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terça-feira, 21 de dezembro de 2010


AVISO AOS MEUS DISTINTOS LEITORES QUE COM ESSA PUBLICAÇÃO ENTRAREI DE FÉRIAS SEM TEMPO DETERMINADO PARA RETORNAR DEPOIS DE DOIS ANOS INITERRUPTOS DE PUBLICAÇÕES NESTE BLOG.

NA CERTA NÃO CONSIGUIREI FICAR FORA DO AR POR MUITO TEMPO.

ASSIM QUERO DESEJAR BOAS FESTAS PARA TODOS E UM ANO NOVO REPLETO DE NOVIDADES CULTURAIS.


AH! QUE SAUDADE...
Meu amigo Rogério Sganzerla ao telefone…
http://www.youtube.com/watch?v=It_-KbTaT_I

Loucura Pouca é Bobagem

parte 02

parte 03

sábado, 18 de dezembro de 2010

NOTÌCIAS

Notícia de Niterói

Aniversário de Sérgio Santeiro

CONVITE

Aos amigos convido para o meu cervejal 66 segunda 20 a partir de 19 hs no meu "Relena's", o 1o. Bar da Cantareira em Niterói, RJ.
sergio santeiro.


Notícia de São Paulo

PELOS DIREITOS HUMANOS DE ELAINE CESAR, SEU FILHO E O TEATRO OFICINA14/12/2010
AS DIONIZÍACAS DE 17 a 20 no TEATRO DE ESTÁDIO do ex-ESTACIONAMENTO do BAÚ da FELICIDADE serão dedicadas à luta pelos DIREITOS HUMANOS DE ELAINE CESAR E À LIBERDADE ARTÍSTICA VIOLADA PELA VARA DE FAMÍLIA DE SÃO PAULO
São 06:16. Acordei, apesar de estar exausto por excesso de trabalho pelos trabalhos de realizar meu maior desejo em 30 anos, de apresentar a partir de 6ª feira as DIONIZÍACAS no Teatro de Estádio que levantamos no Ex-Estacionamento do Baú da Felicidade mas não consigo dormir porque não estou mais suportando a ENORME INJUSTIÇA que a SOCIEDADE BRASILEIRA está cometendo com ELAINE CESAR, que neste momento está na UTI, correndo risco de vida.
Este caso não é diferente do de Sakineh no Irã, do de Lu Xiaobo na China e de Assange na Inglaterra. Vim pro computador porque até agora não conseguí fazer chegar nossas vozes de defesa aos DIREITOS HUMANOS desta Mãe Artista, Diretora de Video do Teatro Oficina Uzyna Uzona, que na semana passada, perdeu em duas jogadas:
1º, a guarda de seu filho THEO, de 3 anos de idade.
2º, seus instrumentos de trabalho confiscados, seus HD’s, que também são do Oficina, com todo material gravado de pelo menos 30 anos de Oficina Uzyna Uzona, e de outros trabalhos seus, e de artistas como Tadeu Jungle.
É um atentado à liberdade de produção artística, um sequestro só comparável à invasão do CCC em 1968 a “Roda Viva”.
E agora esta mulher está incapacitada de estar à frente do trabalho que adora, de comandar a direção de Video e das filmagens das Dionizíacas esta semana, e tem de ver a sociedade, a Mídia sempre tão escandalosa, impassível com este fato.
Porque tudo isso ?
Porque um ex-marido ciumento, totalmente perturbado, teve acolhidos por autoridades da Vara da Família, para esta praticar uma ação absolutamente anti-democrática, para não dizer nazista, todos seus pedidos mais absurdos de ex-marido ególatra, doente, de arrancar o filho do convívio da Mãe, acusando Elaine de trabalhar num “Teatro Pornográfico” e para lá levar o filho: o Teatro Oficina. Fez oficiais de justiça sequestrarem os HD’s deste Teatro, com um texto de uma obscenidade rara, para procurar cenas de pedofilia e práticas obscenas que Elaine e seu atual marido, o ator Fred Stefen, do Teatro Oficina, teriam cometido com o filho de Elaine, o menino Theo.
Quase todas as 90 pessoas que trabalham na Associação Oficina Uzyna Uzona têm se manifestado por escrito, pois tiveram contato permanente com Theo, Elaine e Fred dentro do teatro e fora dele e não se conformam com a falta de eco de seus protestos.Porque tudo isso ?
A revolução cultural da liberdade que uma grande parte dos seres humanos vem conquistando determina uma reação absolutamente inquisitorial, fascista, como é o caso dos homofóbicos da Av. Paulista e no caso, não do Estado Brasileiro, mas da própria Sociedade Reacionária incorformada, querendo novamente impor censura à Arte, aos costumes, e pior à vida dos que escolheram viver livremente o Amor.
E é incrível aqui, a liberdade de imprensa tão fervorosa em escândalos moralistas, se cala totalmente diante de um atentado a dois seres humanos, Elaine, a Mãe, e Theo seu filho, e a um teatro de 52 anos como o Oficina, e não toca no assunto, como se fosse o Partido Comunista Chinês, os Republicanos dos EEUU e os fundamentalistas islâmicos do Irã.
Tenho feito inúmeras reportagens sobre as DIONIZÍACAS, e falado no assunto, mas a divisão ainda tayloriana de trabalho impede que os jornalistas levem a sério o que estou dizendo, por não estar no limite das matérias que estão fazendo comigo.
Enquanto isso uma mulher, ELAINE CESAR, praticamente corre risco de vida na UTI e o Teatro Oficina censurado estreia as DIONIZÍACAS tendo por exemplo de fazer sua propaganda para a TV com material ainda filmadas no edifício do Teatro Oficina, pois as imagens do Teatro de Estádio erguido pelo Brasil em 2010 estão sequestradas pela Vara da Família.O moralismo desta instiuição, que parece odiar os Artistas como criminosos, dá proteção a um macho ciumento, invejoso, doente, mordido de ciúmes, que está tendo delírios sexuais, projetando em ações discricionárias como as que tem praticado, e pior com apoio da injustiça.
Fazendo um ensaio corrido de BACANTES, que conta a história de Dionisios e da luta de seu adversário moralista, que quer impedir o culto do Teatro em sua cidade, percebi o óbvio. Tudo que Penteu acusa nas BACANTES e em DIONISIOS é projeção de coisas que seu ciúme provocou em sua cabeça.
Elaine, muito tempo depois que se separou deste ex-marido, teve o privilégio de encontrar um novo amor no ator Fred, que é homem muito bonito e muito livre. O macho, ex-Hare Krishna, ciumento, invejoso, então endoidou e começou a imaginar em sua cabeça cenas de pedofilia, sexo de Elaine e de seu novo maravilhoso amor com seu filho, repressão ao TEATRO OFICINA. Elementar, Freud diria.
Os desejos de pedofilia, até de pederastia em relação ao atual marido de Elaine estão nele. Por isso o menino de 3 anos Theo, corre perigo nas mãos deste irreponsável. Uma tia procuradora aposentada, de Brasília, rica, e um deputado devem estar auxiliando o rapaz com seus contatos reacionários aqui na Vara de Família.
Nem sei os nomes das pessoas porque os autos não estão na minha mão. Elaine não tem pai nem mãe, estão mortos. Fred está sem dormir há dias, agora preocupado acima de tudo com a sobrevivência de Elaine. Segunda feira havia uma audiência com o Juiz de família, para copiarmos o absurdo de mais de 400 horas de vídeo dos HD’s. Nenhum de nós nem pôde aparecer, pois estávamos preocupados com a vida de Elaine, hospitalizada na UTI. Fred doi buscá-la no aereoporto, onde voltava de Brasília, para onde tinha ido ver o filho, sob a vigilância de uma babá contratada pela tia. Na despedida Theo o menino chorava, querendo voltar para os braços da mãe em São Paulo, segundo relato de Elaine, que do aeroporto, passando muito mal, teve de ser hospitalizada, e em estado grave o hospital resolveu colocá-la na UTI.
Não sei o que fazer para acordar a mídia, esta Justiça Injusta que, querendo defender a Família, destreoi a vida de uma Mãe, de uma Criança e atormenta todo nosso trabalho maravilhoso neste momento vitorioso do Oficina Uzyna Uzona. Este “taylorismo”, (divisão de trabalho e competências do século 19) da vida contemporânea, esta insensibilidade aos direitos humanos que me é revelada agora neste momento, me faz dedicar as DIONIZÍACAS á todos que lutaram em 30 anos por este momento, mas sobretudo a ELAINE CESAR E THEO.Que esse filho volte imediatamente para os braços da MÃE antes que aconteça o PIOR.
E que o material apreendido retorne imediatamente ao Oficina Uzyna Uzona.
É uma Obra de Arte sequestrada em nome de uma atitude mesquinha provocada pelo Ciúme de um Ególatra, de uma Justiça cega e de uma Sociedade, Mídia, conivente como a de São Paulo.
Por favor acordem os trabalhadores da difusão do que acontece de bom e de mau no Mundo e revelem isso a todos. Peço a todos, seja quem for, que façam esse favor de amor aos direitos humanos e batam seus tambores.
Me dirijo especialmente a Ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire. Médica, Professora da UFRJ, Nilcéa ocupa o Ministério há quase 8 anos. Tem feito um excelente trabalho. O endereço da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República é: Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Edifício Sede, 2º andar – Brasília/DF. CEP: 70047-900. Fones: (61) 2104 – 9377 e 2104 – 9381. Faxes: (61) 2104 – 9362 e 2104 – 0355.
A OTAVIO FRIAS, na FOLHA, aos diretores do ESTADÃO, do GLOBO, das TV’S, Rádios, que apurem os fatos. Nós estamos envolvidos nos trabalhos de estrear dia 17 as DIONIZÍACAS, um marco na história do TEATRO MUNDIAL, e nos sentimos impotentes diante da gravidade do assunto, de uma VIDA HUMANA CORRENDO O RISCO, POR SEUS SENTIMENTOS DE DIREITOS HUMANOS TEREM SIDO AGREDIDOS.
Colaborem conosco, estamos sobrecarregados dos trabalhos das DIONIZÍACAS, mas não podemos parar pois é a ARTE somente que temos para dar Vida a Elaine nestes dias.
José Celso Martinez Corrêa14 de dezembro de 2010, 07:40

Loucura Pouca é Bobagem


O Acelerador de partículas e o buraco negro.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Poesia


O filme que não se acaba...

O tempo passa e rápido
mas sua presença é eterna
em nossos grandes momentos
e tivemos muitos.deles

Eu e você particularmente
estamos ‘INSIDE’ na voz do Brasil

A loucura sempre rondou a nossa porta
A porta cinematográfica de nossas vidas

O cinema Pirajá em noite de chuva
Tempestade das almas

Raios impetuosos impressos
em celulóide revolucionária

Corpos e corações distantes
Nunca perdidos e muito menos malditos.

A história sempre está ao nosso favor
Os ventos é que são às vezes contra

Vai meu amigo
Segue o seu caminho envelhecido
tal qual vinho de incomparável sabor

Ao Baco reverencio a sua memória
Ao Deus o seu amor.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

ROTEIRO CINEMA

SOLITUDE

Releio, nestes dias de tédio, um livro que me marcou muito quando o li pela primeira vez na minha adolescência: Trata-se do melancólico texto “Dublinenses” de James Joyce.

Sempre quis filmar o conto “As Irmãs” em contraponto a outro conto “Um Caso Doloroso”. Sairia dessa união, acredito, um filme extraordinário de longa metragem sobre a solidão humana – SOLITUDE – roteiro que acabo de escrever e que o autor na certa aprovaria.

SOLITUDE - Um decifrador de imagens em um só enigma literário chamado cinema.

A supressão do movimento, a paralisia - antítese do cinema - que faz parte de sua estética literária, tornou os escritos de Joyce, por sua densidade narrativa, sua inventividade lingüística, até hoje uma novidade, como assim também o é Guimarães Rosas, os dois são de difícil adaptação cinematográfica.

Filmar os dois contos, os dois textos, adaptados para os dias de hoje, em uma mesma história, é um desafio que sempre me excitou. Nunca pude fazê-lo.

No meu filme Amaxon, tratei o mesmo tema da solidão só que do ponto de vista poético-feminino. Porque não agora usurpar toda a carga emocional do bancário James Duff, misturado ao fracassado padre James Flynn, nesta nova história onde se mistura de amor, rebeldia, inércia e solidão?

Vocês que conhecem o livro e já leram esses dois contos, acreditam que o senhor Duff é a mesma criança que visita o padre Flynn e que depois de velho, na solidão do seu quarto, revive as duas histórias..., você acha ser isso possível?

