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sábado, 28 de fevereiro de 2015

ENTREVISTA



CORRUPÇÃO

Ricardo Semler: “A corrupção não é um problema público, é um problema privado enorme”Em entrevista, empresário tucano reafirma sua percepção de que “nunca se roubou tão pouco” no Brasil e estende a responsabilidade do problema para o setor privado. “Eu quero ver alguém vender pra uma grande montadora no Brasil sem dar propina para um diretor de compras”, questionou
“A corrupção é muito mais endêmica do que parece, não é um problema ‘só’ brasileiro. E não é um problema público, é um problema privado enorme”.
A declaração é de Ricardo Semler, empresário filiado ao PSDB, em entrevista concedida ao programa Diálogos com Mário Sérgio Conti, exibida na noite desta quinta-feira (26) na Globo News. Em novembro de 2014, Semler já havia ido na contramão da cobertura noticiosa da mídia tradicional quando, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, afirmou que “nunca se roubou tão pouco no Brasil”, fazendo alusão a uma “santa hipocrisia” da elite em relação às denúncias na Petrobras. Agora, voltou à carga analisando a questão da corrupção no país e no mundo.
Na entrevista, Semler falou a respeito da percepção que as pessoas em geral têm, de que a corrupção no Brasil alcança índices escandalosos, fazendo um paralelo com a visão sobre a violência. “Nunca se matou tão pouco. Se voltar pra Guerra Civil espanhola, [com] Franco são 21 milhões de pessoas; Segunda Guerra Mundial, Primeira Guerra Mundial, Guerra dos 30 Anos, Guerra dos Cem Anos… Nunca morreu tão pouca gente. No entanto, esse ‘atacado’ das grandes guerras está no ‘varejo’”, explica. “E a internet, a facilidade de comunicação, faz com que tudo fique óbvio e conhecido por todo o mundo”, pontua, fazendo a comparação: “Com a corrupção é a mesma coisa, ela era no ‘atacado’. Quando eu listasse pra você o xá do Irã, Idi Amin Dada, estou falando de 10, 15, 20 bilhões de dólares pra cada pessoa. Não estou defendendo, mas o que quero dizer é que agora estamos em um momento em que aparece muito [a corrupção] e que veio pro varejo, o que é um grande problema.”
 O empresário tenta dimensionar o problema da corrupção, afirmando não só que não se trata de um problema tipicamente brasileiro, como também não é novo. “Há 20 anos roubava-se um percentual sobre todos os barris de petróleo que vinham para o Brasil. Se fizesse uma investigação hoje, queria saber com as empreiteiras como foi a construção de Itaipu, Transamazônica, Brasília… Os números hoje são pequenos, mas não são defensáveis”, afirma, criticando a postura do PT no governo em seguida. “O PT enfiou os pés pelas mãos ao achar que precisava jogar o jogo do Brasil do jeito que se joga porque senão não tinha chance. É uma pena, porque o PT era a última esperança de vir alguém e dizer ‘não vou jogar desse jeito’. Mas não quer dizer que o roubo está aumentando, ele está no varejo, está na internet e então aparece ‘pra burro’.”
Embora o foco da mídia de uma forma geral seja a ação de agentes públicos, Semler afirma que a corrupção é algo comum também no âmbito privado. “Quem olhar a iniciativa privada, porque se diz ‘isso é uma coisa pública, esses políticos, Brasília…’. Eu quero ver alguém vender pra uma grande montadora no Brasil sem dar propina para um diretor de compras, que é de uma empresa multinacional alemã, americana…. Não vende pra muitas delas. Propina pro comprador, negócio privado. Pra grandes redes de supermercado, vai lá e pede pra botar seu produto na gôndola mais perto. Vender prótese para hospital particular, os grandes nomes do Brasil, não vende sem corrupção”, diz.
A circunscrição do problema também estaria equivocada já que, segundo o empresário, trata-se de um fenômeno global que atinge países como China, Rússia e Estados Unidos, ainda que de formas distintas. “No tempo Bush, Dick Cheney, Halliburton, 800 bilhões de dólares em armamentos comprados dos amigos… Agora, eles [EUA] estão no atacado, então você vai pra Miami, dirige, e o guarda de trânsito não te pede nada. Porque [a corrupção] é lá em cima, na hora que o cara vende armamento pra um país inteiro pra destruir o Afeganistão.”
De acordo com Semler, a corrupção estaria relacionada com a desigualdade e a submissão das pessoas em relação ao poder do dinheiro. “Quando se pensa um pouco, de onde vem a corrupção? Do desejo de ter o dinheiro que é necessário para a pirâmide social. Hoje, se eu conseguisse convidar as 85 pessoas certas para um coquetel lá em casa, os 85 mais ricos do mundo, eu teria gente que tem mais patrimônio que 2,2 bilhões de pessoas no planeta. Há uma coisa profundamente errada nisso”, pondera. “Achamos que moramos em um mundo cada vez democrático, mas a verdade é que a gente vive em uma monarquia e somos todos súditos do ‘King Cash’, o ‘Rei Grana’. Agora, dinheiro é tudo, e se dinheiro é tudo, a corrupção tende a aumentar de forma capilar, no varejo. Por isso que digo que o valor que se rouba tenho certeza que é menor, mas tem muito mais gente interessada no seu quinhão desta corrupção.”
Para Semler, este cenário só teria chance de ser alterado caso haja uma mudança na educação, que ainda é baseada em um modelo fordista segundo sua avaliação. “A resposta, pra mim, está no jardim de infância, infelizmente demora um pouco. O fato é que nós estamos em um sistema educacional – que estamos tentando melhorar, mas ele é ruim em qualquer lugar do mundo – baseado numa linha de montagem do Henry Ford em 1908 que diz ‘preciso passar um milhão de pessoas pela escola e fornecer para a indústria’”, argumenta. “Mas aquele emprego já acabou. Nós só tínhamos a cabeça pra manter a informação, hoje toda a informação está disponível em trinta segundos no Google, o que estamos fazendo treinando a cabeça das pessoas? Está na hora de, no jardim de infância, a gente parar pra pensar no que está certo, no que está errado, quais são as questões fundamentais de vida em sociedade, cidadania etc. É isso que vai resolver o problema da corrupção logo, logo, em trinta, quarenta, cinquenta anos. Não vai ser em dois meses.”


sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

O CIRCO


Mentalistas
Por Orlando Senna
Vivi intensamente a magia do circo na minha infância interiorana. Os circos chegavam à minha pequena cidade, encantavam e iam embora. Circos modestos, com palhaços, acrobatas, malabaristas, trapezistas e um mágico. A chegada de um circo era sempre um acontecimento marcante e a grande emoção que produzia em mim e nos meus colegas da escola primária nos levaram a fazer nosso próprio circo, no quintal da casa de meu primo Augusto Senna Maciel, que organizou e liderou essa aventura infantil. Ensaiamos durante um tempo e fizemos apresentações com alguns malabarismos, umas acrobacias bobas em pneus pendurados em árvores, duas ou três mágicas e cobrando ingresso. Além das crianças que conseguimos arrebanhar, também alguns pais e avós compareceram.
Minha participação foi apresentar duas mágicas, as primeiras que aprendi e que ainda faço até hoje para impressionar infantes: fazer desaparecer uma moeda que está em minha mão e introduzir uma moeda na nuca e resgatá-la na boca. Aí começou meu ininterrupto interesse pelo ilusionismo, que chegou ao paroxismo, ainda na infância, em um espetáculo que assisti levado por meu pai, no Cine Teatro Guarany de Salvador da Bahia (hoje Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha).
Na adolescência li artigos em almanaques e os raros livros que encontrei sobre o assunto. E também frequentei a única loja de mágicas e truques que existia em Salvador, com a desvantagem que, nessas lojas, o aprendizado de como os truques são feitos (a manipulação) só é possível após a compra do kit com o material.
Nos anos 1970, no Rio de Janeiro e associado a uma dessas lojas, montei uma peça de teatro (Natal na praça, de Henri Ghéon, com o ambulante Grupo Barra) onde os personagens faziam mágicas o tempo todo, buquês surgindo em mãos vazias, fitas coloridas intermináveis saindo das bocas, bolas de pingue-pongue desaparecendo de repente e reaparecendo na plateia (com a ajuda de alguém do grupo disfarçado entre os espectadores). Atualmente vibro com a proliferação de programas de TV dedicados ao ilusionismo, principalmente os que apresentam números mentalistas, o gênero circense que mais me impressiona.
Escrevo sobre isso estimulado pela leitura do livro Confesiones de un mentalista, do espanhol Cristóbal Carnero Liñán, lançado recentemente. O mentalismo é uma vertente do ilusionismo, arte cênica que produz no espectador a impressão que alguma coisa irreal, sobrenatural, impossível está acontecendo diante de seus olhos. Por isso também é conhecido como prestidigitação, que significa, com origem no latim, agilidade, presteza com os dedos e, por extensão, com as mãos.
 O mentalismo soma a essa habilidade e velocidade de movimentos manuais os elementos sugestão e hipnose, relacionando suas façanhas com controle mental, vidência, telepatia e telecinésia. Há vários estudos e ficções sobre a fronteira entre a habilidade e tecnologia dos truques e poderes sobrenaturais (o fenômeno Harry Houdini, mágico húngaro radicado nos EUA, 1874-1926, talvez seja o mais estudado de todos os ilusionistas inexplicáveis). Essa “arte” existe, historicamente, há cinco milênios e, durante períodos obscurantistas da Era Cristã, ilusionistas que usavam elementos mentalistas foram queimados na fogueira como bruxos.
Volto ao espetáculo no Cine Teatro Guarany. Devia ter entre sete e nove anos de idade e a lembrança daquele incrível acontecimento, talvez o mais impressionante da minha vida, flutua em minha memória como um gás, como um flúor, como a recordação de um sonho antigo. O que me lembro, ou acho que lembro, é que as pessoas na plateia começaram a reclamar porque o espetáculo do mágico (possivelmente chinês) não começava. As pessoas passaram a protestar em voz alta, a fazer ruídos (anos depois meu pai disse que foi um atraso de uma hora “ou mais”).

