe e não quero perdê-la.
Iracema:

- O sentido da vida é que ela acaba.
Henri:

- Quando te vi me pareceu que você era uma menina decidida, alegre, romântica, pra quem a vida nunca finda... Uma festa que nunca termina. Um mundo sem fim... Ao meu lado podemos vencer a morte, ter uma nova vida, achar a felicidade. Pense nisso!
Iracema:

-Todas as festas se evaporam, deixando para trás apenas a lama de um novo romance de horror. Não tenho nenhuma das qualidades necessárias para vencer a vida. Para mim a história dos homens é um instante entre dois passos de um comediante. Olha Henri! Eu nem possuo o livre arbítrio da escolha. A minha amargura, a minha vida é, com freqüência, só o petrificado assoreamento de uma menina, nada mais que isso.
Henri:

- A menina que é dotada de inteligência e também do livre arbítrio pode escolher o caminho que quiser para se desvencilhar deste encosto. Você era livre quando quis esta vida; agora não pode evidentemente rescindi-la, pois ela não é o que a queria outrora. Mas você é livre pelo fato de poder escolher o caminho a seguir e a maneira de percorrê-lo e é livre pelo fato de na qualidade daquele que vier a ser o novo dia, ter a vontade de se deixar ir, custe o que custar, através da vida.
Iracema:

- Belas palavras, mas esse caminho não vence o medo. Não há lugar no mundo para um arbítrio justo, quer seja livre ou servo, você não acha?
Henri:

- A fraqueza fundamental do homem não é nada que ele não possa vencer. A juventude vence tudo, a impostura, a astúcia mais dissimulada, mas não há ninguém que possa deter o velho mal da história e assim, sem cessar vencido, o medo nunca é aniquilado, vai para sempre existir.
Iracema:

- Tenho medo! Os homens tornam-se maus e culpados porque falam e agem sem antever os resultados de suas palavras e atos... Eu gostaria de retornar para a terra Henri...
Henri:

- Para a terra Iracema? Mas não íamos a Ilha do Farol?
Iracema:

- Não, Henri! Sinto que alguma coisa de muito ruim pode acontecer se não voltarmos agora para o continente.
Henri:

- Novamente o medo... Iracema, nós já estamos na metade do caminho e o Farol é muito lindo, passamos a noite lá... Não deixe o medo comandar a sua vida.
O barco faz o retorno no mar azul.

Movimento de Passagem

Cinema mudo (trilha sonora)

As marolas do mar se misturam, na contraluz do sol, mais as luzes e os flashes do massacre dos mascarados. A saída desesperada do barracão. O encontro depois do massacre e a crise de consciência do grupo com o retirar das máscaras. Sérgio passa então a liderar os desesperados justiceiros e fala (com gestos) ao grupo de sua fortuna roubada durante anos de corrupção e que toda ela estava escondida em uma pequena cidade costeira. Convida a todos para segui-lo até a cidadezinha. No caminho propõe então a formação de um grupo unido para qualquer tipo de acontecimento. Sérgio mostra a todos o seu plano de dominação...

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

METAMORFOSE


Terceiro Movimento

Vindo da água do mar para o alto vimos, caminhando pelas madeiras do cais. Dois homens conversando: Sérgio e Henri.
Sérgio:

- Henri, o tempo é teu capital; tem de o saber utilizar. Perder tempo é estragar a vida e você anda perdendo muito tempo camarada.
Henri:

- Sérgio, nós somos amigos desde a infância... Entre muitas outras coisas que trago de ti na lembrança, sobressaiu sua valentia e sua liderança. Tu eras para mim uma janela através da qual eu podia ver as ruas, compreender todo esse mundo de onde viemos. Sozinho eu nada podia fazer e nem entender o que deveria ser feito... Obtivemos algum progresso?
Sérgio:

- Crer-se no progresso não significa que já tenha tido lugar qualquer progresso neste nosso particular mundo... Ainda não nos livramos de tudo que poderia nos comprometer. Os nossos espíritos ainda estão presos no passado, naquele acontecimento macabro...
Henri:

- Sobre isso tenho tido pesadelos horríveis... Vejo a princípio uma floresta. Quando penetro na floresta, nada encontro, e a fraqueza, o medo, logo me força a sair de lá, quando vou deixar a floresta, ouço, ou creio ouvir, os cliques de armas usadas em uma guerra. Sinto que posso ser morto a qualquer momento e que um abismo abre-se a minha frente. É horrível!...
Sérgio:

- O espírito se liberta só quando você deixar de ser um suporte do corpo que cai. Na é o que diz seu pesadelo? Você é um impostor! Henri nós estamos aqui fortes, dominadores. Não vamos mudar os nossos negócios, vamos ampliar o nosso horizonte com a chegada do dinheiro que vem do petróleo. A incitação à luta é um dos meios de sedução mais eficazes do mal. O mal conhece o bem, mas o bem não conhece o mal. Se deixarmos o medo se abater no nosso espírito, ai sim é que estamos perdidos.
Henri:

- Quem procura não acha, mas quem não procura é achado, você não acha?
Sérgio:

- Henri nós vamos mudar o assunto que este seu pesadelo já está virando um filme.
Henri:

- Sérgio, você ainda gosta de cinema?
Sérgio:

- Tanto quanto gosto das mulheres! Mas não gosto de todos os filmes que vejo. Quero filmes que me afete como se um desastre ocorresse. Um filme deve ser como um machado diante de um mar congelado no meu peito. Se o filme que vemos não nos desperta como se levássemos um murro no crânio, para que vê-lo? As mulheres têm para mim essas mesmas características... Uma mulher tem de ser arrebatadora... Henri olha que estamos com sorte neste lugar, trouxemos pra aqui muitas mulheres, vivemos bem, todos juntos, sem traição e ainda com poder de mando, em pouco tempo estaremos todos muito mais ricos...
Henri:

- Sérgio eu não quero riquezas, quero ter a consciência da verdade. A verdade que todo o homem precisa para viver e que ele não pode obter nem adquirir de ninguém. Verdade que devemos extraí-la sempre nova do próprio íntimo, caso contrário a falta dela te arruína. Viver sem verdade é impossível. A verdade é talvez a própria vida. Por isso eu luto contra o que resta de mim no mundo da mentira.
Sérgio:

- Em sua luta contra o resto do mundo, aconselho que você se coloque ao lado do resto do mundo.
Henri:

- Ainda tenho esperança!
Sergio:

- Há esperanças, menos para nós.
Andando em sentido contrário aos dois amigos vem Iracema serenamente rebolando dentro de sua justa mini-saia e mostrando a sua exuberância de menina travessa.
Henri:

- Você está vendo o que eu vejo?
Sérgio:

- Ainda não fiquei cego!
Henri:

- Encontrei com ela na pousada do Mario agora a pouco...
Iracema fica cara a cara com os dois, olha e fala com meiguice para Sérgio.
Iracema:

- Quem é o Sérgio, eu preciso visitar a Ilha do Farol, você sabe como posso chegar até lá?
Henri:

- Eu sou o Henri, ele é o Sérgio. Mas ele não pode resolver o seu problema. Eu posso! Henri, este é o meu nome, muito prazer...
Sérgio:

- Cuidado que ele é perigoso...
Iracema:

- Não sou criança e já posso cuidar de mim...
Sérgio:

- Não falei por mal, é uma brincadeira!
Henri: - Vai para cidade Sérgio que eu vou levar a moça para um passeio de barco e na volta nos encontramos...
Ele não sabe o nome dela e olha para ela em silêncio. Iracema fala então o seu nome completo... Henri continua agora mais galanteador.
Henri:

- Pois é Iracema... Que nome poderoso. Levo você daqui para aonde queiras ir
Iracema:

- Ilha do Farol... É simples...
Sérgio:
- Que dia podemos marcar um novo passeio?
Iracema:
- Agora!
Sérgio:

- Agora?...
Henri:

- Agora?
Iracema:

- Agora sim! Tem algum problema com vocês. Sérgio você também pode vir...
Sérgio:

- Opa! Não posso não! Mas, mesmo assim, obrigado, repasso o convite para mais tarde e quando os dois voltarem do passeio, você venha jantar comigo na Pousada.
Henri:

- Eu também sinto que estou convidado... Você já está pronta? Então vamos para a Ilha do Farol?
Iracema:

- Sim! Vamos Sérgio? Eu te peço! Gostaria tanto que você fosse... Vamos!
Sérgio:

- Não posso! Espero os dois à noite.
Henri e Iracema partem em direção do barco e Sérgio sai em direção da cidade. Nós acompanhamos Sérgio. Antes de chegar à rua principal da cidade ele se encontra com o padre.
Padre:

- Sérgio, eu preciso falar com você... Marcos morreu nesta manhã assassinado no seu carro quando chegava à cidade.
Sérgio:

- O Marcos? Mas o que aconteceu? Foi um assalto? A Polícia já sabe?
Padre:

- Não sabe Sérgio! O Brandão está investigando. Ele está indo a pousada do Mario para fazer averiguações... Eu não estou gostando nada disso... Onde está o Souza? Temos que agir... Você toma alguma medida de urgência, pois afinal quem é o Prefeito desta merda aqui?
Sérgio:

- Agora já não sei! Devemos ir à pousada...
Padre:

- Deus me perdoe, estou perdendo a paciência, mas tem algo de podre no ar...
Sérgio:

- Todas as falhas humanas provêm da impaciência... Vamos falar com Mario, ele saberá, na certa, o que está acontecendo.
Padre:

- Depois de ter dado abrigo ao mal, ele não mais pedirá que você acredite nele...
O Padre e Sérgio se afastam.

Movimento de Passagem

Cinema mudo (trilha sonora)
Jaci se recupera em um hospital. Na rua, ela já recuperada, mas andando com dificuldade, retorna a casa abandonada onde tudo aconteceu. Visita o seu interior desorganizado. Recolhe alguns apetrechos da sua cozinha e vai se sentar no centro do terreiro onde ascende uma fogueira. Enquanto traça o chão com signos mágicos joga pequenas quantidades de pólvora no fogo. O ambiente se transforma com o brilho dos fogos de salão. Por entre a fumaça aparece Iracema.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

METAMORFOSE


Segundo Movimento

Iracema chega à cidadezinha praieira. Anda em suas ruas repletas de personagens fellinianos. Ela observa os estranhos transeuntes que passavam por ela, todos são pelas roupas que vestem pobres, mas com uma rica característica, pois suas roupas são extremamente coloridas.

Iracema:
- O senhor pode me informar onde eu encontro um lugar para dormir na cidade?

Homem (pescador):
- Tem uma casa, que fica mais pra lá, que recebe gente pra dormir... É logo ali na frente..., depois da curva feita, aí você retorna e ali está ela... (sai andando)

Iracema:
- De certo ponto adiante não há mais retorno. Esse ponto, o primeiro, por mim já foi alcançado. Como eu fui me meter nisso? Depois de ter dado abrigo ao mal, ele não mais pedirá que você acredite nele.