Pois bem, meus amigos, eu achei aqui, se me permitem, saídas para outras concepções de linguagens cinematográficas ainda não experimentadas na construção desta idéia.

Aguçando a visão, da mesma maneira que fez Jonh Huston no seu introspectivo e último filme "Os Vivos e os Mortos", baseado no livro “Finnegan`s Wake” de James Joyce (depois descobri que o filme foi baseado no conto "Os Mortos" do mesmo ivro Dublinense) e com a grande lente de aumento do cinema de invenção, revivendo uma fotografia de claros e escuros, realçando uma representação expressionista, posso filmar os atores de “SOLITUDE” da mesma maneira que Huston, sem perder a alta carga dramática, o calor humano e a mais profunda lucidez encontrada nos textos inconfundíveis deste grande autor irlandês.

O Roteiro está pronto e registrado, só me falta agora um produtor de visão que se possa se interessar em investir na liberdade da boa arte cinematográfica expressa neste filme poético do reconhecimento humano que se chamará “SOLITUDE”.

Espero que pessoas inescrupulosas não se apossem desta idéia, mas se outros não resistirem e surgir ai algum filme, me dêem muitos créditos, façam justiça ou financiem os meus projetos.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

POESIA

Kimura Schetino - na peça EU E OS ANJOS

VINDO

MORTO

Deste dantesco novo mundo
Com os sortilégios de sempre
Quero me apresentar
Aos portais do inferno.
Mefistófeles
minha alma
Metrópoles
meu corpo
Acrópoles
meu desígnio
Fausto
meu louco
Amigo
universal
Deus
desta festa
Na terra

Deuses soltos
EVOE
E para você
de mente aberta
minha meta
Indecente
É
ser ninguém
Meu inferno
ultimamente
É
o meu céu.
Amém.

1976

domingo, 12 de dezembro de 2010

MEMÓRIA VIVA

A Verdade Desconhecida
Parte III

Era tudo previsível quando recebi da mão do poeta Pedro Maciel e li a coletânea dos poemas mineiros que deveria ser publicada no jornal, isso foi feito depois de muita insistência dos poetas para serem publicados, estavam se sentindo rejeitados, já que o periódico estava se tornando a Ponta de Lança da arte de vanguarda que se fazia em Minas. Todos queriam estar nele, era o único órgão informativo do estado que professava a liberdade de expressão nos seus editoriais.
Não tínhamos compromissos com nada a não ser com a arte do bem fazer.
Eu sabia de cara, quando li, que o poema do Sebastião era uma bomba de efeito retardado, um teste de caráter, ele não acreditava que eu fosse publicá-lo e assim poderia dizer que sofreu censura do jornal, mas o que ele não sabia é que a publicação do seu poema evidenciava uma situação de conflito que já existia quando fui convidado a assumir aquela diretoria, ato este que não agradou a elite mineira que havia se apossado, na figura de Ângela Gutierrez, da Secretaria de Cultura do Estado.
Eu estava chegando do Festival de Cinema de Berlim quando fui convidado pelo governador. Pensei que seria a época propícia para me lançar na política, ali poderia dar os primeiros passos, me fazer conhecido, preparar a minha candidatura a deputado ... Não seria uma madame empreiteira, muito menos um governador analfabeto que interromperia a seta libertária do Jornal Ponta de Lança. Eles teriam de me colocar na rua e fechar o jornal. Teria assim o apoio dos artistas, criaria o debate e tentaria uni-los em torno do meu nome. Depois de transformar aquele cemitério das artes, com a colaboração das melhores cabeças da minha relação, em um centro de cultura viva, onde se respirava o ar puro da livre criatividade, não deixaria de lado a minha equipe, as minhas convicções, por um projeto pessoal e político.

O pau ia quebrar enquanto muitos queriam ficar no quartel da saúde. Não abandonaria o jornal, seria a nossa bandeira no campo de batalha. Aos poucos fui percebendo que estaria sozinho nesta guerra.Ameaças bisonhas e rancorosas eu sofri dos eternos comensais da burocracia que queriam me ver longe do pequeno poder que eu exercia... Entrei apimentado no gabinete do Dalton e as palavras foram jorrando da minha boca: - Quando muitos tentam me sabotar unindo-se contra o jornal Ponta de Lança, contra a liberdade no espaço de criação que implantei aqui na Fundação, preparo-me para o conflito que já se avizinha. Sempre achei que é chegada a hora de transformar o velho no novo introduzindo o visto pelo não visto nesta polêmica que se inicia. Estão nos forçando a uma censura velada, escondida, e vocês querem sumir com toda essa edição histórica? Pondo fim no jornal, vocês vão queimar mais uma vez o professor Darcy Ribeiro, que está nele presente com alguns fragmentos do seu próximo livro. É um desrespeito com todos que neles escreveram e trabalharam, vocês vão queimar o dinheiro do contribuinte só para satisfazer uma falsa moral palaciana? Estamos dando o primeiro passo no lamaçal da política. Não vamos aceitar o jogo dessa gente! São oportunistas de plantão que na calada da noite procuram uma maneira de exterminar a luz das idéias que tanto lhes incomodam... Assumo todos os riscos em nome da minha posição de independência, sem fugir das minhas responsabilidades... Não se apavorem, vocês não serão os enforcados, eu criei o jornal Ponta de Lança em homenagem a Oswald de Andrade e a nossa liberdade, não posso trair nem um, nem outro. O jornal será distribuído e nada vocês podem fazer para impedir e vocês continuarão limpos com o governo...ninguém vai perder o seu empreguinho! Dalton, estatelado, boquiaberto, ouvia a tudo no mais lúgubre silêncio e assim que terminei, ele olhou primeiro para seu amigo Paulo e depois para seu assessor Luiz Carlos e sem dizer uma palavra levantou o ombro, esfregou as mãos e sentou-se na poltrona do gabinete onde reza o silêncio, a prudência e não o saber.
O jornal não conseguiu a distribuição de antes, mas foi disputado no câmbio negro a tapas. Mais de 1000 jornais que ficaram na minha sala sumiram tal qual pão quente, cada um que chegava na sala carregava um fardo, a edição evaporou-se. Foi um sucesso. O que não devia ter sido lido, foi amplamente divulgado por toda uma cidade sedenta de culpados. Passou-se uma semana e os jornais só falavam disso, eu já cheio daquelas lorotas de salão sobre as cabeças cortadas, aporrinhado pelas demissões dos meus amigos que se fazia a pedidos daquela madame coberta de ouro e colecionadora da memória alheia, resolvi não ir mais a Fundação. Fui para o Rio de Janeiro para terminar o meu filme sobre o maestro Camargo Guarnieri, que havia feito quando o maestro Airton Escobar o convidou para um concerto comemorativo dos seus 80 anos na Fundação.
Nesta manha de quarta-feira abro o caderno de cultura do jornal Estado de Minas e como sempre não havia nada de novo, mas folheando o resto do jornal, vi estampado na manchete da página 5 do primeiro caderno, os primeiros acordes do grotesco absurdo que se seguiu...
Estou voltando novamente para o Rio de Janeiro e faço como fez o poeta Carlos Drumond com Itabira, dependuro o seu retrato na parede e vejo a praia de Copacabana... Mas como dói.

O POEMA DO SEBASTIÃO NUNES

Deitado de costas o presidente ronca.
Deitada de bruços a senadora sua.

Ajoelhado no tapete o ministro chupa.
De pernas abertas a deputada goza.

O líder do governo propõe uma suruba.
Em regime de urgência o plenário aprova.

Pelo buraco da fechadura o secretário.
Enrolado nas cortinas o mordomo.

A afilhada do prefeito sobe a rampa.

Poetas que participaram da página maldita da edição Ponta de Lança de maio de 1988.
Sebastião Nunes; Márcio Almeida; Laís Corrêa de Araujo; Pedro Maciel; José Américo; Afonso Ávila e Carlos Ávila.

Jornal Ponta de Lança – artistas que participaram da sua curta existência: J.E.Ferola; Leonardo Fróes; Eid Ribeiro; Helvécio Ratton; Sérgio Lara; Mario Drumond; Wilson Simão; Nise da Silveira; Teodoro Rennó; Éolo Maia; Tonico Mercador; Adão Ventura; Carlos Herculano Lopes; Uilcon Pereira; Oscar Nieneyer; Jose Paulo Paes; Maria do Carmo Arantes; Marcus lontra Costa; Moacyr Laterza; Fernando Peixoto; Nivaldo Ornelas; Rogério Sganzerla; Silvio Potestá; Floriano Martins; Tomie Ohtake; Antonio Beneti; Denise Stoklos; Marcelo Dolabela; Adélia Prado; Darcy Ribeiro; Augusto Boal; Ciro Barroso; Ricardo Bada; Paulo Augusto de Lima; Carlos Scliar.
Corpo editorial: Pedro Maciel; Osvaldo Medeiros; Jose Sette; Fernando Tavares; Daniel de Oliveira.

MEMÓRIA VIVA



Numeros 2 & 3

A Verdade Desconhecida

Parte II

Eu sabia quando li, que o poema do Sebastião Nunes ia criar um alvoroço, mas lutei muito pela Liberdade para não aceitar nunca mais qualquer tipo de censura! – Vamos tomar um café no gabinete do Dalton Canabrava que tenho certeza que o Paulo Navarro vai te divertir com suas preocupações mundanas... Neste momento aproxima-se de nós, a passos largos o neurótico Daniel Oliveira, a quem eu chamava de mate-leão, pois já vinha queimado, com a cara feia de quem sofrera uma grande descompostura, emburrado, o que não me causava espanto, pois é assim que ele sempre se apresentava. Mas hoje o que ele trazia no verbo não era o diário pedido de aumento de salário, nem as suas brigas íntimas... Eu já estava fora do carro quando ele chegou gesticulando com um jornal enrolado entre os dedos. Trazia nos lábios certo tremor, pois não conseguia falar o que queria... – O que houve Daniel? Perguntei... Podíamos sentir no ar o cheiro da carniça. Antes mesmo que ele pudesse me responder entrou em cena, com seu andar lento e pausado, o artista plástico Fernando Tavares, diretor e programador da grande e das pequenas galerias da casa. Ele surge como um gato por detrás das colunas que sustentam o foyer do grande teatro, me pega pelo braço e leva-me até a porta da sala do cineminha Humberto Mauro. Afasta-me dos outros para comentar o fato que agitava os corredores da Fundação: - Olha Mestre, o jornal Ponta de Lança foi distribuído para todos os departamentos aqui da Fundação e também da Secretaria de Cultura, ninguém sabe por quem e já tem gente dizendo que ele vai ser o motivo da sua exoneração..., agora todo cuidado é pouco. Pedro se aproxima e depois vem o Daniel, sempre querendo me dizer alguma coisa, mas primeiro ouvindo, espionando o teor de cada palavra... ele enche o peito e diz: – Estive agora com o Dalton e ele me disse estar preocupado com o que possa acontecer com todos nós se este jornal for distribuído. Ele me pediu para antes de você tomar alguma atitude precipitada ir ao seu gabinete... O nervoso Daniel conseguia finalmente passar o recado do chefe e ficou espantado quando dei uma gostosa gargalhada já entrando em minha sala de trabalho... Aproximo do meu amigo e digo – Pedro, onde se meteu o Wadin? Para onde foram os jornais que vieram da gráfica? – Estão chegando quentinhos... Entra na sala Osvaldo, artista plástico e o diagramador do jornal dizendo que estava no carro a edição completa do jornal Ponta de Lança sendo descarregada pelos funcionários da Fundação até a minha sala. Eram mais de 2.500 exemplares empilhados um por cima do outro ocupando, no final do carregamento, grande parte da sala. Ouve um silêncio tumular quando o ultimo fardo de jornais pousou em cima de minha mesa. Todos os funcionários estavam constrangidos, todos já haviam lido ou ouvido sobre o poema (dito pornográfico) do Sebastião Nunes. - O que devemos fazer com esses jornais? Perguntou um funcionário... Luis Carlos Pires, velho comunista produtor de cinema e que ora assessorava a superintendência junto com o Paulo Navarro, entrou na minha sala transmitindo a ordem que veio de cima: - Todos os jornais devem ser recolhidos e nada poderá ser distribuído... Essas são as ordens da Ângela Gutierrez para o Dalton! Ela é a nossa secretária da cultura e prestem atenção que neste momento ela está almoçando com o governador e na certa está lendo para ele o poema do Sebastião, não há nada que possamos fazer, disse-me constrangido... – Abaixo a censura! Gritou Osvaldo Medeiros. – Porcos chauvinistas! Repicou Fernando Tavares... Todos começaram a falar - inicia-se uma algazarra, pensei um tempo, me levantei de supetão e pedi silêncio e falei: – Quero dizer que não venho construindo a minha história com atitudes covardes, ou como se diz aqui em Minas, cautelosas. Não vamos deixar que a burrice do governo censure um poema, um jornal, ou qualquer outra coisa, se é que é em um estado democrático de direito que pretendemos viver e trabalhar. Por isso peço aos meus funcionários que mantenham a rotina, distribuam por toda a parte, por tod os meios, o jornal, eu sou o único responsável por essa ação, essa afronta ao sistema em nome da nossa liberdade fica por minha conta.
Enquanto saiam os jornais para as bancas tradicionais da cidade, livrarias e a postagem para o correio pela mala direta da Fundação, eu peguei um dos pacotes com 50 exemplares, como sempre fiz em cada edição que saia do forno e caminhei para o gabinete do jovem superintendente. O Dalton só tinha notícias do jornal quando ele já estava pronto. Assim que eu chegava com o pacote no gabinete, ele, o Paulo e o Luis retiravam alguns exemplares cada e mandava a secretária remeter o resto para os amigos e admiradores.
Caminhei lentamente pelo corredor que separava a minha sala da superintendência como quem caminhava para o cadafalso. Dizia pra mim mesmo, me convencendo: - Basta de tamanha mediocridade! Muitas rainhas e poucas saúvas os males dessa casa são! A cada passo eu tinha a certeza do meu caminho. Romper as barreiras do servilismo e sair em defesa de uma utopia cultural, mesmo que isso custasse a mim o meu generoso salário mensal.
Não seria a primeira vez, nem seria a última.

