ABAIXO TEXTOS - CRÍTICAS - ENSAIOS - CONTOS - ROTEIROS CURTOS - REFLEXÕES - FOTOS - DESENHOS - PINTURAS - NOTÍCIAS

Translate

domingo, 13 de dezembro de 2009

Notas para o futuro... (5)

A Conversa Continua
entre o professor e o aluno de cinema.

- E como é ganhar a vida? Meu cinema digital, sem produção, ainda vai dar muito dinheiro...

- CineArtesão! Assim eu chamo esse cinema feito com equipamento digital e de edição caseira, onde o autor e quase tudo na construção da sua obra. É um cinema sem futuro.

- A cinestética, onde “intelectuais” se debruçam para analisar um filme, uma idéia, uma obra, anda destituída de informações imprescindíveis a formação do conhecimento, cegando o observador despreparado para fatos e citações poéticas que fogem a sua compreensão, tornando-os insensíveis a uma nova visão estética, histórica e cultural deste país.

- Você tem razão! 2010, um novo ano se aproxima. O governo federal vai derramar no mercado de arte, através das leis de incentivo a cultura, milhões de reais.

- E os milhares de projetos já estão sendo preparados para os editais do Ministério da Cultura e outros tantos, que terão os seus recursos financiados pelas leis de renúncia fiscal das grandes empresas do país?

- Eu tenho algumas dúvidas quanto à escolha dos projetos que merecerão o beneplácito de tal mecenato.

- O Governo, embora tenha acertado na área social e desenvolvimentista do país, tem errado de modo grosseiro no que diz respeito à arte e a cultura.

- Não temos, pelos Brasis afora, bons teatros, cinema, televisão, e o que existe está na mão de poucos. Poucos, mas com uma única intenção: ganhar muito dinheiro.

- Veja a fita sobre a sua vida que custou em financiamento direto, sem lei e sem nada, mais de 20 milhões de reais de gastos que precisam ser justificados financeiramente apenas com um ”bom”, lacrimejante, novelesco e popular filme.

- Mais nada? Veja: o seu produtor, que já viveu bem todos os momentos do cinema brasileiro, emplacou neste projeto a sua aposentadoria...

- Acho que ele merece!
- Mostrou o seu oportunismo, sua competência para fazer algo de novo, de inédito, na produção do cinema brasileiro...

- Mas ele teve que convencer e envolver, estruturar, levantar e receber, de várias grandes empresas do país, os milhões de reais, a fundo perdido, que ele necessitava para realizar essa “grande” obra cinematográfica.

- Feliz o cineasta que tem como pai um produtor deste porte e desta envergadura.

- Eu, que nada disso tenho, quero reivindicar, neste ano que vai começar, um projeto de produção de um longa metragem rodado em película 35mm.

- Desiste disso!

- Ontem os festivais de cinema abriam as suas portas para o cinema de arte, foi assim que apareceu Glauber, Nelson e todo o cinema novo, a vanguarda artística de uma época. Ontem o governo e o capital privado nacional interessavam-se pelo cinema diferenciado que se realizava no país e que passava a ser prestigiado e a conquistar prêmios e respeito em terras estrangeiras. Ontem os jovens, os estudantes, a classe média e a burguesia, iam ao cinema para depois discutirem o filme na praia, nos bares e restaurantes da cidade.

- Ontem se respirava a inteligência neste país.

- Depois veio o golpe militar, a ditadura, e o cinema novo aboletou-se do poder com a edificação da Empresa Brasileira de Filmes e os intelectuais que permaneciam vivos nas grandes redes de televisão e sindicatos.

- Guardaram o novo, o revolucionário, no baú e passaram a disputar o mercado com roliude, com filmes medíocres que conquistassem também um mercado que nunca lhes pertenceu.

- Tiveram alguns êxitos. O Concine foi um deles e também alguns dos filmes ali produzidos foram verdadeiros sucessos.

- Mas o berço rebelde e revolucionário, onde todos eles nasceram, foi atirado longe, onde nunca mais pudessem encontrá-lo. Nunca mais estes titãs de outrora conseguiram fazer um bom filme de arte, principalmente depois que abandonaram a sua própria sorte, no estrangeiro, o amigo mais rebelde e criativo de todos.

- Hoje, passados mais de meio século de história política, eles continuam no comando do desenvolvimento cultural do país.

- Este aglomerado de titãs gananciosos, que querem sempre mais, não tem uma preocupação política de identidade e renovação, usa do discurso teórico nacionalista, nas assembléias de sindicatos e associações, para criar consenso entre os contrários e, com apoio da maioria de cordeirinhos silenciosos e domesticados, sempre a espera também de uma oportunidade, na prática capitalista, ali estão para defender seus interesses.

- Agregados a eles, como craca-dos-navios, nascem os burocratas das artes.

- São eles que pretendem continuar com a degola daqueles que não seguem a suas cartilhas.

- Hoje nem os festivais se interessam por filmes que não sejam destinados ao mercado e ao sucesso financeiro.

- Eu parei de mandar meus filmes para os festivais por mais de dez anos. Fui a alguns só como convidado.

- Eu também nunca mais mandei os meus roteiros e idéias para os editais passados.

- Eu remeti a alguns festivais o meu novo filme, mas ele foi recusado.

- Eu vou mandar um novo roteiro para os editais e espero que desta vez não haja recusa e me dêem a oportunidade de mostrar o meu cinema.

- Se não, dê a sua guerra cinematográfica como perdida e mais uma vez recolha-se aos seus cinevideos, poemas, textos, pinturas e passe a viver mais calmamente a vida.

- Ai, quem sabe, um dia, se ainda estiver vivo, alguém me convida para escrever e dirigir um belo filme de cinema.

- O que faz o jornalista, observador da história, estar tão desatentos a esse processo?

Nenhum comentário: