O poeta louco de Cruz e Sousa
O poeta João da Cruz e
Sousa (1861-1898) nasceu em Desterro, atual Florianópolis, tornou-se conhecido
como o “Cisne Negro” de nosso Simbolismo, seu “arcanjo rebelde”, seu “esteta
sofredor”, seu “divino mestre”. Procurou na arte a transfiguração da dor de
viver e de enfrentar os duros problemas decorrentes da discriminação racial e
social.
O ASSINALADO
Cruz e Sousa
Cruz e Sousa
Tu és o Louco da imortal loucura,
o louco da loucura mais suprema.
A terra é sempre a tua negra algema,
prende-te nela extrema Desventura.
o louco da loucura mais suprema.
A terra é sempre a tua negra algema,
prende-te nela extrema Desventura.
Mas essa mesma algema de amargura
mas essa mesma Desventura extrema
faz que tu’ alma suplicando gema
e rebente em estrelas de ternura.
mas essa mesma Desventura extrema
faz que tu’ alma suplicando gema
e rebente em estrelas de ternura.
Tu és o Poeta, o grande Assinalado
que povoas o mundo despovoado,
de belezas eternas, pouco a pouco.
que povoas o mundo despovoado,
de belezas eternas, pouco a pouco.
Na Natureza prodigiosa e rica
toda a audácia dos nervos justifica
os teus espasmos imortais de louco!
toda a audácia dos nervos justifica
os teus espasmos imortais de louco!
IN MUNDO PASSADO
"Padre
Francisco da Costa, Prior de Trancoso, de idade de sessenta e dois anos, será
degredado de suas ordens e arrastado pelas ruas públicas nos rabos dos cavalos,
esquartejado o seu corpo e postos os quartos, cabeça e mãos em diferentes
distritos, pelo crime que foi arguido e que ele mesmo não contrariou, sendo
acusado de ter dormido com vinte e nove afilhadas e tendo delas noventa e sete
filhas e trinta e sete filhos; de cinco irmãs teve dezoito filhas; de nove
comadres trinta e oito filhos e dezoito filhas; de sete amas teve vinte e nove
filhos e cinco filhas; de duas escravas teve vinte e um filhos e sete filhas;
dormiu com uma tia, chamada Ana da Cunha, de quem teve três filhas. Total:
duzentos e noventa e nove, sendo duzentos e catorze do sexo feminino e oitenta
e cinco do sexo masculino, tendo concebido em cinquenta e três mulheres".
Não satisfeito tal apetite, o malfadado prior, dormia ainda com um escravo
adolescente de nome Joaquim Bento, que o acusou de abusar em seu vaso nefando noites
seguidas quando não lá estavam as mulheres. Acusam-lhe ainda dois ajudantes de
missa, infantes menores que lhe foram obrigados a servir de pecados
orais, completos e nefandos, pelos quais se culpam em defeso de seus vasos intocados, apesar da malícia exigente do malfadado prior.
"El-Rei D. João II lhe perdoou a morte e o mandou pôr em liberdade aos dezessete dias do mês de Março de 1587, com o fundamento de ajudar a povoar aquela região da Beira Alta, tão despovoada ao tempo e, em proveito de sua real fazenda, o condena ao degredo em terras de Santa Cruz, para onde segue a viver na vila da Baía de Salvador como colaborador de povoamento português. El-rei ordena ainda guardar no Real Arquivo esta sentença, devassa e mais papéis que formaram o processo".
"El-Rei D. João II lhe perdoou a morte e o mandou pôr em liberdade aos dezessete dias do mês de Março de 1587, com o fundamento de ajudar a povoar aquela região da Beira Alta, tão despovoada ao tempo e, em proveito de sua real fazenda, o condena ao degredo em terras de Santa Cruz, para onde segue a viver na vila da Baía de Salvador como colaborador de povoamento português. El-rei ordena ainda guardar no Real Arquivo esta sentença, devassa e mais papéis que formaram o processo".
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