sábado, 11 de dezembro de 2010

MEMÓRIA VIVA


número 0 & número 1

PONTA DE LANÇA

Remexendo em velhos papeis guardados no meu baú, deparei-me com a edição completa do jornal mensal Ponta de Lança que criei quando fui diretor do Palácio das Artes em Belo Horizonte no ano de 1988.
Estavam ali pois, depois de 22 anos guardados, o tablóide que revolucionou, em suas 5 edições, o panorama cultural belorizontino a tal ponto que foi censurado e provocou a minha demissão.
O governador de Minas era então o senhor Newton Cardoso, que começou o seu governo convidando Darcy Ribeiro para implantar as escolas de tempo integral no estado. Depois me convidou para ser o diretor da Fundação Clovis Salgado. Hesitei, a princípio, pois estava envolvido nos meus projetos de cinema, acabava de voltar do Festival de Cinema de Berlim, mas achei também que era uma oportunidade única para colocar na prática muito das minhas teorias sobre a importância da divulgação e consolidação da vanguarda criativa que havia conseguido sobreviver aos 20 anos de ditadura militar.
Antes mesmo de ser nomeado, a pressão contrária ao meu nome era grande nos meios políticos e administrativos do governo. Hoje sei que meus inimigos eram muitos – alguns por medo e outros por covardia, mas a maior parte era por inveja e ciúmes.
Não me arrependo de nada que fiz. Nunca fui um radical, em qualquer circunstância. Quando recebi o telefonema do governador me comunicando da impossibilidade de me manter no cargo, compreendi o seu medo e o seu recuo. Ele já havia desistido de renovar os quadros do Estado, havia dispensado o professor Darcy Ribeiro e se alinhava ao que de pior havia em Minas.
Fiz como fez o professor Darcy, não dei asas à polêmica e voltei para o Rio de Janeiro, ao meu cinema. Mas na época escrevi um texto que hoje encontrei junto com a coleção.

A VERDADE DESCONHECIDA

Terça-Feira, maio de 1988, tudo parecia normal. Abri os jornais de Minas e pelas notícias e manchetes, pude notar que o Governo de Minas, para quem eu trabalhava, ia de mal a pior.
Tive vontade de ficar em casa. Acendi um cigarro enquanto tomava o meu cafezinho pingado. Um pássaro do peito amarelo pousou na minha janela e pareceu-me dizer que todos estavam de olho em mim. - Seria um presságio? Perguntei-me estarrecido em voz alta espantando o pássaro que saiu batendo as fortes asas contra o vento frio da manhã na Rua Gramogol do bairro Sion.
Lia todos os jornais disponíveis para me informar sobre o renascer, em um país agora democrático, o espírito libertário do nosso povo. Mas tudo me parecia ser como antes fora, era como se nada houvesse mudado. Só não mais me sentia perseguido pela polícia do Dops – Ah! A nova república e os mesmos enganos do passado, nada de novo, que merda! Pensava enquanto dirigia meu velho carro no trânsito agitado da capital mineira. Chovia uma garoa fina paulista em todo Belo Horizonte quando cheguei aos portões de ferro da Fundação que ficava encravada no belíssimo Parque Municipal. Assim que os portões foram abertos, pude reparar a agitação do meu editor, produtor, jornalista e poeta Pedro Maciel, que estava molhando-se na garoa e agitadando-se nas nuvens, com seu andar elétrico, caminhando de um lado ao outro do jardim interno onde ficava o estacionamento. Quando ele me viu agitou-se mais ainda estendendo para cima seus longos braços para mim saudar. Apressado aproximou-se do carro e antes que eu pudesse sair, abriu a porta e sentou-se ao meu lado e foi logo dizendo que estava assustado com a recepção interna dessa nova edição do jornal Ponta de Lança . Mostrava-me o exemplar que estava em suas mãos: - Esta edição mal saiu do forno e já provoca uma estrondosa polêmica... Estou preocupado Zé! – Tenha calma! Estamos fazendo história, disse a ele saindo do carro.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Poema


Confissão

posso ser morto
tenho grande dívida com o sistema
não posso pagar
assim vou morrer de fome
fome de desejos novos
nos dejetos recolhidos no lixo
há fome na tevê
nos despejos
do artista sem ter onde morar
na família ressentida perdida
na praça ou debaixo da ponte
há fome mesmo
nas lavouras abandonadas
nas matas e nas queimadas
nos cenários das cidades esquecidas
há fome nos fornos de carvão
há crianças perdidas numa montanha de fezes
pintadas de preto
tornando-se polibandidos
massacrados inocentes aflitos
neófitos de mentes arrasadas
há fome de tudo quanto o choro
de todos derramado pela fome da vida
possamos ter ou seja quase nada
quando sabemos que muitos vivem muito bem
conservados nas distantes tradições oligárquicas
com seus bens absurdos e de mal gosto
cercados por um batalhão de escravos mal pagos
brancos índios negros e mestiços pouco importa
que comem de segunda a segunda
o resto desta industria suculenta
feijoadas e sangrentos churrascos
plebe ignara e arrependida desejando ser burguês
robôs que vagam nos diversos níveis do tempo eterno
nos labirintos palacianos e nas cachoeiras de serpentes
mundo que cai no lamaçal do seu espaço-tempo
remexendo a informação
dirigida aos débeis mentais
todos jornais e todas as mídias
mentem com a verdade dos fatos
maldosamente mentem
a favor do cruel capital
o maioral do norte
dando o troco para o otário de plantão
dementes nas primeiras flores do capital
nos juros invariavelmente mente até a morte
imenso e insano continente
ganância e dívida que não posso pagar
amém!

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Império da bandalheira

Paulo César Pereio 1975 - Filme Bandalheira Infernal
Opinião

Destrua esse cara antes que ele desmoralize todo o sistema...
Não estou espantado com o desespero e com a contra ofensiva dos países que professam o capitalismo neoliberal como a única forma democrática de governo e que são considerados símbolos do poder, do luxo e da nobreza, pois é ali que vivem os mandatários de tão cruel missiva que os Estados Unidos e a Inglaterra armaram com o apoio da Suécia, contra um homem só. Criaram um mal estratagema para prender o cara, o louco Julian, o destemido herói australiano que colocou na imprensa livre da internet as correspondências secretas dos prepotentes embaixadores americanos espalhados pelo mundo. O pânico invadiu os gabinetes do pentágono. Muitos mais documentos comprometedores podem surgir de repente, em qualquer momento, que criem situações muito mais constrangedoras para o sistema de dois países que há mais de séculos dominam o mundo monetário internacional. Morei um ano em Londres e sei muito bem como a elite financeira de Bank trata os negros e os latinos de Nothing Hill Gate.

Memórias

Remexendo em velhos papeis chegou-me aos olhos dois poemas de Waly Salomão. Um deles é propício ao momento vivido.

(Publicado no Suplemento Literário n.73 julho 2001, Secretaria de Cultura - MG, com interferência de Guilherme Mansur)

Arte Anti-Hipnótica

Mal a barra do dia rompia
saía pra rua
a caçar trabalho.
Lavrador desempregado
morador de casebre
3 cômodose
em Araçatuba
cumpre pena de prisão domiciliar
por furto de luz
do programa de energia rural
para população de baixa-renda
4 lâmpadas
sendo que duas queimadas
e uma geladeira imprestável.
Sem dinheiro para pagar a conta
teve o marcador de quilowatts arrancado.
Um compadre compadecido armou o “Gato”.
70 anos incompletos
Não compareceu ao fórum
pois só possuía chinelo
despossuia sapato e roupa decente.

Aqui firma e dá fé um Bertold Brecht de arrabalde:
o sumo do real extraído da notícia do jornal:
a arte ilusória
idílica
hipnótica
do fait divers.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Crônicas do Cotidiano

Até amanhã.

É uma sensação entrar, flanar, flertar nos salões da vida ao lado de quem a seu lado estiver quanto mais tempo melhor. Pode até ser quanto mais tempo de conhecidos apenas. Acredito que o que mais vivemos plenamente é um ciclo de gerações e realmente cada um no seu e na sua. Sempre defendi o conceito de geração desde que o aprendi na sociologia americana.Acho que é a única forma de recortarmos sem perdê-lo o conceito de classe, a grande criação do gênio humano nos estudos sociais. Ler Marx é uma revelação. Opositores pressurosos só sabem dizer besteira a respeito. Os usuários políticos para o bem ou para o mal tampouco não o conhecem ao todo, pescam ali e aqui o que lhes interessa no momento e mandam ver a seu modo e vício.O projeto, a perspectiva de uma vida igualitária elimina qualquer possibilidade em nenhuma instância de submissão de qualquer um a qualquer outro. A liberdade humana individual é intangível e irrefreável como a água que sempre corre para onde quer, debalde botar-lhe paredes.Não li tudo, na verdade muito pouco. Não posso ser massivamente inundado por revelações. De preferência uma a cada década. Não combina com os acelerados dias de hoje mas também não sou de agora. Nascido em 44 e socialmente em 64 mantenho a cabeça de lá neste corpo de cá. Vamos os dois muito bem, envelhecendo sem envilecer. Nem por um segundo fui vil.Errar é humano, perseverar no erro é ser burro, reza a tradição, as tradições me são muito caras. Não posso, ninguém deve arrepender-se de nada que vivemos, não seria justo, não se tem outra vida, é só uma, só essa. Estamos bem empatados com os desafios da vida.Perdi ganhei meu dia, diz o poeta. Tá de bom tamanho. Chega o tempo das reminiscências não para reclamar, nem para louvar, apenas para seguir na busca ao imaginário fio da existência, o fio da memória. Ajuda-me demais o fio marxista ele mesmo que, como se sabe, Marx precisou dizer a todos que não era marxista pois, claro, era ele o próprio, era o criador, não a criatura.Nunca li e provavelmente nunca lerei seus escritos de economia, conheço minhas limitações. Tive enorme prazer nos estudos históricos e sociais. É uma bem aventurança as palavras irem abrindo os escaninhos de nossas mentes e então podemos ver o mundo com todas as múltiplas cores sendo iguais que o compõem.Nada é apenas aquilo. Cada aquilo desdobra-se em miríades de aquilos que giram como planetas ou como átomos no sistema local, mundial ou planetário. Assim como as pessoas, as espécies, a vida e a natureza se transformam, uma coisa virando outra, por que seria diferente com as sociedades ou os grupos sociais?A história se move. Não como a queremos cada um mas no conluio bélico ou pacífico de todos os habitantes do planeta. Nem tudo é possível, há que contentar-se com o tempo e a hora. Nada acontece de fora pra dentro, a não ser a indesejada das gentes. A que não se deve nomear, sob pena de atraí-la, a morte.Destaco a simplicidade do 18 Brumário e sua descrição da consciência como surge na realidade. O real é a única instância do universo. Parente da outra peça notável que é a sua correspondência jornalística que narra a guerra de independência americana, aquele aqui e agora em que a colonia bate a metrópole. Dia a dia como o jornal podemos acompanhar a batalha da guerra econômica, é lindo.Superada para mim a questão do determinismo graças a Althusser, antecipado entre nós no Brasil pelo Giannotti. Não encontro o livro, aliás não encontro nada quando quero, papéis e livros espalhados e empilhados aleatòriamente pela casa. Depois achei, nem tudo está perdido: José Arthur Giannotti, ?Origens da dialética do trabalho?, DIFEL, São Paulo, 1966. Também de 66 é meu primeiro filme ?Paixão?.A determinação que é real se dá somente em última instância na composição das forças econômicas, históricas e sociais. Lance de gênio: é a sobredeterminação que não é previamente determinada, ela é a resultante. Quando duas pessoas distantes descobrem a mesma coisa é porque é real. E vê-la e ver-nos em movimento é preciso, senão ficamos como paquidermes no pântano, e nós humanos em certas horas ao invés deles nem devemos fazer marola senão nos entram as coisas pela bôca.O único luxo a que não pode permitir-se a civilização é estagnar-se e no entanto vivemos socialmente como há muito tempo, como há tanto tempo. Aqui e ali nada mudou. Corremos muito, somos muito mais velozes, mas para onde corremos? Para a indesejada das gentes, a que não se deve nomear, sob pena de atraí-la, a morte?Todo ser humano é em tudo e por tudo igual a qualquer outro ser humano em qualquer parte do mundo. Se isto não é uma premissa teórica indispensável, minha avó é bicicleta. Não deixa de ser; a bicicleta foi e volta a ser um veículo extensivo do corpo humano e dificilmente mata embora se bobear mate.Não me digam que também o é o carro ou o avião. Fossemos feitos para voar nasceríamos com asas. Inventá-lo foi a proeza extraordinária de um nativo visionário que morreu de desgosto ao ver sua invenção a serviço da indesejada das gentes, a que não se deve nomear, sob pena de atraí-la, a morte.Saio da vida para entrar na história: mané! Saímos todos da vida, otário, nós e você que em vida foi um matador cruel e minucioso de vidas. Entraste sim para a história, para a história do genocídio humano geral e individual a exclusivo critério destas mentes satânicas desviadas do mínimo respeito à convivência e à sociabilidade que são as mais básicas componentes da nossa condição humana.Ao promovermos a inominável deixamos de ser humanos, de ser animais. Viramos plantas ou pedras? Não! Nelas enxergo mais vida que nos carrascos, os que se atrevem ao maior pecado que é infligir violência ao semelhante e na vida sobre a terra somos em tudo assemelhados. Talvez até no sistema planetário, nas galáxias, enquanto houver luz ou até nos buracos negros além dos nossos.Escrevo a história de uma vida, a que mais e melhor conheço, a minha. Se não traí-me revelo para todos um pé da vida. Se trair-me, bem, também terá sido minha a vida. Descuidei-me, o cabelo cobriu-me a cara, pensei que estava sonhando.Um estalo com os dedos despertou-me como se tivesse sonhado. Não sonho. Dizem que sim, todo mundo sonha, apenas não lembro que sonhei. E se não lembrar, não sei. Despeço-me de quem sou? Não, de quem fui, sem deixar de ser o ter sido. Para mim está bom, está muito bom, está ótimo. Até amanhã.
Sergio Santeiro
(santeiro@vm.uff.br).