Iracema segue o belo caminho indicado pelo pescador. Toda a rua é banhada pelas águas calmas do canal. Entre árvores frondosas e casas coloniais ela chega à pequena pousada do Mario. Antes de ela entrar passa por ela um hospede do local, Henri. Os dois se cumprimentam. Ela entra na recepção da pousada e é recebida por Mario que olha Iracema da cabeça aos pés.

Mario:
- Se está procurando trabalho chegou ao lugar certo na hora certa.

Iracema:
- Não estou! Só quero um quarto para dormir. Estou muito cansada.

Mario:
- Apartamento sete, o melhor da casa para moça bonita... Onde estão as malas?

Iracema:
- Não viajo com bagagem, compro roupas novas quando preciso. As chaves!

Mario:
- Pagamento adiantado, ou você também não anda com dinheiro?

Iracema:
- Passa mais tarde no meu quarto que nós acertamos a conta. Agora, as chaves!

Mario: - O que uma menina bonita ta fazendo por essas bandas? Assine aqui!...

Iracema:
- Deve-se saber ler para fazer perguntas... processando...Mario, onde eu assino... (assina), e depois faço o resto no meu quarto. É só você me levar até ele...

Mario pega a chave e segue com Iracema até o quarto onde entram. Ele fecha a porta e vai se sentar na cama. Iracema tira parte de sua roupa e pede para Mario esperar enquanto ela vai ao banheiro. Passa um tempo. Mario fica desconfiado. Excitado, quase nervoso, levanta-se da cama e vai abrir a porta do banheiro, aparece Jaci do outro lado da porta e ele se afasta com horror.
Mario: - Quem é você e o que está fazendo aqui?
Jaci: - Você na certa se lembra de mim... Não lembra?
Mario: - Quem possui a faculdade de ver a beleza, não envelhece, mas também não se lembra de nada.
Mario fica menos nervoso e passa a andar no quarto de um lado ao outro. Vai até a janela, olha e passa a andar em direção de Jaci.
Mario: - O que você veio fazer aqui bicho feio?... Lembro-me de você... Onde você escondeu a menina?... Eu pago o quanto você quiser para ficar com ela... Eu sei que você gosta de dinheiro sua macumbeira, que vende suas crias quando a fome aperta, vamos, fala logo o que você quer!
Jaci: - Primeiro vingar o assalto e o assassinato vergonhoso das crianças encantadas no meu terreiro. Crianças ignorando a verdade e humilhadas na mentira, de modo insensível e progressivo. Depois livrar esse o povo daqui da peste que todos vocês representam.
Mario pára de frente da velha bruxa.
Mario: - Mas isso é uma mentira! Eu sou inocente! Nunca fiz mal a uma mosca... De que você está me acusando?
Jaci: - Toda a minha educação e paciência assentam-se nestes dois princípios - Ignorando a verdade e humilhando a mentira. Eu te acuso da morte de todos os inocentes que cruzaram o seu caminho...
Mario: - Verdades e Mentiras no jogo sujo da morte... Mas eu sou inocente, sua bruxa! Nunca matei ninguém.
Mario retira do bolso um pequeno revólver e antes de usá-lo jaci com a rapidez de um raio saca o seu punhal e crava-lhe no coração;
Jaci: - Agora está lembrando?... Onde você colocou a sua inocência? Mario você foi condenado à morte lenta e dolorosa. O primeiro passo já foi dado.
Mario: - - Jaci... Mãe de santo poderosa. Única sobrevivente do meu pesadelo. Sou condenado sem direito a me defender, sem poder provar a minha inocência, não somente à morte que me está reservada, mas também a de defender-me até a morte...
Antes de morrer ele agarra no pescoço de jaci para matá-la. Jaci então aperta com força um pouco mais o punhal no peito do condenado, ele se debatendo, sofrendo, dá um gemido e cai desfalecido sentado na cama, acorda com os olhos surpresos e vai morrendo aos poucos.
Jaci: - Para o seu feito não há uma defesa possível na terra. Nada poderia te proteger de você mesmo. Sinta a dor como elemento positivo deste mundo, e também o único vínculo entre este mundo e o positivo em si para onde você vai.
Jaci termina então de cravar o punhal no coração de Mario, que com os olhos estatelados faz de seu rosto o palco do desespero, da dor e da morte.
Silêncio.
Saímos da máscara mortuária de Mario para o chão, onde passa uma barata entre os sapatos de Iracema que os calçam. Depois caminha em direção da porta saindo do quarto e seguindo em direção da piscina onde se encontra com Souza, o jardineiro.
Souza: - Bom dia senhorita! A piscina está limpa. Vai nadar?
Iracema: Não, obrigada! Vou até a praia... Quero ver o mar
Souza: - O mar está de ressaca... Aconselho a piscina.
Iracema: - Ta bem, aceito o conselho! Vou molhar o corpo..., mas lembre-se que eu não sei nadar e você tem que ficar por perto...
Souza: - Sim, vou ficar de vigia enquanto a menina toma o seu banho, fica sossegada que aqui nada vai te acontecer.
Iracema: - Estou aqui, mais do que isso eu não sei...
Pelo olhar atento e surpreso do Souza, Iracema vai tirando as poucas roupas que veste e ainda de sapatos joga-se nua na piscina. Souza corre para perto e fica procurando pela menina que ressurge na água azul se debatendo como se afogasse. Souza pula de roupa e agarra Iracema colocando-a para fora. Ela finge ter se afogado. Souza massageia o seu corpo e faz respiração boca a boca. Ela finge estar melhor e ele começa a acariciá-la excitando-se. Iracema não esboça nenhuma reação. Como ela está ainda de sapatos ele começa a tirá-los... No lugar de Iracema agora está Jaci.
Jaci: - Não gosto que mexam nos meus sapatos...
Souza: - Você pode não gostar... Não faz mal! Vou tirá-los assim mesmo...
Jaci: - Desde que alberguemos uma única vez o mal, este não volta a dar-se ao trabalho de pedir que lhe concedamos a nossa confiança... Não tire os meus sapatos!
Souza vira-se e se assusta com o rosto de Jaci a lhe contemplar,
Souza: - Quem é você?
Jaci: - Não se lembra de mim? Quando eu começava a fazer alguma coisa que não te agradava e tu me ameaçavas com a sua arma, então o respeito pela tua opinião era tão grande que com ele o meu fracasso era inevitável. Perdeu a memória homem!
Olhar de horror de Souza. Sangue na boca. Movimento do rosto para o lado. Corpo cai apunhalado e morto na piscina onde bóia sinistramente. A água clara vai aos poucos se manchando de vermelho.
Jaci: - Não tenho piedade dessa gente. Esse só podia encontrar a felicidade se conseguisse subverter o mundo para fazê-lo entrar no seu verdadeiro ser, impuro, imundo, imutável, desumano. Um pervertido! Isso era o que ele era.
Saímos de Jaci e ficamos atrás de Iracema que olha para o corpo de Souza boiando na piscina.
Iracema: - Os bons andam no passo certo; os outros, os ignorando inteiramente, dançam a volta deles a coreografia das horas passadas.
Movimento de Passagem Cinema mudo (trilha sonora)
Alusões a um assalto violento que se interrompe quando nota-se o grande engano. Jaci chorando está caída no altar, ferida, com uma criança morta no colo. Imagens de luzes e sons de ambulância. Rostos preocupados. Movimento dentro de um hospital. Água no contra luz. O mar está agitado.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

