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quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Notas para o futuro... (2)

Foto de Antônio Cruvinel - SP
- Vou fazer em janeiro de 2010, 62 anos e não tenho mais tempo para ficar me explicando... Prefiro um desabafo, um porre! Alguém que fale mais alto, mas em bom tom. Outro dia reclamei e ouvi: - Seu cinema vale e fala, por mil novas imagens, por centenas de textos escolhidos na memória, por dezenas de citações fundamentais na arte de saber ver e por ter um único propósito: o de inventar poeticamente um novo cinema - foi o que me disse um amigo, artista rebelde e professor, pelo telefone: - No nosso Brasil, José, as nossas histórias, a dos seus artistas mais rebeldes, não valem nada e também a sua criatividade, a sua obra, nem um tostão furado. O seu amor a arte, o seu trabalho exaustivo na intervenção poética das imagens e sons diferenciados, que fala cantando àquilo que está escondido no pensamento esquecido do homem, dos seus personagens caboclos; no mais profundo da alma, da alma brasileira, matéria prima de todos os seus filmes, são sentimentos que nada valem, nem um mísero festival nordestino consegue esconder a sua ignorância cultural perante uma obra que está à frente do seu tempo. - O que eu posso fazer se essa minha geração já nasceu desacreditada, marginalizada, injustiçada, respondi: - Geração limite! Rebelde! Barroca! Defensora da liberdade e do saber! Da cultura popular! De tudo que se liberta e que se transforma! Somos os artistas que não obtiveram perdão, continuamos historicamente massacrados, antes pela ditadura, pela censura, hoje pelas elites culturais e pelo dinheiro... - Às vezes penso se não deveria ter mudado de lado quando podia... Talvez eu fosse um bom médico... Não tenho vergonha de dizê-lo. Parece-me ver o meu pai, passando a sua gorda mão na cabeça do menino esperto, ativo, que dele se aproximava, dizendo: - Que menino esperto! Inteligente! Coitado, vai sofrer muito na vida... - Perdoam-se todos nesse país, menos a inteligência... Já dizia o meu amigo Rogério Sganzerla.

Também, sem acreditar no absurdo destas exclusões, o meu amigo Mario Drumond, sempre atento aos deslizes dos caretas, tentou achar os motivos pelos quais a ilha revolucionária de Cuba recusou Amaxon.

“O filme mais recente de José Sette, Amaxon, que tem sido muito elogiado pelos poucos que tiveram o privilégio de assisti-lo e tem causado grande expectativa pelo seu lançamento, foi recusado para o Festival de Cuba. Até aí nada de mais, nada de novo. Rogério Sganzerla já reclamava desse “bloqueio de Cuba” para o cinema brasileiro de invenção. Um cinema que, nos espaços mais destacados da arte cinematográfica em todo o mundo, sempre despertou grande interesse. Mas agora que o stalinismo perdeu força na Ilha graças à influência da Revolução Bolivariana da Venezuela, que promove uma abertura sem precedentes para as manifestações artísticas independentes, cabe a denúncia de que o “bloqueio” se mantém exclusivamente em nosso território, onde nada muda, ainda que os tempos e as coisas mudem radicalmente em toda a América Latina. São os mesmos de sempre – os responsáveis pela mesmice crônica de que padece o cinema nacional –, que filtram o material que pode ou não ser exibido em Cuba ou na Venezuela. É a caretice udenista das “esquerdas” acomodadas no poder desde a ditadura e que permanecem muito à vontade em diversas instâncias petistas de decisão. Isto sim, precisa mudar com urgência, e a Gazeta promete voltar ao assunto e bater nessa tecla com mais informações e denúncias”

Recebo no mesmo dia da exclusão do filme Amaxon, agora do festival de cinema Natal, outro emeio, agora de uma estudante que, sem saber das duas recusas, consola minha alma de artista com as suas inteligentes observações...

“Caro José Sette,
Sou estudante do curso de ciências sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora, estou cursando o 2° período, faço uma disciplina chamada Sociologia das artes, ministrada pelo professor Gilberto Felisberto Vasconcellos. O trabalho é referente a disciplina, nada sério como uma pesquisa (quem me dera!). Assistimos o curta "A Janela do Caos", sobre Murilo Mendes e eu achei muito interessante, principalmente porque foi filmado em Juiz de Fora. Esse tipo de produção não se acha em qualquer lugar, e é até excitante ter de buscar as coisas interessantes e inteligentes e encontrá-las perto de casa. Infelizmente, nosso país não dá a devida importância (maior parte das vezes, nenhuma) para iniciativas como a sua. Fico muito desapontada com essa situação, pois adoro cinema e arte de maneira geral, mesmo reconhecendo que tenho muito ainda à aprender para melhor proveito tirar de tudo que meus sentidos captam. Daí não só pelo trabalho, mas pela minha curiosidade, resolvi procurar mais informações sobre o senhor e confesso que logo após ter-lhe mandado o e-mail, percorri com mais atenção seu blog e achei uma entrevista que me ajudou bastante no trabalho, também assisti o curta do Ivo Filho - "pintando o 7" - o qual gostei bastante e me proporcionou novas informações sobre o senhor, da mesma forma que aumentou minha curiosidade sobre seu trabalho. Com essa intenção, olhei seus blogs e me surpreendi por ver que o senhor deixa seus roteiros disponíveis, simpatizei muito com seu gosto musical e assim que tiver oportunidade, assistirei seus outros filmes. Bem, é isso. Espero que as pessoas descubram cada vez mais os artistas dos seus bairros, de seu país e quando buscarem algo de fora, que ao menos seja algo de melhor. Muito obrigada por ter respondido o e-mail, de verdade. Continue fazendo arte, o cinema-arte agradece”.

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