ABAIXO TEXTOS - CRÍTICAS - ENSAIOS - CONTOS - ROTEIROS CURTOS - REFLEXÕES - FOTOS - DESENHOS - PINTURAS - NOTÍCIAS

Translate

domingo, 31 de maio de 2015

Reflexões de um cineasta


Violência budista
Por Orlando Senna
A migração de refugiados no Mediterrâneo é um acontecimento angustiante e marcante da atualidade. Milhares de pessoas fugindo de seus países em barcos precários, tentando escapar de conflitos bélicos, perseguições étnicas e religiosas e da fome. O destino sonhado é a Europa e estão à mercê de organizações de traficantes de gente, que lucram milhões de dólares com o negócio e tratam os migrantes como gado descartável. Como mercadoria que, já tendo sido paga e sem credor para recebê-la, pode ser jogada fora, afogada. O número de mortos é impressionante e não para de crescer no que está sendo classificada como a “rota migratória mais letal” que se tem notícia.
O trânsito criminoso também acontece no Oceano Índico, mas fiquemos com o Mediterrâneo, um mar interior com uma estreita saída para o Atlântico, entre a Europa, a África e a Ásia. Os refugiados são majoritariamente provenientes da Líbia, Síria, Iraque, Sudão, Eritreia e Bangladesh, países islâmicos, e Mianmar, controlado pelo budismo. A União Europeia, assustada, está realizando operações de resgate de barcos à deriva e de combate aos traficantes e apresentou uma nova agenda sobre migração, com programas de asilo em todos os países do bloco e rapidez na legalização dos asilados. Espero que os programas sejam implementados imediatamente, pois a cada meia hora alguém morre afogado ou assassinado nas águas mediterrâneas.
A partir desse cenário horripilante uma informação antiga e meio escondida ganhou destaque, as mídias manchetaram e discutiram o assunto, milhões de pessoas ficaram sabendo e, em consequência, milhões de surpresas foram vividas. Refiro-me a Mianmar, ex-Birmânia, um país com maioria budista, governo budista e extrema intolerância religiosa. Os 500 mil monges budistas de Mianmar se dedicam a expulsar do país o grupo étnico Rohingya, praticante do islamismo, “devolvendo-os” a Bangladesh, que seria seu lugar de origem. A campanha de expulsão, que está dando resultados, é lastreada por uma gama de desumanidades que vai dos castigos físicos a leis que controlam a natalidade dos muçulmanos e lhes vetam os serviços públicos.
Refiro-me, pois, à violência budista, algo impensável para a maioria dos budistas espalhados pelo mundo e para milhões de não budistas que têm uma noção de tranquilidade e elevação espiritual quando pensam nessa religião, a quinta maior da humanidade, 380 milhões de adeptos. Surgiu meio milênio antes de Cristo, com as reflexões de um nepalês chamado Sidarta Gautama, um avatar, um homem transcendente. Seus ensinamentos essenciais são focados nos caminhos para a plena realização da natureza humana, para a eliminação do sofrimento, que é causado pelo desejo. Os caminhos da paz interior, da não violência, de uma relação sacralizada com o próximo e com o mundo.
Sidarta, também chamado Buda (Iluminado em sânscrito), fundou uma religião sem Deus, sem Deuses. A divindade está na relação do humano com a natureza material e imaterial. É a única grande religião sem Deus, não-teísta. A esse diferencial, soma-se outro: o nome Buda não se refere apenas a Sidarta, mas sim ao conjunto de todos os iluminados, dos seres com inteligência e sensibilidade superiores à normalidade humana que ajudam seus semelhantes a dialogar com os grandes mistérios da existência.
Sabemos que todas as grandes religiões protagonizaram guerras e matanças ao longo da História, inclusive o budismo em antigos conflitos no Japão. Mas na Idade Moderna do Ocidente (ou seja, a partir de 1500) sua imagem para a humanidade é a da busca da paz, um entendimento respaldado pela aproximação das percepções de Sidarta às tradições filosóficas chineses da meditação zen e do pacifismo tao. Os monges de Mianmar desmentem isso e, chafurdando na intolerância e na brutalidade, nos chocam e entristecem. 

