ABAIXO TEXTOS - CRÍTICAS - ENSAIOS - CONTOS - ROTEIROS CURTOS - REFLEXÕES - FOTOS - DESENHOS - PINTURAS - NOTÍCIAS

Translate

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

CONTO DE REIS


DE VENTO EM POPA

Fabio Carvalho


Dizer que os espectadores entram no cinema como vão, ou iriam, ao bordel, não deixa de ser chocante, mesmo atenuando-se bastante a idéia com o acréscimo de que isso sucede sob um ângulo bem particular do exame. As necessidades que o cinema e a prostituição satisfazem são as mesmas. Tenho a impressão de que meus propósitos ficarão mais claros e menos chocantes se, invertendo agora a maneira de ver as coisas, eu lembrar que com muita frequência os homens vão ao bordel como vão ao cinema. Os homens, os mais jovens em menor medida, e os adultos plenamente, vão ao bordel em busca da ficção. Esta reflexão foi retirada por mim do letreiro inicial do filme Lucia McCartney do cineasta David Neves. Tive o privilégio de conhecer e de filmar este autor tão pouco visto ou lido do cinema brasileiro. Assim nasce a composição, quem pensava que a fonte secou, não sabia que a vida começou. Quando a cidade amanhecer é carnaval. Bastou uma nova visão de três de seus filmes em sequência, no mesmo dia fervente de sábado, para abreviar o longo percurso que tenho que percorrer em busca de mim mesmo. Retornei ao fugidio e sinuoso caminho da minha própria sensibilidade. Formosa não faz assim.  Ficção palavra diretamente ligada à fantasia. A música e o cinema, artes que se entendem. E eu então que sou tão só. Vale sempre lembrar o que Jean Luc Godard disse: a ficção é o documentário do imaginário do autor. Cinema, sonho e lucidez. Com seus olhos de inesperadas amêndoas, I love you Maria. Teus olhos molhados. O foguetório imponderável para aquele horário da Sexta–Feira de Verão terminou junto com a última faixa do CD que tocava no computador, sendo assim, fiz um brinde ao mistério dos acontecimentos naturais do cotidiano. Só com as palavras posso tentar conseguir te deixar molhadinha. Tenho que esperar o momento exato para começar. Tudo incide na reflectância alva daquela necessidade só minha, que não tem nada a ver com as da humanidade. O próximo passo será descobrir as rosas em vários tons das cortinas internas, numa saturação inconsequente. O carreto chegou com a geladeira branquinha em pé amarrada na carroceria da Kombi velha. Depois de exibi-la aberta para a mulher opulenta dona da porta de usados na Rua Padre Belchior, o senhor baixinho atarracado da cabeça branca começou o descarregamento junto com o seu assistente manquitola. Uma engenharia muito bem treinada. Ainda pivete a personagem do Irving São Paulo fala para seu comparsa pretinho no calçadão da lagoa Rodrigo de Freitas: “qualé mano? Jacaré que dorme vira bolsa”. Entre o sim e o não há uma palavra o talvez. Muito Prazer o nome do filme. Três arquitetos e três meninos de rua observam-se, entrecruzam-se, sem nunca se misturarem diante das impossibilidades morais e sociais na zona sul do Rio de Janeiro. E temos as mulheres. Quem não foi ao finado cine Palladium ver um filme com este nome não sabe o que perdeu. No outro ela, a música no mesmo espaço luxuoso de projeção: “me dá teu sorriso para guardar. Será para o mar o teu segredo. Acaso será esta estória uma ilusão? O sol de repente para na esquina”. A primeira visão destes filmes que contém um arguto exame das relações, na fase de transição do fim da adolescência, justamente quando a gente acha que sabe tudo, serviu para apertar meus parafusos e quem sabe tentar aprender um pouquinho vivendo a vida em crescimento cabal.  De toda forma tenho sonhado, sofrido e me divertido até hoje, quase na mesma medida, tendo aprendido praticamente nada, já que todo dia novo dia novas circunstancias se apresentam. Vamos lá sem correr porque o que não temos é tempo para desperdiçar com velocidades desnecessárias. O moderno teor da investigação naturalista dos costumes contemporâneos desse cinema me deu e dá tanto prazer quanto uma degustação do drink especial refrescante em um fim de tarde degradé acompanhado por ostras frescas. Prazeres telúricos. Nosso Diplomata Arnaldo Carrilho descreveu o David Neves: “era um carioca-mineiro, conheceu melhor as circunstâncias dos seres humanos e amava suas fraquezas sem demonstrações de pejo ou distanciamentos preconceituosos. Tudo isso está nos seus filmes, desde Mauro, Humberto, até Jardim de Alah. Como cineasta os olhos de David conduzem-nos a essa ironia extrema de tratar o simples com a transcendência superior da lógica. A luz do seu pensamento jorra para dentro do seu próprio olho”.  O olho do cinema observando na altura do olho.  A câmera filma o pensamento. Não temos mais princípios é só o nosso meio. Saúde, proteção e meios desejavam nossos progenitores.  A bela personagem em sua diáfana nudez em frente ao espelho no terceiro andar do edifício era observada por três pivetes trepados na árvore em frente à janela através de cortinas esvoaçantes. Cruzei com meu amigo contra-baixista na escadaria do La Traviatta, e perguntei brincando: e o baixo? Sorrindo respondeu: está cada vez mais alto. Manhã com música. “Te quero menina, estrela de um filme, estória de amor, te vejo em meu sonho de felicidade, luz de verão”.  

