Um Conto de Cinema
A ÚLTIMA CENA
SEXTA
ESCRITÓRIO DA
PRODUTORA
A secretária sedutora entra na sala novamente e
imediatamente Jimi se põem ao seu lado.
Pompeu:
- O que foi agora? Trouxe o meu dinheiro ou voltou novamente
de barriga vazia seu verme escroto.
Jimi desencosta-se da mesa onde está Pompeu e pegando a
secretária pelo braço a encaminha com rigidez para a porta que é trancada em
seguida.
Pompeu:
- Mas o que está acontecendo aqui?... Você enlouqueceu? Aqui na minha casa quem
manda é eu!
Jimi:
- Segredo! É confidencial! Tenho uma grande surpresa para
você e ninguém pode saber disso...
Pompeu:
- Certas surpresas vão acabar te matando...
Jimi, depois de uma prolongada gargalhada:
- Como pode morrer quem tem te dado o melhor?
Pompeu:
- Chega de conversa fiada e vamos fechar logo o nosso
negócio... Cadê a mala?
Jimi:
- Falei horas com Miami e resolvemos o melhor para você...
Meu amigo, os seus problemas chegaram ao fim... Preste bastante atenção: são
três cheques – o primeiro, o de menor valor, pode ser resgatado hoje no banco e
tem o suficiente para você produzir o filme e ainda uma boa quantia para saldar
parte de suas dívidas, isso se você não quiser dar o cano em todas elas e
viajar com o dinheiro... O segundo, de valor médio, poderá ser resgatado na
entrega da encomenda, depois de assistida e aprovada. O terceiro, o mais
polpudo, como é de praxe em qualquer negócio, pode ser depositado 30 dias
depois de tudo acertado e, depois disso, você fica emancipado financeiramente e
pode realizar os seus sonhos existenciais: mudar de profissão; tirar uma longa
féria; viver de juros, que é a primeira flor do capital... Ora! Pompeu é pegar,
ou largar!
Pompeu:
- Estou entendendo. Só estou endividado por sua culpa, seu
desgraçado. Você tem me roubado e pela necessidade do trabalho venho aceitando
as suas desculpas e seus filmes de encomenda.
Não estou disposto a tolerar mais isso... Vá ao banco, desconte o
cheque, pague a sua dívida e ai sim vamos conversar...
Jimi:
- O cheque é nominal, não posso trocá-lo... O que você quer
é impossível... Estou colocando a solução em suas mãos, você é louco? Come
merda? Em que mundo você vive. Aqui na terra imbecil quem manda é o dinheiro,
ou você vai dizer que é pouco o que estou te oferecendo? Se você continuar assim o seu próximo filme
irá se chamar “Os últimos dias
de Pompeu”.
Pompeu, com certa ironia:
- Se fosse à vista, na mala e em dólares, estava justo, mas
da maneira colocada eu fico inseguro, pois não confio em você..., ademais, não
tenho medo da morte! (ouve-se um grito em cena)
ESTÚDIO ILUMINADO
Uma mão forte e velha tenta de todas as maneiras fazer com
que a menina se cale.
O rosto assustado da menina com a mão forte que tenta tapar
a sua boca.
NA PRAIA
Pompeu:
- O que você carrega nesta mochila?
Anita:
- Roupas, um pão integral, chá, um cobertor e uma arma.
Pompeu:
- Pra que tudo isso?
Anita:
- Eu ia passear na mata antes de encontrá-lo...
Pompeu:
- Não modifique seu passeio por minha causa, eu posso chegar
sozinho de onde vim.
Anita:
- O caminho de volta é longo e ter sua companhia vai ser um
prazer... Vamos andando?
Pompeu:
- Aceito a sua companhia se você me permitir parar para
conversar de vez em quando e me responder sobre a sua arma...
Anita:
- É uma arma com setas tranquilizantes caso eu encontre
algum animal feroz no meu passeio...
Pompeu caminha em silêncio desconfiado.
Jimi passeia com a mulher de Pompeu pelas ruas da cidade.
Olham, como dois namorados, as vitrines do comércio.
A mão tapa a boca da menina que havia parado de chorar.
A menina morde a mão agressora com violência e consegue se
safar, passando a correr do homem sombra pelo estúdio derrubando coisas.
NO ESCRITÓRIO DA
PRODUTORA
Jimi e a secretária estão de frente olhando para Pompeu.
Jimi:
- Já conversei com sua mulher e ela aceitou o cheque
oferecido..., só falta você aceitar... Pense que os dois podem passar uma nova
lua de mel, com o fim de semana em Miami. Vocês serão os convidados de honra
para a grande festa que iremos promover no lançamento do filme Lolita
Tropical... Você estará rico... Sua filha e sua mulher serão estrelas
internacionais, é a glória! Não é genial Pompeu?
Pompeu:
Quer dizer que você quer eu filmando a minha filha
adolescente com a minha mulher em cenas eróticas e só assim eu posso ganhar o
dinheiro que você me roubou... Novamente outra vez. É tudo muito bizarro...
Você não acha?
Jimi:
- Não é bizarro, pois envolve de cara quinhentos mil dólares
em cena, dez vezes mais o valor de sua dívida. E você ainda pode ser o bem
sucedido empresário de sua filha em Miami, vivendo com rei e a América aos seus
pés.
A mulher concorda, com gestos rápidos da cabeça, em tudo o
que o gringo fala e enfatiza.
NA PRAIA
Anita e Pompeu sorridentes continuam a lenta caminhada pela
praia deserta.
Pompeu:
- Você sabe o que eu
estou pensando agora? ...
Anita:
- Não! ... Fala!
Pompeu:
- Falo! (sorri) Mas tenho medo de não ser entendido por
você.
Anita:
- Sou formada em defesa pessoal, sei me defender...
Pompeu:
- Magrinha desse jeito?
Anita:
- É isso que você tinha medo de dizer?
Pompeu:
- Dizer o quê?
Anita:
- Que eu sou magrinha (sorri).
Os dois param de andar.
Pompeu:
- Quero lhe dizer é que faz muito tempo que eu não me sinto
tão bem... Há pouco tempo o mundo, este paraíso que torno a ver em toda a sua
exuberância, não tinha o menor valor...
Anita:
- Isto é um elogio ou uma constatação?
Pompeu:
- Estou me sentindo um garoto que descobre a vida no olhar
de uma menina que ele acabara de conhecer. Pronto disse o que verdadeiramente
sinto...
Anita:
- Fico lisonjeada com essa energia de vida que acabei lhe
passando...
Pompeu:
- Espero não estar abusando da sua paciência e zelo com esse
velho desconhecido, mas é que nele se opera um milagre...
Anita:
- Sou paciente quando me aproximo do desconhecido; do que me
parece oculto e ao mesmo tempo inteligente.
Pompeu:
- Sou um artista que quis mudar o mundo sabendo que essa
operação não seria um milagre, mas uma conquista de trabalho político-biológico
da natureza do homem, que é se transformar para conquistar uma nova vida... Mas
envelheci e não tenho tempo de começar tudo novamente.
Anita:
- Pompeu! Você tem o tempo nas mãos.
Pompeu:
- Deuses da Grécia! Não tenho mais palavras, vocês me
surpreendem a cada momento nesta travessia. Tenho tantas coisas para falar e
tantas outras para perguntar...
Anita:
- Temos tempo! Mas agora vamos andar um pouco mais?
Pompeu:
- Sim..., um pouco mais.
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