Recebi do meu amigo Sérvulo um novo texto que tomei a liberdade de titular pois acho essa carta-artigo pertinente ao momento cultural do cinema brasileiro. Para minha alegria ele está se tornando um valoroso colaborador desta revista eletrônica.
O Espelho do Ecran
Continuo pensando em seu comentário. Acredito que o cinema brasileiro precisa ser capaz de produzir um modelo alternativo ao sistema dominante, como o fez com o cinema novo e o chamado cinema udigrudi, do qual você participou.
Os nossos produtores e diretores precisam esquecer por um tempo as benesses dos patrocínios – que nem sempre chegam – e procurar restabelecer uma ligação com o público, que perderam. Na verdade, em muitos casos esta ligação jamais chegou a se estabelecer porque esteve mediatizada por exibidores e distribuidores que no Brasil sempre estiveram a serviço do cinema americano.
Como correspondente no Brasil do jornal de show-business The Hollywood Reporter, eu sempre ouvi falar que o maior alvo da Motion Picture Association of America (MPAA) era a privatização da distribuidora da Embrafilme que abocanhava quase 40% do mercado, o que finalmente conseguiram com a implantação do modelo neoliberal no cinema brasileiro a partir de 1990. Ficamos então à mercê do cinema internacional, que tomou conta da distribuição, se apoderou de um setor ainda maior da exibição e conta hoje até com patrocínio oficial para produções.
Para rompermos este círculo vicioso, será necessário buscar outras formas de exibição, recorrer às novas tecnologias do data-show, pequenas salas digitais, mercados alternativos de venda de DVD’s, como se faz na Nigéria por exemplo, e até uma estrutura de camionetes equipadas que vá ao interior levar o audiovisual a quem nunca teve a possibilidade de vê-lo, como no antológico filme de Octavio Cortazar, Por Primera Vez.
Temo que esta seja uma tarefa muito difícil para o nosso contexto já que em meus já longos anos de observação jamais percebi uma grande união entre as pessoas de cinema no Brasil, a não ser quando motivada pelo interesse em atraentes recursos financeiros.
Por outro lado, também penso que o prolongado efeito da Rede Globo sobre o produto audiovisual brasileiro já tenha deformado a nossa percepção do que possa ser considerada uma expressão mais propriamente nacional. Acreditamos hoje que produzir audiovisual – que é hoje a nova forma que tomou o cinema de antigamente – consiste em criar uma imagem com uma asséptica limpeza técnica que, no entanto, não consegue camuflar em muitos casos a completa incapacidade de enquadrar, fazer um corte menos grosseiro, elaborar uma atmosfera ou despertar emoções.
Acredito, por fim, que como na pintura, na arquitetura, na música, na literatura, etc. a saída para a mediocridade que tomou conta do nosso panorama cultural é o velho e sempre estimulante recurso à criatividade, ao estudo, à pesquisa e – ouso dizer – também à humildade.
Porque é que não perguntamos, por exemplo, aos argentinos como é que eles – com menos recursos que os nossos – conseguem fazer um cinema muito mais interessante e bem feito, ou aos chilenos ou peruanos porque a sua literatura é mais criativa, ou então aos cubanos quais são as razões que tornam suas universidades tão superiores às nossas?
Se tivermos a capacidade de abandonarmos a postura sub-imperial que nos foi delegada pelos colonizadores e esta mesquinha visão das elites brasileiras de que somos superiores aos nossos vizinhos do continente, poderemos aprender algo com eles.
Aí, então, teremos a oportunidade de, finalmente, nos vermos realmente somos.
O Espelho do Ecran
Continuo pensando em seu comentário. Acredito que o cinema brasileiro precisa ser capaz de produzir um modelo alternativo ao sistema dominante, como o fez com o cinema novo e o chamado cinema udigrudi, do qual você participou.
Os nossos produtores e diretores precisam esquecer por um tempo as benesses dos patrocínios – que nem sempre chegam – e procurar restabelecer uma ligação com o público, que perderam. Na verdade, em muitos casos esta ligação jamais chegou a se estabelecer porque esteve mediatizada por exibidores e distribuidores que no Brasil sempre estiveram a serviço do cinema americano.
Como correspondente no Brasil do jornal de show-business The Hollywood Reporter, eu sempre ouvi falar que o maior alvo da Motion Picture Association of America (MPAA) era a privatização da distribuidora da Embrafilme que abocanhava quase 40% do mercado, o que finalmente conseguiram com a implantação do modelo neoliberal no cinema brasileiro a partir de 1990. Ficamos então à mercê do cinema internacional, que tomou conta da distribuição, se apoderou de um setor ainda maior da exibição e conta hoje até com patrocínio oficial para produções.
Para rompermos este círculo vicioso, será necessário buscar outras formas de exibição, recorrer às novas tecnologias do data-show, pequenas salas digitais, mercados alternativos de venda de DVD’s, como se faz na Nigéria por exemplo, e até uma estrutura de camionetes equipadas que vá ao interior levar o audiovisual a quem nunca teve a possibilidade de vê-lo, como no antológico filme de Octavio Cortazar, Por Primera Vez.
Temo que esta seja uma tarefa muito difícil para o nosso contexto já que em meus já longos anos de observação jamais percebi uma grande união entre as pessoas de cinema no Brasil, a não ser quando motivada pelo interesse em atraentes recursos financeiros.
Por outro lado, também penso que o prolongado efeito da Rede Globo sobre o produto audiovisual brasileiro já tenha deformado a nossa percepção do que possa ser considerada uma expressão mais propriamente nacional. Acreditamos hoje que produzir audiovisual – que é hoje a nova forma que tomou o cinema de antigamente – consiste em criar uma imagem com uma asséptica limpeza técnica que, no entanto, não consegue camuflar em muitos casos a completa incapacidade de enquadrar, fazer um corte menos grosseiro, elaborar uma atmosfera ou despertar emoções.
Acredito, por fim, que como na pintura, na arquitetura, na música, na literatura, etc. a saída para a mediocridade que tomou conta do nosso panorama cultural é o velho e sempre estimulante recurso à criatividade, ao estudo, à pesquisa e – ouso dizer – também à humildade.
Porque é que não perguntamos, por exemplo, aos argentinos como é que eles – com menos recursos que os nossos – conseguem fazer um cinema muito mais interessante e bem feito, ou aos chilenos ou peruanos porque a sua literatura é mais criativa, ou então aos cubanos quais são as razões que tornam suas universidades tão superiores às nossas?
Se tivermos a capacidade de abandonarmos a postura sub-imperial que nos foi delegada pelos colonizadores e esta mesquinha visão das elites brasileiras de que somos superiores aos nossos vizinhos do continente, poderemos aprender algo com eles.
Aí, então, teremos a oportunidade de, finalmente, nos vermos realmente somos.
Sérvulo Siqueira
(Underground, Sérvulo?...eu não concordo com esta terminologia de escárnio cunhada pelo Glauber Rocha que sempre se mostrou contrário ao novo cinema que surgia das cinzas do cinema novo)
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