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quinta-feira, 15 de novembro de 2012

FOLHETIM


Um Conto de Cinema
A ÚLTIMA CENA

PRIMEIRA
Fundo infinito – Câmera lenta – O dia amanhece artificialmente (jogo de luzes)
Mulheres de todos os tipos e de todas as épocas vestidas conforme os seus personagens.
Outras mulheres, com os corpos desnudos, passam correndo por entre o quadro fixo da imagem. Detalhe do movimento dos corpos, em ângulos diferentes, tantos quantos forem necessários. Um jovial e alegre Pompeu dirige esta cena. O fundo do cenário é o azul do céu que gradualmente vai escurecendo. Algumas nuvens passam ligeira, como passam apressadas as mulheres nuas na cena. No final, projetando o fundo, o céu de estrelas e então as nuvens tornam-se negras. Escurece todo o estúdio. Relampejo, trovoadas na trilha e chuva artificial.
Ruídos de chuva.
Em uma mesa estão sentados um homem e uma mulher. Um garçom serve um cálice de vinho para a mulher e outro para o homem. A mulher chama-se Anita e depois de beber o vinho, olha para seu acompanhante e diz com a sua voz suave: - Para começar, devo dizer que Pompeu fez todos os seus primeiros curtos filmes sobre mulheres despudoradas, todas retiradas dos clássicos da literatura brasileira (A Moreninha, Capitu, Gabriela, Iracema, Emília, Diadorim, Ceci, Carolina, Macabéa, etc.), adaptando-as a suas ideias  orgiásticas. Seus filmes premiados, apreciados pela crítica, foram vendidos no mercado exterior. Ele possuía invejável conhecimento cinematográfico e literário. Poderia ter sido um homem rico, respeitado, se tivesse vivido na Europa, mas foi roubado e traído por Jimi...
O dia amanhece. Nuvens passam ligeiras no céu azul. A praia grande se perde na névoa distante. O mar se quebra em ondas espumosas. Agitam-se as águas revoltas que cobrem o corpo de Pompeu. Ele submerge e emerge enchendo o seu pulmão de ar. Várias ondas seguidas cobrem o seu corpo e ele perde o fôlego, como se afogasse. A expressão de horror, estampado no seu rosto marcado pela exaustão, anuncia-se pelo desespero de suas primeiras braçadas na direção da praia.
No restaurante a beira mar De volta à mesa onde está Anita e o outro homem ela continua narrando a sua história: - Ora meu Senhor! Ele que sempre se achou alguém, reconhecido, querido e festejado por muitos, neste dia soube, enfim, que era um Zé ninguém, um desconhecido, simples matéria do caos universal... Um mortal como muitos. Nunca sentiríamos a sua falta! Olha! Disso tudo que eu quero lhe contar, meu senhor, só sobraram às cinzas de um vulcão que aos poucos foi se extinguindo...
Em um quarto todo branco, muito claro, acontece a cena de um homem (sombra e contraluz), preparando e orientando, com gestos fortes, uma menina que está sentada em uma poltrona. De outro lado, em uma praia deserta de areias brancas com a luz, podíamos observar o rosto de Pompeu molhado, refletindo o sol. Um rosto marcado, agitado e tenso mexendo-se nervoso nas águas do mar bravio. Assustado, atordoado, olhando para o alto onde se vê o céu azul. Pompeu, já bastante cansado, tenta nadar com ajuda dos seus braços batendo na água para não se afogar e, no desespero da salvação, coloca a cabeça para fora da água para respirar... Anita, conta a sua história para o seu desconhecido acompanhante: - Ele já não sofria a angústia dos abnegados, dos conformados. Já não precisava mais do aplauso dos contentes desconhecidos e dos amigos descontentes. Para quem sempre alimentou sua alma de artista com sonhos utópicos... O dia chegou ao seu limite e ele se descontrolou... Nada mais podíamos fazer. Mas ele, ainda descontrolado, continuava batendo as mãos nas ondas, a ponto de se afundar pelo cansaço, e só quando a maré se afastava ele podia colocar o seu pé no fundo, na areia. e achando o chão firme ele pode caminhar com as ondas batendo nas suas costas o empurrando em direção à praia. Ele se esforça na luta contra as águas agitadas. Anita narrando o acontecido na mesa do restaurante: - Só naquele dia, estando inteiramente só, ele pode perceber isso... Mas era tarde. Só assim ele confessa-se ao diabo esperando a sua salvação: - Faltou-me coragem!... Ainda não me preparei para o último e solitário ritual...  