No meio da balbúrdia o mágico aparece no palco e pergunta o que está acontecendo. É informado que está atrasado, já são seis horas da tarde (só como exemplo, não tenho esse detalha na memória esfiapada). O mágico sorri, diz que há um engano, que por favor voltem a consultar seus relógios. Os espectadores olham para seus relógios de pulso e de bolso e ficam estupefatos: marcam cinco horas da tarde e um minuto atrás estavam marcando seis. Estupor, surpresa enorme e silenciosa e em seguida aplausos fervorosos. O mágico agradeceu e disse que o espetáculo estava encerrado. Nova consulta aos relógios e tudo volta ao normal: são seis horas outra vez. Hipnose coletiva? Que sei eu.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

REFLEXÃO CONTEXTUAL


É PRECISO FALAR SEM MEDO E SEM MENTIRA DE TUDO UM POUCO

Pra que mentir?
Amigos, nós não vamos entrar em detalhes econômicos, são chatos e longos, nem em ideologia partidárias, pois não creio nelas. Agora, me diga, o que te faz acreditar que o seu pensamento de direita é melhor que o outro de esquerda. Qualquer político neste país, ou em qualquer outro país latino americano, vai navegar na onda e desejos de um congresso bizarro eleito pelo pseudo estado "democrático", que engana o povo através de uma rede de comunicação  invisível entre os palhaços, regentes e pupilos pomposos, que não passam de escravos das grandes fortunas, unidos aos piores, aos mais violentos e radicais personagens da nossa atual e preconceituosa sociedade, fieis representantes dos desinformados boçais que os elegeram. Como sobreviver em um mundo dominado por um sistema tão desumano e cruel? A que ponto nós chegamos? Imagina um jovem rei sedento de poder, repleto de grandes interesses cercado por uma corte de devassos. Um dia explode a revolta. Dá pra ver o final desse filme!
Vai ser difícil navegar nessa tempestade onde todos se igualam em suas mediocridades. Sendo assim , se são iguais às possibilidades das transformações sociais, por que não escolher, com muita lucidez, pela história do homem, pelo seu saber (scien) e por sua experiência da vida. Só assim pode existir algum equilíbrio no complexo reino de Pindorama, que está a cada dia mais dominado pela sede do poder financeiro e pela ascensão social sem limite, navegando em um mar de consumo e de falsa felicidade. Eis aqui o paradoxo da nossa contemporaneidade: onde tudo é possível, nada pode existir e tudo se perde.
Mas ao contrário do que aconteceu no nosso passado, na nova experiência recente dos governos democráticos, no presente, os trabalhadores se deixaram dominar pelos néscios (nescis) mercantilistas do poder e se não houver um basta morreremos na rebeldia e criaremos o caos social onde a morte reinará.
Deveriam ser proibidos, por lei, os interesses e a falsidade da mídia com suas notícias maldosas e elaboradas para prejudicar um ou outro que não coadunam com seus interesses.  Não se pode chamar alguém de ladrão, nos jornais, televisões, internet, debates, antes dos cidadãos envolvidos em denúncias, empresas, políticos, serem julgados e condenados. É o que anda acontecendo nestes debates, onde uma mulher Presidenta é menosprezada pelo seu contrário que ataca, acusa, debocha, vocifera, sem nenhuma nobreza, sem nenhum respeito ao cargo que ela ocupa, mas nos envergonha a sua leviandade no tratar o ser humano brasileiro que ela  representa.                                                     É preciso intervir economicamente no Brasil para salvar o combustível das vidas dos automóveis de Los Angeles...                                                                                                         