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Loucura Pouca é Bobagem


Estamos à beira da total auto-destruição?
Noam Chomsky

O que o futuro trará? Uma postura razoável seria tentar olhar para a espécie humana de fora. Então imagine que você é um extraterrestre observador que está tentando desvendar o que acontece aqui ou, imagine que és um historiador daqui a 100 anos – assumindo que existam historiadores em 100 anos, o que não é óbvio – e você está olhando para o que acontece. Você veria algo impressionante.
Pela primeira vez na história da espécie humana, desenvolvemos claramente a capacidade de nos destruirmos. Isso é verdade desde 1945. Agora está finalmente sendo reconhecido que existem mais processos de longo-prazo como a destruição ambiental liderando na mesma direção, talvez não à destruição total, mas ao menos à destruição da capacidade de uma existência decente.
E existem outros perigos como pandemias, as quais estão relacionadas à globalização e interação. Então, existem processos em curso e instituições em vigor, como sistemas de armas nucleares, os quais podem levar à explosão ou talvez, extermínio, da existência organizada.
Como destruir o planeta sem tentar muito
A pergunta é: O que as pessoas estão fazendo a respeito? Nada disso é segredo. Está tudo perfeitamente aberto. De fato, você tem que fazer um esforço para não enxergar.
Houveram uma gama de reações. Têm aqueles que estão tentando ao máximo fazer algo em relação à essas ameaças, e outros que estão agindo para aumentá-las. Se olhar para quem são, esse historiador futurista ou extraterrestre observador veriam algo estranho. As sociedades menos desenvolvidas, incluindo povos indígenas, ou seus remanescentes, sociedades tribais e as primeiras nações do Canadá, que estão tentando mitigar ou superar essas ameaças. Não estão falando sobre guerra nuclear, mas sim desastre ambiental, e estão realmente tentando fazer algo a respeito.
De fato, ao redor do mundo – Austrália, Índia, América do Sul – existem batalhas acontecendo, às vezes guerras. Na Índia, é uma guerra enorme sobre a destruição ambiental direta, com sociedades tribais tentando resistir às operações de extração de recursos que são extremamente prejudiciais localmente, mas também em suas consequências gerais. Em sociedades onde as populações indígenas têm influência, muitos tomam uma posição forte. O mais forte dos países em relação ao aquecimento global é a Bolívia, cuja maioria é indígena e requisitos constitucionais protegem os “direitos da natureza”.
O Equador, o qual também tem uma população indígena ampla, é o único exportador de petróleo que conheço onde o governo está procurando auxílio para ajudar a manter o petróleo no solo, ao invés de produzi-lo e exportá-lo – e no solo é onde deveria estar.
O presidente Venezuelano Hugo Chávez, que morreu recentemente e foi objeto de gozação, insulto e ódio ao redor do mundo ocidental, atendeu a uma sessão da Assembléia Geral da ONU a poucos anos atrás onde ele suscitou todo tipo de ridículo ao chamar George W. Bush de demônio. Ele também concedeu um discurso que foi interessante. Claro, Venezuela é uma grande produtora de petróleo. O petróleo é praticamente todo seu PIB. Naquele discurso, ele alertou dos perigos do sobreuso dos combustíveis fóssil e sugeriu aos países produtores e consumidores que se juntassem para tentar manejar formas de diminuir o uso desses combustíveis. Isso foi bem impressionante da parte de um produtor de petróleo. Você sabe, ele era parte índio, com passado indígena. Esse aspecto de suas ações na ONU nunca foi reportado, diferentemente das coisas engraçadas que fez.
Então, em um extremo têm-se os indígenas, sociedades tribais tentando amenizar a corrida ao desastre. No outro extremo, as sociedades mais ricas, poderosas na história da humanidade, como os EUA e o Canadá, que estão correndo em velocidade máxima para destruir o meio ambiente o mais rápido possível. Diferentemente do Equador e das sociedades indígenas ao redor do mundo, eles querem extrair cada gota de hidrocarbonetos do solo com toda velocidade possível.
Ambos partidos políticos, o presidente Obama, a mídia, e a imprensa internacional parecem estar olhando adiante com grande entusiasmo para o que eles chamam de “um século de independência energética” para os EUA. Independência energética é quase um conceito sem significado, mas botamos isso de lado. O que eles querem dizer é: teremos um século no qual maximizaremos o uso de combustíveis fóssil e contribuiremos para a destruição do planeta.
E esse é basicamente o caso em todo lugar. Admitidamente, quando se trata de desenvolvimento de energia alternativa, a Europa está fazendo alguma coisa. Enquanto isso, os EUA, o mais rico e poderoso país de toda a história do mundo, é a única nação dentre talvez 100 relevantes que não possui uma política nacional para a restrição do uso de combustíveis fóssil, e que nem ao menos mira na energia renovável. Não é por que a população não quer. Os americanos estão bem próximos da norma internacional com sua preocupação com o aquecimento global. Suas estruturas institucionais que bloqueiam a mudança. Os interesses comerciais não aceitam e são poderosos em determinar políticas, então temos um grande vão entre opinião e política em muitas questões, incluindo esta. Então, é isso que o historiador do futuro veria. Ele também pode ler os jornais científicos de hoje. Cada um que você abre tem uma predição mais horrível que a outra.
“O momento mais perigoso na história”
A outra questão é a guerra nuclear. É sabido por um bom tempo, que se tivesse que haver uma primeira tacada por uma super potência, mesmo sem retaliação, provavelmente destruiria a civilização somente por causa das consequências de um inverno-nuclear que se seguiria. Você pode ler sobre isso no Boletim de Cientistas Atômicos. É bem compreendido. Então o perigo sempre foi muito pior do que achávamos que fosse.
Acabamos de passar pelo 50o aniversário da Crise dos Mísseis Cubanos, a qual foi chamada de “o momento mais perigoso na história” pelo historiador Arthur Schlesinger, o conselheiro do presidente John F. Kennedy. E foi. Foi uma chamada bem próxima do fim, e não foi a única vez tampouco. De algumas formas, no entanto, o pior aspecto desses eventos é que a lições não foram aprendidas.
O que aconteceu na crise dos mísseis em outubro de 1962 foi petrificado para parecer que atos de coragem e reflexão eram abundantes. A verdade é que todo o episódio foi quase insano. Houve um ponto, enquanto a crise chegava em seu pico, que o Premier Soviético Nikita Khrushchev escreveu para Kennedy oferecendo resolver a questão com um anuncio publico de retirada dos mísseis russos de Cuba e dos mísseis americanos da Turquia. Na realidade, Kennedy nem sabia que os EUA possuíam mísseis na Turquia na época. Estavam sendo retirados de todo modo, porque estavam sendo substituídos por submarinos nucleares mais letais, e que eram invulneráveis.
Então essa era a proposta. Kennedy e seus conselheiros consideraram-na – e a rejeitaram. Na época, o próprio Kennedy estimava a possibilidade de uma guerra nuclear em um terço da metade. Então Kennedy estava disposto a aceitar um risco muito alto de destruição em massa afim de estabelecer o princípio de que nós – e somente nós – temos o direito de deter mísseis ofensivos além de nossas
 fronteiras, na realidade em qualquer lugar que quisermos, sem importar o risco aos outros – e a nós mesmos, se tudo sair do controle. Temos esse direito, mas ninguém mais o detém.
No entanto, Kennedy aceitou um acordo secreto para a retirada dos mísseis que os EUA já estavam retirando, somente se nunca fosse à publico. Khrushchev, em outras palavras, teve que retirar abertamente os mísseis russos enquanto os EUA secretamente retiraram seus obsoletos; isto é, Khrushchev teve que ser humilhado e Kennedy manteve sua pose de macho. Ele é altamente elogiado por isso: coragem e popularidade sob ameaça, e por aí vai. O horror de suas decisões não é nem mencionado – tente achar nos arquivos.
E para somar um pouco mais, poucos meses antes da crise estourar os EUA haviam mandado mísseis com ogivas nucleares para Okinawa. Eram mirados na China durante um período de grande tensão regional.
Bom, quem liga? Temos o direito de fazer o que quisermos em qualquer lugar do mundo. Essa foi uma lição daquela época, mas haviam outras por vir.
Dez anos depois disso, em 1973, o secretário de estado Henry Kissinger chamou um alerta vermelho nuclear. Era seu modo de avisar à Rússia para não interferir na constante guerra Israel-Árabes e, em particular, não interferir depois de terem informado aos israelenses que poderiam violar o cessar fogo que os EUA  e a Rússia haviam concordado. Felizmente, nada aconteceu.
Dez anos depois, o presidente em vigor era Ronald Reagan. Assim que entrou na Casa Branca, ele e seus conselheiros fizeram com que a Força Aérea começasse a entrar no espaço aéreo Russo para tentar levantar informações sobre os sistemas de alerta russos, Operação Able Archer. Essencialmente, eram ataques falsos. Os Russos estavam incertos, alguns oficiais de alta patente acreditavam que seria o primeiro passo para um ataque real. Felizmente, eles não reagiram, mesmo sendo uma chamada estreita. E continua assim.