quarta-feira, 27 de maio de 2015

UM CONTO DE REIS


PÉ DE PATO MANGALÔ TRÊS VEZES
 Fábio Carvalho

Novamente na esquina das três portas a personagem Deus outorga sua pregação para seus mais fiéis asseclas com os seguintes dizeres: informo, para os devidos fins, que a erva processada, após ser fumada, degustada e curtida, foi completamente absolvida e abençoada com louvor! Na sequência, todos aplaudiram de pé. Na despedida do B.B.King, passei a noite inteirinha com a Susan Tedesch sem mini saia, no andar mais alto do edifício Astral, de frente para o mar. Derek Trucks, o sobrinho do Alman Brothers, nunca desconfiou de nada. Era nossa atividade secreta, em que ela nunca levava a guitarra como de outras vezes, ademais, ele também não tinha nada a ver com isto, era uma questão só minha e dela. Isto posto, na noite seguinte tive um sonho bastante estranho.  Eu estava num apartamento térreo, de onde via através de duas grandes janelas na altura do olho, bem de perto, a Praça Da Liberdade, minhas filhas ainda pequenas faziam a maior algazarra pelos cômodos vazios, vestidas apenas com fraldas descartáveis.  Um computador no chão de uma das salas me incomodava, pois tinha que ligá-lo e não sabia como. As paredes estavam limpas como se tivessem sido pintadas naquele momento, e não ofereciam barreira nenhuma para minhas caminhadas de um lado para o outro. Eu era um translúcido. O grande mestre cineasta Alberto Cavalcante andava ao meu lado apoiado em uma bengala, dizendo coisas agradáveis e interessantes, pensava em dar-lhe de presente meu livro, mas não sabia onde estava. Sentia a presença de minha mulher da vida inteira, só que não a via, nem sabia quem era. Num determinado momento o Cavalcante estava sentado numa poltrona com uma senhorinha de cabelos bem brancos vestida com vestido de lã colorida, no seu colo, abraçada ao seu pescoço. Ela olhava para mim e sorria, balançando os pés descalços no ar como se estivesse nadando. Virei-me na direção da área de fundos do apê, e vi a motoqueira que trabalha na loteria ajudando sua namorada a subir no muro para olhar o que estava acontecendo lá fora. Ouvi um som profundo e surdo vindo do infinito das catástrofes. Vozes de desespero misturadas a um burburinho estridente foram gradativamente aumentando de volume. Da janela maior pude ver uma multidão de pessoas bonitas e bem vestidas, parecendo num desfile de modas, correndo assustadas em direção ao nada, algumas eram chutadas e pisoteadas em câmera lenta. Uma bola de fogo vinha se aproximando e tomando conta do céu e da praça, como um efeito especial bastante tosco feito no tempo do chroma-key analógico. Sentei-me em outra poltrona de frente para a janela sem nenhum medo, ao contrário, com prazer, para esperar, quando percebi que chegaria o fim.  A bola de fogo vinha feroz destruindo e engolindo tudo e a todos. Pensei nas pessoas que amo e fui ficando emocionado com a idéia de que talvez não as visse mais. Ao mesmo tempo estava muito curioso para saber como seria a passagem desta para a outra. Prestes ao fogo entrar pela janela, sem me conter, falei para que meus amores ouvissem: um beijo para todos! A imagem foi frisada, como se alguém tivesse dado uma pausa num aparelho de DVD, o som também cessou por completo. Num breve instante perguntei com eco: então é isto o nada? Assim acordei com o dia clareando e fui ao banheiro olhar-me no espelho para ver se ainda era eu mesmo, um Bem Te Vi cantava como sempre na árvore da frente. A lembrança deste sonho vem me perseguindo há dias; talvez hoje, depois de escrever, me livre dela. Tristezas não pagam dívidas, nem esperanças perdidas, para a vida continuar é preciso que eu volte a cantar. A alma do violino é uma peça dentro desse instrumento.  A dádiva do instrumentista é saber tocar com o coração, deixando suas mãos livres sob o comando do além-cérebro, corpo em expansão a te desvirtuar em zonas multi-sensuais, cantava Johnny Alf no filme do João Carlos Rodrigues que ainda não vi. Jade a spalla. O maestro de brancos cabelos desgrenhados sinaliza aos seus músicos para tocarem de forma mais arrastada, já que se trata de uma marcha rancho. Assim eu e você, nós dois juntos, chegaremos ao fulgor das estrelas. Um conceito tridimensional. No entanto não sou de reclamar e ainda trafego num refúgio de luz. Claro está, lembrei-me do Lupicínio Rodrigues, por conseguinte do Paulo Saraceni, meu carinhoso professor, sem contar que o Fluminense tomou de quatro do Galo, merecidamente, podendo ter sido de mais. Hosana nas alturas. Doralice eu bem que lhe disse, olha essa embrulhada que eu vou me meter. Agora amor, Doralice meu bem, como é que nós vamos fazer? Amar é tolice, é bobagem, ilusão. Um belo dia você me surgiu, eu quis fugir, mas você insistiu. A árvore de Ráfia crescia vertiginosamente no meio da sala de jantar da Rua do Ouro, ainda em um vaso pequeno para sua magnitude. O outro maestro de cabelos mais curtos elucida seus músicos aplicadíssimos com os seguintes dizeres: esta peça fala da tragédia humana, portanto ela deve ser tocada em fortíssimo e em pianíssimo, de novo, por favor! Uirapuru do Villa Lobos indelevelmente tomou conta do som interior do filme que estou a fazer. Exatamente JK Nas Alturas, que me foi presenteado pelo grande pesquisador do cinema brasileiro contemporâneo Antônio Leão. Le lion cest le roi des animaux. Logo em seguida, fui ao edifício da Providência na Rua da Salvação número 333 buscar uma encomenda para a época da quaresma. Desta vez saí de lá com a nítida impressão que era outro, embora continuasse eu mesmo em novo patamar. A transferência do próprio mundo é uma questão de volatilidade, para não dizer de voluptuosidade, palavra que gosto muito. Palavras são palavras, sons são sons e homens são homens. Vocação é uma palavra religiosa. O escritor do Ricardo Miranda, Gustav Flaubert, disse que para tornar qualquer coisa interessante basta olhar para ela durante algum tempo. Os jovens não deveriam ser pragmáticos como hoje em dia, deveriam se sonhadores. Tonho, o bombeiro, me contou hoje pela manhã que na noite de ontem tomou duas doses cavalares da marrom, cachaça do Grotão, apelidada de Alcione, e quando estava indo para casa sentiu suas orelhas crescendo. Tenho impressão que certamente foram mais de duas. O céu azul e o friozinho de Abril só chegou ao fim de Maio, bom também. Escrevo para não conseguir descobrir nada, fico tentando. Paradise Now. Recordei-me de vestígios de harmonia na mesma praça que mamãe me levava para tomar banho de sol no carrinho de bebê. Estou no terceiro ciclo de experiências nessa mesma localidade e no mesmo jardim, que ficam no coração da cidade província que nasci, agora vistos de cima, também por vezes em linha reta nas caminhadas das idas e das vindas. O ciclo atual, desconfio com quase certeza, não é o último. Quando adolescente fiz várias investidas no hoje extinto Cine Candelária, que no início de sua decadência, foi o primeiro a exibir comédias italianas com mulheres em nu frontal. Uma beleza para olhos ávidos por ver imagens proibidas. Depois já adulto filmei por duas ou três vezes, utilizando-me desta praça como locação e cenário. Agora quase todos os dias ela me revela alguma coisa curiosa. Ontem, ao voltar do botequim da Loura, onde comi uma Merluza com legumes, me deparei com a porta entreaberta de uma casa toda pintada de preto, que sempre estava completamente fechada. Sem placas que indicassem o que funcionava ali, eu já tinha imaginado várias possibilidades, todas no território do submundo. Não resisti e entrei. Surpreendentemente lá dentro era tudo muito amplo e claro, atravessei uma espécie de recepção onde não havia ninguém, e cheguei a um salão com o piso todo coberto por tatame, cercado por espelhos, no canto uma mulher morena muito bonita, vestida com um quimono preto e vermelho, ensaiava uma dança com leques sem música alguma. Fiquei observando extasiado por alguns minutos seus movimentos leves e rápidos, sem nenhum outro som a não ser o do abrir e fechar dos leques, e o de sua respiração.  Saído de uma porta do outro lado, veio em minha direção um chinês magrinho, também de quimono, rindo para mim. Com muito sotaque, ele me explicou que ali é uma academia de Tai Chi Chuan e Kung Fu e deu as coordenadas para me inscrever. Pedi licença para assistir durante mais um tempo o ensaio da mulher, ele prontamente me ofereceu uma cadeira de rodinhas para ficar mais bem acomodado, delicadamente recusei preferindo ver de pé. Não tive tempo até hoje de assistir Virgens Suicidas, filme da Sophia Copolla, embora o nome me atraia muito, tentarei conseguir qualquer dia destes, pirateei junto com o F For Fake do Orson Welles e o coloquei na estante. Nem sei se é mentira ou verdade o que digo aqui, sei que a vida não é fácil, só sabemos dessa que temos, então vamos lá. Essa vivência é a minha, portanto não posso falar o que farei amanhã, já que ainda não sei.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

