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sábado, 24 de outubro de 2015

UM CONTO DE REIS




O VELHO ENIGMA DAS NINFAS
(PHODAM-SE OS CARETAS)


Tenho vivido e sofrido sentindo a liberdade de recusar a ideia da
culpa e do karma. Ouço sua voz encorpada sussurrando meu nome na hora
exata do gozo (voo). Sou de Oxóssi.  Maria Amélia passei toda noite
sonhando. Maria Amélia passei toda noite pensando. Lindas palavras que
eu preparei pra lhe dizer, mas me esqueci, mas me esqueci. Eu cheguei
lá, mas me esqueci do que ia dizer do que ia falar. Eu cheguei lá, eu
cheguei lá. Fonte do prazer.  Anteontem na noite de Sábado, assisti a
queda de uma bela árvore centenária na esquina das ruas Oriente e
Palmira, ao lado da produtora de audiovisual chamada Brócolis. Eram
mais ou menos dez e meia, eu ia chegando para cumprir mais uma etapa
no escritório de número três, quando, o próprio Caçapa, me alertou que
ela, a árvore estava estalando e tombando. Eu e os eternos convivas,
ficamos observando o transcorrer do evento, dois degraus acima do
outro lado da rua, os bombeiros já tinham sido acionados. A incerteza
a torturar. Depois de outro surdo estalar, seu galho maior que dava na
rua em frente tombou na fiação beirando as janelas do prédio
residencial, devido o calor seco do tempo de inverno, pegou um fogo
rápido ameaçador. Qual nada, a explosão não aconteceu, os bombeiros
chegaram e rodearam com cordas todo o entorno, entre milhares de
comunicações, via vários tipos de ondas virtuais, assim decidiram com
o apoio de outros órgãos, durante a madrugada, decepar aquela vida
antiga. Acho que não havia outro jeito. Na manhã seguinte só restava
um toco no meio do passeio levantado pela sua enorme raiz que teimava
em crescer por baixo do asfalto e do concreto. O fenômeno da lua. Nem
o Biro–Biro, a enciclopédia da Serra, soube me dizer que tipo de
árvore era aquela. Era só ela a árvore. Tão redonda Lua, como flutua.
Olhos cozidos de vida arrastada. Cinema polifônico é só o que desejo
no momento, apesar de andar meio travado. Descobri que pra mim tudo
depende das relações intergalaxiais, não da ordem da comunicação
simplória e sim do apuro da intuição rarefeita em ligação direta, que
melancolicamente vai de mal para pior, interrompida pela falta da
troca de canais, por culpa das contradições, se bem que amo as
contradições. Estive morto durante mais de duas semanas junto com
aquela árvore, essa morte conseguiu fazer com que eu escapasse mais
uma vez do baixio sacolejo da realidade desinteressante. Adoro as
palavras. Não tenho vergonha nenhuma de dia a dia ir ficando mais
doido, ampliando o grau da doce loucura, só sei que agora quero fazer
este filme, apenas tenho que descobrir como. Descobrir a alma do filme
soprou o Saraceni no pé do meu ouvido. De braços dados com o brother
soul.  O aconchego cor de rosa da verdadeira morte com a bela árvore,
minha amante secreta, possibilitou nova ereção frondosa vertical,
quase adolescente à beira do meu umbigo. Fulge, ó rosa, rosa às vezes
de tão rosa vermelha, em explosões de juras de amor, rosa se mostra
esparzindo perfumes nos rincões, no horto montanhês e na cidade
iluminada por luzes intangíveis. Rosa de calor, rosa apaixonada de
rútila esperança orvalhada, língua rosa se expande da cor de Cereja
rosa, cintila por entre luas brancas, de tão brancas acharam em si, o
que tinham de rosas. É fugaz a rosa igual a rosa do coração
apaixonado.  Rosa rubra.  Rosa culposa da menstruação vermelha meio
vermelho rosa. Rosas do Dorival.  Rosas de Abril. Tudo me diz não
podes mais fingir. Rosas a me confundir.  Minha anatomia enlouqueceu,
sou todo coração. Confesso que gostei de minha morte, juntinho da
árvore, por todos esses dias, não posso contar para ninguém, é um
mágico segredo. Morreria de novo com ela, se me chamasse, ou então eu
mesmo a chamaria de meu amor rosa. Sim, podemos morrer só um pouquinho
todo dia, durante as noites também, quem sabe? Ela não respondeu. A
culpa e ela voltaram a se encontrar, pura perda de tempo.  Vamos
seguindo em frente. Não sei o porquê do vamos, se sempre vou só, como
todo mundo que se preza. Os bigodes do Rosemberg. O destino é apenas
um, onde a bússola indica e o coração desconfia, não sei usar fio
dental para o desespero dos meus dentes. Descobri ao acaso esta
sonatina mozartiana. Sofres porque queres, foi o que disse o cara para
a mulher no bar calorento do Domingo sem futebol e eu anotei também
não sei por que, no verso do bilhete do bicho que joguei na cobra e na
borboleta, pode dar na cabeça. Ouvi Recôndita Harmonia do Giácomo
Puccini na voz dele o cantor. O que significou isto para o filme que
estou a fazer, não sei, sei que significou alguma coisa. A receita de
família é manter um distanciamento crítico.  A música começou muito
bem. A rosa louca. O excesso de rosa. Longe lá onde eu nem sei, cantou
o doce Afonsinho Heliodoro. Exitetion Blues. Vou tentar penetrar a
fronteira imprecisa entre a arte e a técnica, disse a rainha da Leica,
tudo foi ajustado com grande precisão, tínhamos já aí a correção de

Paralaxe, leve e manuseável.  A arma do caçador foi esquecida, o muque
da arte pode acertar o alvo por si mesmo como um preâmbulo ainda
desconhecido, como um evangelho não domesticado, como nossa mestiça
bárbara vontade incontida. Eu vou numa caravela, a velha Santa Maria,
que passa Domingo de noite, pelo meu Rio de Janeiro. Se você quiser
também, entre na embarcação e vamos sorrindo para o mundo.

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