O que pensar das crises nucleares Iraniana e Norte-Coreana
No momento, a questão nuclear está regularmente nas capas nos casos do Irã e da Coréia do Norte. Existem jeitos de lidar com esse crise contínua. Talvez não funcionasse, mas ao menos tentaria. No entanto, não estão nem sendo consideradas, nem reportadas.
Tome o caso do Irã, que é considerado no ocidente – não no mundo árabe, não na Ásia – a maior ameaça à paz mundial. É uma obsessão ocidental, e é interessante investigar as razões disso, mas deixarei isso de lado. Há um jeito de lidar com a suposta maior ameaça à paz mundial? Na realidade existem várias. Uma forma, bastante sensível, foi proposta alguns meses atrás em uma reunião dos países não alinhados em Teerã. De fato, estavam apenas reiterando uma proposta que esteve circulando por décadas, pressionada particularmente pelo Egito, e que foi aprovada pela Assembléia Geral da ONU.
A proposta é mover em direção ao estabelecimento de uma zona sem armas nucleares na região. Essa não seria a resposta para tudo, mas seria um grande passo à frente. E haviam modos de proceder. Sob o patrocínio da ONU, houve uma conferência internacional na Finlândia dezembro passado para tentar implementar planos nesta trajetória. O que aconteceu? Você não lerá sobre isso nos jornais pois não foi divulgado – somente em jornais especialistas.
No início de novembro, o Irã concordou em comparecer à reunião. Alguns dias depois Obama cancelou a reunião, dizendo que a hora não estava correta. O Parlamento Europeu divulgou uma declaração pedindo que continuasse, assim como os estados árabes. Nada resultou. Então moveremos em direção a sanções mais rígidas contra a população Iraniana – não prejudica o regime – e talvez guerra. Quem sabe o que irá acontecer?
No nordeste da Ásia, é a mesma coisa. A Coréia do Norte pode ser o país mais louco do mundo. É certamente um bom competidor para o título. Mas faz sentido tentar adivinhar o que se passa pela cabeça alheia quando estão agindo feito loucos. Por que se comportariam assim? Nos imagine na situação deles. Imagine o que significou na Guerra da Coréia anos dos 1950’s o seu país ser totalmente nivelado, tudo destruído por uma enorme super potência, a qual estava regozijando sobre o que estava fazendo. Imagine a marca que deixaria para trás.
Tenha em mente que a liderança Norte Coreana possivelmente leu os jornais públicos militares desta super potência na época explicando que, uma vez que todo o resto da Coréia do Norte foi destruído, a força aérea foi enviada para a Coréia do Norte para destruir suas represas, enormes represas que controlavam o fornecimento de água – um crime de guerra, pelo qual pessoas foram enforcadas em Nuremberg. E esses jornais oficiais falavam excitadamente sobre como foi maravilhoso ver a água se esvaindo, e os asiáticos correndo e tentando sobreviver. Os jornais exaltavam com algo que para os asiáticos fora horrores para além da imaginação. Significou a destruição de sua colheita de arroz, o que resultou em fome e morte. Quão maravilhoso! Não está na nossa memória, mas está na deles.
Voltemos ao presente. Há uma história recente interessante. Em 1993, Israel e Coréia do Norte se moviam em direção a um acordo no qual a Coréia do Norte pararia de enviar quaisquer mísseis ou tecnologia militar para o Oriente Médio e Israel reconheceria seu país. O presidente Clinton interveio e bloqueou. Pouco depois disso, em retaliação, a Coréia do Norte promoveu um teste de mísseis pequeno. Os EUA e a Coréia do Norte chegaram então a um acordo em 1994 que interrompeu seu trabalho nuclear e foi mais ou menos honrado pelos dois lados. Quando George W. Bush tomou posse, a Coréia do Norte tinha talvez uma arma nuclear e verificadamente não produzia mais.
Bush imediatamente lançou seu militarismo agressivo, ameaçando a Coréia do Norte – “machado do mal” e tudo isso – então a Coréia do Norte voltou a trabalhar com seu programa nuclear. Na época que Bush deixou a Casa Branca, tinham de 8 a 10 armas nucleares e um sistema de mísseis, outra grande conquista neoconservadora. No meio, outras coisas aconteceram. Em 2005, os EUA e a Coréia do Norte realmente chegaram a um acordo no qual a Coréia do Norte teria que terminar com todo seu desenvolvimento nuclear e de mísseis. Em troca, o ocidente, mas principalmente os EUA, forneceria um reator de água natural para suas necessidades medicinais e pararia com declarações agressivas. Eles então formariam um pacto de não agressão e caminhariam em direção ao conforto.
Era muito promissor, mas quase imediatamente Bush menosprezou. Retirou a oferta do reator de água natural e iniciou programas para compelir bancos a pararem de manejar qualquer transação Norte Coreana, até mesmo as legais. Os Norte Coreanos reagiram revivendo seu programa de armas nuclear. E esse é o modo que se segue.
É bem sabido. Pode-se ler na cultura americana principal. O que dizem é: é um regime bem louco, mas também segue uma política do olho por olho, dente por dente. Você faz um gesto hostil e responderemos com um gesto louco nosso. Você faz um gesto confortável e responderemos da mesma forma.
Ultimamente, por exemplo, existem exercícios militares Sul Coreanos-Americanos na península Coreana a qual, do ponto de vista do Norte, tem que parecer ameaçador. Pensaríamos que estão nos ameaçando se estivessem indo ao Canadá e mirando em nós. No curso disso, os mais avançados bombardeiros na história, Stealth B-2 e B-52, estão travando ataques de bombardeio nuclear simulados nas fronteiras da Coréia do Norte.
Isso, com certeza, reacende a chama do passado. Eles lembram daquele passado, então estão reagindo de uma forma agressiva e extrema. Bom, o que chega no ocidente derivado disso tudo é o quão loucos e horríveis os líderes Norte Coreanos são. Sim, eles são. Mas essa não é toda a história, e esse é o jeito que o mundo está indo.

Não é que não haja alternativas. As alternativas somente não estão sendo levadas em conta. Isso é perigoso. Então, se me perguntar como o mundo estará no futuro, saiba que não é uma boa imagem. A menos que as pessoas façam algo a respeito. Sempre podemos.

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Despedida de Adeus

       Vinicius e Suzana de Moraes
ADEUS SUZANA


Fiquei muito abalado com a morte de minha querida amiga Suzana de Moraes. De todos os meus amigos que já partiram, foi ela quem mais me emocionou. Fiquei espantado com a notícia, um pouco fora de mim e chorei. Tanto tempo longe um do outro, logo nós que vivemos momentos inesquecíveis na década de setenta. Mas assim é a vida. Eu morando em Cabo Frio e ela no Alto da Boa Vista. A nossa amiga em comum Marta Luz me pediu um dia para ir visitá-la, ela queria me ver, talvez despedir, não pude ir, como me arrependo. Descobri hoje, que mesmo distante, de como eu gostava daquela mulher. Assim resolvi retirar do meu filme Bandalheira Infernal de 1975, onde ela foi atriz, um pequeno trecho para homenagea-la com todo meu carinho e resgatar, de pronto, para todos os amigos um pedacinho, quase insignificante de sua rica presença na vida cultural brasileira, fotogramas das nossas memórias cinematográficas. 

sábado, 24 de janeiro de 2015

RECADO

No estado capitalista a corrupção é um negócio onde todos participam em diferentes escalas do poder. Não há solução. Como diria Machado: " Não jureis nunca a verdade, pois a verdade nua e crua além de indecente é dura de roer. Mas jurai a propósito de tudo, pois os homens acreditam piamente muito mais nos que juram falso, do que naqueles que não juram nada. Se disseres que o sol apagou, todos acenderão velas."

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Loucura Pouca é Bobagem



Asteroide que passará “raspando” na Terra em janeiro será observado por astrônomos

Um enorme asteroide passará pela Terra ainda este mês.

A rocha espacial chamada 2004 BL86, poderá passar a cerca de 1,19 milhão de quilômetro de distância, o equivalente a 3X a distância da Terra até a Lua.

Embora esteja longe o suficiente para estarmos seguros, o sobrevoo do asteroide que deverá ocorrer dia 26 de janeiro, é considerado pelos astrônomos como algo “muito próximo” em termos de distâncias espaciais.

Isso é o mais próximo que um asteroide já passou da Terra nos últimos anos. Além disso, os astrônomos confirmam que outro asteroide de nome 1999 AN10, passará também próximo de nós no dia 07 de agosto de 2027.

As estimativas não são nada boas! De acordo com as mais modernas análises por computador, 1999 AN10, com 0,6 km de diâmetro, passará a apenas 390.000 km de distância (podendo ser 100.000 km a menos), o que equivale a distância da Terra à Lua, mas isso só veremos nos próximos anos.

O Dr. Don Yeomans, astrônomo aposentado da Nasa, comentou: “No dia 26 de janeiro deste ano, o asteroide 2004 BL86 passará próximo da Terra, e isso é o mais próximo que já ocorreu nos últimos 200 anos”.

Ele prossegue: “E enquanto ele não representa uma ameaça para a Terra, outro asteroide demonstra preocupação. Apesar de ser relativamente grande, devemos ficar tranquilos, pois ele irá nos oferecer uma oportunidade única para observá-lo a aprender cada vez mais”.

O asteroide do dia 26 de janeiro emitirá brilho suficiente para que astrônomos amadores possam observá-lo com binóculos mais potentes ou telescópios mais simples.

Os asteroides geram fascínio nos astrônomos e entusiastas do espaço por seres considerados os precursores dos “blocos de construção da vida”. Estima-se que muitos asteroides bombardearam a Terra, trazendo consigo água e elementos que proporcionaram o desenvolvimento das primeiras formas de vida.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

NOVO FILME DE JOSE SETTE


QUEBRANTO

Meu próximo filme a ser filmado em Agosto e produzido pela CAVIDEO

O Primeiro Passo

Durante muitos anos eu possuía na minha pequena biblioteca três livros escritos por James Joyce. Confesso que sempre que começava a ler desistia de continuar. Não conseguia acompanhar a sua intricada narrativa. Assim Ulisses, Dublinense, Retrato do Artista Quando Jovem e também um Estudo sobre o romance moderno com textos de Ezra Pound, Umberto Eco, Ítalo Svevo, Richard Ellmann, onde encontrei o seu Giacomo Joyce, ficaram adormecidos nas estantes.

No ano passado (1998), numa noite de insônia, devorei “As Irmãs” o primeiro dos contos de Dublinense e fiquei extasiado com o que eu acabara de conhecer. Depois foram vindos de roldão os outros 14 contos restantes.

Apaixonado, pela tardia descoberta, debrucei-me na vida e na obra do renomado escritor, primeiro com os ensaios dos autores acima citados e depois com algumas pesquisas feitas pela internet, podendo assim experimentar o prazer de degustar o texto e a poesia inocente e indecente do “Retrato do Artista Quando Jovem” e depois, finalmente o colosso de “Ulisses”, o que mais demorei a ler, o mais difícil de ser decifrado.