MEMÓRIA


O Enterro do Sinhô
Manuel Bandeira

J. B. SILVA, o popular Sinhô dos mais deliciosos sambistas cariocas, era um desses homens que ainda morrendo da morte mais natural deste mundo dão a todos a impressão de que morreram de acidente. Zeca Patrocínio, que o adorava e com quem ele tinha grandes afinidades de temperamento, era assim também: descarnado, lívido, frangalho de gente, mas sempre fagueiro, vivaz, agilíssimo, dir-se-ia um moribundo galvanizado provisoriamente para uma farra. Que doença era a sua? Parecia um tísico nas últimas. Diziam que tinha muita sífilis. Certamente o rim estava em pantanas. Fígado escangalhado. Ouvia-se de vez em quando que o Zeca estava morrendo. Ora em Paris, ora em Todos os Santos, subúrbio da Central. E de repente, na Avenida, a gente encontrava o Zeca às três da madrugada, de smoking, no auge da excitação e da verve. Assim me aconteceu uma vez, e o que o punha tão excitado naquela ocasião era precisamente a última marcha carnavalesca de Sinhô, o famoso Claudionor...

que pra sustentar família
foi bancar o estivador...
Me apresentaram a Sinhô na câmara-ardente do Zeca. Foi na pobre nave da igreja dos pretos do Rosário. Sinhô tinha passado o dia ali, era mais de meia-noite, ia passar a noite ali e não parava de evocar a figura do amigo extinto, contava aventuras comuns, espinafrava tudo quanto era músico e poeta, estava danado naquela época com o Vila e o Catulo, poeta era ele, músico era ele. Que língua desgraçada! Que vaidade! mas a gente não podia deixar de gostar dele desde logo, pelo menos os que são sensíveis ao sabor da qualidade carioca. O que há de mais povo e de mais carioca tinha em Sinhô a sua personificação mais típica, mais genuína e mais profunda. De quando em quando, no meio de uma porção de toadas que todas eram camaradas e frescas como as manhãs dos nossos suburbiozinhos humildes, vinha de Sinhô um samba definitivo, um Claudionor, um Jura, com um "beijo puro na catedral do amor", enfim uma dessas coisas incríveis que pareciam descer dos morros lendários da cidade, Favela, Salgueiro, Mangueira, São Carlos, fina-flor extrema da malandragem carioca mais inteligente e mais heróica... Sinhô!

Ele era o traço mais expressivo ligando os poetas, os artistas, a sociedade fina e culta às camadas profundas da ralé urbana. Daí a fascinação que despertava em toda a gente quando levado a um salão.

Vi-o pela última vez em casa de Álvaro Moreyra. Sinhô cantou, se acompanhando, o "Não posso mais, meu bem, não posso mais", que havia composto na madrugada daquele dia, de volta de uma farra. Estava quase inteiramente afônico. Tossia muito e corrigia a tosse bebendo boas lambadas de Madeira R. Repetiu-se a toada um sem número de vezes. Todos nós secundávamos em coro. Terán, que estava presente, ficou encantado.

Não faz uma semana eu estava em casa de um amigo onde se esperava a chegada de Sinhô para cantar ao violão. Sinhô não veio. Devia estar na rua ou no fundo de alguma casa de música, cantando ou contando vantagem, ou então em algum botequim. Em casa é que não estaria; em casa, de cama, é que não estaria. Sinhô tinha que morrer como morreu, para que a sua morte fosse o que foi: um episódio de rua, como um desastre de automóvel. Vinha numa barca da Ilha do Governador para a cidade, teve uma hemoptise fulminante e acabou.

