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segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Folhetim 2


Um Conto de Cinema
A ÚLTIMA CENA


TERCEIRA
Pompeu observa uma luz difusa andando em sua direção. Anita vestida de aventureira, de chapéu, com uma mochila nas costas, se aproxima dele sentado na areia à beira do mar. A expressão do rosto molhado de Pompeu vai ficando mais suave. Chega até esboçar um sorriso quando ela (a luz) se aproxima. Ele levanta a sua mão em direção à contraluz.  Anita tenta pegar em sua mão para ajudá-lo a se levantar da areia. Mas, depois de contemplá-la, absorto, Pompeu continua sentado. Abruptamente, meio lunático, ele levanta-se com gestos lentos, falando sozinho. Tudo é feito com muita dramaticidade, quase oriental. Pompeu: - Essa imagem da vida engarrafada não me sai da cabeça... (olhando na contraluz a silueta de uma mulher) - Foi também com uma imagem erótica engarrafada que eu vendi milhões de cervejas para um cliente de Miami... Fiquei rico?... Não! Aquele filho da puta me roubou tudo! (voltando a refletir e olhando para o mar) – O canalha fugiu com o meu dinheiro... (voltando-se para a mulher) – O que eu podia fazer? Os dois ficam em silêncio. Anita bebendo mais uma taça de vinho no restaurante: - Pelo dinheiro ele fez com a sua vida tudo o que não queria ter feito. Queria fazer cinema de ficção, contar as histórias de grandes homens, grandes produções de arte, ter uma família, mas não conseguiu... Logo descobriu que precisava de muito dinheiro para viver e assim colocou o seu talento para revender aos tolos o que todos eles não sabiam, por isso desejavam, queriam ter, a qualquer preço as moreninhas do Brasil. Pompeu, com dor, rola na areia e depois vai se lavar com dificuldade nas águas do mar: - Sonhos Eróticos! Masturbação! Orgias! Era tudo que eles queriam de mim... Era tudo o que eu podia fazer. Tudo pelo dinheiro! Anita bebendo vinho no restaurante: - Foi ele quem criou, quando começou a fazer cinema, o “Besteirol Orgiástico” - experimentos cinematográficos retratando mulheres famosas, mas tudo feito de uma maneira despudorada. Fez algum sucesso, mas não ganhou muito dinheiro e, com o passar do tempo, sem novos projetos, foi ficando deprimido, cheio de dívidas, até aparecer Jimi, o americano de Miami, cheio de dólares para gastar com as mulheres e o erotismo brasileiro... Um Taxi com Jimi passeia pela cidade. Jimi desce do taxi vê a secretária e lhe dá um demorado abraço e aos poucos vai compondo poses, beijos e carinhos escondidos com a mulher de Pompeu. Jimi e ela entram em um prédio antigo. Anita comendo no restaurante: - Com esse empresário americano, depois de um começo espetacular de sucesso financeiro, de entendimento e trabalho, veio à dúvida e a decadência... Os enredos e as mulheres se repetiam, algumas das suas melhores meninas desapareceram ou viajaram para América e nunca mais voltaram. Seus filmes sem graça, com mulheres mais velhas e cenas repetidas, não agradava aos empresários de Miami. Assim ele gastou todo o seu dinheiro na sua nova e definitiva produção... Foi levada para América e desapareceu na mão do americano. Pompeu estava vivendo em grande dificuldade quando ele retornou. Sentado a mesa Pompeu abre uma gaveta onde fica um revólver. Ele fecha a gaveta e levanta-se falando em direção da sombra que logo sai de cena. Pompeu irritado: - Em muito pouco tempo realizei tudo que me foi proposto. Mas agora você quer o inimaginável, o inenarrável, o que não pode ser feito. Não posso aceitar essa sua nova proposta por principio...  Assim preciso do meu dinheiro e você tem poucos dias para levantar e pagar o que me deve. Agora, ponha-se daqui para fora! Pompeu volta a sentar-se na sua macia poltrona de couro e coloca a sua cabeça sobre as suas mãos. Anita continua bebendo no restaurante: - Mas ele estava sem dinheiro e com o passar dos dias imaginava-se enlouquecendo, ficou deprimido rapidamente... Chorou copiosamente em sua mesa de trabalho. Foi assim até acontecer o inesperado... Um dia, quando acordou, havia se tornando um animal feroz e selvagem.

QUARTA
O homem sombra prepara as luzes e dirige a cena tentando fazer, aos poucos e com muito cuidado, que a menina fique mais sensual. A menina, sentada em uma poltrona vermelha, fica um pouco inibida... A luz dos holofotes rompe a escuridão da cena
O sol e suas sombras refletidas. No mar agitado as ondulações da luz. O rosto de Pompeu, com seu olhar lânguido, está sereno e seco. Pompeu: - Por querer o dinheiro acima de todas as coisas eu perdi tudo que tinha. Nunca mais fiz um filme. Nunca mais vi a minha filha... Mas havia nesta loucura uma razão: eu achava que estava no fim e o tempo foi passando... Anita: - É isso que eu estou entendendo? Um americano vem de fora para te roubar e você não faz nada? Pompeu:  - Fiz, sim! Procurei imediatamente o meu psiquiatra, pois passei a somatizar os meus desejos de vingança em todas as garrafas... – Você precisa sair de férias, disse-me ele, parar de beber, descansar e andar, sem pensar em nada, totalmente zen, pela praia deserta... Pompeu, agora mais tranquilo, mais realista, olha para Anita e pergunta: - Mas afinal quem é você? Anita, olhando para ele com o rosto sério, mostra indecisão no que vai falar: - Eu vinha andando pensativa pela praia..., é claro!... Aí te vi saindo cansado do mar...  Fiquei preocupada...  Olha! Só me aproximei para oferecer ajuda! Mas agora que eu vejo que o senhor está em bom estado, devo-lhe dizer uma coisa... Pompeu: - Não! Eu não estou nada bem... Mas sou-lhe grato por isso. Vamos andar um pouco? Pompeu esta saindo à rua pela porta de um hospital. Os carros passam ligeiros – buzinas e freadas. Ele que está cabisbaixo e preocupado, ascende um charuto, olha ao seu redor e atravessa a rua movimentada sem muita atenção. Imagens com som de freadas e buzinas. Andando ele chega a uma praça onde brincam algumas crianças. Uma das crianças se aproxima dele. Ele passa a mão em sua cabeça. A criança corre. Ele continua o seu caminho.Pompeu, anda com dificuldade na areia. Caminha rente a água que vai lavando os seus pés descalços. As nuvens se acumulam na linha do horizonte. Pompeu, desconfiado, fala com certa dificuldade para Anita: - Você sabe me informar se estamos muito longe da pousada? Perdi o senso de orientação porque me afastei sem me preocupar em voltar... Anita:- Um pouco longe, vai dar uma boa caminhada para chegar lá antes do anoitecer... Mas eu vou te acompanhar e no longo caminho paramos quando o senhor estiver cansado... Pompeu: - Obrigado, se você fizer esse sacrifício, eu ficarei feliz... Mas não me chame mais de senhor. Eu sou Pompeu e você?- Anita... Pompeu:
- Anita! Você tem o nome da minha filha... É muito bonita. Já nos conhecemos?... Anita, constrangida, nega conhecê-lo balançando a cabeça. Pompeu: - Engraçado, mas tenho certeza que te conheço...  Anita: - Não me conhece! O que você pensa conhecer não passa de um simples déjà-vu. Os dois sorriem.



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