Não é necessário viver, somos milhões.
É necessário ler a vida, somos poucos.
A grandeza do homem está nele compreender a si mesmo e, neste mesmo processo dialético do conhecimento, entender a natureza das coisas que o envolve no mistério social do existir. A base do saber está na educação e na cultura circunstanciadas a família e aos amigos de toda uma vida. É a cultura que o faz se envolver com seus semelhantes. Enfim dentro desta engrenagem cósmica ele passa a possuir as chaves da comunidade onde nasceu e foi criado. Se ele transformar a chave em uma gazua, ele vai passar alem do que lhe foi apresentado, podendo ver, ler e ouvir tudo de melhor que milhares de anos de conhecimento a humanidade tem a lhe oferecer. Quando se lê um livro, ouve-se uma música, vê-se um filme ou contempla-se uma pintura, uma peça de teatro, não basta só isso para saber o que melhor da criação se coloca a sua frente. É preciso ouvir o texto que existe em todas as manifestações artísticas do homem. É preciso saber ler um filme ao vê-lo. Ler significa ir além das imagens, significa mergulhar no pensamento, na existência do criador e nas suas exegeses. Ter o estalo. Querendo ou não isso acontece com qualquer pessoa, só que uns se utilizam desta epifania e outros não. O que importa no caso é o que se vê, o que se ouve e o que se lê. O que se vai fazer depois é outro assunto. O homem que cresce em um meio desprovido de arte, de cultura, vai preencher essa lacuna com o que de pior existe e na certa vai sofrer o mesmo processo que o leva a compreender e a depender daquilo que não interessa, pois tem a sua gênese na ignorância e na alienação. Não é uma questão de gosto, é uma questão de saber gostar. Um louco pode comer lavagem com os porcos, como impedi-lo? Dando a ele qualquer outra coisa limpa ele na certa vai apreciar como se aquilo fosse um manjar dos deuses. Não me venha com essa que depende dele comer caviar. O trabalho escravo não lhe oferece caviar mas sim a cova rasa de sete palmos de terra depois da vida mais infeliz desse mundo, pois nada significou para ele ter vivido, além de uma falsa alegria quando se torna um pequeno burguês representado pelos amigos e familiares no churrasco de fim de semana ou em festas religiosas onde se vende a esperança da salvação de um mundo maldito que eles criaram. Que mundo é esse? Quando eu li o livro A Psicologia de Massa do Fascismo de Wilhem Reich, há muitos anos passados, eu não consegui entendê-lo na sua excelência, pois não conseguia ler o criador, assim quando ele dizia que não compreendia por que só alguns homens se revoltavam com os acontecimentos e não todos, eu só pude entendê-lo de fato agora. “... o que é necessário explicar não é que o faminto rouba, ou por que o explorado entre em greve, mas por que razão a maioria dos famintos não rouba e a maioria dos explorados não entra em greve”. Nada mudou e os fascistas fizeram e ganharam a guerra, dominam o mundo com uma ditadura financeira cruel e muitos poucos se incomodam com isso. Mas é sempre bom lembrar que no mundo há fascistas de direita (o que é natural) e também agora os de esquerda (o que é uma aberração) e também os fanáticos religiosos (o que é inevitável). Temos de separar o joio do trigo, tudo ficou mais difícil. Às vezes penso que este é um mundo condenado a existir assim, desigual, desleal, paradoxal, infernal, para sempre. Mas continuo lutando, é preciso acreditar em alguma coisa enquanto se viver. E depois o que me importa se a bicharia comer todo o meu corpo após a morte?
Nenhum comentário:
Postar um comentário