O partidão, com a prática do cupim – comer por dentro, fundeou-se erroneamente em todas as instituições da república e depois do processo autofágico a que se submeteu burrocratizou-se ainda mais para depois morrer.                                                              
Compactuando com a mais retrógrada prática política aqui existente estavam muitos dos nossos intelectuais e artistas de esquerda que de quando em quando uns morriam na mão da repressão militar e outros que  se vendiam ao sistema com as mais esfarrapadas mentiras.                                          Todos mantinham suas boquinhas e seus interesses e ninguém até hoje pediu desculpas ao povo brasileiro.                                                                                                                                                    Porque os médicos cubanos se submetem a pagar um imposto tão grande dos seus salários para o seu governo que é de esquerda?  Aqui no Brasil todos os médicos formados nas universidades públicas deveriam fazer o mesmo, ou seja: pagar sua dívida com o Brasil.                                                           O que o povo acha disso?  Pra que mentir?                                                                                        
Conheci o dono de um jornal diário de esquerda que precisava de se vender todos os dias para custear sua enorme despesa editorial. Vivendo uma vida caótica e insustentável, o pobre jornalista via seus sonhos ruírem na barreira de uma realidade cruel e indestrutível. Só para no final de tudo acordar com mais débitos que créditos em sua conta. O pior é que ele, no fim de tudo, tornou-se um cara de direita, retrógrado, quase um fascista. O capitalismo destrói a existência dos bem aventurados.                                                                                                    
Pra que mentir? Medo de quê!                                                                                                        
O cinema de arte não morreu, o mercado não tem essa força capital para eliminá-lo. Eles, os neófobos, há anos tentam, cada hora, todos os minutos e segundos, num só instante e não conseguem estancar o processo revolucionário da arte.                                                                            
A minha geração foi separada pelas circunstâncias históricas em que fomos envolvidos – amávamos mas não nos entendíamos – torturava-nos com medo de tudo e de todos. Era a paranoia institucionalizada...                                                                                                               
Pra que mentir?                                                                                                                             
Os artistas e intelectuais das novas gerações têm de lutar unidos em um mesmo propósito, ou seja: a arte pela revolução e a revolução pela libertação total da arte. Nada é mais importante. É preciso avançar no texto e no pensamento. Um passo a frente sempre! É como diz o malandro carioca: quem fica parado é poste e quem anda para trás é caranguejo!                                          
O mundo está oculto nas páginas de recônditos livros de lendas e entretenimentos. É preciso tirar coelhos da cartola, sapos da lagoa, escorpiões do buraco, cobras do serpentário, piranhas do igarapé e atravessar os pântanos das idiossincrasias que durante todos esses anos fomos submetidos, só assim poderemos dar mais um passo à frente.                                                           
Por que tudo tem que ser assim? Ainda bem que quase toda memória está guardada na grande e eterna biblioteca do homem. Precisamos conservar e saber escolher a melhor obra, mesmo sendo uma comédia tudo isso.                                                                   