NOTÍCIA DO RIO DE JANEIRO

NEBLINA 68

Em 1968 jovens estudantes da Associação Cristã de Moços, da Lapa, Rio de Janeiro, fizeram um curta metragem em 16mm, intitulado Neblina. O filme foi premiado no Festival de Cinema do Jornal do Brasil - 68, realizado no Cine Paissandu.
Era uma obra de ficção mostrando o impacto dos primeiros anos da ditadura militar sobre a juventude brasileira. A maior parte das cenas foram rodadas onde hoje é o
Parque das Ruínas, em Santa Tereza.
Neblina sumiu. As cópias e os negativos sumiram... De repente, um dos atores do filme descobre, no armário do seu pai recém falecido, uma cópia em película.
No dia 12 de dezembro de 2010, às 16 horas,
42 anos depois, o Parque das Ruínas vai mostrar essa raridade.
Um filmemória que espelha o passado desse local encantado da nossa maravilhosa cidade.
Local que acolheu a magia de artistas inesquecíveis.
Espaço preservado, aberto como um presente, para cariocas e visitantes.

RUA MURTINHO NOBRE - SANTA TEREZA

Não percam.

NEBLINA

Ficha Técnica:
Obs. a cópia salva não tinha os créditos finais. Quem puder colaborar para completar a lista abaixo e também passar contatos de pessoas que participaram do filme, agradecemos.
Direção: Noilton NunesProdução: Anselmo Serrat - Luis Octávio - Fotografia: Flavio Chaves Musica: Paulo Cesar Willcox - Zé Bola

(Melhor Musica Original - Festival JB 68)

Elenco:
Ana Maria Belucci - Kleber Lesaige - Francisco José Freire - Ana Maria Freire - Ana Lúcia Avelino - Nely - Odilon Correa Noelton Nunes - Carmem - Nancy - José Luis - Geraldo Macarrão - Clarisse - Djalma - Cesar - Tetê - Tânia - Natan

noiltonunes@hotmail.com21
parquedasruinas@gmail.com

domingo, 5 de dezembro de 2010

Opinião


LIBERDADE AGORA

Respondendo aos emeios recebidos, muitos me criticando, quero explicar como na prática formaliza-se, através de uma estória, o conceito da palavra Liberdade.

Tenho um velho amigo, que bebe muito pouco, se alimenta com equilíbrio, não gosta de esportes, andar e correr no calçadão, academias de ginásticas, etc., mas todo o dia, depois do trabalho, vai tomar um banho de mar. O cara tem 65 anos e tem uma saúde de ferro. Acorda por volta de 11.00 horas, toma um suco de frutas e vai para o trabalho. Ele é professor, dá aulas de 13.00 as 22.00 horas. Durante os períodos das aulas ele se alimenta com sanduíches naturais, sucos e café com leite. No intervalo do dia para noite ele almoça, come arroz, feijão, verduras e as vezes um ovo cozido ou um filé de peixe. Terminado o período noturno ele vai religiosamente ao boteco, onde encontra alguns amigos e toma a sua cerveja, pois a sua boca geralmente está muito seca. Chega em casa por volta das 24.00 horas. Dorme por volta de 5.00 horas da madrugada no máximo, diz que tem horror de dormir depois que o dia amanhece. Seria uma história comum se ele não fumasse dois cigarros de maconha por dia. Um baseado antes de sair de casa e outro quando retornava.Um dia, comprando algumas gramas em uma boca de fumo, que era a sua reserva mensal, foi surpreendido por um tiroteio entre os bandidos e a polícia e quase sai dali morto ou preso. Resolveu então fazer uma plantação em seu apartamento e quando os pezinhos da cânabis tomaram vida, um amigo seu, também professor, teve o seu apartamento invadido pela polícia e foi preso com o filho. Ele ficou, a partir desse caso, paranóico e amedrontado com a repressão e arrancou todos os doze pezinhos das selecionadas sementes vindas da Holanda, triturou todos os pezinhos no liquidificador, bebeu um pouco daquele xarope verde de gosto amargo, colocou o resto na geladeira e foi, chateado com o acontecido, dar as suas aulas. O professor fumava tabaco desde a sua adolescência, na sua juventude trocou de cigarros – fumava mais de vinte cigarros de tabaco por dia e passou a fumar dois de maconha – e não podia ficar agora, depois de tantos anos, sem o seu prazer predileto... Teria que correr o risco e voltar à maldita boca de fumo.

Conto esse caso para dizer o quanto a nossa civilização é escrava de um sistema preconceituoso, repressivo e fascista quando o assunto é a Liberdade.

O professor gostava de dizer que só devia ser proibido roubar e matar - Embora matar é também roubar a vida, dizia ele: - O estado deveria libertar os seus cidadãos destes grilhões e libertar os seus contribuintes deste atentado contra a sua liberdade individual. Se não sou bandido, se trabalho, se pago meus impostos, se estudei e tenho perfeito domínio de meu intelecto, tenho o direito sagrado de fazer comigo, com meu corpo, o que eu quiser. Quem pode me proibir de me matar? Mas sei que não posso roubar a vida de ninguém. Eu acho que se o homem quiser beber até cair; fumar até se entupir; se drogar até sucumbir; é seu direito e ninguém tem o direito de reprimir. Pode-se aconselhar o suicida a se tratar, mas nunca levá-lo a força a um hospital se ele tem plena consciência daquilo que ele é, pois, se não, ele acaba fazendo como fizeram o poeta português Mario de Sá Carneiro e o compositor brasileiro Assis Valente. Um se matou com veneno em um hotel de Paris e o outro no Rio de Janeiro tomando formicida com guaraná num boteco da Lapa. Dois gênios da arte. Quantos outros mais fizeram o mesmo? É chegada à hora de se libertar o homem aos seus mais íntimos desejos. Legalize tudo que ainda não foi legalizado e estaremos dando um passo fundamental rumo a Liberdade de se ter a desejada consciência do imponderável.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Notícia

Visite a Biblioteca Digital Mundial

Reúne mapas, textos, fotos, gravações e filmes de todos os tempos e explica em sete idiomas as jóias e relíquias culturais de todas as bibliotecas do planeta.Entre os documentos mais antigos há alguns códices precolombianos, graças à contribuição do México, e os primeiros mapas da América, desenhados por Diego Gutiérrez para o rei de Espanha em 1562", explicou Abid.Os tesouros incluem o Hyakumanto darani , um documento em japonês publicado no ano 764 e considerado o primeiro texto impresso da história; um relato dos azetecas que constitui a primeira menção do Menino Jesus no Novo Mundo; trabalhos de cientistas árabes desvelando o mistério da álgebra; ossos utilizados como oráculos e esteiras chinesas; a Bíblia de Gutenberg; antigas fotos latino-americanas da Biblioteca Nacional do Brasil e a célebre Bíblia do Diabo, do século XIII, da Biblioteca Nacional da Suécia.

A Biblioteca Digital Mundial já está disponível na Internet, através do sítio: www.wdl.org

O acesso é gratuito e os usuários podem ingressar directamente pela Web , sem necessidade de se registrarem. Permite ao internauta orientar a sua busca por épocas, zonas geográficas, tipo de documento e instituição. O sistema propõe as explicações em sete idiomas (árabe, chinês, inglês, francês, russo, espanhol e português.

Visite Arqueologia Histórica em:http://arqueologiadigital.com/groups/group/show?id=1988290%3AGroup%3A813&xg_source=msg_mes_group

terça-feira, 30 de novembro de 2010

CRÔNICAS DO COTIDIANO

Recebi pela internet dois textos que me impressionaram muito.
O primeiro uma entrevista, onde não se sabe quem é o repórter, com o conhecido preso Marcola em alguma penitenciária de segurança máxima e o segundo um panfleto apócrifo proclamando a união das facções do crime.
Pareceu-me o enredo de algum novo filme entre bandidos e mocinhos em uma luta fratricida, telespetacular, tão popular hoje em dia. Uma ficção que começaria com uma entrevista com o comandante dos bandidos, no caso um intelectual de cadeia que começa, depois de dedicar o seu ócio prisional a leitura obsessiva de três mil livros, a teorizar sobre a sociedade dos miseráveis e da opção de uma maioria de jovens pelo crime do tráfico...

Aqui está o título e em seguida as primeiras sequências do filme:

Estamos todos no inferno

S1 - Dia – exterior – plano aéreo da região onde foi construída uma grande penitenciária de segurança máxima.

Narração:

"O homem nasceu livre e está sempre acorrentado.
Há quem se julgue dono dos outros, mas não deixa de ser mais escravo do que eles.
Quando um povo é obrigado a obedecer e obedece, faz bem; logo que ele pode romper o jugo, e o rompe, faz ainda melhor: pois, recuperando sua liberdade com o mesmo direito com que lhe foi tirada, ou é justo que ele a reconquiste, ou não era justo que lhe fosse tirada." (ROSSEAU, Jean Jacques. Contrato social).

O carro conduzindo o repórter chega à penitenciária.

S2 – Dia – interior – penitenciária

O repórter é conduzido pelo guarda até onde se encontra o preso.
Os dois se olham.
O guarda a pedido do repórter sai da sala separada por um vidro.
O repórter tira um gravador do bolso e começa a entrevista.

- Você é do PCC?
- Mais que isso, eu sou um sinal de novos tempos. Eu era pobre e invisível... Vocês nunca me olharam durante décadas... E antigamente era mole resolver o problema da miséria... O diagnóstico era óbvio: migração rural, desnível de renda, poucas favelas, ralas periferias... A solução é que nunca vinha... Que fizeram? Nada. O governo federal alguma vez alocou uma verba para nós? Nós só aparecíamos nos desabamentos no morro ou nas músicas românticas sobre a "beleza dos morros ao amanhecer", essas coisas... Agora, estamos ricos com a multinacional do pó. E vocês estão morrendo de medo... Nós somos o início tardio de vossa consciência social... Viu? Sou culto... Leio Dante na prisão...

