A falta do Estado torna a
todos, prematuramente, órfãos de pai e mãe.
O meu estado é de total desespero e absoluto
medo de faltar o pão.
Não há cachorro nem caça; nem sonho, nem
nada...
Jose Vieira
Tirania
financeira
1. Michael Hudson, professor da Universidade Misouri-Kansas, escreveu excelente artigo, “O enganoso abismo fiscal dos EUA em 2012”. A enganação diz respeito a que o déficit orçamentário não precisaria existir (mas existe) e às suas reais causas.
1. Michael Hudson, professor da Universidade Misouri-Kansas, escreveu excelente artigo, “O enganoso abismo fiscal dos EUA em 2012”. A enganação diz respeito a que o déficit orçamentário não precisaria existir (mas existe) e às suas reais causas.
2. Ele está em US$ 14 trilhões, o
equivalente a quase um PIB anual dos EUA e menos que seu governo gastou para
salvar os bancos. Nouriel Roubini aponta que o recente acordo entre Obama e
parlamentares do partido “republicano” prenuncia novo colapso, pois prevê reduções
fiscais, e não há como abrir mão de receitas tendo que cobrir um déficit dessa
magnitude.
3. Os economistas do sistema clamam que, para reduzir os
déficits públicos, há que: 1) cortar despesas sociais, obrigando os
trabalhadores a financiarem seus planos de saúde e aposentadorias; 2) fazer que
o Estado deixe de investir nas infra-estruturas econômicas e sociais; 3)
demitir servidores; 4) privatizar as propriedades e os serviços públicos.
4. O Brasil seguiu, mais de uma vez, esse caminho, o que
intensificou os malefícios da desnacionalização, encetada em 1954, e causa
primordial de o País estar muito atrás de países, antes, muito mais
pobres. O serviço da dívida e as privatizações acabaram de inviabilizar o
desenvolvimento, de modo irreversível até que sejam substituídas as atuais
estruturas econômicas e políticas.
5. A Europa - desprovida de soberania - pois o Banco
Central não emite moeda para financiar os países membros, arruína-se
através das políticas de “austeridade”, que agravam a depressão a pretexto de
reduzir os déficits públicos gerados pelo colapso dos derivativos.
6. Os EUA só não estão de todo afundados, por empregarem a força
para obrigar produtores de petróleo a vendê-lo em dólares e por emitirem-nos à
vontade para pagar importações e o serviço da dívida.
7. Os analistas não submissos mostram que
os déficits não provêm das despesas sociais nem dos investimentos públicos nas
infra-estruturas. Na verdade, os orçamentos do Estado foram onerados pelas
operações de socorro aos grandes bancos, que ficaram em dificuldades quando os
derivativos se revelaram títulos podres, após terem gerado lucros fantásticos
para seus controladores.
8. Em suma, a oligarquia financeira, dona desses bancos e de
outras indústrias dominantes, comanda, através de títeres políticos, os
governos das “democracias”, bem como os formadores de opinião em cátedras
e nos meios de comunicação.
9. Ela subordina a todos, por meio das políticas fiscal e
monetária. Os 0,01% da oligarquia (incluindo executivos) são privilegiados por
isenções fiscais e como credores, com o endividamento do Estado e de mais de
90% da população.
10. Por isso não admitem que os Tesouros nacionais emitam moeda
para financiar o de que precisa a economia. Criou-se a mentira – aceita como
verdade – que isso seria inflacionário. O sistema exige que o próprio o Estado,
endividado por ter socorrido os bancos, dependa do crédito deles.
11. O cartel dos bancos, nos EUA, recebe dinheiro emitido pela
Reserva “Federal” a juros de 0,25% aa, muito abaixo da taxa da inflação, e
aplica em títulos especulativos e nos de países, como o Brasil e a Austrália,
que se deixam tosquiar pagando juros elevados nos títulos públicos.
12. Como assinalei em artigo, “No Limiar de 2013”, não interessa à oligarquia acabar com a depressão, que dela se serve para quebrar o poder e a resistência de quantos pretendam equilibrar a sociedade e promover seu bem-estar.
13. O orçamento equilibrado é
um dos instrumentos ideológicos para arranjar depressões. Falam da economia
como se esta devesse ser gerida por quitandeiros ou políticos demagogos, na
linha de Cícero (século I AC): “não gaste mais do que arrecada”.
14. Michael Hudson recorda que
as depressões coincidiram com períodos de superávit orçamentário. Este precedeu
e/ou acompanhou as seis depressões iniciadas em 1819, 1837, 1857, 1873,
1893 e 1929. A atual, iniciada em 2007, é efeito retardado dos superávits
de Clinton (1998/2001), postergada em consequência das bolhas da internet
e dos imóveis residenciais, com inusitada explosão do crédito.
15. Quanto mais obtém maior concentração de riqueza – reduzindo assim o poder relativo inclusive dos ricos fora do topo da pirâmide – mais a oligarquia se converte em tirania.
16. Discordo
de Hudson quando conclui que isso é não é capitalismo, mas sim
feudalismo. Na verdade, o capitalismo converte-se em algo pior que o
feudalismo, porque nele não há limites à concentração.
17. Quanto ao Brasil, lembrou, há pouco,
Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES: "Não estamos sequer reproduzindo a República
Velha. Esta República atual praticamente universalizou a desnacionalização."
18. Enquanto
isso, o sugado povo brasileiro é distraído pelo “combate à
corrupção”, como se essa não fosse sistêmica. Milhões indignaram-se com o
mensalão e aplaudem o STF.
19. Entretanto, até hoje, dormem,
engavetados nos tribunais superiores, os processos em foi provada a colossal
roubalheira das privatizações (Vale Rio Doce, elétricas,
telecomunicações, siderúrgicas, bancos estaduais), após terem
esses tribunais cassado as liminares concedidas para sustá-las. Elas já
completaram, impunes e consolidadas, quinze anos em média.
20. Mais
tragicômico: os atuais “governantes”, além de nada terem feito para mudar
a triste estrutura formada conforme o Consenso de Washington, usam
o BNDES e a política fiscal para cevar ainda mais os concentradores, principalmente
transnacionais, que desviam renda nacional, em quantias crescentes, para
o exterior.
21. Isso é pouco para a mídia e demais
alienados - antinacionais, desde antes do primeiro golpe contra Getúlio
Vargas, 1945. Trabalham pela volta dos perpetradores do desastre em
mega-doses. Mais: mesmo fora dos dois partidos ocupantes do
Planalto nos últimos 18 anos, falta espaço, sob as instituições presentes, para
lideranças capazes de oferecer alternativa real.
Adriano Benayon é doutor em economia e autor do livro
Globalização versus Desenvolvimento.
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