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

CORREÇÃO DA LÍNGUA



                            Tropeços com verbos e pronomes

Há quem diga e escreva “fazem x dias que…” e Eduardo Martins os desasna assim: “Fazer, quando exprime tempo, é impessoal (não varia: faz dez dias./ Fez dois meses./ Fazia cinco séculos.”
Outros tropeços são detectados com o verbo haver. Didático, ele dá primeiro o erro – “haviam” muitos alunos – e depois explica: “Haver, no sentido de existir, também é invariável: Havia muitos alunos na classe./ Houve muitos acidentes./ Pode haver novos casos de dengue.”
Outro terreno pantanoso é o do uso dos pronomes. Em “está tudo certo entre eu e você”, Eduardo Martins explica àqueles que faltaram à aula no dia em que isso foi explicado: “Depois de preposição, usa-se mim e ou ti: Está tudo certo entre mim e você´.” Ele não dá o seguinte exemplo, mas é bom recordar: “Está tudo certo entre você e eu.”
Redatores nem consultam Manual de Redação
Um outro caso desconcertante no uso dos pronomes é o do “lhe”. Você baixa o programa de antivírus e lá vêm as temidas instruções, com os habituais crimes de lesa-gramática, do tipo “para lhe proteger”, semelhante ao de algumas canções que apregoam para “lhe amar”. O incansável Eduardo Martins retoma a paciência e lembra aos enfermos da língua a bula gramatical: “Lhe não pode ser usado com verbos diretos, pois substitui a ele, a eles, a você e a vocês: Não o conheço./ Nunca a deixarei./ Nós o convidamos./ O marido a ama./ Dois exemplos com lhe: Pedi-lhe (pedi a ele) o favor./ Ficou contente e lhe (a ele) agradeceu.”

Na questão das formas verbais, ele ilustra o que prescreve com um exemplo muito comum: “O Estado interviu”, em que o falante ou escrevente errou a conjugação. O certo é “o Estado interveio”. “Intervir conjuga-se como vir.” Adiante explica outros dois verbos em que muitos tropeçam: mediar e intermediar. É errado “A ONU intermedia conflitos”. “Mediar e intermediar segue odiar: A ONU intermedeia conflitos./ Empresários medeiam negócios.”

Publiquei por achar boa a explicação.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

O Livre Pensar


COMO ESQUECER MARX?
Carlos Sepúlveda

      Fora as bobagens que se escreveram sobre o marxismo como um dogma ou uma religião, é, no mínimo, leviano condenar o trabalho de Marx e seus seguidores ( Engels sobretudo)  como um equívoco condenado ao lixo da História.
       Mesmo para os não marxistas, sejam eles saudosos adeptos das revoluções ou nostálgicos teóricos do comunismo, o autor do Manifesto Comunista de 1848, ainda serve de inspiração para quem pensa no âmbito da Dialética Negativa.
       Hoje, está claro que o marxismo como teoria de legitimação de Estado já teve melhores dias. Mas a herança maldita do Stalinismo e o fracasso da União Soviética enterraram , sob os escombros do Muro de Berlim, a romântica hipótese de uma sociedade sem classe, o que não quer dizer que os fundamentos destas teses não mereçam ser (re) pensadas.
       Lembro-me do episódio que narra o encontro entre Habermas e |Marcuse, estando este último já nos estertores, com tubos espetados em seu corpo, tanto à direita quanto à esquerda. Habermas, ex-aluno fervoroso de Marcuse, dedica-lhe uma derradeira reflexão, que encerraria um impasse teórico entre os dois. Habermas lhe diz que finalmente encontrara a exigência de validade para o socialismo: a compaixão que um homem deve ter pela dor do outro.
       Este legado do marxismo, a meu sentir, não devia ser descartado. Uma sociedade em busca da justiça, solidária com o sofrimento dos outros, se repete na esperanças do recente livro “ O capital no século XXI” de Tomas Picketti cuja leitura recupera muito do que Marx denunciou, sobretudo no que diz respeito à acumulação primitiva..
       No entanto, a teoria marxista como Teoria da Cultura é, ainda, um instrumento válido para as análises das questões culturais que incendeiam este século. Vis a vis da globalização, da imposição de padrões culturais, da grave questão das identidades que hoje explodem no mais cruel terrorismo, cujo entendimento passa pelas teorias da cultura de  viés marxista.
       Aliás, os instrumentos do marxismo ainda podem oferecer boas interpretações para se entender, por exemplo, a Indústria Cultural que fez a fama de Benjamin, Adorno e toda a Escola de Frankfurt.
       A imposição do domínio cultural da classe dominante, classicamente formadora de padrões culturais e de discursos de dominação, pode ser visitado na obra de Michel Foucault ou mesmo de Sartre, dependendo do ângulo que se escolha. Foucault, sobretudo, em ração de sua teoria sobre a ordem dos discursos.
       Esta suposta amnésia em relação ao pensamento marxista esconde, na verdade, uma banalidade e uma leviandade. Escolhe-se o marxismo como uma teoria da práxis como se a práxis cancelasse toda a complexidade da obra  do gênio Karl Marx em favor do puro e simples “transformar o mundo”, escrito na 11ª tese contra Feuebach..
       Não será surpresa se daqui a algumas décadas o marxismo ainda for uma leitura essencial para se compreender os descompassos da Modernidade, isto se o Terror não nos pegar antes.


quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

O Pensamento Político

Sobre a Social-Democracia
Karl Marx e Friedrich Engels

No momento presente, em que os pequeno-burgueses democratas são oprimidos por toda a parte, eles pregam ao proletariado em geral a união e a conciliação, estendem-lhe a mão e aspiram à formação de um grande partido de oposição que abarque todos os matizes no partido democrático; isto é, anseiam por envolver os operários numa organização partidária onde predominem as frases sociais-democratas gerais, atrás das quais se escondem os seus interesses particulares e onde as reivindicações bem determinadas do proletariado não possam ser apresentadas por mor da querida paz. Uma tal união resultaria apenas em proveito deles e em completo desaproveito do proletariado.
O proletariado perderia toda a sua posição autônoma arduamente conseguida e afundar-se-ia outra vez, tornando-se apêndice da democracia burguesa oficial. Essa união tem de ser recusada, por conseguinte, da maneira mais decidida. Em vez de condescender uma vez mais em servir de claque dos democratas burgueses, os operários, principalmente a Liga, têm de trabalhar para constituir, ao lado dos democratas oficiais, uma organização do partido operário, autônoma, secreta e pública, e para fazer de cada comunidade o centro e o núcleo de agrupamentos operários, nos quais a posição e os interesses do proletariado sejam discutidos independentemente das influências burguesas. Quão pouco séria é, para os democratas burgueses, uma aliança em que os proletários estejam lado a lado com eles, com o mesmo poder e os mesmos direitos, mostram-no por exemplo os democratas de Breslau, os quais no seu órgão, a Nova Gazeta do Oder, atacam furiosamente os operários organizados autonomamente, a quem intitulam de socialistas. Para o caso de uma luta contra um adversário comum não é preciso qualquer união particular. Assim que se trate de combater diretamente um adversário, os interesses dos dois partidos coincidem momentaneamente e, como até agora, também no futuro esta ligação, só prevista para o momento, se estabelecerá por si mesma. Compreende-se que nos conflitos sangrentos que estão iminentes, como em todos os anteriores, são principalmente os operários que, pela sua coragem, a sua decisão e abnegação, terão de conquistar a vitória. Como até agora, os pequeno-burgueses em massa estarão enquanto possível hesitantes, indecisos e inativos nesta luta, para, uma vez assegurada a vitória, a confiscarem para si, exortarem os operários à calma e ao regresso ao seu trabalho [a fim de] evitar os chamados excessos e excluir o proletariado dos frutos da vitória. Não está no poder dos operários impedir disto os democratas pequeno-burgueses, mas está no seu poder dificultar-lhes o ascendente perante o proletariado em armas e ditar-lhes condições tais que a dominação dos democratas burgueses contenha em si desde o início o germe da queda e que seja significativamente facilitado o seu afastamento ulterior pela dominação do proletariado. Durante o conflito e imediatamente após o combate, os operários, antes de tudo e tanto quanto possível, têm de agir contra a pacificação burguesa e obrigar os democratas a executar as suas atuais frases terroristas. Têm de trabalhar então para que a imediata efervescência revolucionária não seja de novo logo reprimida após a vitória. Pelo contrário, têm de mantê-la viva por tanto tempo quanto possível. Longe de opor-se aos chamados excessos, aos exemplos de vingança popular sobre indivíduos odiados ou edifícios públicos aos quais só se ligam recordações odiosas, não só há que tolerar estes exemplos mas tomar em mão a sua própria direção. Durante a luta e depois da luta, os operários têm de apresentar em todas as oportunidades as suas reivindicações próprias a par das reivindicações dos democratas burgueses. Têm de exigir garantias para os operários assim que os burgueses democratas se prepararem para tomar em mãos o governo. Se necessário, têm de obter pela força essas garantias e, principalmente, procurar que os novos governantes se obriguem a todas as concessões e promessas possíveis — o meio mais seguro de os comprometer. Têm principalmente de refrear tanto quanto possível, de toda a maneira mediante a apreciação serena, com sangue-frio, das situações, e pela desconfiança não dissimulada para com o novo governo, a embriaguez da vitória e o entusiasmo pelo novo estado de coisas que surge após todo o combate de rua vitorioso. Ao lado dos novos governos oficiais, têm de constituir imediatamente governos operários revolucionários próprios, quer sob a forma de direções comunais, de conselhos comunais, quer através de clubes operários ou de comités operários, de tal maneira que os governos democráticos burgueses não só percam imediatamente o suporte nos operários, mas se vejam desde logo vigiados e ameaçados por autoridades atrás das quais está toda a massa dos operários. Numa palavra: desde o primeiro momento da vitória, a desconfiança tem de dirigir-se não já contra o partido reacionário vencido, mas contra os até agora aliados [do proletariado], contra o partido que quer explorar sozinho a vitória comum.


segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Olha o tamanho do Nietzsche e a pequinês do Paul

Paul Reé  - Lou-Salomé - Friedrich_Nietzsche

A onça e o bode

Luis da Câmara Cascudo

O Bode foi ao mato procurar lugar para fazer uma casa.  Achou um sítio bom.  Roçou-o e foi-se embora.  A Onça que tivera a mesma ideia, chegando ao mato e encontrando o lugar já limpo, ficou radiante.  Cortou as madeiras e deixou-as no ponto.  O Bode, deparando a madeira já pronta, aproveitou-se, erguendo a casinha.  A Onça voltou e tapou-a de taipa.  Foi buscar seus móveis e quando regressou encontrou o Bode instalado.  Verificando que o trabalho tinha sido de ambos, decidiram morar juntos.
Viviam desconfiados, um do outro.  Cada um teria sua semana para caçar.  Foi a Onça e trouxe um cabrito, enchendo o Bode de pavor.  Quando chegou a vez deste, viu uma onça abatida por uns caçadores e a carregou até a casa, deixando-a no terreiro.  A Onça vendo a companheira morta, ficou espantada:
— Amigo Bode, como foi que você matou essa onça?
— Ora, ora… Matando!… Respondeu o Bode cheio de empáfia.  Porém, insistindo sempre a Onça em perguntar-lhe como havia matado a companheira, disse o Bode:
— Eu enfiei este anel de contas no dedo, apontei-lhe o dedo e ela caiu morta.
A Onça ficou toda arrepiada, olhando o Bode pelo canto do olho.  Depois de algum tempo, disse o Bode:
— Amiga Onça, eu lhe aponto o dedo…
A Onça pulou para o meio da sala gritando:
— Amigo Bode, deixe de brinquedo…
Tornou o Bode a dizer que lhe apontava o dedo, pulando a Onça para o meio do terreiro.  Repetiu o Bode a ameaça e a onça desembandeirou pelo mato a dentro, numa carreira danada, enquanto ouviu a voz do Bode:
— Amiga Onça, eu lhe aponto o dedo…

Nunca mais a Onça voltou.  O Bode ficou, então, sozinho na sua casa, vivendo de papo para o ar, bem descansado.