Como a minha letra, o meu texto, a minha poesia, é composta por imagens e sons, resolvi fazer um esboço do que eu havia visto e daquilo que mais havia sensibilizado os meus ouvidos em todos os textos do genial escritor. Frases soltas, deste ou daquele momento retiradas do romance ou dos contos, poemas, e todo erotismo fantástico deste anárquico e misterioso ser, foram enchendo páginas e mais páginas de papéis com a minha confusa caligrafia. No final dessa maratona enlouquecida eu já tinha esboçado o desenho do que viria a ser o primeiro tratamento do roteiro de um filme. Comecei de pronto a ordenar e a digitalizar a urdidura, a trama, que aos poucos, como peças de um quebra-cabeça, tomavam a forma da história que deveria ser contada.

Assim nasceu “Quebranto”. Um filme das alucinações de Giacomo no seu um século de vida. Giacomo é James, que pode ser João, o nome que dei ao nosso personagem.

O roteiro, que ainda não foi dividido em planos e sequências, começa com a apresentação dos três tempos de vida do João, o principal personagem desta história: CONTUBÉRNIO, GNÔMON, SIMONIA...

Na ânsia de colocar, em imagem e som, parte o que eu estava sentindo nesta indescritível aproximação de parte da obra deste extraordinário escritor, fiz um clipe poético caseiro de três minutos que está postado no Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=p9fn14-Xbn4

Não sei se nesse primeiro momento concretizarei o meu intento que é abrir o caminho de uma produção cinematográfica para a realização deste filme. Mas, pelo menos, é um começo e sei que não se atravessa um deserto sem se dar o primeiro passo.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

O Fim de uma longa história


‘ESTADO DE MINAS’
A agonia dos Diários e Emissoras Associados
Por Ângela Carrato em 13/01/2015
A sede do jornal Estado de Minas está à venda, deixando explícita a gravíssima crise que a empresa enfrenta, envolvendo má gestão, perda de credibilidade e o consequente desaparecimento de leitores e anunciantes. A título de exemplo, o jornal, que é o mais antigo e tradicional da capital mineira, tem circulado com apenas dois cadernos, num total de 24 páginas, ao contrário de um ou dois anos atrás, quando, mesmo em dias de edição mais fraca, eram quatro ou cinco.
O objetivo da venda é tapar buracos no caixa da empresa, que tem demitido jornalistas e demais funcionários com idêntico objetivo. As instalações do Estado de Minas serão transferidas para o prédio onde funciona a TV Alterosa e a rádio Guarani, ambas do mesmo grupo, os Diários e Emissoras Associados. Nesta transferência, é possível antever novos cortes de pessoal e não está descartado nem mesmo o fim da publicação em papel, permanecendo apenas a versão digital.
Localizada em um dos pontos nobres da capital mineira, a sede da SA Estado de Minas vale em torno de 50 milhões de reais, mas as ofertas, até o momento, não ultrapassam 30 milhões de reais. A venda representará mais um capítulo, talvez dos últimos, na história do condomínio fundado pelo primeiro magnata da mídia brasileira, Assis Chateaubriand, que chegou a ter 36 jornais, 18 revistas, 36 rádios e 18 emissoras de televisão.
Do que antes foi o “império” de Chateaubriand restam agora, com alguma expressão, além dos veículos em Minas, apenas o Correio Braziliense, na Capital Federal, e dois jornais no Nordeste. Há pelo menos duas décadas que o jornal Estado de Minas é considerado o carro-chefe do grupo, situação que apenas enfatiza a gravidade do quadro.
Os jornais impressos estão enfrentando problemas em todo o mundo. Recentemente o Washington Post também colocou sua sede à venda. Diariamente se tem notícia de jornais nos Estados Unidos e na Europa que estão fechando as portas ou reduzindo drasticamente suas tiragens em consequência das novas tecnologias que, indiscutivelmente, tem tido forte impacto no modelo de negócios destas publicações. No entanto, seria um equívoco atribuir à derrocada dos Associados e, em especial do jornal Estado de Minas, apenas às novas tecnologias. Os problemas são mais antigos e profundos.
O reforço à imagem de “neutro”
O jornal Estado de Minas foi o tema de minha dissertação de mestrado, defendida na Universidade de Brasília, em 1996. Sob o título de “A ‘amena’ Casa de Assis, imprensa e conservadorismo em Minas Gerais”, procurei entender as razões pelas quais os Associados haviam declinado em todo o país, mas continuavam firmes e fortes no Estado. Em outras palavras, quais eram as relações e ligações entre este veículo e seus leitores? O jornal, como se autodefinia, era realmente “o espelho de Minas” e “a voz de Minas”?
Ao contrário do que muitos acreditam, o jornal Estado de Minas não nasceu grande e durante muito tempo foi apenas um entre os vários jornais existentes em Belo Horizonte. Fundado em 1929 por Pedro Aleixo, Juscelino Barbosa e Álvaro Mendes Pimentel, foi adquirido no ano seguinte por Chateaubriand. A decisão de vender a publicação foi tomada pelo grupo de Pedro Aleixo após vários enfrentamentos com as forças situacionistas locais, encarnadas pelo Partido Republicano Mineiro (PRM).