Seu corpo foi levado para o necrotério do Hospital Hahnemanniano, ali no coração do Estácio, perto do Mangue, à vista dos morros lendários... A capelinha branca era muito exígua para conter todos quantos queriam bem ao Sinhô, tudo gente simples, malandros, soldados, marinheiros, donas de rendez-vous baratos, meretrizes, chauffeurs, macumbeiros (lá estava o velho Oxunã da Praça Onze, um preto de dois metros de altura com uma belida num olho), todos os sambistas de fama, os pretinhos dos choros dos botequins das ruas Júlio do Carmo e Benedito Hipólito, mulheres dos morros, baianas de tabuleiro, vendedores de modinhas... Essa gente não se veste toda de preto. O gosto pela cor persiste deliciosamente mesmo na hora do enterro. Há prostitutazinhas em tecido opala vermelho. Aquele preto, famanaz do pinho, traja uma fatiota clara absolutamente incrível. As flores estão num botequim em frente, prolongamento da câmara-ardente. Bebe-se desbragadamente. Um vaivém incessante da capela para o botequim. Os amigos repetem piadas do morto, assobiam ou cantarolam os sambas (Tu te lembra daquele choro?). No cinema d'a Rua Frei Caneca um bruto cartaz anunciava "A Última Canção" de Al Johnson. Um dos presentes comenta a coincidência. O Chico da Baiana vai trocar de automóvel e volta com um landaulet que parece de casamento e onde toma assento a família de Sinhô. Pérola Negra, bailarina da companhia preta, assume atitudes de estrela. Não tem ali ninguém para quebrar aquele quadro de costumes cariocas, seguramente o mais genuíno que já se viu na vida da cidade: a dor simples, natural, ingênua de um povo cantador e macumbeiro em torno do corpo do companheiro que durante tantos anos foi por excelência intérprete de sua alma estóica, sensual, carnavalesca.



Na crônica acima, extraída do livro
“Os Reis Vagabundos e mais 50 crônicas”, Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1966, pág. 11, ele narra sua convivência em vida com o famoso compositor da música popular brasileira, Sinhô, que muitos dizem ser o autor do primeiro samba, e a cena de seu velório, o que a faz uma peça descritiva de alto valor.

domingo, 17 de maio de 2015

UM CONTO DE REIS


BOM DIA SESTROSA
Fábio Carvalho (cineasta)