POR UM NOVO CINEMA

Acabei de escrever um roteiro para um filme longa metragem.
Quando a idéia me surgiu imaginei que não poderia criar uma história que tornasse a produção muito alta inviabilizando a sua realização. Pode parecer inacreditável, mas depois que realizei “Um Filme 100% Brazileiro”, premiado no Brasil e no exterior, nunca mais consegui financiamento para um novo filme. Apresentei varia vezes o meu novo projeto. Era um filme de produção média sobre a Revolução Liberal de 1842 e o seu líder Teófilo Otoni (publicado aqui na página ROTEIROS). Assim, depois de tentar várias vezes os editais de produção, sem nenhum êxito, passaram-se anos e eu venho filmando com parcos recursos os meus roteiros. Agora em digital. Faço isso, pois não consigo ficar sem filmar, o desejo de criar é para mim quase um vício. Mas aprendi a fazer um filme com muito pouco dinheiro.
Escrevi para a atriz Maria Gladys, o papel de Jaci e para sua filha Teresa, o papel de Iracema e estou buscando um produtor ou uma produtora que se interesse pelo projeto. Acredito que posso realizá-lo com muito pouco dinheiro. Imagine se eu consigo, por exemplo, o cantor Roberto Carlos para fazer uma ponta no filme, no papel do personagem Henri, pode transformar o filme, afinal ele é simpático ao cinema e é amigo da Gladys, a mais brasileira de nossas atrizes. Não duvide. Na arte e no cinema tudo é possível.
Vou passar aqui no blog, em capítulos diários, a história completa da minha idéia, ainda sem o roteiro definitivo, só no primeiro tratamento. Quem sabe algum leitor do Brasil ou do mundo se interesse em produzi-lo. Registrado na Biblioteca Nacional.
Segue abaixo a minha nova idéia literária para um bom roteiro de cinema.


METAMORFOSE
Adaptação e criação livre e cinematográfica de alguns textos de Franz Kafka.


Protagonistas: Jaci, uma nochê dona de terreiro e Iracema, sua noviche.

São coadjuvantes: Sérgio, Prefeito e dono da cidade; Henri, amigo de infância do Prefeito; Osório, o padre da pequena comunidade; Marcos, secretário; Brandão, o chefe da polícia; Mario, o dono da única pousada; Souza, o segurança. Todos são maníacos, psicologicamente confusos. Todos, menos Henri, têm seus sintomas doentios exteriorizados por gestos repetitivos, sestros, dificuldades motoras, etc.

Uma repórter e um fotógrafo, documentaristas de televisão (personagens realistas) fazem parte da trama.

Figurantes: Mulheres de branco no terreiro. Batuqueiros.

Vindo do povo humilde, da vila de pescadores, surgem os personagens extras. Todos são pessoas normais, mas se vestem com roupas extravagantes, estranhas e coloridas (carnaval felliniano): Pescadores. Mulheres trabalhadoras (lavadeiras) e homens parados nas esquinas, todos estão maltrapilhos e pintados de todas as cores. Músicos. Pintores pintando seus quadros. Pequenos comerciantes. Muitas prostitutas e travestis – são os personagens que povoam a cidade.


Primeiro Movimento

Estrada de asfalto com pouco movimento. No acostamento todo tipo de lixo. Um bicho morto. Observamos pés que caminham lentamente pelo acostamento do asfalto ao rosto amargurado de Jaci, que anda resmungando em uma língua desconhecida, falando baixo, sozinha. Na sua frente passa uma barata. Ela olha para o inseto, se aproxima e fala mais alto para ele ouvir

Jaci:
- Quando despertei nesta manhã de um sonho agitado, me senti diferente, mais nova, mais disposta... O que teria acontecido comigo? Talvez se eu dormisse mais um pouco esqueceria toda esta estupidez...

