Fictício Diálogo, Kit, Vieira, Polany, Kautsky, Owen, Marx, Sobre o Fato Real
José Luiz Vieira
- Houve uma falha em nossa
conexão!
- Antes lhe enviei o prefácio
que havia acabado de escrever sendo em seguida convocado para uma conversa mais
direta, amparada pelos aparatos da imagem e do som.
Assim que a conexão se
estabeleceu fui abruptamente arguido:
- Você leu "A Grande
Transformação" do economista e sociólogo Karl Polany?
A humilde sinceridade em mim
presente respondeu:
- Não, pois desconheço esse
autor não podendo assim por consequência óbvia conhecer sua obra.
Mr.Kit então prosseguiu por
longo tempo seu monólogo:
- Aqui na Europa há tempos é
o autor mais lido por filósofos, economistas, antropólogos e interessados de
forma geral pelo assunto...
Remetendo-me, em seguida, um
texto crítico sobre o livro acima citado.
- Aqui
no velho mundo, Marx está de fato morto e enterrado, com mais de 7 palmos de
terra sobre sua lúcida cabeça.
De pronto assustei-me, contendo minha ingênua
indignação e logo pensei: - Como pode tamanha alienação sendo o velho mundo o
continente contextual de um processo histórico que se desenrola sem solução até
os dias de hoje?
Fui interrompido pela interposição "concomitante
dos sons", com diálogos sobrepondo-se uns aos outros, até me calar para
que possível fosse algum entendimento então ouvindo.
- José leia o livro! Leia anteriormente a
crítica sobre ele e verás que ambos abordam não somente o mesmo tema, como da
mesma forma sem se embasarem em "dogmas já padecidos dentro de si
mesmos", pelo excesso de crença e não por excesso de reflexão, sendo que
ambas são inesgotáveis... Desejo deixar claro que o
foco de nossa temática não é fazer apologia
ou depreciar dogmas já
padecidos dentro de si mesmos pelo excesso de crença e consecutiva carência de
reflexão. Espero da mesma forma não decepcionar fanáticos para com sufixos
tais como: ista; ismo; dentre
outros.Para não cairmos em constantes contradições causadas pelos “ismos” ,
sendo capazes de prosseguir à busca de um pensamento puro e livre de
pré-conceitos.Vamos abolir de imediato o termo Marxismo, nos restringindo
apenas a refletir sobre as observações de Marx a qual se refere ao impacto
nocivo do processo de produção capitalista para com a integridade da natureza
do homem.
Para a produção de toda e qualquer mercadoria ou “riqueza”,
sendo ela de propriedade material ou intelectual,necessitamos imprescindivelmente
de dois fatores : Trabalho
Humano e Recurso Natural.
A mercadoria que “ao primeiro olhar”, nos parece como algo “isenta
de tudo” adquiri todo seu “caráter social”, determinado pelo
seu modo de produção, sendo este determinado pela sua finalidade.
O novo modelo de produção capitalista foi gradativamente extraindo o “caráter social” da mercadoria,
assim como sua função reguladora de uma economia sustentável baseada na divisão
dos recursos naturais, e do trabalho humano para gerá-la.
Não foi preciso mais de uma década após sua implantação, para
que fosse possível fazer um diagnóstico assertivo sobre seus impactos devastadores
à integridade social , econômica e moral do homem.
Ainda no século XIX, Robert Owen constatou que o novo
capitalismo causava não só o empobrecimento material dos trabalhadores mas
também o rompimento da cultura ética à qual os trabalhadores pertenciam e
através da qual definiam a sua identidade. Owen foi dos primeiros a reconhecer
que as instituições econômicas têm um impacto no auto-reconhecimento cultural
das pessoas. Ele advogava (e chegou mesmo a estabelecer) uma organização
alternativa da produção industrial, que permitisse aos trabalhadores definir as
suas vidas através do respeito mútuo e da cooperação.
-
Você já leu Kautsky? Ele é fudamental!...
