PARA ONDE?
Por que milhões de pessoas vão às ruas
manifestar-se, mesmo sem ter tido conhecimento dos passos mais recentes dados
pelos poderes do Estado no sentido da destruição do País?
2. Claro que para revoltar-se nem precisam
estar bem informados. Basta sentir os sofrimentos decorrentes de
problemas que continuam agravando-se : 1) transporte público insuportável e,
além disso, nas grandes cidades, transporte particular inviabilizado pelo
excesso de veículos; 2) acesso difícil ou inexistente a serviços
públicos de saúde e de educação, de alguma qualidade, além de, no âmbito
privado, preços absurdos sem qualidade correspondente; 3) salários
baixos; 4) preços elevados, em mercados dominados por empresas e bancos
concentradores; 5) impostos e taxas numerosos e custosos.
3. Credita-se ter desencadeado a faísca ao Movimento do Passe
Livre (MPL), baseado em São Paulo e outras cidades, organizado há anos e
voltado para objetivos justos, embora limitados
4. O momento em que surgiram os
protestos devidos ao aumento das passagens de ônibus em São Paulo, coincidiu
com os jogos da Copa das Confederações, a qual expôs os superfaturamentos e
outros absurdos ligados à construção dos estádios.
5. É compreensível que associem esses
gastos suntuários às carências no atendimento das necessidades da população.
6. Falta, porém, elevar mais o número dos
manifestantes e motivá-los a lutar pela erradicação das verdadeiras causas das
desditas do povo. Para isso é urgente disseminar, para dezenas de milhões
de brasileiros, as informações econômicas e políticas relevantes.
7. Dizer-lhes, por exemplo: Os
gastos com a dívida pública absorveram 43,98% dos recursos federais em 2012. Mais de R$ 750 bilhões. Para a saúde foram
destinados somente 4,17% desses recursos;3,34% à educação; 0,7 aos transportes; 0,39% à segurança e 0,01% à
habitação.
8. Os R$ 750 bilhões para a dívida equivalem a quase o total
dos investimentos públicos e privados no mesmo ano. Significa que se esse
dinheiro fosse investido produtivamente, em vez de dilapidado em despesas
financeiras, poderiam
ser dobrados os
gastos realizados na produção e na geração de empregos.
9. Desde 1988
foram gastos 10 trilhões de reais com a dívida pública. Um trilhão é mil vezes
um bilhão, e um bilhão é mil vezes um milhão, que é mil vezes mil.
10. De onde veio isso: A indústria e os mercados são controlados
por empresas estrangeiras, que remetem dinheiro ao exterior de mais de quinze
modos. Os bens e serviços que vendemos são subfaturados, e os que compramos são
superfaturados.
11. Então
se acumulam as dívidas. O
produto de nosso trabalho, os nossos minérios, a produção agrícola, tudo é
mandado para o exterior por quase nada, e o governo ainda premia os exportadores
e os isenta de ICMS e contribuições sociais.
12. Por
que é assim? Os
políticos recebem dinheiro das empresas e bancos concentradores para as
eleições e dependem também das TVs comerciais e imprensa, tudo ligado aos
concentradores financeiros.
13. Por
isso o problema dos investimentos produtivos não é só serem poucos, mas serem
mal escolhidos e realizados. Tudo é desenhado, orientado para o ganho dos
concentradores: transportes, educação, saúde, telecomunicações e
energia.
14. E também: O
transporte está ruim? Lógico, as ruas estão entulhadas com veículos produzidos
por montadoras estrangeiras, às quais o governo federal, os estaduais e
os municipais dão prêmios e isenções de centenas de bilhões de reais. E não
construíram linhas de metrô. Por isso o trabalhador se desgasta durante cinco
horas por dia dentro das conduções. Não se fazem tampouco hidrovias nem
ferrovias para transportar passageiros e cargas.
15. A corrupção tem efeitos muito mais graves que os
percebidos pela grande maioria dos brasileiros. Esta se indigna diante
dos casos de enriquecimento, na ordem de milhões de reais, dos políticos e
agentes públicos, que a grande mídia resolve expor, poupando os corruptos mais
ligados aos interesses estrangeiros.
16. O povo não protesta, ainda, com a devida força, contra as
lesões praticadas pelo atual governo ao patrimônio público nos leilões de
petróleo - trilhões de dólares entregues praticamente de graça a
petroleiras estrangeiras - nem contra a gradual destruição da Petrobrás.
17. Ainda por cima Executivo e Legislativo fazem demagogia
decretando que 75% dos royalties do petróleo sejam carreados para a educação e
25% para a saúde. Ora, esses percentuais incidem sobre praticamente nada,
além de a produção ainda demorar, os royalties são 10% das receitas
subdeclaradas (o governo não controla o que sai).
18. Ainda se manifesta pouco contra as concessões de
ferrovias, portos e aeroportos financiadas pelo BNDES. Igual com os empréstimos
de grande vulto para empresas concentradoras e para as parcerias
público-privadas nos investimentos de infra-estrutura, em que o setor
privado tem lucros garantidos pelo Estado, sem sequer investir.
19. Não se mostra ao povo de que modo os
bancos obtêm ganhos colossais. Apenas três bancos privados - Itaú,
Bradesco e Santander - somam lucros anuais de R$ 30 bilhões, emprestando
e aplicando dinheiro dos depositantes. E o art. 164 da Constituição obriga o
Banco Central a financiar somente os bancos, proibindo-o de financiar o próprio
Tesouro Nacional.
20. Ignoram-se, ainda, os prejuízos de trilhões de reais que
resultaram das privatizações de FHC, como a da Vale, a do BANESPA, dado ao
Santander, e as das siderúrgicas. E as de serviços públicos extorsivos e
deficientes, como a eletricidade e as telecomunicações.
21. Nem falam das antigas estradas construídas com dinheiro
público, mal conservadas e entregues a concessionárias, que se cevam através de
absurdos pedágios. E ninguém constroi novas.
22. Está, pois, na hora de o povo ser
informado do que precisa saber para exigir instituições que revertam a
lastimável situação do País.
23. Conscientizá-lo de que a luta é árdua. A mídia condenará
as manifestações quando focarem no que interessa, e recrudescerá a repressão
policial, inexistente para vândalos e assaltantes.
24. Mas o povo terá de enfrentar isso tudo, se não quiser,
mais uma vez, servir de massa de manobra para os interesses que o têm mantido
sem perspectivas de se libertar. Libertar-se das imposições de potências
estrangeiras, brutais embora ocultadas.
25. Em suma, ter-se-á de ir ao fundo da
questão: exigir autodeterminação, só possível num sistema político em que os
governantes não sejam escolhidos, cooptados, corrompidos nem acuados pelos
concentradores.
26. Os obstáculos são muitos. Um dos
principais é o tradicional jogo do império anglo-americano, de incitar o ódio
ideológico. Para vencê-lo, os brasileiros têm de se unir em torno de questões
concretas pautadas pelo interesse nacional.
27. Por exemplo, os manipuladores
qualificam o governo de socialista ou neocomunista, quando as políticas dele
privilegiam a oligarquia financeira imperial. Enquanto isso, partidos como o PT
e PCdoB espalham o mito de serem de esquerda.
28. O programa de reconstrução do Brasil
deve priorizar a reindustrialização sob capital nacional e dar ênfase à defesa
do País. O oposto do que acabam de fazer lideranças da Câmara dos Deputados
desengavetando o acordo que cede aos EUA, potência balística, nuclear e
imperial, a base de lançamento de foguetes em Alcântara.
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Adriano Benayon é doutor em economia e autor do livro Globalização versus
Desenvolvimento.
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