Jaci continua andando pela estrada e só pára quando vê outra barata passando na sua frente.

- Deus do céu! Quantas baratas! Que trabalho... Viajar todo santo dia! Ocupação muito mais cheia de preocupações do que quando trabalhava em meu terreiro.

Jaci olha para a estrada:

- Viajar, minha amiga, é mudar constantemente de lugar. Refeições irregulares nas encruzilhadas, horríveis! Caras sempre novas que eu não veria nunca mais... Quem pode se divertir viajando? Odeio viajar!... Você já gosta, eu sei! Viajar e conhecer outros lugares... Eu não! Mas tenho que cumprir o meu destino... Viajar até achar quem trouxe o mal para dentro da nossa casa...

Jaci volta a andar no acostamento:

- Será que somos obrigados a fazer sempre o que menos gostamos?... Não há nada mais degradante do que ter de agradar a todos... É preciso cortar o mal pela raiz e para isso poder acontecer vamos ter que ser vorazes predadores. As circunstâncias obrigam-nos a isso... Você está preparada?

Jaci pára ao lado de uma árvore e descansa em sua sombra.

- Mulheres guerreiras, como nós, deveriam poder dormir mais, fazer mais amor e trabalhar menos, assim poderíamos evitar muitos pesadelos como esse...

Jaci refaz a sua energia deitada e olhando para o céu. Depois levanta e anda até a beira do asfalto. Olha para o ponto onde as duas estradas se cruzam.

- Para eliminar as sete encruzilhadas que atormentam os pobres inocentes de uma cidade escravizada, precisamos ser astutos como a raposa. Livramos a cidade e depois estamos livres.

Jaci volta a caminhar rente ao asfalto...

- Preciso muito de você para esse trabalho...

Um carro passa em alta velocidade.

Eu te protejo e você abre o caminho... Depois disso feito eu lhe conto o meu maior segredo. E depois..., que fossem todos para o diabo.

De novo estamos percorrendo o asfalto, rente ao chão, quando surgem os pés de outra personagem caminhando. Acompanhamos os seus passos. Aos poucos se desnuda a nova personagem e percorremos com vagar os contornos da menina Iracema. Ela está vestindo uma roupa moderninha que deixa as suas grossas pernas desnuda. E assim sensual, mas de cara fechada, resmungona, pára de andar a beira da estrada e passa a pedir uma carona.

Iracema, resmungando:
- Vamos começar dando os primeiros passos... Fazer justiça, mesmo tardia, você esta certa e que tudo mais vá pro inferno!

Um carro pára ao seu lado e o homem no volante abre o vidro.

Marcos:
- Quer uma carona?

Iracema não responde e volta a andar. Marcos sai do carro e insiste:

Marcos:
- Vamos! Não tenha medo... Eu te levo a qualquer lugar, basta me pedir... Tem uma cidade aqui na frente onde podemos comer alguma coisa e nos conhecermos mais... Está bem! Você não vai sair perdendo nessa escolha... Anda, vamos!

Marcos entra no carro, arranca e passa lentamente ao lado de Iracema que continuava a andar. Ela pára de andar, o carro também, ela abre a porta do carro e entra.

Marcos:
- Que bom! Você não vai se arrepender...

Iracema:
- Eu sei!

Silêncio. Movimento gráfico da estrada: asfalto, placas, faixas aleatórias. Iracema olha para o rapaz que dirigi o carro, fica um tempo esperando o seu olhar, vira o rosto, olha para o alto como se pensasse algo divertido, então sorri, cruza as pernas e mostra a sua calcinha. Quando ela vê Marcos olhando como um animal para as suas pernas, pudicamente tenta se arrumar.

Marcos:
- Meu nome é Marcos, e o seu?

Iracema:
- Iracema...

Silêncio. Iracema olha de um lado e de outro e mexe compulsivamente as mãos nervosas. Marcos olha a todo o momento para ela. Silêncio. Marcos liga o rádio do carro. Música. Estrada a beira da lagoa.

Marcos:
- Você está nervosa Iracema?... Aconteceu alguma coisa? Não precisa ter medo...

Iracema:
- Não! Não é medo! Estou impaciente para chegar, é só isso!

Marcos:
- Talvez haja apenas um pecado no mundo: a impaciência. Devido à impaciência, fomos expulsos do Paraíso e devido à impaciência não podemos voltar. Aleluia!...

Iracema:
- Você é religioso?

Marcos:
- Sim! Sou pastor de ovelhas desgarradas...

Iracema:
O lobo e as ovelhas!

Marcos: - Você é inteligente, entende rapidinho o que eu quero te falar... Vou te contar um segredo: Sou eu o Prefeito e mais cinco, os homens que mandam na próxima cidadezinha... Sou irmão do Prefeito e se você for boazinha eu posso te transformar em uma rainha... A rainha de Eldorado! Lá eu sou rei e você será uma deusa! Basta você querer doçura...

Iracema:
- Então estou bem acompanhada... Não é qualquer um que pode ser dono de toda uma cidade... Um rei você e eu uma deusa! Eu sei quem você é Marcos, mas você não se lembra de mim...

Marcos olha para Iracema com um leve sorriso nos lábios, diminui a velocidade do carro e entra no acostamento.

Marcos:
- Agora que você falou, eu estou com uma leve lembrança da sua pessoa, do seu nome... Iracema dos lábios de mel... É claro! Foi em alguma festa na região, mas como são muitas e foram tantas... Eu não consigo me lembrar do seu rosto... Mas eu me pergunto: Como fui esquecer um rosto tão lindo, tão angelical? Olha que conheço todas as mulheres bonitas que vivem aqui na região... Mas você é encantadora, inebriante e esse perfume de mata virgem que o seu corpo exala me descontrola todinho...