 Mimosa rosti e Bonita com feijão no mar aberto. Através da janela observei no fundo seu hálito de Tilápia, amor oblativo, ajudou a desanuviar minha vista cansada obnubilada pela realidade tosca. O computador engoliu o texto. Sem te ver, te sonho sentindo. Observei também o diálogo mais que improvável de meus amigos, ao redor do balcão a caminho do mictório do bar temático do velho sírio, eram eles: o dinossauro do rock inglês, o polonês filho de judia e o negão grego da ilha de Mikonos. Não posso repetir este colóquio, por falta de condições instrumentais, bem posso dizer, sua audição equacionou o problema matemático do roteiro que ainda teimo em escrever.  Frequência cardíaca alterada. O estrabismo da bela violoncelista lendo a partitura na estante do meu ponto de visão em contre-plongée deixou-me siderado. A acústica da nova sala de concertos era perfeita. A salada do almoço é igual à fruta do café da manhã, se não for comida primeiro, ela sobra.  Agora vou mudar minha conduta, vou pra luta, porque eu quero me aprumar. A vida não é algo que se têm, não se têm a vida pela frente, nem para trás, a vida passa. Não temos a vida é ela quem passa por nós. Simone de Beauvoir. A vida rola como avelã, Flor olha pra mim, dadivosa, há anos luz não roía as unhas, mais uma vez se fez necessário este ato de uma violência pouco usual, era ela novamente me perturbando. Imovision. Quando pela primeira vez mirei seus olhos em close-up, atravessei um campo magnético com som de virtuoso violoncelo, depois do portal da lua tonta, uma voz encantava a todos, sinuosa almoçando-me na hora do jantar. O tempo precisou passar. Não sou eu quem me navega quem me navega é o mar. Apoplexia, disse o Peter Lorre: não jogue as coisas no chão, please! Nem me mate atrás da porta. Eva hesitante, Adão flutuante, achei um talismã pra dormir com a colaboração do paralelepípedo de recepção indescritível. Um grande enigma. E se os ontens fossem devorar nossos belos amanhãs? Algo mais que o total. Revi na noite passada, na telinha Fany e Alexander, depois de um hiato de mais de trinta anos entre a primeira visão no extinto Cine Pathé. Novamente não gostei, sei que gostar ou não gostar não interessa, digo que morri mais uma vez durante essa revisão. Hoje renasci mais cedo: as cinco e trinta da manhã, como tenho que afixar quadros na parede, resolvi utilizar-me da furadeira Black&Deker e de uns parafusos de aço, que comprei há tempos na loja do ator chamada “A Porca e o Parafuso”, exatamente para este fim. Troquei de canal sobre a verdade e a mentira. O inexplicável entorpece o homem pelo caminho tortuoso do conhecimento inatingível. A lamparina acesa na mesinha de cabeceira caiu sobre a cama. Podemos nos divertir sem remorsos, tudo é possível e provável, o tempo e o espaço não existem. Só no cinema. Finjo que estou muito preocupado, mas na verdade não estou nem um pouco preocupado, somente bastante concentrado para entrar em campo daqui a pouco e entortar aquele becão que tenta me acertar a todo custo, de boa. Na pequena claridade incidente do lado escuro da lua, a cena era ela parada no meio do trafego com todo tipo de automotivos esperando a bela nefelibata levantar um voo mais alto e dar a passagem para suas rodas de borracha interruptoras. Acordei de um sobressalto, quando transformadores explodiam em meio ao temporal de raios e trovões, num impulso liguei para ela, que não atendeu, não insisti, não sabia ao certo nem pra quê ligava, nem o que dizer. Há um tempão ronda por aqui um trovão, por aqui um trovão ronda há um tempão, ronda por aqui há um tempão um trovão. Podemos ser eletrocutados. O que move o azul do céu é a vagabundagem. Io sono nati cosi. Cinema é o caráter da pessoa, a persona. Fora isso é preciso o exercício da vontade. Não lembro mais onde li, imagino ter sido no livro que a Roberta organizou com textos do Rogério. Sonhei tua boca sem batom tomando sorvete com chantily na tarde quente de outono, enquanto atravessávamos a ponte em direção ao quadro sinóptico. Não sabíamos se aquele desenho nos bastava para aquele momento e para os outros que viriam na sequência, as noites ainda seriam mais precisas em indefinições das necessidades por descobrir e conquistar. O encontro só não basta, é necessária a premeditação. Mesmo sem dormir, tenho sonhado muito. São Paulo! O que digo é fruto do pensamento, mas o pensamento também erra. Depois que teus pés rosa-chiclets esfregaram-se no meu peito, a luminosidade ambiente ficou mais ambígua, mais expressiva, mais poesia. Lá onde as palavras se refrescavam no jardim orvalhado por gotas transparentes brilhantes antes do amanhecer sortido. O Big mordia a bateria, o Pierre Verger dizia que certamente tinha aprendido o que não queria e com isso sua existência adquiriu uma certa forma. Durante a manhã cor prata, caminhando pelas ruas da cidade sem rumo definido, ao meu redor o ar era o perfume cálido de teu corpo, sensação de um calor úmido e macio, levando-me de volta ao paraíso encantado, de onde não devia ter saído junto com a humanidade. Beijo tua nuca cheirosa. Teus movimentos eram sutis e elegantes. O santo sou eu e as sereias sem dúvida alguma existem. Para guardar o mistério de nossa profissão, deixamos os copiões e os contatos, trancados em uma gaveta, que só abriremos como uma coisa íntima, revelada ao psiquiatra ou a seletos alunos para desmembrar o processo de edição dessa atividade sagrada, ensinava aos quatro cantos o velho fotógrafo. Carrossel de emoções. Enquanto te espero, sei que o relógio bate um minuto a menos, sei também, que este tempo ocidental não existe, é ilusório, no natural estamos rindo juntos internamente. A verdade inconfessável é que ela existe única em sua origem telúrica concebida no turvo pensamento da densidade do drama. Na concepção idealística das ninfas brincantes. Bonita para ela era pouco diante de tamanho esplendor, sob todos os ângulos possíveis de analise. Sua angulação fez temporariamente esquecer meu teatro, embora sua trilha sonora eu não tenha esquecido. Entre nós ressoa. Vejo a manhã, sonhando acordado na esquina do desejo, te penetro, teu brilho reflete a luz por dentro, bem dentro de teus olhos castanhos com textura jabuticaba. Alguém disse que o baiano se tiver uma morte súbita, demora no mínimo vinte dias para cair em si. Ando meio abaianado. Por hora te esqueci, lembrando. Depois de um esforçado périplo pelas escadarias e corredores do pronto atendimento, consegui entrar