Na época, as disputas entre grupos políticos em Minas eram muito intensas e o aparente distanciamento de Chateaubriand dessas questões contou pontos a favor de sua publicação aos olhos da maioria dos leitores, calejados com os frequentes arroubos da imprensa nitidamente partidária.
No início da década de 1960, o Estado de Minas era um entre os 13 jornais existentes em Belo Horizonte. A maior tiragem cabia ao O Diário, de propriedade da Cúria Metropolitana, que se apresentava como “o maior jornal católico da América Latina”. Outras publicações de peso eram a Folha de Minas, o Diário de Minas e o semanário Binômio, aos quais se somou a edição mineira da Última Hora, de Samuel Wainer. Em vários momentos, nos anos de 1962 e início de 1963, as edições de O Binômio e Última Hora venderam bem mais que as do Estado de Minas.
De olho na concorrência, os Associados, que já contavam com um segundo título em Minas, o Diário da Tarde, nunca se sentiram constrangidos em copiar inovações, mesmo as que se constituíam em marca registrada dos concorrentes. Aliás, desde a década anterior que Estado de Minas formava uma dobradinha com o Diário da Tarde, o primeiro destinado aos leitores classes A e B e o segundo ao “povão”.
Pelo fato de Chateaubriand contar com amigos e financiadores ligados a Juscelino Kubitschek, ele preferiu não aderir aos setores da UDN que questionaram o resultado da eleição presidencial de 1955, quando o ex-governador de Minas saiu vitorioso. Agindo assim, o jornal Estado de Minas conseguiu reforçar a imagem de “neutro” e dá início ao aumento de suas vendas em banca, mesmo com tiragem muito reduzida se comparada aos jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo.
“Limpeza geral”
Os anos de JK na presidência foram excelentes para o Estado de Minas, que trouxe para as suas páginas, como anunciantes, todas as vedetes da época, seja em termos do comércio local, seja das empresas multinacionais que chegavam ao país. O tráfico de influências, ao lado de propostas audaciosas como a construção da nova capital federal, marcaram o governo de Juscelino e a própria relação entre imprensa e poder na época. Nunca interessou a Chateaubriand o rompimento com JK. O que ele sempre quis e obteve foram muitos favores e dinheiro. Daí sua presença constante em Minas, que era vendida aos mineiros como “apreço e gosto pela cultura e tradições locais”.
O que a maioria dos mineiros não desconfiava é que muitas das vindas de Chateaubriand ao estado tinham a ver com a conspiração que redundou no golpe civil-militar de 1964. Mesmo bastante doente e preso a uma cadeira de rodas, ele conspirou e estimulou amigos e funcionários a fazerem o mesmo. Desde a chegada de João Goulart ao poder que o jornal, sob o argumento que estava combatendo o “comunismo ateu”, abriu suas baterias contra o governo federal, respaldado pelo apoio do então governador de Minas, Magalhães Pinto, “o general civil da revolução” e por empresas nacionais e multinacionais que aumentavam os anúncios em suas páginas.
A vitória do golpe de 1964 não significou apenas o sucesso da tese que a publicação defendia. Significou, sobretudo, o fim das ameaças provocadas pelos concorrentes em Minas. Aliás, publicações que os Associados não mediram esforços para liquidar, a partir de denúncias, perseguições e de ameaças a anunciantes que insistiam em investir em “páginas adversárias”. Sem os entraves de antes, o Estado de Minas passa a atuar como narrador e comentarista político dos fatos, em suma, como um “ator político” conservador, que se beneficia da nova situação que ele ajudou e contribuiu para consolidar.
No editorial “Minas e a Revolução”, publicado pelo Estado de Minas em 6 de abril de 1964, por exemplo, tem início uma verdadeira cruzada contra qualquer tipo de atenuante ou perdão “aos que ontem entregavam a pátria aos flibusteiros de Cuba”. Na mesma edição, o jornal dedicava toda a contracapa do primeiro caderno aos “Flagrantes da Vitoriosa Revolução Democrática”. Entre as fotos estampadas estava a da sede da União Nacional dos Estudantes (UNE), no Rio de Janeiro, em chamas. Apresentada como “célula do Partido Comunista”, o jornal informava que ela havia sido incendiada “por populares”.
Para se referir às cassações e prisões de pessoas ligadas ao ex-presidente João Goulart, o jornal cunhou a expressão “limpeza geral”, conclamando os militares, através de editoriais, a “não ensarilhar suas armas, antes que se emudeçam as vozes da corrupção e da traição à pátria”. O golpe civil-militar de 1964 foi transformado assim na “revolução redentora”, que havia livrado o Brasil das garras do comunismo, com o Estado de Minas não medindo esforços na organização e cobertura da “Parada da Vitória”, dia 18 de abril, quando tropas do Exército e da Polícia Militar de Minas Gerais desfilaram pela avenida Afonso Pena, a principal de Belo Horizonte, comemorando os feitos alcançados.
Se a Rua Goiás não deu...
Quem lesse as edições do Estado de Minas no final dos anos 1960 e durante toda a década de 1970 dificilmente não seria tomado pela sensação de coparticipante de um processo que havia salvado o Brasil, pois não faltavam manifestos e abaixo-assinados ressaltando os feitos e o sucesso dos governos militares. É importante destacar que naquele período, várias publicações brasileiras que igualmente apoiaram o golpe de 1964 já se mostravam desiludidas e passavam a enfrentar a pesada censura prévia instaurada a partir da edição do AI-5. No jornal Estado de Minas, a censura sempre foi dispensável. O jornal só publicava o que interessava aos novos donos do poder.
Os profissionais considerados mais à esquerda perceberam que não havia mais condição de continuar escrevendo textos minimamente críticos e que contivessem quaisquer informações que desagradassem à direção da empresa e trataram de pedir demissão. Uma parte foi cuidar da vida como pode e outra se mudou para São Paulo ou Brasília, em busca de trabalho.
Em tempos tão sombrios, a marca registrada do Estado de Minas era a tranquilidade. Tranquilidade quebrada apenas na manhã de 22 de junho de 1965, quando do assassinato de seu diretor, Geraldo Teixeira da Costa. A manchete da publicação sobre o assunto foi “Silencia-se uma das grandes vozes de Minas”, com o jornal conseguindo não tocar nas razões efetivas da morte de seu dirigente. E se dependesse dele, estas razões jamais seriam divulgadas. Fiel aos compromissos católicos, O Diário foi o único a apresentar a verdade sobre o assunto: o jornalista era o responsável pela sedução de uma jovem de família pobre, cujo pai jurara vingança. Detalhe: durante o enterro, aviões da Esquadrilha da Fumaça sobrevoaram Belo Horizonte desenhando no céu o apelido Gegê, em homenagem ao diretor assassinado.
Mesmo não possuindo ligações com questões políticas, o episódio serve para ilustrar como o jornal Estado de Minas passa a apresentar a realidade ao sabor dos seus interesses, pouco somando com a veracidade das informações e, menos ainda, com a opinião pública, fazendo exatamente o contrário do que pregava. O episódio demonstra também o peso e a ligação do jornal com os diversos poderes e instituições. A confortável situação desfrutada pela publicação levou-a a acreditar piamente nas palavras de seu então editor-chefe, Pedro Aguinaldo Fulgêncio: “Se a rua Goiás não deu, não aconteceu”. Para quem não é de Belo Horizonte, rua Goiás é onde se localizava a antiga sede do jornal.
“Sociedade” com os cofres públicos
Esse autoritarismo, mais do que a postura de um dirigente, tornou-se a marca registrada do fazer jornalístico do Estado de Minas. Autoritarismo que impediu e continua impedindo que fatos de importância local, nacional e internacional “aconteçam” nas páginas do jornal. Quando muito, o jornal dava e dá a sua versão sobre eles.
Não importava que o Brasil e o mundo passassem por mudanças significativas. Tudo o que desagrada à ótica dos dirigentes da “amena” Casa de Assis era e continua sendo atribuído à subversão comunista e, mais recentemente, ao “bolivarianismo”. Por outro lado, fiel ao ideário de Assis Chateaubriand, que nunca escondeu sua admiração pelos Estados Unidos, tudo o que vem daquele país é tratado como certo, importante e fabuloso.
Em 1982, o jornal Estado de Minas apoiou a candidatura do ex-ministro Elizeu Resende contra Tancredo Neves na disputa pelo governo do estado. Para Tancredo conseguir que matérias sobre sua campanha fossem publicadas, teve que comprar espaço, mesmo sendo acionista da empresa. As páginas do Estado de Minas ignoraram a campanha pela anistia aos presos políticos e em prol das eleições diretas para presidente da República. No plano regional, de 1980 aos dias atuais, o jornal Estado de Minas esteve uma única vez na oposição, quando do governo de Newton Cardoso. Mesmo assim, as razões desta oposição estão longe de qualquer ideal republicano. A empresa e Cardoso se desentenderam no que se refere a pagamentos de publicidade e a verbas destinadas à publicação, numa briga classificada por quem a acompanhou de perto como sendo “coisa de cachorro grande”.
Se os métodos de Chateaubriand valeram para garantir poder e influência ao Estado de Minas em décadas anteriores, foram importantes para mantê-lo em pé, sobretudo a partir de 2003, quando o neto de Tancredo Neves chega ao poder e garante-lhe uma sobrevida que poucos julgavam possível. Já naquela época, os Associados estavam quebrados e o Estado de Minas era a publicação que tinha situação financeira um pouco melhor, mas longe de ser considerada boa. Aliás, fiel ao estilo de vida de Chateaubriand, os dirigentes do Estado de Minas sempre foram pródigos em gastos, pouco somando se a situação financeira da empresa permitia isso. A título de exemplo, enquanto os seus dirigentes e condôminos têm salários (além de retiradas mensais) superiores a R$ 50 mil, a empresa atrasa o depósito do FGTS e paga o piso salarial da categoria para a maior parte de seus funcionários.
No passado, o próprio governo de Minas chegou a arcar com a folha de pessoal do jornal e também com a complementação salarial dos funcionários da empresa via assessorias de imprensa no próprio governo e empresas estatais. O colunista social Wilson Frade, por exemplo, chegou a receber por 17 assessorias. Vale dizer: dia sim, dia não, tinha um dinheiro entrando em sua conta. Inúmeros são também os casos de jornalistas dos Associados em Minas que tiveram três, quatro ou mais assessorias ao mesmo tempo. Para o já citado Pedro Aguinaldo Fulgêncio, entrar para o Estado de Minas era quase sinônimo de ganhar na loteria esportiva ou “tirar a sorte grande”, como preferia dizer.
Os governos tucanos em Minas fizeram o possível para garantir o retorno dos “anos dourados” para os Associados. Razão pela qual a direção da empresa apoiou, elogiou e não mediu esforços para tentar viabilizar a vitória de Aécio Neves para a presidência da República, transformando o jornal em uma espécie de boletim de campanha do tucano (ver artigo “Por quem os sinos dobram“, neste Observatório da Imprensa). Não deu certo e os antigos problemas de gestão agora batem, com mais força, à porta da empresa. Afinal, a “sociedade” com os cofres mineiros parece ter chegado ao fim.
Ângela Carrato é jornalista e professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG. Este artigo foi publicado no blog Estação Liberdade