(Karl Kautsky (Praga, 18 de outubro de 1854 — Amsterdã, 17 de
outubro de 1938) foi um teórico político alemão, um dos
fundadores da ideologia social-democrata. Foi uma das mais importantes figuras da história do marxismo, tendo editado o quarto volume do Das Kapital, de Karl
Marx). ...Especialmente dada à escassez de bibliografia confiável em
português que continua dominado por literatura confessional, salvo honrosas
exceções. E neste campo, a literatura confessional continua se prestando às
mais terríveis falsificações, em nome da preservação de certos dogmas cujo
interesse de manutenção está nas instituições eclesiásticas às quais algumas
editoras pertencem. Deste modo, é sempre importante uma obra escrita com o
necessário “ateísmo metodológico”, no caso de Kautsky fornecido pelo que se
entendia à época por “materialismo histórico” – a saber, a ideia de estudar a
história sempre a partir do movimento de suas forças econômicas. É verdade que
o “materialismo histórico”, da forma como ficou sob o domínio do stalinismo,
tornou-se apenas um arremedo de força intelectual/filosófica, convertendo-se em
dogma de implantação violenta e coercitiva, do mesmo modo que as doutrinas
cristãs em séculos anteriores. Não é assim com a forma em que a metodologia foi
empregada por Kautsky. O que o autor faz é o que convencionamos chamar de
História Nova, que conhecemos no Brasil apenas pelos autores franceses
influenciados pelo marxismo (começando com Marc Bloch e Lucien Febvre – que
também escreveram sobre história do cristianismo). Kautsky trabalha com a
literatura latina, com memorialistas como Josefo, com a literatura patrística
(especialmente a do segundo século) e mesmo com as Escrituras do Cânon Cristão.
O autor faz aquilo que se tornou o metiér do
historiador no século XX: tira das fontes apenas o que elas não pretendem
dizer, desconfiando sempre daquela intencionalidade que faz de todo documento
um monumento, ou seja, um discurso para a posteridade, imbuído de uma série de
armadilhas possíveis na sua leitura.O autor também dialoga com a fabulosa
erudição alemã do século XIX, tanto histórica quanto teológica, o que torna o
livro muito interessante para o leitor brasileiro, à medida que não temos
conhecimento desta bibliografia de base, inacessível em nossa língua. O livro
é, então, muito mais do que uma história do cristianismo nos primeiros séculos:
é uma síntese da pesquisa história sobre o império romano, a filosofia
helenística e os movimentos do judaísmo. Com base neste vasto panorama, Kautsky
tira do cristianismo uma série de pretensas originalidades e mostra o movimento
como deve ser visto: inserido nas disputas e contradições de seu tempo. Da
mesma forma, trata como fonte histórica os Evangelhos e as Epístolas do Novo
Testamento apenas naquilo que eles possuem de valor histórico: um testemunho
sobre as comunidades que lhe deram forma escrita, entre 40 e 100 anos após a
morte de Cristo. Para isso ele usa de forma muito instigante a crítica bíblica,
disciplina que teve o grosso do seu desenvolvimento no século XIX. O
cristianismo assim desvendado por Kautsky foi um movimento proletário, a
princípio uma comunidade sediciosa do nacionalismo judaico de Jerusalém e da
Galiléia, que praticou o comunismo do partir do pão – que o autor classifica
como um comunismo de consumo. Este o seu interesse pelo estudo do tema, pois o
estudo das origens do cristianismo surgiu primeiro como uma introdução a uma
obra em dois volumes intitulada Movimentos
comunistas na Idade Média e O comunismo na reforma alemã. Como fosse
criticado por outros historiadores, o que era um capítulo inicial foi desenvolvido
em uma obra maior e melhor fundamentado, resultado que continua relevante 100
anos depois. Para mim, além da caracterização da comunidade cristã primitiva de
Jerusalém (da qual temos boas caracterizações por outros autores), o que chama
mais à atenção na obra de Kautsky são suas explicações sobre a transformação de
uma comunidade radical proletária em uma instituição hierárquica, processo que
sabemos que estava completo nos tempos de Constantino (século IV), mas que até
hoje considero que ninguém explicou tão bem como nesta obra. Kautsky propõe que
as próprias contradições do regime de comunismo de consumo praticado pelos
cristãos primitivos levaram às transformações operadas, fortalecendo a
autoridade dos bispos. Deste modo, é muito interessante ler uma história em que
o cristianismo dos primeiros séculos não se reduz a um embate
filosófico/doutrinário entre os primeiros teólogos (como geralmente o assunto é
tratado na bibliografia sobre o tema), mas é apresentado como a história da
vida comum dos pobres e de suas esperanças escatológicas, bem como os limites e
contradições de suas formas de vida e trabalho.Também recebe importância nas
considerações de Kautsky o surgimento de um comunismo de produção nos
mosteiros, a partir do século IV – assunto pouco discutido pelos historiadores,
mas que tem papel preponderante no desenvolvimento de toda a economia europeia
da Idade Média. Enfim, continua sendo uma obra única e indispensável, pelas
suas qualidades em intercalar o interesse para o estudo histórico de questões
de economia, política e religião. E só nos mostra o quanto andamos atrasados em
nossas discussões brasileiras sobre o tema, enquanto passamos um século
desconhecendo esta interpretação tão original.
- Puxa! Pensei: Como fala Mr.Kit!
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