por último num elevador enorme lotado de médicas e enfermeiras de branco conversando animadamente, parecendo uma festa no compartimento lascivo do céu. Durante o trajeto, quando encontrei uma breve pausa entre elas, não resisti e mandei a seguinte brincadeirinha: que beleza, finalmente a salvo! A de olhos mais doces, que como todas estava de frente para mim, perguntou num tom definitivo: salvo ou lascado? Todas se riram discretamente e eu também, recolhendo-me a uma atuação reflexiva, até as portas se abrirem. Na vida não existe a intenção, não existe a outra vez, este é o drama o irretocável. Sejam revolucionários! Conclama o Papa Francisco no sinal a cabo global. Treze e treze marca o mostrador do celular. Na esquina das três portas, a personagem Deus na forma e voz do Doutor Kacowicz, informa aos outros fiéis da tripulação que está processando uma erva embora ela não tenha cometido delito algum. Finalmente consegui assistir os filmes do Aloísio Raolino, a visão destes três filmes, me levou a ver o cinema de novo na forma ação. O pensamento, o fotógrafo, a câmera e ela a imagem, já que a câmera filma o pensamento. Ninguém se conhece, nem assim a distingue. Ao pôr do sol dessa Sexta-Feira, encontro o Zinho comendo um quarto de uma melancia bem vermelha na travessia da Rua dos Guajajaras com a Avenida Augusto da Lima, em frente ao Mercado Central. Como estas ruas são paralelas, a esquina entre elas não existe. Vou continuar escrevendo este testículo, já que mais ou menos passou da sua horinha. Continuo com o mesmo sem vontade que rasguei o ventre de minha mãe, off do Dom José Maria Lara citando o poeta José Régio, no filme Esperança Cega que fiz na pré-história da cerimônia de purificação. Hoje o Unicórnio entrou pela janela e vomitou arco-íris no tapete. O que faço custa um bilhão de centavos por unidade, exige milhares de metros de celuloide e mobiliza, à volta de um ato de expressão individual, os meios necessários a uma indústria: este é o problema do cinema, apontou o mestre Roberto Rossellini, no tesouro resgatado do fundo do mar de caixas. Observem o que se passou do lado sombrio: quero dizer a nossa parte instintiva, ávida, animal; esta noite assustadora que temos em nós e que nos leva a querer dominar, pois a condição humana é feita da impossibilidade do homem de viver passivamente seu estado natural. Em se plantando tudo dá, foi a resposta original que dei para a loura falsa que muito me aborrecia com questões jurídicas e burrocráticas, exatamente questões que para delas continuar escapando, construí um bunker nas alturas onde me abrigo até finalizar o horário comercial. Foi só agir pelo coração, aqui estou duro de novo, disse Gilberto de Abreu. Aterrei no planalto central e de frente para o céu de Juscelino, Athos Bulcão, Niemayer e Lúcio Costa, no décimo terceiro andar do flat St. Moritz da Asa Norte, caí de cama. Segundo a santa rebelde La Bauer uma limpeza interna se fazia necessária. Renasci na graciosa colonial Pirenópolis somente dois dias depois. Noite alta, caminhava pelas ruas de paralelepípedos verticais em traveling com as fachadas das casinhas baixinhas da velha cidade de garimpo, quando do nada surgiu uma cavaleira de longos cabelos encaracolados amarrados como um rabo, montada num alazão garboso acinzentado indo em direção ao coreto da praça. Iluminada pela luz tremula da cor alaranjada dos lampiões históricos preservados pelos homens de boa vontade, ela dominava seu animal com altivez, depois que passou por mim notei que seus cabelos pra trás por debaixo do chapéu balançavam para os lados concatenados aos movimentos do rabo branco do belo cavalo. Pela entrada de frente a fonte de luz no parapeito central do jardim das orquídeas em pendão, descobri escondido algo que já tinha descoberto e esquecido na escadaria do portal das delícias. Ainda bem, rascunho sem picote. Consegui com muito esforço chegar até a queda d’agua fortíssima da cachoeira Usina Velha, aquelas flechadas líquidas nas costas, dava a impressão de adolescência física e mental, um tipo de estase do meu caminho passado se reanimou por entre pedras lisas cobertas de musgo e lodo. A nitidez tomou conta da visão, um cheiro esverdeado umidificado transformou a respiração em música naturalista, ritmada na perfeição da tonalidade feminina andante. De súbito despencou um temporal, enquanto eu balançava na ponte de cordas e ripas. A jovem bailarina Flor tomou a direção de seu carrinho com perícia garbosa e improvável, vencendo a estradinha de terra, agora uma corredeira de aguas barrentas e ameaçadoras, sem se alterar, falando sobre Fadas e Gnomos. Impoluta, entre reduções e acelerações passou lépida por aquele rio caudaloso. Ao passo que eu do banco de trás, sofria e imaginava um fim trágico para nossa travessia inconclusa. Graças sua habilidosa expressão corporal, almoçamos uma moqueca com tempero delicado. Após a noite chegar, uma procissão de lampiões levou-me a porta lateral da Igreja do Rosário, com ruínas aparentes da queimada que lá aconteceu, as cigarras cantavam em uníssono initerruptamente. Geisa Maria arte incomum estava fechada naquele fim de Domingo lindo leve e solto. Um cálice de Beija-Flor no Encontro Marcado da passarela mais bem frequentada, de novo pelo Rio das Almas, para o lado lúgubre e pior da localidade onde no passado correu muito sangue. Saí pela Rua do Fuzil direto no Bar dos Turistas em frente ao Kunsk Dance com lampião apagado. A ponte ficou demasiado estreita.  Um tipo boliviano de boné vermelho, queimando um fumo do puro goiano, aproxenetou-se numa cadeira da minha mesa, sem pedir licença nem oferecer-me um tapa. Não é fácil a vida em sociedade. Terminei minhas ocupações e caminhei no rumo de onde tinha vindo. Rascunho com picote e grampo. Ela disse com propriedade para todos os ouvintes que vive num paraíso particular, e isto é verdade. Inventa seu mundo ao seu gosto, vai por aí saltitante, que está só começando com uma taça de espumante rosa. Pupilas que dormem embaixo de pálpebras, assim continuou com voz sussurrante a borboleta poetiza.  Tudo é cinema. Nosso Senhor Luis Buñuel no seu último suspiro, conta: se me dissessem que morreria em dois anos; e me perguntassem o que quero das vinte quatro horas de cada um dos dias que ainda iria viver, responderia: dê-me duas horas de vida ativa e vinte duas horas de sonhos, contanto que possa lembrar-me destes, porque os sonhos só existem através da memória que os alimenta.