- Mas, a solução seria...
- Solução? Não há mais solução, cara... A própria idéia de "solução" já é um erro. Já olhou o tamanho das 560 favelas do Rio? Já andou de helicóptero por cima da periferia de São Paulo? Solução como? Só viria com muitos bilhões de dólares gastos organizadamente, com um governante de alto nível, uma imensa vontade política, crescimento econômico, revolução na educação, urbanização geral; e tudo teria de ser sob a batuta quase que de uma "tirania esclarecida", que pulasse por cima da paralisia burocrática secular, que passasse por cima do Legislativo cúmplice (Ou você acha que os 287 sanguessugas vão agir? Se bobear, vão roubar até o PCC...) e do Judiciário, que impede punições. Teria de haver uma reforma radical do processo penal do país, teria de haver comunicação e inteligência entre polícias municipais, estaduais e federais (nós fazemos até conference calls entre presídios...) E tudo isso custaria bilhões de dólares e implicaria numa mudança psicossocial profunda na estrutura política do país. Ou seja: é impossível. Não há solução.

- Você não têm medo de morrer?
- Vocês é que têm medo de morrer, eu não. Aliás, aqui na cadeia vocês não podem entrar e me matar, mas eu posso mandar matar vocês lá fora. Nós somos homens-bomba. Na favela tem cem mil homens-bomba... Estamos no centro do Insolúvel, mesmo... Vocês no bem e eu no mal e, no meio, a fronteira da morte, a única fronteira.Já somos uma outra espécie, já somos outros bichos, diferentes de vocês. A morte para vocês é um drama cristão numa cama, no ataque do coração... A morte para nós é o presunto diário, desovado numa vala... Vocês intelectuais não falavam em luta de classes, em "seja marginal, seja herói"? Pois é: chegamos, somos nós! Ha, ha... Vocês nunca esperavam esses guerreiros do pó, né ?Eu sou inteligente. Eu leio, li 3.000 livros e leio Dante, mas meus soldados todos são estranhas anomalias do desenvolvimento torto desse país. Não há mais proletários, ou infelizes ou explorados. Há uma terceira coisa crescendo aí fora, cultivado na lama, se educando no absoluto analfabetismo, se diplomando nas cadeias, como um monstro Alien escondido nas brechas da cidade. Já surgiu uma nova linguagem. Vocês não ouvem as gravações feitas "com autorização da Justiça"? Pois é. É outra língua. Estamos diante de uma espécie de pós-miséria. Isso. Após-miséria gera uma nova cultura assassina, ajudada pela tecnologia, satélites, celulares, internet, armas modernas. É a merda com chips, com megabytes. Meus comandados são uma mutação da espécie social, são fungos de um grande erro sujo.

- O que mudou nas periferias?
- Grana. A gente hoje tem. Você acha que quem tem US$ 40 milhões como oBeira-Mar não manda? Com 40 milhões a prisão é um hotel, um escritório... Qual a polícia que vai queimar essa mina de ouro, tá ligado? Nós somos uma empresa moderna, rica. Se funcionário vacila, é despedido e jogado no "microondas"... ha, ha... Vocês são o Estado quebrado, dominado por incompetentes. Nós temos métodos ágeis de gestão.Vocês são lentos e burocráticos. Nós lutamos em terreno próprio. Vocês, em terra estranha. Nós não tememos a morte. Vocês morrem de medo. Nós somos bem armados. Vocês vão de três-oitão. Nós estamos no ataque.Vocês, na defesa. Vocês têm mania de humanismo. Nós somos cruéis, sem piedade. Vocês nos transformam em superstars do crime. Nós fazemos vocês de palhaços. Nós somos ajudados pela população das favelas, por medo ou por amor. Vocês são odiados. Vocês são regionais, provincianos. Nossas armas e produto vêm de fora, somos globais. Nós não esquecemos de vocês, são nossos fregueses. Vocês nos esquecem assim que passa o surto de violência.

- Mas o que devemos fazer?
- Vou dar um toque, mesmo contra mim. Peguem os barões do pó! Tem deputado, senador, tem generais, tem até ex-presidentes do Paraguai nas paradas de cocaína e armas. Mas quem vai fazer isso? O Exército? Com que grana? Não tem dinheiro nem para o rancho dos recrutas... O país está quebrado, sustentando um Estado morto a juros de 20% ao ano, e o Lula ainda aumenta os gastos públicos, empregando 40 mil picaretas. O Exército vai lutar contra o PCC e o CV? Estou lendo o Klausewitz, "Sobrea guerra". Não há perspectiva de êxito... Nós somos formigas devoradoras, escondidas nas brechas... A gente já tem até foguete antitanques... Se bobear, vão rolar uns Stingers aí... Pra acabar com a gente, só jogando bomba atômica nas favelas... Aliás, a gente acaba arranjando também "umazinha", daquelas bombas sujas mesmo... Já pensou?Ipanema radioativa?

- Mas, não haveria solução?
- Vocês só podem chegar a algum sucesso se desistirem de defender a "normalidade". Não há mais normalidade alguma. Vocês precisam fazer uma autocrítica da própria incompetência. Mas vou ser franco... na boa... na moral... Estamos todos no centro do insolúvel. Só que nós vivemos dele e vocês... não têm saída. Só a merda. E nós já trabalhamos dentro dela. Olha aqui, mano, não há solução. Sabe por quê? Porque vocês não entendem nem a extensão do problema. Como escreveu o divino Dante:"Lasciate ogna speranza voi che entrate!" Percam todas as esperanças... Estamos todos no inferno.
É o fim da entrevista!.

S.3 – Dia - interior – penitenciária.

O preso levantou-se e saiu da sala. Passa-se um tempo. Entra na sala o guarda que encaminha o repórter até a saída do presídio, mas antes passa para ele um papel que está escondido, enrolado na sua mão. O repórter abre o papel e entra apressado no carro que sai em disparada. No texto do Panfleto a convocação, quase política ideológica de todos os marginais na luta terrorista da aplicação dos decretos determinados pela união das facções do crime organizado.

O filme poderá contar a história desse exército de famintos até a tentativa final do seu extermínio feito pela invasão da polícia aos morros e periferias das grandes cidades.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

CELUKINO

Enquanto o Rio Pegava Fogo, Cabo Frio Botafogo.

Há na cidade de Cabo Frio um café comandado pela simpática e belíssima Dilene, onde se reúne um grupo eclético de pessoas da cidade e algumas personagens de fora, como eu que sou mineiro. Entre outros, podemos encontrar todas as tardes ali presentes, singular figuras da inteligência local. Falo do Professor Totonho, do comunista Babade, do jornalista Cabral, do empresário Fábio, dos políticos Janio do PDT e Cláudio do PSOL, do ator Caju, do empresário Zé, do articulista Duca, do desenhista Walber, do cineasta Marcelo, etc. Mas neste sábado, o papo político, as confabulações sobre o futuro do país, as últimas notícias da invasão policial nos morros do Rio, não conseguiram apagar o fogo da alma de todos que por lá apareceram. O bloco carnavalesco “Me Beija que Estou Carente” explodiu o seu grito de euforia convocando os foliões para esquecerem as tristezas e abraçarem a alegria da tradicional gozação que são os elementos primordiais da alma brasileira. A banda chegou, o surdo marcou, o tamborim repicou, os metais ativaram a memória das inesquecíveis marchinhas e os nossos amigos extravasaram no asfalto o que estava preso na garganta e Totonho o mais animado de todos deu o seu show de escárnio. Estava com o meu celular e não resisti o registro que aqui hoje publico.

domingo, 28 de novembro de 2010

Poesia

Ligadaço no Plantão
Emiliano Sette

Território Livre
Terrivelmente vive
Sob a égide do calibre

Macacos me mordam
Belisque o meu braço
Pra ver se acordo
E compro um peito de aço

Vou seguindo fugindo do mala
Desviando da bala
Do tapa na cara
Dos bandidos de farda

Trancafiado em casa
Da sala pro quarto
Do quarto pra sala

Paranóia urbana
Aglomeração humana
Só se pensa na grana
De baixo da cama
Ou num banco bacana

Grampos, câmeras
Blindados e grades por todos os lados
Correntes, cadeados
Tudo vigiado

24 horas

Ta ligado?

Notícia de Belo Horizonte


sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Crônicas do Cotidiano

O RIO PEGA FOGO III

Mais ataques incendiários movimentam a cidade com tiros e imagens aéreas de traficantes fugindo de carro, de moto e a pé, por um caminho de terra em direção ao outro morro vizinho. Carros e pneus pegando fogo tentam impedir a invasão policial. Tanques da marinha penetram favela adentro carregando bem protegidos o pessoal da tropa de elite da polícia que invadirá o morro. Tiros e correrias de curiosos, repórteres assustados portam coletes a prova de bala, é a guerra dos miseráveis, um novo Canudos sem Antônio Conselheiro, uma rebelião às avessas, uma nova matança que se inicia. As primeiras cenas da invasão são fotografadas por câmeras postadas nos helicópteros que sobrevoavam o campo de batalha, o espetáculo é visto de longe, mas podem-se ver detalhes das vielas do morro pelas poderosas teleobjetivas que observam paradas a garotada traficante, a maioria sem camisa, todos armados, correndo de um lado para o outro nos labirintos do grande complexo de becos, ruas, travessas, que cortam casas, casebres e barracos de alguns milhares de moradas que formam essa pobre comunidade. Na fuga desesperada dos bandidos um deles é atingido por um tiro e é arrastado por um amigo. O sangue mancha a terra seca da estrada de união das duas comunidades. Os bandidos fogem em massa, são mais de duzentos! Exclama o repórter da rede de televisão. Anoitece, a polícia toma posição de alerta e não se avança um passo a mais no território do inimigo, é muito perigoso, dizem eles. Todos esperam o dia amanhecer. Ai eu pergunto: Como nasce um bandido? Quem são eles? Qual é a história de cada um desses traficantes? Quem comanda as ações? Qual o número de traficantes que sofrem o comando de uma liderança? Essa ação da polícia de pacificação através da expulsão da comunidade de todos os bandidos resolverá o problema do tráfico e da criminalidade? Para onde vai esse dinheirão que se diz que o tráfico ganha neste comércio de droga? Como espalhar por todas as periferias miseráveis do estado, e depois do país, essas unidades de pacificação? Vocês não acham que tem alguma coisa errada nisso tudo? E se além de explodir carros, ônibus, eles comecem a explodir bombas em locais de grande afluxo de pessoas? Como conter ações de terroristas solitários? Aonde as autoridades governamentais querem chegar com essa estratégia de pacificação?

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Cronicas do Cotidiano

O RIO PEGA FOGO II

Depois dos novos ataques aos carros e voltando ao tema que cobrem as páginas dos jornais do país e do mundo, podemos identificar a ação incendiária que tomou conta do Rio como sendo um conluio entre os bandidos e os mocinhos das histórias em quadrinho do nosso cotidiano. O governo através da polícia infiltra-se nos morros com poder de fogo imbatível na mão de homens músculos, guerreiros munidos de alta tecnologia e depois de matar um grande número de inimigos, passam a tomar conta da comunidade, dos guetos que cobrem grande parte da cidade do Rio de Janeiro, em uma ação dita pacificadora que maquia a realidade social de todos que ali vivem com o manto frágil da paz antibelicista e antidroga. E assim acuados, os ditos marginais, se refugiam em outras localidades e se espalham como formigas provocando outros tipos de ações ilegais por todo o estado. Como eles vivem neste sistema cruel, “a cada bandido que morre nascem dois outros”, essa ação só seria vitoriosa e realmente pacificadora com o extermínio de todos bandidos, o que é impossível. Então a pergunta que eu faço é a quem esse tipo de ação pode interessar? Uma teia de aranha grande envolve esses episódios de quem mexe com drogas e armas. Você acredita que um bando de loucos, perseguidos, subnutridos e famintos, que faziam parte do tráfico nos morros cariocas e fugiram para outros complexos habitacionais, teriam criado por iniciativa própria esse tipo de ação que passa a ocorrer em cascata pelo estado de Rio? E se a onda incendiária se espalha para outros estados? Eles estão organizados em grupos que obedecem algum comando superior ou resolveram individualmente praticar esse tipo de ação? O burguês que perde o seu carrinho comprado a duras custas e que talvez ainda não acabou de pagar e quem vai pagar o pato? Os Bancos e suas seguradoras manterão os preços para o seguro do carro da classe média? Eu acho que não existe nada organizado, comando de penitenciaria distante, etc. O que acontece é que um homem isolado, por pura revolta, ateou fogo em um carro, criou o pânico, movimentou o noticiário e de uma maneira única, confusa, a onda se espalhou e os bandidos, com suas motos possantes, descobriram um meio seguro de intimidar o estado através da classe média apavorada. Estão dando o seu recado truncado. O grande perigo e agregar a violência gratuita ao espetáculo pirotécnico. O que o governo que iniciou essa ofensiva pode agora fazer? E o que a sociedade tem a oferecer além do caos?