terça-feira, 13 de janeiro de 2015

UM CONTO DE REIS


VOU BEIJAR-TE AGORA
 Fabio Carvalho
                                                                      
Partiu cinema a chave perdida. Senti-me atravessando uma espécie de júbilo, no centro desse organismo ultra–sensorial com apenas cento e poucos anos, enquanto os imemoriais fundamentalistas explodiam catedrais na cidade luz. O cinema é jovem. Este é meu presente com um pouquinho de antecipação. Maracas tonificadoras para você entrar no ritmo.
Quando Olofim criou a luz inicial, veio Eleguá vibrar toda tensão vital. Diz Oduduá, sou de quem? Sou do mar? Sou do chão? Diz se é um mal ou um bem? Diz Oduduá, quem me deu este ar tão leve assim? (Solo).
Segundo o nosso diplomata Arnaldo Carrilho, Pier Paolo Pasolini ainda nos anos 70, sentenciou o seguinte: “vivemos o que chamo de mutação antropológica homologada, que é o poder do neo capitalismo consumista, matando as raízes críticas do pensamento, a fim de não provocar opções não consumísticas em você. Porque você tem como ser humano civilizado que consumir aquilo que se fabrica e que se faz. Você tem que consumir aquilo que eles querem.” É o sistema avassalador. Minha ambição continua sendo prejudicada pela preguiça e também pela madorna nas tardes ao forno desse verão inóspito que está apenas começando. Na mesma noite que ela sonhou comigo, de sexta para sábado, sonhei um sonho em longa metragem narrativo, então senta que lá vem estória. Pois bem, desembarquei em uma cidade histórica que era uma mistura de Tiradentes, Diamantina, Ouro Preto e Baependi. Tinha sido contratado a peso de ouro por jovens alunos que moravam na república Necrotério para dar um show na festa da música que estava acontecendo por lá. Eu deveria cantar e tocar acompanhado por dois amigos que não vejo há anos, Bigú e Magoo. Depois que me instalaram numa pensão com um colchão no chão, fomos comer caranguejo na carroceria de um caminhão. Amarrei minha câmera fotográfica Nikon no encosto da cadeira e fiquei tentando beber algo. Para minha tristeza não consegui nem uma aguinha. Voltei para pensão para tomar um banho e trocar de roupa, quando percebi que esquecera a câmera. Desci a ladeira e ela ainda estava lá junto da florista lourinha e sorridente que tinha ficado vigiando. Retornei para a pensão, assim que me despi para entrar embaixo do chuveiro, meus alunos chegaram para me buscar, já estava na hora do show. Fomos descendo a escadaria de madeira, quando comecei a me inquietar com a aproximação do momento da subida ao palco.  Como vou tocar e cantar para uma platéia se eu nunca tinha tocado nenhum instrumento muito menos cantado na vida? Pensei que única solução seria a seguinte: eu falaria com o Bigú e o Magoo para fazermos muito barulho, já que nenhum de nós era músico, faríamos tipo o Sex Pistols, no meio da quebradeira eu inventaria uma letra e a gritaria, ou seja, uma tremenda picaretagem. Fiquei grilado pela possibilidade contumaz do Bigú com suas teorias subterrâneas, inverter minha estratégia de dirigir aquele engodo canastrão em que nos metemos. Segundo Jaques Lacan, “o momento em que o desejo se humaniza é também aquele em que a criança nasce para a linguagem”. Eu aqui agora me lembrando do Ricardo Miranda. Enquanto ia caminhando pelas ruas de pedra pensando como seria a não decantada magnificência, avistei logo ali em frente, várias vans com grande parte da minha família, vivos e mortos, me olhando através do vidro fumê, muitos conhecidos e desconhecidos ao redor. Todos vieram para meu espetáculo. Aproveitei que alguns seguiriam a pé para o local que eu não sabia onde era, fui junto com esses me concentrando no meu “repertório”. Profunda foi minha penetração em adágio longe que se ouve daqui. Perdi meus acompanhantes e descobri que também estava perdido na cidade, não sabia mais onde seria meu show. Passei por um grande bar cercado por uma arquibancada, lá uma dupla bastante conhecida já se apresentava. Pior do que não saber tocar é não comparecer ao local contratado. A debacle se abateu sobre mim. Esse momento foi muito aflitivo. Não sabia para onde ir, procurava alguma referência e não encontrava. Por fim era apenas um sonho, minha vitória foi conseguir acordar. Eram exatamente seis horas da manhã, a hora em que nasci mais uma vez. Desde meu nascimento sempre acordo às seis da manhã, sei que nunca saberei por quê. Em cada dia tenho a natureza me esperando, nova luz em meu caminho e toda noite pra ficar sozinho. Funk até o caroço. Na cultura cigana roubar pérolas é proibido, ouro, dinheiro ou outras jóias não. Em nenhum lugar existe tempo algum, disse o velho cineasta de um filme só. Marinas Ilhoas. No obelisco da memória como células dormentes, muitas palavras são jogadas fora diuturnamente, uma hora ou outra serão descobertas novamente. Tinha uma coisa para te contar, mas prefiro deixar para outra ocasião. Vagueando lépido feito um gato malhado vira lata na noite do centro da cidade descobri o dom da invisibilidade. Nem bons nem maus olhos conseguiram me ver. Escapei, invés de triste fosse alegre de partir, se invés de ver só minha sombra nessa estrada eu visse ao longo dessa estrada outra sombra a me seguir. É preciso que eu volte a cantar. Meu samba espera nova chance pra sorrir.  Este ano em que estamos em andamento sem clareza desnecessária, com avassaladora pujança, ainda depois de um dia com o diplomata, o filme, me recolhi ao meu esconderijo. Ouvi tudo que já sabia sem saber e sem poder esquecer, encontrei-me com aqueles necessários durante toda noite alta no Natal das meditações sob a luz de velas em volta do caldeirão das mulheres adoradoras de Jesus Cristo. Voltando para as artes plásticas, nu descendo a escada. E Deus criou a mulher a abordagem em profundidade, uma análise de Insanos Dezembros me veio da letra de uma música. Aninho que foi ao mesmo tempo esquisitinho e bastante interessante, bom também passou demorando rapidamente. Dizem que o fato causador do tremendo tersol que apareceu no meu olho direito, foi o desejo de uma mulher grávida de comer o que ela viu que eu estava comendo, e sem me pedir ou sem poder comer aquilo também, ficou aguada e desejosa. Assim desabrochou o meu tersol, a vontade insatisfeita do olho da grávida. Sabedoria popular e lei da natureza: o olho grande atinge o outro olho. Na manhã daquele dia fui mais cedo do que de costume, enquanto esperava o elevador, fotografei o fotógrafo despistando não sei o quê no balcão da portaria. Do outro lado do salão vi uma mulher baixinha de turbante branco e túnica marrom fazendo sinais para mim. Logo entendi que ela estava me chamando para pegar o elevador de serviço que estava parado ali no térreo.  Subimos juntos, ela se posicionou à minha frente, assim observando-a detalhadamente percebi que era islâmica. Um sorridente e baixinho bom dia nos separou, quando ela saltou antes de mim, para meu alívio não sei também de quê. Aparentemente ela era menos violenta do que muitos franceses que conheci. Eu estava embriagado pela falta de mar, não havia nenhum bar aberto no dia 25 e já cansado do teclado desobediente, depois de ter perdido todas as esperanças, Murilo Mendes veio me salvar. Por isto repito: quando o vazio do nada se aproximar chame o Murilo Mendes. Novamente Murilo Mendes. O fecho-eclair estava encrencado. A sensualidade do cinema sempre presente, mesmo que o assunto seja a morte porque ainda assim tratamos da vida. Sou um homem sem aplicativos, por isto quase me perco na recepção do Museu Cassino da Pampulha, só em plano sequência encontrei o inflamável branquinho no degrau da vitrine da loja A Serenata. Atravessei a rua e continuei andando em outros batimentos coronários. Vendo outras coisas das mesmas que já vi.


segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

PRISÃO X DEMOCRACIA


Jornal A Nova Democracia
MENSAGEM DO ATIVISTA IGOR MENDES DIRETAMENTE DA PRISÃO

*Compartilhamos com nossos leitores e leitoras esta carta entregue por um apoiador na redação de AND escrita pelo ativista Igor Mendes, preso injustamente desde o dia 3 de Dezembro de 2014 no Rio de Janeiro.
_______________

"A todos meus queridos companheiros e companheiras,

Estava ansioso para enviar a todos vocês saudações militantes desde essa prisão que tem sido há 37 dias minha trincheira de combate. Não posso me alongar e também não é a oportunidade para relatar tudo que tenho visto e vivido aqui. Quero apenas ressaltar, desde já, que fui respeitado em minha condição de preso político por todos os presos com os quais convivi até hoje, eles se mostraram solidários com a nossa causa. A vida aqui é muito dura, não temos nada, a não ser uns aos outros.

Me sinto saudável, mas não tive ao longo de todos esses dias nenhum banho de sol e me tem sido sistematicamente negado o acesso a livros, papel e caneta. Recebi suas cartas e os informes da campanha pela nossa liberdade, que me encheu de ânimo e forças, pois tenho que corresponder à altura ao esforço que vocês fazem.

