TRAGÉDIA
BRASILEIRA
Manuel Bandeira
(19 de abril de 1886 – 13 de outubro de
1968)
Misael,
funcionário da Fazenda, com 63 anos de idade.
Conheceu Maria
Elvira na Lapa – prostituída, com sífilis, dermite nos dedos, uma aliança
empenhada e os dentes em petição de miséria.
Misael tirou
Maria Elvira da vida, instalou-a num sobrado no Estácio, pagou médico,
dentista, manicura... Dava tudo quanto ela queria.
Quando Maria
Elvira se apanhou de boca bonita, arranjou logo um namorado.
Misael não
queria escândalo. Podia dar uma surra, um tiro, uma facada. Não fez nada disso:
mudou de casa.
Viveram três
anos assim.
Toda vez que
Maria Elvira arranjava namorado, Misael mudava de casa.
Os amantes
moraram no Estácio, Rocha, Catete, Rua General Pedra, Olaria, Ramos,
Bonsucesso, Vila Isabel, Rua Marquês de Sapucaí, Niterói, Encantado, Rua Clapp,
outra vez no Estácio, Todos os Santos, Catumbi, Lavradio, Boca do Mato,
Inválidos...
Por fim na Rua
da Constituição, onde Misael, privado de sentidos e de inteligência, matou-a
com seis tiros, e a polícia foi encontrá-la caída em decúbito dorsal, vestida
de organdi azul.
TEATRO MARÍLIA BH/MG
TRAGÉDIA MINEIRA (1966)
Esta
foi a primeira vez que li o poeta. Adoro esse poema que segue abaixo - não sei
o seu nome, mas é do mestre Manuel Bandeira, disso eu ainda tenho certeza -
ouvi o seu canto pela primeira vez na voz potente do ator Paulo Augusto, na
peça-colagem escrita por Marco Antônio Menezes “Não Poesia Para”, que foi
apresentada também pelo grande ator (que trabalhou no meu filme interpretando
Peter W.Lund o famoso paleontólogo dinamarquês de Lagoa Santa) José Aurélio Vieira.
Sensacional! Ali estava a vanguarda do teatro mineiro da minha adolescência.
Paulo Augusto:
Entre brumas, ao longo, surge a aurora.
O
hialino orvalho aos poucos se evapora,
Agoniza
o arrebol.
A
catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece,
na paz do céu risonho,
Toda
branca de sol.
Quando em meu peito rebentar-se a fibra,
Que
o espírito enlaça a dor vivente,
Não
derramem por mim nem uma lágrima
Em
pálpebra demente.
Por um lado te vejo como um seio murcho
Pelo
outro como um ventre de cujo umbigo pende ainda o cordão placentário.
És
vermelha como o amor divino
Dentro
de ti em pequenas pevides
Palpita
a vida prodigiosa
Infinitamente
Transforma-se o amador na cousa amada,
Por
virtude do muito imaginar;
Não
tenho logo mais que desejar,
Pois
em mim tenho a parte desejada.
OUTRA POESIA EXTRAORDINÁRIA DO MESTRE ESCRITA EM TERESÓPOLIS EM 1912
DESENCANTO
Eu faço versos
como quem chora
De
desalento... de desencanto...
Fecha o meu
livro, se por agora
Não tens motivo
nenhum de pranto.
Meu verso é
sangue. Volúpia ardente...
Tristeza
esparsa... remorso vão...
Dói-me nas
veias. Amargo e quente,
Cai, gota a
gota, do coração.
E nestes
versos de angústia rouca
Assim dos
lábios a vida corre,
Deixando um
acre sabor na boca.
-- Eu faço
versos como quem morre.
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