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Crônica do Cotidiano

Meu amigo Sérgio Santeiro remeteu para lista de documentaristas, da qual participo, uma crônica dramática extraída do cotidiano sobre o desrespeito, o desconhecimento e o maltrato que um senhor de 66 anos pode sofrer em sua própria casa. Santeiro é um artista, um intelectual rebelde e revolucionário, professor na UFRJ, que construiu, assentando tijolo por tijolo, mano a mano, a sua casa, o seu devenir, de frente para o mar da cidade de Niterói, um lugar tranqüilo onde o velho comunista pudesse observar a natureza e ter a paz merecida de um guerreiro. Nosso amigo comum Gilberto Vasconcelos, também professor da UFMG, é quem me contou a história da obsessão desse homem de cinema pelo lugar onde ele hoje vive, descrevendo em detalhes os botecos da redondeza, onde ele bebeu uma boa branquinha e uma cervejinha gelada em sua companhia, disse-me ainda que quando foi visitá-lo a casa não havia sido mobiliada e que ele, mesmo assim, estava felicíssimo com o seu recanto encantado. Assim podemos agora ler com toda a dramaticidade a crônica que ele em desabafo sofrido nos remeteu.

Ser idoso
A última mas não a primeira, nem a segunda crise teve inicio, a meuver, quando manifestei há uns dois ou três meses a Ela o meu temor denão conseguir mais manter a casa com mais seis pessoas que constituema família dela.Nestes 30 anos sempre me esforcei por acompanhar e suprir material eafetivamente a criação de seus dois filhos então menores, hoje com 32e 35 anos respectivamente. Atravessamos momentos difíceis na relaçãocom o pai e os dois filhos. Até o segundo filho de seu primeirocasamento foi igualmente acolhido e nutrido por mim quando necessitou,ainda jovem.Ultimamente tenho com o mesmo empenho acompanhado e garantido acriação dos dois netos mais próximos que acabaram por morar conosco.Infelizmente, a retribuição tem sido terrível, além do rastro desujeira e bagunça que os adultos promovem pela casa inteira a qualquerhora e de qualquer maneira.Ao reclamar da cozinha suja que sempre deixam dias a fio sem lavar nemum copo, acabo ameaçado pelo caçula, hoje enorme (com uns 2 metros por3) marombeiro e vitaminado, e secundado pela irmã, tampouco franzina.Fazem coro na bagunça e ameaçam-me fisicamente.Sou um senhor de quase 66 anos que jamais fui sequer acusado deagressão a quem quer que seja. Fico triste ao ver que se queira agirassim comigo, ainda mais na minha própria casa que partilho com a mãedeles.Não creio que tenham direito a ocupar a casa à minha revelia e dojeito que fazem, com a sobrecarga dos serviços e das contas de luz,gás, água, alimentação etc. Nestes últimos três meses inesperadamentenão tenho trocado mais que três frases com Ela que, finalmente, hámais de um mês arrumou malas e não tem aparecido em casa.Em sua ausência, a insistência intempestiva dos enteados em prejudicaro funcionamento da casa motivou forte discussão e novas ameaças. Paraminha surpresa, Ela retorna e toma o partido dos filhos contra mim,recusando-se a discutir o que mais me preocupa que é a impossibilidadede continuar mantendo a casa praticamente sozinho.Novas discussões e exaltações de parte a parte e parece que chegamosao fim. Os filhos dela e seus pares continuam aqui atrapalhando tudo,luzes acesas, televisões ligadas, portas e janelas abertas etc,agravando ainda mais o custo de manutenção da casa que, apesar desolicitados, mãe e filhos jamais se dispuseram a considerar.Finalmente este mês repassei uma ou outra despesa para o novocompanheiro da enteada, e parece que assim se sentem ainda maisagressivos e desordeiros.Imagino que apenas Ela e eu temos direito ao abrigo e suporte da casa,afinal os demais tem pais e parentes vivos a quem solicitar além denós neste momento de impasse. E como persiste o ambiente de permanenteameaça, requeiro alguma providência acauteladora enquanto Ela e eu nosseparamos sem litígio, afinal temos em comum somente a casa.Apesar de muito apegado à casa, que construí com as minhas própriasmãos, concordo em vender a minha parte por um valor compatível com oimóvel e minhas necessidades, eliminando-se o vínculo que nos resta.Enquanto isso é necessário que os agregados se mudem daqui no máximoao final do ano letivo das crianças, que não podem ser prejudicadas.Não há como nem porque protelar a convivência impossível e agoradanosa entre nós.

Sergio Santeiro. 20/11/2010

domingo, 21 de novembro de 2010

Cinema de Invenção

Recolhi, em corte seco, do seu filme de longa metragem “O Vampiro da Cinemateca” (1975/77) onze minutos (10%) de alguns trechos que poderiam ilustrar o momento histórico em que ele foi filmado e passar, para quem ainda não conhece, um pouco do seu pensamento polêmico e idiossincrático. O filme é narrado na primeira pessoa pelos textos do próprio Jairo e de outros autores com sua voz distorcida como uma guitarra de Hendrix, e também por gestos e movimentos da sua figura- personagem quixotesca de forte presença ditirâmbica frente à câmera superoito. Nele pode-se reencontrar o discurso estético-poético da época de uma geração infelizmente hoje esquecido.

Pequena Homenagem ao Escritor, Crítico e Cineasta Jairo Ferreira.

Alo! Ministério da Cultura, da educação e do saber: Não seria uma má idéia fazer uma grande reunião com toda essa geração, todos esses personagens que estão presentes no livro do Jairo, os reunindo em uma grande mostra dos seus filmes no Festival de Brasília ou talvez, quem sabe, muito depois, em um encontro Kinespiritual na casa do Eliseu Visconti em Teresópolis.

Ambos os encontros poderiam muito bem serem registrados, documentados, por todos jovens entusiastas do cinema-futuro ali presentes trazendo nas mãos suas câmeras digitais e nas cabeças a memória do genial Jairo Ferreira e de todo o seu cinema de invenção.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Loucura Pouca é Bobagem

Clipes da Internet e seus (D) Efeitos Visuais.

Recebi (repasso aqui embaixo) outro dia pelo meu emeio um pequeno clipe da história dos efeitos especiais que nasceram com o cinema há 110 anos passado, em 1902, na Europa, com A Viagem a Lua de Méliès, Der Golem de Paul Vegener; Caligari de Robert Wiene; entre outros. Depois, na década de cinqüenta, surgiu o cinema de roliude com O Incrível Homem que Encolheu de Jack Arnold e finalizando a edição deste pequeno clipe, trecho de filme com os recursos atuais da tecnologia na criação dos efeitos visuais que são espalhados aos milhares pela Internet.
E assim, brincando com as imagens como sempre, eles vendem o impossível para o mundo dos incautos espectadores e ficamos espantados com o que nos parece verdade na fantasia do planeta Disney.
O fotógrafo do filme Amaxon, meu produtor e amigo Marcelo Pegado, anda estudando e criando alguns efeitos em vídeo HD e até está montando um site dedicado a essas suas experiências que na certa um dia serão úteis em algum filme de ficção poético-brasileiro.
Viva roliude e salve a tecnologia digital nipônico-americana da computação! São milhares de plug-ins e programas neste fantástico universo onde imagens com registro de qualidade e possibilidades infinitas de efeitos visuais parecem-nos vindas de outro mundo, onde jovens aficionados possuídos de todas as possibilidades criativas experimentam o novo, criando efeitos que no passado do cinema eram desenhados e trabalhados a exaustão, meses a fio pelas velhas trucas, sem contanto obter a qualidade que hoje se consegue em poucas horas de trabalho na frente de uma telinha de um computador caseiro, obtendo resultados nunca antes vistos pela mistura infinita de movimentos memorizados nos milhões de cálculos dos poderosos micros-chips e desenhados em sofisticados programas que fazem surgirem nas telinhas espalhadas pelo mundo imagens, que ainda não são, mas poderão ser ainda, futuristas, expressionistas, abstrações poéticas cheias de efeitos de arte e de beleza.
Vamos ao vídeo-filme em questão:

Só o futuro é moderníssimo.


Poesia de Cinema

Matéria Inséctil

De tempo em tempo
De páginas em páginas
Dos contos aos cantos
Das sombras as sombras
Só espero a partida que vem.

Esta luz de néon invade o cosmo
vinda do fundo de um cabaré.
Na minha alma um sonho
um átomo , um corpo estranho
tamanha luz , incêndio que não é.

Estranha entranha de caminho róseo
ideário vermelho a procura de ação
que insistentemente e sem nenhum propósito
rouba da escuridão o insólito ar do meu pulmão

Desejo insone do meu quarto chorinho.
Declamo tristes trovas de paixão e ódio
Lutando para não transformar em negócio
O resto da luz em matéria

É que o seu amor me conduz
entre a paz e a guerra
No princípio o caminho da artéria
e no fim o martírio da cruz

Luto o luto torto no contra mão da glória
Enigmas de um pobre poeta maluco
Preso no cipoal da história

Eu sei que te constrange o sopro do meu coração
Por esse seu sexo molhado quente tenho tesão
Gosto infinitamente de te passar a mão

Lavo minha língua solta nos seus ouvidos
Afasta-me aos gritos de horror
Palavras de dor e de prazer...
Minha língua fala e isto te assusta
Consola-me Amor
Tu tens um furor de menina
Tara animal ser uterina
Sem sexo sem nexo
Sou seu menino
Lambuzando-me em você.

Oh! Pode ser que eu me fodo
No batuque e na mandinga
No choro de uma cuíca dentro do trem da Central
No Brasil cineral...
No soluço de uma fêmea agasalhando o meu todo
Isto não é normal!

O grito do zagueiro no ritmo imortal de uma pelada
Um samba afina o cortejo que passa vai e volta mal
Uma entoada marchinha de meninas sacanas e abusadas
Tudo isso é carnaval!

No meio do povo o gringo trôpego penetra com
alma vadia o corpo da morena brejeira deixando
o bravo guerreiro explodir
nos sentimentos e na porra
de um mundo velho
repleto de fodas livres.

Que esta felina maldita
logo queira ao som de um grito
o fogo de graves e agudos
grunhido no tempo infinito
a música universal
súbitos sussurros
cai de novo de quatro
o animal em seu louvor
gesticulando o meu apêndice expele
navegando por gotas d`água
o gozo na perna esperma
aflito de vida bandida.