Marcos se aproxima de Iracema que não esboça reação alguma e passa a acariciá-la no banco do carro

Marcos:
- Iracema o seu perfume é inesquecível! Só há uma maneira de eu me lembrar completamente de você: é te namorando e assim ativando, a cada carinho recebido, você na minha memória... Iracema!... Iracema!... Iracema dos lábios de mel.

Marcos começa a beijá-la, mas, aos poucos, ele começa a enxergar nela algo diferente, algo que lhe deixa aterrorizado. Ele começa a suar frio e as imagens de um passado recente de violência, voltam a ser lembrada. O rosto de Iracema esta ligado a esse passado. Seu rosto, aos poucos, vai ficando desfigurado, os olhos esbugalhados como em um filme de terror e no seu peito, pode-se ver enterrado até o cabo em cruz, um punhal no coração. A porta do carro então se abre. Jaci coloca os seus dois pés no chão do acostamento de pedra e começa a andar afastando-se do carro em direção da estrada.

Movimento de Passagem

Cinema mudo. O diálogo é dramatizado com gestos fortes realçados pela trilha sonora.

No interior de um olho castanho, refletindo-se na pupila dilatada, explodem em flashes a imagem de sete homens armados, mascarados, cercando um casebre à noite. Dois deles ficam vigilantes na porta e os outros cinco arrombam e invadem as portas fechadas do casebre no alto do morro cercado por uma pequena mata. Estão nervosos e apressados. No seu interior acontece um ritual Vudu. Tocam-se os tambores. Velas e despachos com muita pólvora e fumaça. Mulheres possuídas pelos santos se debatem enquanto outras dançam. Iracema também está presente e é a mais formosa bailarina do além.
. O comandante da missão, capitão Sérgio dá a ordem em voz alta: - Chega de conversa fiada! Não temos tempo a perder! Vamos invadir é por logo fim a este tormento. Invadir!
O sargento Marcos é o primeiro a entrar no pegi. No momento em que o terreiro é invadido a nochê Jaci, vestida de branco, está sentada no baquinho traçando pemba no chão do pegi com uma varinha. Os tambores param de tocar. A noviche Iracema corre e pega a sua filha no colo. O sargento, com sua arma engatilhada, olha para os rostos assustados. Jaci se levanta do banquinho. As luzes elétricas do terreiro piscam e se apagam. Algumas velas permanecem acesas. Um rastilho de pólvora entra em combustão espontânea provocando o início do tiroteio no terreiro. Um grupo homens de roupas comuns foge da casa para dentro da mata atirando. Tiros e mais tiros. Dentro do terreiro uma chacina com poucos sobreviventes, As luzes retornam a iluminar o terreiro.
Iracema tem a sua roupa branca toda manchada de sangue. Sua criancinha está morta no chão.
Aos olhos de Jaci surgem flashes das cenas do massacre em fragmentos de luz e sombras.
Na estrada está Marcos, com a cara deformada, morto dentro do carro com um punhal cravado no coração.
Iracema caminha no meio do asfalto, saindo de perto do carro em direção da cidade. Fincado no acostamento da estrada uma placa indicativa: ELDORADO 5 km.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Túnel do Tempo

Nunes Pereira em Belo Horizonte durante as filmagens na Oficina Goeldi do "Um Filme 100%Brazileiro"1985
O culto vudu no Brasil: a visão de um documentário
Entrevista do Professor Nunes Pereira a Sérvulo Siqueira
www.guesaaudiovisual.com/

