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quinta-feira, 3 de março de 2011

JOGANDO CONVERSA FORA

OCA MODERNA

No governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, remeti ao Ministério da Cultura o esboço de um projeto que poderia, a meu ver, revolucionar o saber cultural em nosso país. A idéia não foi entendida pelo Senhor Ministro, ou não havia, em verdade, interesse pelo tema cultura brasileira, vivíamos no auge da globalização.

Era uma idéia simples que nasceu da importância e da espontaneidade de um movimento cultural que eu vivi no início dos anos 60. Nesta época a UNE promovia com o apoio do Governo do Presidente João Goulart, encontros dos estudantes e jovens brasileiros com algumas das principais personagens do nosso universo cultural. Assim surgiu, por todo país, momentos singulares na nossa história.

Podíamos, antes do golpe militar, conviver informalmente, conversar e trocar experiências com alguns dos grandes artistas daquela época: escritores, poetas, músicos, pintores, escultores, diretores de teatro e de cinema, atores e atrizes, fotógrafos, técnicos renomados, que viajavam pelo país para participarem e incentivarem esses sensacionais encontros com uma juventude, que está hoje e sempre, sedenta de saber.

Durou pouco tempo na cidade de Belo Horizonte, onde eu morava, essas verdadeiras quermesses intelectuais onde tudo se ouvia e de tudo se aprendia um pouco.

Esses encontros festeiros e ideológicos modificaram muitas cabeças, a minha foi uma delas.

Eu tinha 15 anos em 1963 quando conheci algumas das melhores figuras da nossa inteligência e sei o quanto isso me foi importante. Escrevi, nesta época, o meu primeiro roteiro de um filme de longa-metragem “Cidade Sem Mar” sobre a juventude mineira.

Acredito que a nossa presidenta Dilma tenha freqüentado alguns desses encontros na sua época.

É preciso refazer hoje “modernamente” esses encontros temáticos com os jovens do tão carente interior brasileiro. Eles têm o direito de usufruir também do melhor que o universo das artes brasileiras pode oferecer e aprender, em polêmicos debates e palestras, o pensamento dos nossos criadores de cultura que, na sua grande maioria, não tem aonde exibir, expor, ou com quem discutir as suas obras.

Esse é o mote principal desta velha idéia: criar vários espaços com arquitetura própria, de norte a sul do país, onde se possam promover os encontros do povo brasileiro com os representantes da sua cultura geral e conhecer, discutir e até comprar suas obras.

Fiz o desenho detalhado do espaço imaginado/necessário e também um pré-orçamento dos custos, ou do que poderia ser gasto na construção de um centro de cultura em cem cidades do interior brasileiro. Infelizmente perdi o arquivo em minhas mudanças. Tenho certeza que Oscar, o velho gênio da arte do novo, ou um jovem arquiteto de vanguarda, faria de bom grado esse singelo projeto arquitetônico.

Esses centros de cultura, que chamo de “OCA MODERNA”, pois o projeto arquitetônico se assemelhava a essa conhecida casa do índio brasileiro, só poderá ser viável se houver a união do Governo Federal com os Estados, Municípios e uma grande vontade política de transformar culturalmente o país.

Lembro-me que nos meus cálculos de então, verifiquei o quanto o erário havia gasto com as grandes produções que até hoje não se justificaram. Essas verbas monumentais de incentivo poderiam ser muito mais bem empregadas construindo, em varias cidades carentes de informação, muitos destes centros de cultura.

A união do Governo do Brasil, Ministério da Cultura, com os Governos Estaduais e Prefeituras Municipais, viabilizariam facilmente essa idéia que para dar certo teria de começar com 100 cidades pilotos. Cidades de 100 até 500.000 habitantes.

Um governo que pretende compreender e espalhar por todo esse país o prazer do conhecimento de nossas coisas, o desejo de consumir as coisas nossas, tem de olhar essa idéia, ou outra similar, com uma visão fina direcionada para a expansão do mercado, no futuro, com a nossa sonhada libertação cultural, isto é: é preciso urgentemente abrir espaços de exibição para toda a criação da arte nacional.

Imaginei que no governo do Presidente Lula, o Ministro Gil, implantasse alguma coisa semelhante e possibilitasse esses espaços de encontros, mas ele saiu com os “pontos de cultura” que, a meu ver, hoje poderiam ser a “ponta de lança” na criação destes centros culturais.

Fico imaginando o meu caso: dirigi na década de 80 o Palácio das Artes em Belo Horizonte e por isso sei da importância, para qualquer cidade do mundo, dos espaços públicos como esse. Sei também como muitos outros sabem que onde se é o produtor, diretor, escritor, realizador dos seus trabalhos, se houvesse a possibilidade de exibi-los e debatê-los com os jovens do Brasil, com a certeza de que haveria 100 salas para lançar os filmes, expor as pinturas, recitar os poemas, cantar e tocar suas músicas, experimentar o teatro, debater cultura e criatividade, ou simplesmente mostrar a sua arte, na certa, eu e muitos outros artistas realizadores, por muito pouco, agora e no futuro, poderíamos começar a viver dias melhores.

Imaginei a Oca Moderna sendo dividida em cinco salas: Sala 1: Cinema digital e pequeno palco para esquetes de teatro, apresentações de música, recitais de poesia, palestras, etc. Sala 2: Videoteca e Internet (possível mini-biblioteca de alguns livros sobre arte). Sala 3: Exposição e artesanato. Sala 4: Café bate-papo. Sala 5: Banheiros.

Um amigo a quem eu disse que escreveria novamente ao governo sobre essa minha idéia, me falou: - Se nesses anos todos eles não cuidaram da educação, não criaram as escolas de tempo integral do Darcy Ribeiro, não aplicam uma lei (a lei do curta) aprovada que leva a jovem arte brasileira aos cinemas, o que te faz pensar que eles darão atenção aos seus centros de cultura? Ele tem razão, pensei, vou jogar conversa fora...

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