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domingo, 6 de setembro de 2015

MÚSICA


SINTAGMA
Paulo Mota


Entre o corpo humano e o corpo do dispositivo sonoro se interpõe a inteligibilidade conceitual, com o propósito de condicionar o sensível do som sobretudo às formas musicais. No entanto, a inteligibilidade corporal não se limita à construção conceitual: o corpo humano possui, também, impregnado em seus movimentos direcionados à operacionalidade das máquinas sonoras, uma inteligibilidade intrínseca à manualidade envolvida neste processo: as māos pensam, com certa autonomia relativamente à inteligibilidade conceitual, mesmo carregando resquícios desta última. 

Via de regra, os sons, sejam eles instrumentais, acústicos ou eletrônicos, se sujeitam aprioristicamente à inteligibilidade das formas, aos sistemas composicionais (tonalidade, serialismo, atonalismo etc.), aos gêneros e estilos musicais; ou seja, condicionam-se às anterioridades inteligíveis.

Sintagma inclui o registro de performances em tempo real de sintetizadores analógicos, virtuais e analógico-virtuais fundamentadas em um processo que inclui a síntese sonora em tempo real e ao posterior registro em suporte fixo. Na verdade, esse processo envolve uma relativa decomposição das frequências e timbres, no qual os demais parâmetros musicais - altura, dinâmica e ritmo -, por sua vez, são condicionados a aplicação desse processo de decomposição, propriamente dito, aliado à espacialização sônica. Em decorrência, altura, dinâmica e ritmo tornam-se auditivamente secundários no processamento decomposicional dos timbres e frequências, e a espacialização reforça e reativa a dissipação desses parâmetros. Em primeira e última instâncias, os componentes eletrônicos (constituintes dos módulos que integram os sintetizadores), atuam na microestrutura das sonoridades e como parâmetros de modificação das mesmas. Tal característica solicita do músico uma operacionalidade que implica na interação sinestésica entre a manualidade e a interface do dispositivo, um procedimento que, por sua vez, deflagra uma permanente interatividade entre os componentes eletrônicos dos módulos que agem na tranformação da síntese de-composicional dos sons.

Em Sintagma, o sensível sonoro surge como prioridade estética e se superpõe auditiva e perceptivelmente aos condicionadores estético-inteligíveis imputados aos sons: a dignidade do sensível sonoro se esquiva da "maquiagem", da "lapidação" e da "higienização" sônicas protagonizadas pela inteligibilidade musical. Portanto, são os próprios sons que sucitam o risco e a experimentação (e não necessariamente uma anterioridade inteligível), em um processo contínuo e transformacional dos componentes microestruturais que os constituem. (Paulo Motta, 03.09.2015)

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