Não se trata de macumba, mas de vudu mesmo:este culto existe no Brasil, apesar de, quando se fala nele, as pessoas pensarem só no Haiti. Embota tenha em comum com a macumba a origem africana, o vudu é um culto com características próprias. Seu panteão encontra-se em Lagos, na Nigéria e no Daomé. Os adeptos, ao contrário dos praticantes da macumba, estão diminuindo no Brasil. Nunes Pereira, um de seus estudiosos, atribui o fato à falta de continuidade na formação de sacerdotisas do culto (nochês).
"A Casa das Minas — Introdução" é parte do que se pretende um amplo documentário cinematográfico sobre o culto vudu. A oportunidade do filme, segundo Carlos Silva - juntamente com José Sette e Rolando Santos seu diretor e produtor - surge do fato de que o vudu "está se perdendo ao revés das palavras dos cultos e isto começa a desaparecer e a ser tão corrompido que não mais pode ser sequer conservado". Diz o professor Nunes Pereira, autor da obra em que se inspirou o filme: "0 documentário já não consegue mais preservar a integralidade da tradição africana, de acordo com minha conceituação vai servir para estudiosos como eu".
Com duração de 30 minutos, o documentário começa no gabinete de trabalho de Nunes Pereira - prateleiras que abrigavam uma biblioteca há pouco vendida ao governo do Pará -, com o professor recordando traços de sua meninice em São Luís do Maranhão. Estes traços se localizam na "Casa das Minas" onde Felicidade Nunes Pereira - sua mãe e uma nocbê- participava como uma das oficiantes do culto. De suas lembranças vamos para Jacarepaguá, onde o professor nos introduz num querebetã, que quer dizer terreiro, em idioma nagô.
Dona Zuleide, praticante do culto, fala de algumas de suas características. O modo de preparo da comida, que participa de um ritual onde entram também os huntós, tocadores de atabaque, únicos homens participantes de uma cerimônia oficiada exclusivamente por mulheres. O altar se encontra em uma construção ao lado do querebetã. Sua disposição, segundo Nunes Pereira, "já não tem mais nenhuma ligação com o altar especificamente africano, representa uma adulteração. O altar legítimo da tradição africana - dentro de suas concepções religiosas, politicas e sociais - é sempre uma árvore, um baobá. Entre nós é a cajazeira. É sempre uma árvore e representa como que uma catedral na natureza, um santuário. Dai o fato de dona Zuleide nos falar multo de sua ligação com a natureza".
Do altar registrado pelo filme - uma disposição triangular em torno de um quarto - contendo elementos representando divindades - passamos para um jardim onde se completará o ritual de um culto vudu. A câmera destaca pedras estranhas e bonitas que parecem ter sido esculpidas. Nunes Pereira diz que elas estão ligadas á cosmologia do culto minajêgê:
— São pedras caídas do céu. Pedras de raio ou seixos rolados do leito dos rios e têm aquela forma porque sofreram erosão devido à influência do sol ou sob a ação das águas. Não compõem nenhum significado mas estão ligadas ao culto dos vudus. Viajando no altiplano andino - na Bolívia e Peru - encontrei à margem das estradas pedras semelhantes a estas, observa Carlos Silva.
As últimas sequências do documentário registram o sacrifício de um galo e o momento em que os vudus "baixam" no querebetã.
— Este sacrifício - observa o professor - não somente "representa uma homenagem à divindade como também se constitui num alimento do vudu e da nochê. São preparados com temperos especiais que dão força às oficiantes, representando também um elemento de integração no culto. Entretanto, aquela matança do galo revelada no filme - que é uma coisa impressionante - não é vista por todo o mundo, é um fato secreto.
Carlos Silva fala dos seus planos imediatos e futuros.
— Já filmamos na Casa das Minas do Maranhão, na Rua São Pantaleão, em São Luís. A primeira parte é o que está representado no livro: a velha cajazeira. o ambiente onde se formou a meninice do professor Nunes Pereira. Por outro lado, documentamos a festa de São Sebastião de Acóssi e uma visita da Casa das Minas - dos participantes do culto vudu - ao terreiro Nagô, para caracterizar isto que o professor chama de esgalhamento, a ramificação de vários cultos dentro do tronco cultural nagô. Há neste segmento um aspecto de volta ao passado, usa-se por isso um negativo que dá um tom ligeiramente sépia.
— Iremos depois à Bahia, ao Haiti e à Africa buscar a fonte deste culto que se propagou no Brasil. E assim, teremos um painel que servirá de registro seguro para historiadores e etnólogos. Só a primeira e segunda partes do filme já estão feitas — diz Carlos Silva.
Moronguetá: uma visão da nossa cultura
- Carlos, como surgiu a idéia do filme?
— Quando foi publicado o livro "Panorama da alimentação indígena", o Rolando - um dos autores do filme - chegou em casa com a obra e nós, depois de ler e discutir, chegamos à conclusão de que ela tinha uma visão da cultura brasileira. Em segundo lugar, o que nos chamou a atenção foi o fato de que ela trata de assuntos sobre os quais não há muita coisa publicada. Existem trabalhos de Silva Mello, Câmara Cascudo e Oswaldo Orico mas de qualquer maneira a bibliografia não é muito extensa. Quando chegamos na casa do professor Nunes Pereira fomos conversar sobre o "Moronguetá", ainda não conhecíamos o livro "A casa das minas". Tomamos contato com, este livro que é uma publicação pioneira da Sociedade Antropológica Brasileira de 1947, é a primeira edição desta sociedade que foi dirigida por Artur Ramos. Depois de tomarmos conhecimento com o corpus desta obra, decidimos filmar. registrar a realidade de uma cultura que está em contágio cora outras e por isso se corrompe. Como disse um documentarista africano que esteve no Brasil, o cinema é o veiculo ideal para registrar a cultura da África, porque a cultura negra é eminentemente visual. Não tínhamos dinheiro e as possibilidades de obter um financiamento eram muito remotas. Daí optamos por filmar com um mínimo de recursos, filmar o professor aqui na biblioteca, situá-lo como um estudioso também de gabinete e depois fazer uma pesquisa de campo. Isto se constituiria numa introdução ao assunto. A pesquisa de campo seria realizada num querebepã, que é um vocábulo minajêgê usado para designar um terreiro. Por outro lado, havia a dona Zuleide Amorim, que é ligada à Casa das Minas. Assim, pensamos nós, através da venda de uma cópia deste filme, poderíamos prosseguir o nosso trabalho.