terça-feira, 12 de maio de 2015

POESIA


Elixir do Pajé

Os versos de Bernardo Guimarães (1825-1884) circulavam clandestinamente, em forma manuscrita, sendo “erótico-cômicos”, até que saíram impressos em Ouro Preto, Minas Gerais, a 7 de maio de 1875:

Que tens, caralho, que pesar te oprime
que assim te vejo murcho e cabisbaixo
sumido entre essa basta pentelheira,
mole, caindo pela perna abaixo?
Nessa postura merencória e triste
para trás tanto vergas o focinho,
que eu cuido vais beijar, lá no traseiro,
teu sórdido vizinho!
Que é feito desses tempos gloriosos
em que erguias as guelras inflamadas,
na barriga me dando de contínuo
tremendas cabeçadas?
Qual hidra furiosa, o colo alçando,
co'a sanguinosa crista açoita os mares,
e sustos derramando
por terras e por mares,
aqui e além atira mortais botes,
dando co'a cauda horríveis piparotes,
assim tu, ó caralho,
erguendo o teu vermelho cabeçalho,
faminto e arquejante,
dando em vão rabanadas pelo espaço,
pedias um cabaço!
Um cabaço! Que era este o único esforço,
única empresa digna de teus brios;
porque surradas conas e punhetas
são ilusões, são petas,
só dignas de caralhos doentios.
Quem extinguiu-te assim o entusiasmo?
Quem sepultou-te nesse vil marasmo?
Acaso pra teu tormento,
indefluxou-te algum esquentamento?
Ou em pívias estéreis te cansaste,
ficando reduzido a inútil traste?
Porventura do tempo a dextra irada
quebrou-te as forças, envergou-te o colo,
e assim deixou-te pálido e pendente,
olhando para o solo,
bem como inútil lâmpada apagada
entre duas colunas pendurada?
Caralho sem tensão é fruta chocha,
sem gosto nem cherume,
lingüiça com bolor, banana podre,
é lampião sem lume
teta que não dá leite,
balão sem gás, candeia sem azeite.
Porém não é tempo ainda
de esmorecer,
pois que teu mal ainda pode
alívio ter.
Sus, ó caralho meu, não desanimes,
que ainda novos combates e vitórias
e mil brilhantes glórias
a ti reserva o fornicante Marte,
que tudo vencer pode co'engenho e arte.
Eis um santo elixir miraculoso
que vem de longes terras,
transpondo montes, serras,
e a mim chegou por modo misterioso.
Um pajé sem tesão, um nigromante
das matas de Goiás,
sentindo-se incapaz
de bem cumprir a lei do matrimônio,
foi ter com o demônio,
a lhe pedir conselho
para dar-lhe vigor ao aparelho,
que já de encarquilhado,
de velho e de cansado,
quase se lhe sumia entre o pentelho.
À meia-noite, à luz da lua nova,
co'os manitós falando em uma cova,
compôs esta triaga
de plantas cabalísticas colhidas,
por sua próprias mãos às escondidas.
Esse velho pajé de pica mole,
com uma gota desse feitiço,
sentiu de novo renascer os brios
de seu velho chouriço!
E ao som das inúbias,
ao som do boré,
na taba ou na brenha,
deitado ou de pé,
no macho ou na fêmea
de noite ou de dia,
fodendo se via
o velho pajé!
Se acaso ecoando
na mata sombria,
medonho se ouvia
o som do boré
dizendo: "Guerreiros,
ó vinde ligeiros,
que à guerra vos chama
feroz aimoré",
- assim respondia
o velho pajé,
brandindo o caralho,
batendo co'o pé:
- Mas neste trabalho,
dizei, minha gente,
quem é mais valente,
mais forte quem é?
Quem vibra o marzapo
com mais valentia?
Quem conas enfia
com tanta destreza?
Quem fura cabaços
com mais gentileza?"
E ao som das inúbias,
ao som do boré,
na taba ou na brenha,
deitado ou de pé,
no macho ou na fêmea,
fodia o pajé.
Se a inúbia soando
por vales e outeiros,
à deusa sagrada
chamava os guerreiros,
de noite ou de dia,
ninguém jamais via
o velho pajé,
que sempre fodia
na taba na brenha,
no macho ou na fêmea,
deitando ou de pé,
e o duro marzapo,
que sempre fodia,
qual rijo tacape
a nada cedia!
Vassoura terrível
dos cus indianos,
por anos e anos,
fodendo passou,
levando de rojo
donzelas e putas,
no seio das grutas
fodendo acabou!
E com sua morte
milhares de gretas
fazendo punhetas
saudosas deixou...
Feliz caralho meu, exulta, exulta!
Tu que aos conos fizeste guerra viva,
e nas guerras de amor criaste calos,
eleva a fronte altiva;
em triunfo sacode hoje os badalos;
alimpa esse bolor, lava essa cara,
que a Deusa dos amores,
já pródiga em favores
hoje novos triunfos te prepara,
graças ao santo elixir
que herdei do pajé bandalho,
vai hoje ficar em pé
o meu cansado caralho!
Vinde, ó putas e donzelas,
vinde abrir as vossas pernas
ao meu tremendo marzapo,
que a todas, feias ou belas,
com caralhadas eternas
porei as cricas em trapo...
Graças ao santo elixir
que herdei do pajé bandalho,
vai hoje ficar em pé
o meu cansado caralho!
Sus, caralho! Este elixir
ao combate hoje tem chama
e de novo ardor te inflama
para as campanhas do amor!
Não mais ficará à-toa,
nesta indolência tamanha,
criando teias de aranha,
cobrindo-te de bolor...
Este elixir milagroso,
o maior mimo na terra,
em uma só gota encerra
quinze dias de tesão...
Do macróbio centenário
ao esquecido mazarpo,
que já mole como um trapo,
nas pernas balança em vão,
dá tal força e valentia
que só com uma estocada
põe a porta escancarada
do mais rebelde cabaço,
e pode em cento de fêmeas
foder de fio a pavio,
sem nunca sentir cansaço...
Eu te adoro, água divina,
santo elixir da tesão,
eu te dou meu coração,
eu te entrego a minha porra!
Faze que ela, sempre tesa,
e em tesão sempre crescendo,
sem cessar viva fodendo,
até que fodendo morra!
Sim, faze que este caralho,
por tua santa influência,
a todos vença em potência,
e, com gloriosos abonos,
seja logo proclamado,
vencedor de cem mil conos...
E seja em todas as rodas,
d'hoje em diante respeitado
como herói de cem mil fodas,
por seus heróicos trabalhos,
eleito rei dos caralhos!