Fiquei muito feliz em saber que estão todos firmes e de cabeça erguida e na verdade não esperava outra coisa. É claro que não vejo a hora de recuperar minha liberdade para me dedicar ainda mais a nossa luta, mas, caso ocorra o pior não se abalem, pois a nossa convicção vale muito mais do que grades e algemas. Sairei daqui mais convencido de que o Brasil precisa de uma grande revolução, que derrube esse velho Estado burguês latifundiário que tanto oprime nosso povo.

Muito obrigado a todos.

Às companheiras Elisa e Karlaine um forte abraço, é uma vitória do movimento popular que essa prisão política e arbitrária não as tenha atingido, sigamos em frente, como diz a bela canção: 'Nada a temer senão o correr da luta'.

Lutar não é crime
Agora e sempre fascistas não passarão.
Resistir até o final.

Igor Mendes da Silva
09 – 01 – 2015"

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Porões da Ditadura




Sobrevivente da “Chacina da Chácara de São Bento” reaparece e revela fatos novos sobre o caso 
POR ALUIZIO PALMAR ·

Entrevista com Jorge Barrett

Jorge conta como sua passagem na cela número 3 do DEOPS em São Paulo e seu contato com Edgard de Aquino Duarte

Apesar de ter abandonado a militância Edgar de Aquino Duarte foi assassinado.

Jorge conta que só veio a saber que Daniel de Olinda era cabo Anselmo após conversar com Edgard de Aquino.

Aquino confirmou pro Jorge a história da equipe cubana de basquetebol.

Segundo Jorge, o cabo Anselmo tinha algumas manias pouco varonis.

Segundo Aquino, ele e o cabo Anselmo foram presos na mesma noite do contato com a equipe cubana.

Aquino teria ficado preso para que a prisão de Anselmo não vazasse.

Jorge conta que um grupo de policiais comentou na antesala do escritório de Fleury que iriam pro Chile no início de setembro. Era 1973, o ano do golpe.

Em 1985 Anselmo procurou o pai da mulher de Jorge para saber onde eles estavam.

Além da equipe de Fleury, na repressão em Recife e Olinda atuou o chefe do Deops do Rio de Janeiro.

OS SEIS MILITANTES DA VPR ASSASSINADOS

Jarbas Pereira Marques

Jarbas Pereira Marques, estudante e comerciário, nasceu no Recife, a 27 de agosto de 1948, filho de Antônio Pereira Marques e Rosália Pereira Marques. Militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), usava o codinome de Sérgio. Foi preso dia 08 de janeiro de 1973, na Livraria Moderna, centro do Recife, onde trabalhava e foi trucidado, juntamente com outros cinco companheiros. O fato teria ocorrido na cidade de Paulista, Região Metropolitana do Recife e o episódio ficou conhecido como O Massacre da Chácara São Bento.

Inicialmente, a versão oficial informava que os militantes políticos Soledad Barrett Viedma, Eudaldo Gomes da Silva, Evaldo Luiz Ferreira de Souza, José Manoel da Silva, Pauline Reichstul e Jarbas Pereira Marques foram mortos durante uma suposta troca de tiros, na Chácara São Bento, onde a polícia descobrira “um aparelho terrorista”. Anos mais tarde, porém, essa versão era desmascarada e surgia a verdade: todos foram presos e torturados até a morte, provavelmente em lugares diferentes, tendo a chácara sido utilizada apenas para forjar o cenário do falso “tiroteio”.

Soledad Barret Viedma

Nascida no Paraguai, Soledad era neta do intelectual paraguaio, nascido na Espanha: Rafael Barrett. Tanto o pai quanto o avô foram perseguidos por suas ideias políticas. No Uruguai, onde a família viveu exilada, Soledad foi raptada em julho de 1962, aos 17 anos, por um grupo neonazista, que a colocou em um automóvel e, sob ameaças, quis obrigá-la a gritar palavras de ordem contrárias às suas idéias. Por ter se negado, os raptores gravaram em sua carne, com uma navalha, a cruz gamada, símbolo do nazismo. Começou assim um ciclo de perseguições e prisões mostrando que, para a polícia uruguaia, Soledad passou de vítima a culpada. Ela decidiu deixar o país e seguiu para Cuba, onde conheceu o exilado brasileiro José Maria Ferreira de Araújo – militante da VPR conhecido como Ariboia, desaparecido no Brasil em 1970 –, com quem se casou e teve uma filha, Nasaindy de Araújo Barrett. No Brasil, onde passou a militar pela mesma organização. Soledad foi presa e torturada até a morte .

A análise das fotos feitas pelas forças de segurança no local mostra que Soledad recebeu quatro tiros na cabeça e apresentava marcas de algemas nos pulsos e equimoses no olho direito. Os legistas que assinaram seu laudo fizeram também referências a equimoses espalhadas pelo corpo.
A militante paraguaia foi enterrada como indigente, sem qualquer identificação, no cemitério da Várzea, no Recife.

Pauline Philipe Reichstul

Filha de judeus poloneses, Pauline Reichstul nasceu em Praga (na então Tchecoslováquia), em 1947. Seus pais eram sobreviventes da Segunda Guerra e casaram-se depois de encerrado o conflito. Quando a menina tinha dezoito meses, a família mudou-se para Paris, onde viveu até 1955, voltando então a imigrar, agora para o Brasil. Com 8 anos de idade, Pauline foi estudar no Liceu Pasteur, em São Paulo. Viveu também em Israel, por um ano e meio, onde trabalhou e estudou. Depois de curtos períodos na Dinamarca e na França, fixou residência na Suíça, em 1966, primeiramente em Lausanne e depois em Genebra. Em 1970, Pauline completou o curso de Psicologia na Universidade de Genebra. Nesse período, passou a ter contatos com movimentos de estudantes brasileiros de resistência ao regime militar. Assim, passou a trabalhar com vários órgãos de divulgação na Europa, denunciando as violações de direitos humanos no Brasil, especialmente as torturas e mortes de militantes. Foi esposa de Ladislau Dowbor, dirigente da VPR banido do país em junho de 1970 em virtude do sequestro do embaixador alemão no Brasil. Pauline e mais cinco companheiros da VPR foram presos em lugares distintos e torturados até a morte.

Eudaldo Gomes da Silva

Nascido a 1 de outubro de 1947, no Estado da Bahia, filho de João Gomes da Silva e Izaura Gomes da Silva.

Estudante de Agronomia da Universidade Federal da Bahia, membro do Diretório Central dos Estudantes, durante o ano de 1968, e presidente do Diretório Acadêmico de sua Faculdade.

Banido do Brasil, em 15 de junho de 1970, por ocasião do seqüestro do embaixador da Alemanha, Von Holleben, com mais 39 presos políticos.

Retornando ao Brasil clandestinamente, foi morto no dia 7 de janeiro de 1973 juntamente com Pauline Reichstul, Evaldo Luís Ferreira de Souza, Jarbas Pereira Marques, José Manoel da Silva e Soledad Barret Viedma.

Os torturadores e assassinos crivaram de balas os cadáveres dos seis combatentes, jogaram várias granadas na casa da referida chácara, com o objetivo de aparentar um violento tiroteio, dizendo que lá se realizava um suposto congresso da VPR.

Evaldo Luis Ferreira

Nasceu no Estado do Rio Grande do Sul, em 5 de junho de 1942, filho de Favorino Antonio de Souza e Maria Odete de Souza.

Muito jovem entrou para Marinha de Guerra, engajando-se no movimento dos marinheiros. Com o golpe de 1964, foi expulso pelo Ato Ministerial nº 365/64, devido à sua atuação na Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil.

Foi preso e morto sob torturas juntamente com outros companheiros no dia 07 de janeiro de 1973.

José Manoel da Silva

Militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

Nasceu em 2 de dezembro de 1940, em Toritama, Pernambuco, filho de José Manuel da Silva e Luiza Elvira da Silva.

Ex-cabo da Marinha, expulso em 1964.

Foi assassinado sob torturas pela equipe do delegado Sérgio Fleury no dia 8 de janeiro de 1973, no Massacre da Chácara São Bento. Os detalhes desse massacre estão na nota referente a Eudaldo Gomes da Silva.

Em 19 de dezembro de 1994, sua viúva Genivalda Maria da Silva exumou seus restos mortais.

À época da morte de José Manoel, Genivalda também foi presa, torturada e estuprada por soldados do Exército. Ficou, então, sem coragem para reclamar o corpo do marido.

Esses jovens militantes assassinados pelo Estado Brasileiro, através da sua força de repressão, num acontecimento que ficou conhecido como o "Massacre da Chácara São Bento". E que é um fato histórico deprimente, do chamado Período de Chumbo, que não gostaria que se repetisse.

Essa é nossa homenagem póstuma do dia. 07 de janeiro de 2015.