- Professor Nunes Pereira, o que é "A casa das minas"?
- A Casa das Minas é um centro de religiosidade afro-brasileira. Negros e escravos - chamados de "contrabando" - que conseguiram chegar a Minas Gerais e Bahia e mais tarde ao Maranhão, fundaram as bases da liturgia dos vudus, cujo panteon mais representativo se encontra em Lagos, na Nigéria e no Daomé. Eles trouxeram toda a liturgia do culto para o Brasil - isto já tem mais de cem anos - e, levado por trabalhadores, seringueiros e mulheres, ele estendeu-se até a Amazônia. Assim você encontra este culto também em Porto Velho. Mãe Esperança, uma maranhense octogenária, fundou um terreiro lá, que continua agora sob a direção de Chica Macaxeira. Ela é mãe de santo, o que no idioma minajêgê se diz nochê. Este culto teve uma expressão religiosa muito grande na Amazônia. Os mais conhecidos eram o de mãe Andresa Maria e o Nagô. Eu me preocupei mais com o culto vudu da Casa das Minas. Do nagô se pode dizer que era o tronco da religiosidade dos cultos vudus no Brasil e na Africa. Ele se esgalhou no culto do minajêgê mas o representativo é a imagem deste tronco puramente nagô: ioruba, fon e nagô. 0 nagô é um ramo, uma língua. Minha ligação com a Casa das Minas, vem do fato de minha mãe ter sido iniciada no culto vudu, ela era uma noviche, uma sacerdotisa ou, como se diz na umbanda, uma filha de santo. Na minha obra lá está o nome dela - Felicidade Nunes Pereira - e isto também consta no filme. 0 santo de minha mãe, seu vudu, é Poli Bogi, que juntamente com Zanadone são as figuras mais representativas do panteon minajêgê. Zanadone, no entanto, já não baixa mais no terreiro, senão episodicamente, e quando o faz é uma divindade violenta. Uma vez no Maranhão eu pude presenciar quando ela baixou em mãe Filomena, que era uma nochê. Sua ação se estendeu de tal maneira que prostou por terra várias noviches, dando-lhes feições verdadeiramente horrorosas, como se fosse uma máscara. Zanadone não baixava naquele terreiro há muitos anos. Existe um tambor para chamá-lo que tem proporções muito grandes, é maior de um metro e vem da África. É feito de uma madeira especial. Mas este santo não "baixa" mais. Ele subiu. Há uma outra divindade que não foi mencionada no meu livro mas que vai aparecer no novo a ser lançado: Savanô - uma outra divindade que eu identifiquei recentemente graças a uma conversa que tive com uma nochê de um querebepã do Maranhão.
- Professor, seria possível estabelecer uma relação de sincretismo com os santos católicos?
— Zanadone, por exemplo, eu não sei, mas Poli Bogi é São Sebastião. Entretanto, no Maranhão este sincretismo não era tão nítido como na Bahia. Por isto mesmo, mãe Andresa dizia que "santo negro é santo negro". Isto não queria dizer que os santos negros não tivessem ótimas relações com os santos católicos.
No rosto, os traços de uma verdadeira princesa negra
- Professor, qual é o santo que dona Zuleide recebe no filme ?
— E Poli Bogi, o santo da minha mãe. Dona Zuleide é ligada à Casa das Minas mas não é uma nochê. A última nochê foi mãe Filomena. Agora, na Casa do Nagô ainda existem nochês. O que aconteceu é que, com a morte de mãe Andresa Maria, o culto vudu entrou em decadência. Vieram outras nochês mas não tiveram a força de irradiação e sobretudo de penetração social que ela tinha. Um grande sociólogo francês que visitou mãe Andresa Maria reconheceu nela traços e qualidades de uma verdadeira princesa negra. Uma mulher nobre, pela maneira como o recebeu. Grandes escritores passaram pelo Maranhão e foram visitar esta famosa nochê. E havia - dando uma estrutura verdadeiramente emocionante ao culto minajêgê - um fundamento moral de alta incorruptibilidade. No entanto, com a morte de mãe Andresa Maria e, mesmo no tempo em que ela vivia, não obstante a insistência para que novos grupos de moças fossem iniciadas, as nochês voltavam as costas a esta solicitação. Por outro lado, era preciso que as noviches fossem virgens, embora este não seja um fator fundamental, uma vez que não havia necessidade de comprovação. E houve também perseguições policiais, porque o culto vudu era proibido.
- Não havia uma identificação com a magia negra?
— Há magia negra no vudu mas há também uma identificação com a maçonaria, pelo fato de que ambos têm uma linguagem secreta. Nesta minha obra que vai editada agora, eu faço largas referências às interligações da maçonaria com o vudu. Os maçons ajudaram muito o movimento de libertação dos escravos. Tanto assim que quando morria um maçon eles batiam tambor na Casa das Minas em homenagem ao morto. Entretanto, só agora descobri elementos que provam isto. Este é um estudo que pretendo desenvolver amplamente e já estou no rastro de vários documentos que provam esta ligação. Eu mesmo já assisti ao enterro de um maçom e obrigatoriamente o cortejo parava na porta da Casa das Minas quando o tambor batia em surdina. O aspecto desta ligação rta mais político e nascia da integração destas duas sociedades secretas.
Carlos Silva observa que "na Casa das Minas do Maranhão, situada na Rua São Pantaleão, em São Luís, durante a festa que nós filmamos, você vê um altar sacrário católico". - Num determinado momento, entram as rezadeiras com uma orquestra de trombones, banjos e começam a cantar ladainhas. Neste instante, o povo canta junto. Quando acaba a cantoria, entram as noviches e cantam uma outra música em língua africana. E aí que você nota a distinção que elas querem fazer. Este é um costume muito antigo que demonstra o desejo de camuflar - através da introdução de elementos da liturgia católica - a sua crença.
-- Professor, como é que o sr., um estudioso vê o filme? Qual é a sua importância?
— A importância do filme está no fato de ele fixar verdadeiramente aspectos legítimos e firmar também adulterações que foram feitas no culto. Uma delas é, por exemplo, o fato de dona Zuleide fazer o sacrifício do galo à vista de todos. O sacrifício de animais; galinhas, cabras, carneiros, cobras é feito sempre numa certa área do querebetã por homens, sacrificadores especiais, e não por mulheres. Mesmo no bogã de mãe Valentina, na Bahia, que eu frequentei — da linha Minasmari, uma outra extensão do culto — são somente homens os sacrificadores. O filme confirma a autenticidade de meus estudos e de adulterações muito sérias na estrutura litúrgica. E a importância disto para o estudioso é que ajuda a restabelecer a pureza e a continuidade da tradição.

Matéria publicada no jornal O GLOBO em 25 de agosto de 1977.