Rio, janeiro de 1978

domingo, 14 de novembro de 2010

Para meu amigo Gilberto Vasconcellos

LIBERDADE

Fala-se muito em liberdade, liberdade disso ou daquilo, liberdade de imprensa, de comércio e de posse. Fala-se e coloca-se a palavra, repleta de sentidos nobres, nas situações mais constrangedoras de engano e mal dizer. Liberdade não se amálgama com escravidão, servidão, sujeição. Liberdade, como dizem os filósofos, independente de quaisquer condições e limites, é o meio pelo qual o ser humano realiza a plena autodeterminação, constituindo a si mesmo e ao mundo que o cerca por sua capacidade inerente à ordem cósmica, concebida como natureza, universo ou realidade absoluta, fazendo-o existir com autonomia e autodeterminação ilimitada, desde que consigam agir e pensar como parte dessa realidade primordial e abrangente, harmonizando-se conscientemente com seus desígnios e suas aptidões, por meio dos quais a coletividade compreendendo as leis da natureza e os condicionamentos que pesam sobre a história universal, transforma o real com o objetivo de satisfazer suas necessidades materiais e intelectuais.
É deste ponto de vista libertário, distanciado e livre de mim mesmo, que pude observar e ter visões holísticas do vídeo que o professor Gilberto Vasconcellos fez comigo e que acabei de assistir. O vídeo que ele intitulou de “Sette Sétima Arte” é conversa-documento de uma geração. Eu e Gilberto, que é também sociólogo, escritor e crítico de arte, passamos horas na recepção de um hotel em Juiz de Fora, bebendo vinho, comendo queijo de minas e ruminando palavras em pensamentos expressos de maneira quase teatral, como se os dois personagens representassem em um só ato de meia hora todos os contornos de uma existência dedicada ao saber da arte na política e na cinematografia de todos os tempos. Fazíamos cinema como se fossemos gregos socráticos entre uma taça e outra de um bom “rouge” divino, sorvendo o que comíamos enquanto vivíamos sem restrições esse momento de prazer em poder se expressar com plena liberdade, na arte de um bom diálogo, todo o nosso conhecimento, quase toda a nossa história. Não discutíamos, nem queríamos persuadir um ao outro com suas idéias. A conversa, mesmo interpretada teatralmente com inflexões dramáticas e cômicas, principalmente por mim, foi muito bem gravada (posso dizer filmada), com movimentos precisos e ágeis do homem-câmera, criando nos planos-sequências segmentados pelo tempo-espaço das imagens, o conflito das lentes com o que foi retratado, aproximando-se nos clímax dramáticos e se afastando nas reflexões contemplativas e dedutivas do professor Gilberto, formalizando a ação contida nas palavras, valorizando a edição final em processo de corte seco, autofágico, sem identificar o protagonista como tal, livrando o observador da chata e entediante entrevista. A fotografia elétrica não intervém nos personagens e nem deixa, em nenhum momento, de observar o enquadramento perfeito, cinematográfico, das angulações preciosas. O começo misterioso, de suspense futurista, com o personagem-repórter pelas ruas (da Alphaville de Godard), procurando encontrar um homem 100%brazileiro. Através de toda a brasilidade de Câmara Cascudo, Oswald de Andrade, orientado pela batuta de Camargo Guarnieri, sob a inspiração do gringo Cassavete e a benção do transatlântico trotskista da história, Gilberto corta pela prosa a proa da poderosa lente kinoptik 9.8 retratando Kodak com seu olhos de aço afiado nos verdes mares do sul. E de binóculos no fim do nada e no começo de tudo podemos fazer o raio x de uma época conturbada pela vontade revolucionária de uma geração que ainda não passou e que possui a gazua e o x do problema. Evoé professor Gilberto e todos os seus meninos universitários, artistas dedicados que com muita criatividade e respeito participaram deste kinovídeo!

Estarei publicando o vídeo amanhã na página do KTV do Blog – Assistam!...

sábado, 13 de novembro de 2010

O Sábio da Venezuela

Ludovico Silva: A POESIA NO MARXISMO E O MARXISMO NA POESIA.

Gilberto Felisberto Vasconcellos

Ludovico Silva imagina Marx sentado no sofá vendo televisão horrorizado diante do superfetichismo da mercadoria. Ouve-se a voz de Marcuse falando que a forma da mercadoria no capitalismo monopolista é avassaladora. O que aí interessa não é o valor de uso, e sim o valor de troca, e muito menos o valor de verdade ou artístico. Então, a mais valia ideológica é o zênite do fetichismo da mercadoria. Neste livro escrito em 1971 (a televisão Globo nasceu 1965), Ludovico adverte os revolucionários latino-americanos sobre a importância da televisão e os fatores subjetivos. Camponês delatou guerrilheiros, operário votou em FHC, pastor da igreja universal é aclamado nas urnas, então o subdesenvolvimento deve ser visto pela condição subjetiva das pessoas moldada pela ideologia da televisão, que difunde a aceitação do subdesenvolvimento como um destino e, ao mesmo tempo, o desenvolvimentismo, ou seja, a possibilidade do capitalismo monopolista trazer o progresso para a maioria da população, sobretudo se esta comprar aparelho de televisão. Em cada país as empresas televisivas são específicas, mas o que Ludovico escreveu aplica-se não apenas à Venezuela, mas a todos os paises latino-americanos.
Glauber Rocha falava que o “Brasil era um país ocupado pelo Imperialismo”, e essa ocupação não se dava por tanques, marines ou aviões de guerra, mas sim pela televisão, que é um exército midiático gringo operado por mãos brasileiras para extrair a mais valia material e os recursos naturais dos trópicos, principalmente agora com o descalabro climático provocado pelo combustível fóssil que está em extinção, portanto o que se divisa neste século XXI é o território do trópico como fornecedor de energia e como o único remédio para a catástrofe climática.
A televisão é bancada pelo latifúndio agronegócio e as multinacionais. Se existe executivo do banco de Boston no banco Central, haverá a ocupação estrangeira na televisão brasileira comprada pelo capital estrangeiro. Não há possibilidade de o sistema televisivo continuar sob o controle do capital nacional. Se a infra-estrutura brasileira está nas mãos das grandes empresas multinacionais (somente as empresas multinacionais dominam o agronegócio), portanto essas empresas podem comprar a rede Globo, Record e outras televisões. Então não será surpreendente se todo sistema televisivo estiver nas mãos do capital estrangeiro, aliás, este já é o proprietário da mais valia ideológica.
Vale ressaltar à acústica que preside o ensaio de Ludovico Silva, e não só esse ensaio, vide, por exemplo, a teoria poética que vai de Homero a Rubem Dario. Ludovico era músico, tocava sanfona, seu pai era músico. Essa sensibilidade ao som fez com que apreendesse com mais argúcia o significado da televisão.

Beleza e Revolução
A necessidade vital do ouvido de Ludovico Silva para os brasileiros se educarem, sobretudo os professores universitários, cuja percepção acústica é deplorável. A educação musical e sonora na universidade brasileira é um desastre, então necessitamos dos ensinamentos de Ludovico para combater a surdez estrutural que nos persegue e para pensar a relação entre estética e política, como escreveu em seu livro extraordinário Beleza e Revolução, no qual dialoga com Marx, o Rimbald da economia política. Ludovico tinha ojeriza do economicismo e do pragmatismo supostamente realista que despreza a poesia.
A erradicação do subdesenvolvimento só será feita com socialismo, e nisso ele está sintonizado com o que há de melhor no pensamento de esquerda, Gunder Frank, Ruy Mauro Marini e Darcy Ribeiro. O grande poeta venezuelano escreveu livros e ensaios extraordinários sobre a literatura latinoamericana e do mundo inteiro, grega, latina, francesa, inglesa e norte-americana. O ouvido de Ludovico é a antítese do derrelicto sonoro e ruidoso sob o jugo da televisão, incluindo música popular, pop e sertaneja. A parafernália sonora extraí a mais-valia pelo ouvido para deixá-lo surdo em relação ao subdesenvolvimento. Ludovico foi leitor da escola de Frankfurt, mas não desconfiou da capacidade política do proletariado, não acreditou que tivesse chegado ao fim a missão do proletariado, não compartilhou do pessimismo frankfurtiano a respeito da integração conformista do proletariado na ordem social e industrial.
Embora se distanciasse do pessimismo da escola Frankfurt, concordava que a história do século XX, depois de 1945, não poderia ser entendida sem o aparato televisivo. Ludovico corrigiu Theodor Adorno: a indústria cultural não é cultural, porque a cultura desvela e é libertária, enquanto a ideologia é a essência desta indústria, encobridora, deformadora e falaciosa, portanto o melhor seria dizê-la indústria ideológica, no sentido marxista do vocábulo ideologia, algo que falseia a realidade em função de interesses materiais.
Ludovico traz a prosódia, a oralidade do povo, por isso não está apartado do folclore, escreveu sobre o estilo de Marx, sintonizando-o com Beethoven. Seu livro Letras e Pólvora se destaca pelo som da fala, como se o efeito do som da palavra dissipasse a neblina ideológica. A poesia é concebida como som e símbolo. A poesia também faz revoluções, ele dizia. A beleza é revolucionária; o capitalismo, feiúra. É pelo som da palavra que se poderia escapar da televisão-caverna e do capital monopolista financeiro.

Ócio e Filosofia
Quando reparo a oralidade de seu estilo, estou pensando no folclore tal como foi transfigurado musicalmente por Villa Lobos. É que no ouvido está o olho do povo. É mais ouvindo do que vendo, a produção do som sensibiliza o povo, a musica é a psicologia popular. A função do ouvido está em primeiro plano. Glauber Rocha foi artista da imagem e do som. Quando digo que no ouvido está o olho do povo, lembro o belo verso de Ludovico “si solo mirar el ojo escucha”. É a música na literatura como escreveu em seu livro A Filosofia da Ociosidade: “puede ser que algún músico del pueblo se haya interessado alguna vez por el ritmo encantador de mis frases y mis poemas”.
Ludovico juntou poesia, consciência estética do fazer literário, meta-linguagem informada pelas teorias literárias, falando 7 línguas entre tantas outras lidas, ao mesmo tempo tinha um conhecimento científico da sociedade ditado pelo marxismo, que é ciência da revolução proletária. A América Latina é caracterizada pela claridade dos trópicos, o sol vertical sobre a Venezuela. Ele adorava Mallarmé, a clareza harmoniosa, a melodia nítida, o poeta dos poetas.
Ludovico atribuía um poder imenso às palavras, se não fosse isso não seria poeta, embora soubesse que não é a música nem a poesia o motor da história. A história é movida pela luta de classes. Ele não tinha inibição de falar de si mesmo, de colocar a sua pessoa no estilo, o que não comprometeu em nada a objetividade de seus estudos. Escreveu mais de 10 livros sobre Karl Marx e o conceito de alienação. Conhecia muito a Europa, mas não se pode dizer que tivesse sido um intelectual eurocêntrico. Leu e estudou Marx como um latino-americano. O curioso é que não tematizou a selva, nem conheceu a Amazônia e o Brasil. Autor brasileiro, eu me deparei somente com Darcy Ribeiro, mesmo Villa Lobos não aparece como referencia, assim como não aparece o samba, não aparece o chorinho, não aparece Glauber Rocha, Ludovico se achava parecido com Engels. Eu não o vejo parecido com Engels. Eu o vejo parecido com meu amigo Sergio Santeiro. O poeta-filósofo venezuelano nasceu em 37, três anos mais velho que Glauber nascido em 1939.
Como Ludovico se tornou Ludovico? Como de Luís virou Ludovico? Quando estava na Espanha os amigos dele o chamaram de Ludovico, ai ficou o nome de Ludovico. E, antes disso, ele chegou ao marxismo pelo Sartre, lendo-o em Caracas mas ele não se ligou no Sartre, fala pouco do Sartre, fala bem, mas não foi uma figura nuclear em sua visão de mundo. O que o comoveu foi Marx, décadas estudando-o, tomando seus tragos em Caracas com Marx ao seu lado. Ludovico era afeiçoado ao bebum, escreveu um livro de poesia sobre o vinho, tematizou o álcool o tempo todo, afirmando que o álcool o mataria, o álcool estava levando-o à morte, ora dizia que largou o álcool, ora que não largou, morreu cedo com cinqüenta e poucos anos.

A MAIS VALIA IDEOLÓGICA
Em seu ensaio Sono Insone tematizou a sociedade latino-americana subdesenvolvida e os fatores responsáveis pela continuidade dessa situação deplorável, em que o capital desde o começo nasceu estrangeiro, a sociabilidade foi feita pela produção voltada para o mercado externo. E o que isso tem a ver com a televisão? O que o capital estrangeiro tem a ver com o efeito psico-cultural da televisão na sociedade brasileira agora?
A televisão do capital estrangeiro convence os explorados a aceitarem a exploração imperialista. A mais valia ideológica é a relação colônia-metrópole, por isso Ludovico é o grande autor da teoria marxista da ideologia no Terceiro Mundo. A mais valia material, extraída da força de trabalho, tem sua justificativa na indústria cultural. Assim, a mais valia ideológica opera com o não consciente do psiquismo, por onde se introjeta o subdesenvolvimento. Como é que subdesenvolvimento é introjetado no aparelho psíquico dos colonizados? Nisso entra a televisão, sobre a qual é impossível discorrer com neutralidade axiológica.
Ludovico retomou o conceito de Theodor Adorno sobre indústria cultural, elaborado há quatro décadas. E nessa indústria cultural sobressai a televisão como o suporte psíquico da sociedade, fator fundamental do conformismo e da aceitação do subdesenvolvimento como uma realidade ineliminável.
O estudo da televisão requer uma postura critica e não meramente descritiva, pois a descrição do efeito que exerce um programa na massa da população, sem uma abordagem critica, é mera algaravia fragmentada e superficial. Ludovico rebatizou o conceito de Adorno sobre indústria cultural; na verdade é indústria ideológica, e não indústria cultural, porque a cultura revela a realidade, a ideologia a encobre. Há um abismo entre ideologia e cultura, assim entre crença e ciência. A crença mascara, enquanto que a ciência desoculta, então Ludovico prefere falar em indústria ideológica, a mensagem imaterial justificadora da existência da exploração, tornando-a aceitável pelo povo. Essa mais valia ideológica, imersa na produção material, tem, no entanto uma dimensão não consciente, pré-consciente ou inconsciente, o homem comum presta lealdade ao capital material por intermédio dessa mais valia ideológica produtora de um excedente psíquico.
A televisão pode ser vista como uma terapia repressiva para as massas, é isso que dá aos donos do capital as condições de realizarem simultaneamente a extração da mais valia material e a da mais valia psíquica. A esfera psíquica de cada indivíduo é submetida à televisão para justificar o poder material do capital.
A televisão não pode ser considerada em si mesma, nem é propriamente uma extensão do olho, como dizia Mcluhan. É um olho, corrigiu Ludovico, que nos olha, então esse olho da televisão, esse olho pelo qual nos vemos e somos vistos, é o olho do capital. Esse olho-ouvido nos faz ver e ouvir, nós vemos e ouvimos com olho e ouvido constituídos pelo aparato televisivo. Ludovico assinala que a televisão é como um médium absorvente é uma mercadoria que nos faz ver outras mercadorias. A televisão fala da existência de outras mercadorias. A televisão é uma mercadoria no meio de outras mercadorias como o dinheiro, então ela é uma mercadoria especial no mundo capitalista, porque produz o excedente de trabalho imaterial, cujo beneficiário é o sistema de dominação material. A televisão é a exploração imaterial que torna possível a continuidade da exploração do capital. A televisão está dentro do processo de produção, mas atua como uma exploração imaterial.
Ludovico colocou outra questão essencial: a diferença de uma televisão em país desenvolvido e em país subdesenvolvido. Como é o subdesenvolvimento televisivo? A televisão do subdesenvolvimento – a televisão em um país subdesenvolvido - é a penetração imperialista, a esfera do imperialismo por excelência que justifica a extração da mais valia para os centros metropolitanos. É essa a função primordial da televisão no país subdesenvolvido. Embora em todo lugar a televisão seja a mesma coisa, ela atua como fator decisivo dessa produção material e imaterial na periferia do capitalismo, portanto a rigor é desprovida de qualquer particularidade nacional.