Postado por Manoel Messias Pereira

domingo, 4 de janeiro de 2015

CINEMA ITALIANO


CARTA A ÍTALO CALVINO
Pier Paolo Pasolini

Que eu sinta ou não saudade deste universo camponês, isto é, de qualquer modo, problema meu. Isto não me impede, de fato, de agir sobre o mundo atual, assim como na minha crítica: ou antes, tanto mais lucidamente quanto mais dele me destaco e quanto mais aceito vivê-lo apenas estoicamente.
Disse, e repito, que a aculturação do Centro consumista destruiu as várias culturas do Terceiro Mundo (falo agora em escala mundial, e me refiro também às culturas do Terceiro Mundo, às quais as culturas camponesas italianas são profundamente símiles): o modelo cultural oferecido aos italianos (e de resto a todos os homens do globo) é único. A conformação a tal modelo se acha antes de tudo no vivido, no existencial; e, portanto, no corpo e no comportamento. É aqui que se vivem os valores, não ainda expressos, da nova cultura da civilização do consumo, isto é: do novo e do mais repressivo totalitarismo que jamais foi visto. Do ponto de vista da linguagem verbal, se tem a redução de toda língua a língua comunicativa, com um enorme empobrecimento da expressividade. Os dialetos (os idiomas maternos!) estão afastados no tempo e no espaço: os filhos são coagidos a não falá-los mais porque vivem em Turim, em Milão ou na Alemanha. Lá onde esses dialetos são falados agora, eles perderam sua potencialidade inventiva. Nenhum rapaz das periferias romanas seria hoje capaz de, por exemplo, compreender a gíria dos meus romances de dez ou quinze anos atrás: e, ironia do destino!, ele seria obrigado a consultar o glossário anexo como um bom burguês do Norte!
Naturalmente, esta minha “visão” da nova realidade cultural italiana é radical: observa o fenômeno como fenômeno global, não as suas exceções, as suas resistências, as suas sobrevivências.
Quando falo de homogeneização de todos os jovens, segundo a qual, desde o seu corpo, desde o seu comportamento e desde a sua ideologia inconsciente e real (o hedonismo consumista), um jovem fascista não pode ser distinguido de todos os outros jovens, enuncio um fenômeno geral. Sei muito bem que existem jovens que se distinguem. Mas são jovens pertencentes à nossa própria elite, e condenados a ser ainda mais infelizes que nós: e, portanto, também provavelmente melhores. Digo isso devido a uma alusão (Paese sera, 21-6-1974) de Tullio de Mauro, que, depois de ter se esquecido de convidar-me para um congresso linguístico de Bressanone, reprovava-me por não ter a ele comparecido: lá, disse ele, eu teria visto alguns jovens que contradizem a minha tese. É como dizer que, se algumas dezenas de jovens usam o termo “eurística”, quer dizer que tal termo é utilizado por cinquenta milhões de italianos.
Você dirá: os homens sempre foram conformistas (todos iguais uns aos outros) e sempre existiram elites. Eu respondo a você: sim, os homens sempre foram conformistas e o mais possível iguais uns aos outros, mas segundo a sua própria classe social. E, no interior dessa distinção de classe, segundo as suas particulares e concretas condições culturais (regionais). Hoje, ao contrário, (e aqui reside a “mutação” antropológica) os homens são conformistas e todos iguais uns aos outros segundo um código interclassista (estudante igual operário, operário do Norte igual a operário do Sul): ao menos potencialmente, na ansiosa vontade de uniformizar-se.
Enfim, caro Calvino, gostaria de fazer-lhe notar uma coisa. Não como moralista, mas como analista. Na sua apressada resposta às minhas teses, no Messagero (18 junho 1974), escapou a você uma frase duplamente infeliz. Trata-se desta frase: “Os jovens fascistas de hoje não conheço nem espero ter ocasião de conhecê-los”. Todavia: 1) certamente você não terá nunca tal ocasião, também porque se, numa cabine de trem, na fila de uma loja, na rua, em uma sala de visitas você encontrasse jovens fascistas, não os reconheceria; 2) felicitar-se por não encontrar nunca jovens fascistas é uma estupidez, porque, ao contrário, nós devemos fazer de tudo para identificá-los e para encontrá-los. Eles não são os fatais e predestinados representantes do Mal: não nasceram para serem fascistas. Ninguém – quando eles se tornaram adolescentes e ganharam capacidade de escolha, segundo qualquer razão ou necessidade – colocou neles de modo racista a marca dos fascistas. É uma atroz forma de desespero e neurose a que precipita um jovem a uma escolha como essa; e talvez bastasse uma só experiência diversa na sua vida, um simples e só encontro, para que o seu destino fosse diverso. "
[1] A tradução toma como base a versão publicada em: PASOLINI, P.P. Scritti corsari. Milano: Garzanti, 2013. Prefazione di Alfonso Berardinelli. Settima ristampa.
[2] Publicado em “Paese sera” com o título “Carta aberta a Italo Calvino: aquilo de que sinto saudade”http://outraspalavras.net/…/o-desejo-anticapitalista-de-pa…/

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Reflexões Culturais


ALERTA AOS CAROS AMIGOS DA MÚSICA
Sergio Ricardo
(Diretor de cinema, ator, cantor e compositor brasileiro, autor e intérprete da trilha original do filme Deus e o Diabo de Glauber Rocha )

Nem saudosismo nem preconceito. Só uma pequena observação de quem é obrigado, mesmo distante dos meios de comunicação, a ter que ouvir o som que me vem pela janela, lembrando-me a todo o momento da destruição sonora emitida pela favela, ligada 24 horas por dia aos rádios e tvs, massificando o gosto popular, que lamentavelmente, emprenhado pelo costume, já canta e dança um falso Brasil. Mecânico, feio, sem ginga ou balanço, negando suas raízes, a cada acentuação rítmica elementar e hipnótica das ausências de mensagens que se ouve por aí, como a martelar um decreto do sistema, a essa altura, já absorvido, com a intenção de burrificar e alienar a capacidade criativa do povo. O bate-estacas de seu conteúdo, além de despersonalizar os sinais culturais atávicos de nossa cultura musical, outrora imitada e respeitada por todo o mundo, hoje é até recusada pelos animais. Dela, hoje, nem sinais. Cada fração dessa alienação são vinténs a se somarem na fortuna desse império que só visa o lucro, e mais do que isto, limpa o terreno para impor suas diretrizes sociais e políticas. Somos todos americanos e de tal forma já dominados, que quem não usa vocábulos do inglês, não consegue mais articular o português. Indução pura. Modéstia à parte, como compositor posso enumerar as perdas de nossas conquistas, de há muito, gradativamente perdidas, sob uma rígida análise teórica da estrutura da composição musical.
1- Melodia = pobre sem a construção das variantes de células melódicas a surpreender pela beleza de suas alternâncias como a contar uma história com princípio, meio e fim, que caracterizam a riqueza de um tema.
2- Harmonia - Preso a um, dois, ou no máximo três acordes, não embeleza a melodia com surpresas de encadeamento, dando estofo de beleza à ela, ajudando o desenvolvimento orquestral e dar forma particular à obra.
3 - Ritmo - Sempre o mesmo bate estacas limitando e escravizando a correspondência ou diversificação a colorir uma canção. Hipnótica. Primitiva. Repetitiva à exacerbação.
4 - Poema - Palavras ou frases repetitivas, sem conteúdo, muitas vezes de profundo mau gosto, ou pornográficos, como a comentar o obvio ululante, ou sem poesia alguma.
Chamar isto de música popular, no Brasil, é uma acinte à Africanidade e Lusitania rítmica e melódica herdadas de nossos ancestrais, sobre as quais inventamos os choros, os sambas, o frevo, a capoeira, etc. etc. com seus contratempos e riqueza rítmica movendo nosso corpo com nosso balanço próprio, imitado por outros povos, e dando nosso recado nobre e belo. Joguemos no lixo Caymmi, Cartola, J. Gilberto, Pixinguinha, Luis Gonzaga, Noel Rosa, Radamés Gnatalli, Tom Jobim, e tantos outros em detrimento de um bate estacas que nunca sai de moda e nada fala de nossos anseios, sentimentos, fincados na alma de nossa história?
Felizmente há uma juventude de estudiosos e cheia de talento nas periferias dessa imposição dos canalhas da comunicação que andam arriando as calças à determinação de retrocesso dos donos da grana. Mais uma vergonha nacional. Caro colega, não caia nessa esparrela. Vamos retomar nosso processo cultural que anda aos pedaços e enriquece-lo com sua contribuição e talento. Chega de frescura.