Não estou só! Sei o que é a solidão. Trabalhei dia e noite sem descanso para chegar aonde cheguei. Sou um fraco obcecado pelo sucesso... Com o meu fracasso de artista popular, pela incompreensão da minha arte, resolvi ganhar dinheiro e aí fiz qualquer coisa... Fiz um pacto com satanás e só depois de um último esforço supremo, consegui chegar e assentar-me a beira mar. Exausto, perdido no tempo, sentado na areia, falo comigo mesmo e observo do meu lado, na areia, um caranguejo grande e velho correndo de lado em direção do mar: - De tudo só não consigo retirar da minha cabeça a força da última cena... Só o tempo, este destruidor de sonhos, pode apagar todos os meus pesadelos... Estou com sede! Seria bom se a deusa do esquecimento, da boa vida, viesse engarrafada... E para desfrutar deste paraíso era só abrir a garrafa e bebê-la. As deusas, neste dia tenebroso, ficaram contra ele. Diz Anita na mesa do bar. Com o tempo seus pensamentos confusos se repetem. Vê coisas que deixaram de existir. Embaralha-se entre o real e o sonho e não pode resistir a uma crítica sincera...
SEGUNDA  
Pompeu sentado atrás da mesa do seu escritório fala ao telefone:
- Não!... Tomei um porre e desisti do que estava fazendo... Aqueles filmes já não me davam mais nenhum prazer... A porta a sua frente se abre e entra sua secretária anunciando a presença de Jimi. Quando ela cita o nome do estrangeiro, ele vem, maroto, sorrateiro, seguindo os passos dela. Pompeu olha para ele com certo desprezo:- Agora vou ter que desligar, pois chegou aqui na minha frente uma pessoa desprezível... Pompeu falando para sua secretária: - Quem permitiu a entrada deste verme aqui na minha produtora? Jimi, sem sotaque: - Calma! Pompeu... Trouxe-lhe esse taco de beisebol da América como prova da minha amizade... (Silêncio) - Nosso produtor quer um novo filme, só precisamos agora é de uma nova estrela... (silêncio) - Ele viu a foto de Anita e ficou impressionado com sua beleza... (Silêncio) - Sua mulher é que tem que ser a protagonista dos seus filmes... (silêncio – Jimi olha para a secretária) - Com esse corpo e esse gingado, é sucesso garantido na América e nos mercados europeus... Já vejo o título estampado nos cinemas: “A COMÉDIA DO ESCRACHO”.  Estrelando: Anita e Lolita Rodrigues. Pompeu:- Não me venha com essa agora! Não coloque a minha mulher e nem a minha filha nesta merda Jimi. Você andou sumido há mais de seis meses, me deixou sem nenhuma notícia, se escondeu e me escondeu do que é meu. Não vou esquecer que você me deve muito dinheiro.  Você vendeu a minha última grande produção para os seus produtores tarados de Miami e depois de eu te mandar as fitas originais, sumiu com o meu dinheiro... Não tem desculpa Jimi! Seis meses! Você acha que eu vivo como, seu gringo de merda! Deveria matá-lo. Onde está à mala com as minhas verdinhas? Seu prazo aqui na terra está acabando...  Jimi: - Trago aqui comigo muito mais dinheiro do que lhe devo, não fique nervoso... Olha! Eu vou conversar com o distribuidor em Miami e te fazer uma última proposta... Vou te tornar um homem rico! (Pompeu faz cara de nojo) Não faz essa cara! Depois de tudo que nós passamos! Não me venha agora com esse falso moralismo. Estou falando de muito dinheiro!... Pompeu! Estou falando de sua liberdade financeira.
 (Continua ...)

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