Televisão sem Anestesia
Cosmopolita tal qual o dinheiro, a televisão é um canal do imperialismo, embora possa existir proprietários nativos de televisão. Ludovico trata da aparência e essência, por exemplo: a ideologia não consiste nas opiniões e idéias manifestadas ou divulgadas pela televisão, assim como ela não aparece apenas nas opiniões e tendências expostas pelos partidos políticos. Isso é a aparência, mas a ideologia é produzida aquém e além desta aparência, por isso o conceito de mais valia ideológica trata da parte não consciente.
A ideologia do neocolonialismo está na televisão, mas isso não quer dizer que o sistema educacional e o sistema religioso tenham desaparecido. É que depois do surgimento do aparato tecnológico-eletrônico, do qual resulta a televisão, esses dois elementos - o religioso e o educacional - devem ser vistos em função do papel primordial da televisão. Antes de a pessoa entrar na universidade ou no sindicato, sua infância já foi moldada pela exploração imaterial e psíquica da televisão. Então a televisão é o fator determinante que abrange e incorpora a educação e a religião. A ênfase na dimensão imaterial é diferente quando se fala em navios ou trens que transportam mercadorias, pois a televisão transporta objetos imateriais, idéias, imagens e mensagens.
A televisão comunica a mercadoria, é um fator novo da exploração capitalista. É isso o que há de especifico na comunicação: transportar realidades imateriais. É impossível isolar a televisão do subdesenvolvimento, porque ela o reproduz. Então, a teoria do subdesenvolvimento necessariamente tem que incluir a televisão como objeto de estudo. A televisão é um componente fundamental da estrutura subdesenvolvida da sociedade latino-americana.
Ludovico Silva volta e meia em seus livros citava (e como ele era mestre em citar o pensamento de outros autores) a definição de cultura de Samir Amim: “ a cultura é o modo de organização e de utilização dos valores de uso”. A televisão extrai do trabalhador um excedente psíquico para fazê-lo aceitar a exploração do trabalho como algo natural e, muitas vezes, masoquisticamente desejado. Quanto mais a humanidade se converte em mercadoria, mais a TV se expande como medida do capitalismo, isto é, o modo de organização do valor de troca, seja telenovela ou jogo de futebol. A diversão no capitalismo é o momento do gol no futebol manipulado como o anúncio de automóvel.
A televisão nasceu das entranhas do imperialismo, sua irmã gêmea é a bomba atômica de 1945. Assassinado em 1940, Trotsky não viu o aparecimento da televisão anti-socialista. A televisão é o dólar em ação na mente e no espírito do espectador. A alquimia manipuladora da telenovela ou do futebol é aplaudida unanimemente por todos os partidos políticos depois que se foi Leonel Brizola, o último homem político que considerava a televisão uma serpente do capital monopolista.
O conceito de mais valia nasceu depois de Ludovico muito meditar acerca do vocábulo “ideologia” na obra de Marx, assunto sobre o qual escreveu dezenas de livros, tendo consciência de que o fazia melhor do que qualquer acerto na Europa e Estados Unidos, salvo as exceções como Ernesto Mandel e Maximilien Rubel.
O conceito de mais valia ideológica, que nega a distinção entre infra-estrutura econômica e superestrutura cultural, é de autoria de um poeta, crítico de arte, filósofo, dotado de uma sensibilidade para a linguagem, encarada sob o prisma da totalidade histórica, o que o levou a sincronizar o artista Charles Baudelaire, o poeta da modernidade (quem aliás inventou essa palavra) com Marx, o primeiro a fazer a análise revolucionária da sociedade capitalista em seu livro de 1859: A Crítica da Economia Política. Um não sabia da existência do outro, mas ambos tinham o capitalismo como inimigo em comum Ludovico observa que a poesia chegou com atraso na percepção de que no fundo da miséria humana existe o capital. Essa percepção se deu com o poeta Baudelaire que, não por acaso, se meteu nas barricadas de Paris no século XIX.

O Sol é do Povo
O que sobressai na bela crítica marxista de Ludovico é a recusa de ver o mundo em prateleiras separadas, por isso conseguiu elaborar com primor o conceito de mais-valia ideológica, valendo-se da filosofia que, segundo Platão, tão citado por ele, é a “ciências das coisas invisíveis”. Em seu livro sobre o poeta venezuelano Vicente Gerbasi, assinala que os “filósofos são meninos sérios”. Ludovico, o poeta-filósofo, em sua Teoria Poética, que vai de Homero a Vicente Gerbasi, sublinha que a obscura caverna descrita por Platão impede a entrada do “sol das idéias”, de modo que a caverna moderna é a televisão, o principal instrumento da industria ideológica do capitalismo, que na latitude subdesenvolvida do mundo tem efeito ainda mais pernicioso, porque na América Latina, como dizia Darcy Ribeiro, a população (antes de ingressar na letra, ou melhor, banida do alfabeto) está submetida ao bombardeiro da televisão deseducadora. Nada pior do que um pobre analfabeto cabeça feita pela televisão.
É possível estabelecer a constelação entre o descenso da consciência da classe operária e a emergência da televisão como produtora de mais-valia ideológica. Com certeza o anti-capitalista Jean Luc Godard estava ciente dessa correlação quando afirmou, tal qual Ludovico a respeito do “sol das idéias”, que o cinema era a luz do pintor Cezane Iluminando a caverna de Platão. No Brasil de hoje (basta observar os candidatos à presidência da República) é pela televisão que se produz, no som e na imagem, isto é, nos meios mentais de produção, a ilusão do desenvolvimentismo que não é senão a máscara do imperialismo norte-americano dentro de casa.
A televisão na América Latina é uma agência local de interesses estrangeiros. Não só econômicos, mas de ordem cultural, quer dizer, é uma agência de interesses estrangeiros com estereótipos culturais. Ludovico se vale da metodologia de Adorno, segundo a qual a televisão, quer como aparelho emissor quer como receptor, lida com o inconsciente, por isso é que a pesquisa empírica sobre o público baseada em pergunta e resposta, é falha porque o significado da televisão está em se apossar do inconsciente das pessoas, daí o conceito de mais valia ideológica.
A mensagem da telenovela é a seguinte: a miséria capitalista é inevitável, portanto o remédio é aceitá-la, daí o conformismo que aparece na telenovela, todas as telenovelas são rigorosamente iguais. A grande contribuição conceitual de Ludovico é mostrar que o produtor, o receptor da televisão, é um produtor de mais valia ideológica com a adesão não consciente ao sistema de exploração.
Este ensaio notável, sono-insone, traduzido para o português, dá em sonho-insônia, paradoxo que ele tomou de um texto de Adorno sobre a televisão, a quem homenageia no ano da morte do pensador alemão em 1971. Mas Ludovico vai além de Adorno quando aborda do ponto de vista histórico as coisas, os olhos, e os ouvidos, baseando-se na escola de Frankfurt, como ele mesmo diz, sublinhando a história no objeto apreendido e no órgão que o apreende. Ludovico neste ensaio pergunta (parecido nesse aspecto com Jean Luc Godard) o que é ver e ouvir na era da televisão? O que é o olho numa sociedade cujo olhar é feito pela televisão? E o que isso implica na maneira de entender a sociedade? Responde a essas questões com a teoria do subdesenvolvimento capitalista latino-americano. É isso o que o diferencia de outros autoes que teorizaram subdesenvolvimento capitalista como Gunder Frank, Jorge Abelardo Ramos, Ruy Mauro Marini e Darcy Ribeiro. É o destaque dado à função desempenhada pela televisão no subdesenvolvimento, ou seja, a ideologia televisiva do subdesenvolvimento como responsável pela miséria e o atraso, nesse aspecto sendo mais importante do que a religião e a educação. Ele percebeu a televisão como fator ideológico no inicio da década de 70. Algo parecido foi feito por Glauber Rocha, que, aliás, não se encontrou com Ludovico, sendo três anos mais novo que o ensaísta venezuelano. Eles poderiam ter se encontrado: Glauber, o Marx; Ludovico, o Engels, pois Ludovico gostava de dizer que ele era parecido com Engels. Embora Glauber e Ludovico não tivessem se encontrado, eles tematizaram a ideologia do subdesenvolvimento. A Motion Pictures começou nos anos 50 com JK, portanto converteu-se em um fator essencial nos rumos da história do Brasil.
Glauber pensou a comunicação e a história. Não que a história fosse feita pela comunicação, mas sem a comunicação é impossível entender os rumos da história do Brasil. A televisão, segundo Ludovico, é o principal instrumento para produzir e perpetuar o capitalismo monopolista. A cabeça do colonizado é feita pela televisão que hipnotiza a população. Ludovico trata de três elementos fundamentais: subdesenvolvimento, televisão e ideologia. A televisão é por onde se faz a ofensiva psíquica do imperialismo. Escreveu isso em 1971, paralelamente a Glauber Rocha, o que enseja algumas reflexões, sobretudo agora durante a Copa do mundo. O que é pensar o futebol do ponto de vista do valor de troca, isto é, o futebol como mercadoria? Afinal, não existe futebol como uma esfera separada da televisão, a televisão é futebol, a televisão faz com que o esporte exista na sociedade contemporânea, eu diria até que cada gol é a celebração da televisão como mercadoria e aparato de domínio. Por isso eu compartilho da tese de Glauber Rocha e Oswald de Andrade, segundo a qual o futebol é uma alienação perpetrada pela indústria ideológica na sociedade brasileira, sem mencionar o meu saudoso amigo José Róiz: esporte mata.
A televisão é a ideologia do futebol ou o futebol é a ideologia da televisão? É impossível imaginar um Maracanã chamado Karl Marx, um Morumbi chamado Engels, ou um Mineirão chamado Lênin ou Trotsky. O fetichismo do chute na bola é o equivalente universal do dinheiro no atual capitalismo. Capitalismo vídeofinanceiro, eu o batizei em meu livro O Príncipe da Moeda. Haja mercadoria, haverá fetichismo, então por que somos levados à supertição de que a bola na rede é momento lúdico e não valor de troca? Por intermédio da televisão, quem faz o gol é o capital. Os trocadores de passe no campo são os trocadores de valor, que aliás o que nós somos no sistema capitalista de produção de mercadorias, pois existimos como portadores de valores que se trocam entre si. Isso não ocorre apenas quando determinado atleta faz anuncio comercial na televisão: compre isso e converta-se na minha pessoa de sucesso. É isso o intercâmbio da pessoa (mercadoria) do jogador com o produto reificado. O campo de futebol é o mercado de proprietários privados.
Glauber Rocha dizia que Pelé chutava a cabeça do povo brasileiro. O futebol é contra o socialismo. O futebol satisfaz as demandas mundiais do mercado capitalista. Nada mais do que isso.

*Gilberto Felisberto Vasconcellos é Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora.
E-mail: gilbertovasconcellos@yahoo.com.br