sábado, 9 de maio de 2015

HISTÓRIA

BANDEIRA-SOVIETICA
RUSSOS CELEBRAM VITÓRIA SOVIÉTICA SOBRE NAZISMO 
Breno Altman (*)
Dia 8 de maio, 1945.
O relógio apontava quase meia-noite na Escola de Engenharia Militar da Wehrmacht, em Karlshorst, na periferia de Berlim, onde estava instalado o quartel-general das forças soviéticas.
Começava a cerimônia de rendição formal das tropas alemãs, findando uma guerra de agressão que durara quase seis anos.
Os derrotados estavam representados pelo marechal Wilhelm Keitel (Exército), o general Hans-Juergen Strumpff (Aeronáutica) e o almirante Hans-Georg von Friedeburg (Marinha).
O ato de capitulação incondicional era presidido pelo marechal Georgi Konstantinovich Zhukov, principal liderança militar da União Soviética.
O marechal britânico Arthur William Tedder, representando o comando do Corpo Expedicionário Aliado na Europa, subscrevia o documento de rendição junto com o comandante do Exército Vermelho.
O general norte-americano Carl Spaatz e seu colega francês, Jean de Lattre de Tassigny, assinavam como testemunhas.
Às 00h45 do dia 9 de maio entrava para a história o documento que determinava a vitória das forças antinazistas.
Outros momentos de rendição anteciparam a solenidade em Berlim, mas este seria consagrado como a página final do conflito mais épico e doloroso da história.
Acima de tudo, porque era o reconhecimento simbólico, com os nazistas de joelhos, que o mundo devia ao heroísmo soviético a colaboração principal para a derrota de uma ditadura forjada no terror contra os trabalhadores e a democracia.
Mais de 74% das baixas totais da Wehrmacht (10 milhões, sobre 13,4 milhões de soldados abatidos) foram provocadas pelas armas soviéticas.
O Exercito Vermelho eliminou 607 divisões inimigas entre 1941 e 1945, contra 176 dizimadas por britânicos e norte-americanos juntos.
O número de combatentes mortos e feridos na frente oriental foi seis vezes maior que na ocidental e no Mediterrâneo somados.
No calor dos dias finais de combate, quando a verdade se impunha a sangue e fogo, os chefes das nações capitalistas aceitaram naturalmente a proeminência da União Soviética na luta contra o inimigo comum.
“O exército russo está matando mais soldados do Eixo e destruindo mais material nazista do que todas as outras 25 nações juntas”, disse o presidente do EUA, Franklin Roosevelt, a certa altura do conflito.
O anticomunismo e a Guerra Fria, porém, levariam à disputa incessante para reescrever o que havia se passado nos campos de batalha.
Discursos, filmes, livros, peças e toda sorte de documentos passaram a ser produzidos para esmaecer o papel do Exército Vermelho e criminalizar o desempenho do líder da primeira pátria socialista, Joseph Stálin.
Até mesmo setores de esquerda claudicaram diante de versões destinadas a recontar o enredo da Segunda Guerra Mundial, pressionados pela ofensiva ideológica da burguesia mundial ou movidos por legítimas críticas à experiência soviética sob o tacão de ferro do velho militante bolchevique.
O sucessor de Lênin foi acusado por muitos erros e crimes no dramático período de governo revolucionário que lhe tocou conduzir, durante o qual, como registrado pelo historiador trotsquista Isaac Deutscher, o país saiu da era do arado e se converteu em uma potência atômica.
Mas a verdade é que os homens e mulheres livres devem a derrocada do nazismo ao Exército Vermelho e a União Soviética, à abnegação de seus combatentes e cidadãos, ao comando de Stálin e seus militares.
A partir da lendária Batalha de Stalingrado, a mais gloriosa de todas as gestas militares, na qual os nazistas beijam a lona pela primeira vez, concluída em 1943, alterou-se a sorte do enfrentamento, transformado em grande guerra patriótica, como até hoje é tratada em solo russo, pela comunhão armada de soldados regulares, guerrilheiros comunistas e resistência popular.
Dois anos depois, Berlim caia nas mãos das guerreiros de Zhukov, consolidando o triunfo dos aliados em todas as demais frentes.
A bandeira com a foice e o martelo, alçada sobre as ruínas do Reichstag, foi a arma que feriu de morte a besta hitlerista, empunhada pelos 20 milhões de mortos que a União Soviética doou à libertação dos povos.
Quando as tropas russas voltarem a marchar sobre Moscou, no dia 9 de maio, diante de Vladimir Putin e convidados, estes fatos serão lembrados e o mundo terá mais uma chance de bater continência à honestidade histórica.
O presidente russo fará questão de mostrar, mesmo em circunstâncias históricas diferentes, ainda marcadas pelo colapso do socialismo, mas resgatando o feito monumental da vitória contra o nazismo, que não se brinca com a soberania e a independência de sua nação.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

BRASIL


TAUMATURGOS
Vejo quase nada de televisão. Não consigo. É insuportável. Vejo a rede pública de tevê educativa, às vezes. Mas, mesmo assim, muito pouco. Agora eu não sei por que o Governo não cria a Rede Nacional de Tevês Educativas para exibição periódica de programas especiais de cultura. É lógico que precisamos apresentar para todo o Brasil o melhor da nossa arte esquecida, do nosso teatro; da nossa dança; da nossa música; da nossa literatura; do nosso cinema. É programação pra mais de ano. Seria um sucesso! Os filmes de curtas, médias e longas, por exemplo, produzidos com dinheiro público, que não tiveram o mercado exibidor e que estão guardados e esquecidos nas prateleiras, seriam exibidos diariamente, em horário nobre e em rede nacional. Cineastas, produtores, atores e técnicos destes filmes seriam convidados para um debate sobre a arte brasileira e o seu tempo. UTOPIA.

O que eu sei é que, ao contrário da lógica, por todas as regiões do país, cidades como Juiz de Fora e Cabo Frio, onde se tinha um canal aberto para a TV Cultura, presenteados pelo governo a empresários e políticos inescrupulosos, que nunca produziram nada, pois nunca tiveram coragem de regionalizar a produção e só repetiam  os sinais das Tevês do Rio.. Eles arrumaram agora uma maneira de faturar alto, vendendo suas grades, leiloando os seus horários nobres, desvirtuando sua programação cultural, trocando o já quase nada por programas horrendos produzidos por entidades desconhecidas e por empresários que faturam com a venda direta e tudo isso no ar pelos canais de tevês abertas: comunidades religiosas de exorcismos fazem a parceria da alienação com as igrejas dos mil nomes, muitas das quais eu nunca tinha ouvido falar, criando uma verdadeira babel de consumo de fé em informações truncadas e distorcidas. Uma loucura irresponsável que precisa ser revista. De quem são essas concessões? Que canais são esses que proliferam no etéreo nacional? Os nossos cidadãos tele-espectadores estarão para sempre privados das boas programações de arte e cultura que ali existiam? As informações privilegiadas repassadas por nossos artistas nestes canais de televisão, mais que refletem, são fontes de luz da alma brasileira. Ora, sem essas informações, tornamo-nos assim, por consequência, presas fáceis do massacre estrangeiro a nossa identidade cultural. E tudo isso pelo descaso do governo na compreensão da importância da rede nacional de cultura. Vamos criar um movimento para que os artistas tomem posse desses canais abertos de televisão permitindo a arte praticar o exercício da cultura no contexto midiático nacional. O que eu também sei é que se nada for feito agora, o que irá acontecer então com a tevê digital? Com o cinema digital? Com a Internet? Com o futuro (que não se brinca) - pode acontecer algum milagre? Uma revolução?