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sábado, 13 de junho de 2015

Visão Cinematográfica



Voos proibidos
   Por Orlando Senna

Vi o filme cubano Vuelos prohibidos na bela mostra do 8º Encontro de Cinema Negro Brasil, África e Caribe, criado por Zózimo Bulbul, com curadoria de Joel Zito Araújo e direção de Biza Vianna. O filme incide na Cuba atual, neste momento cubano (aproximação com EUA, reformas econômicas, implementação do grande polo produtor e exportador de Mariel) que está despertando novas curiosidades, indagações e esperanças com relação à ilha caribenha que, há pelo menos um século, se instalou no imaginário da humanidade como um país, ou um povo, diferenciado. O filme, embora realizado este ano e recém lançado em Cuba, não trata diretamente dos novos acontecimentos, mas sim da atualização da antiga dicotomia inferno/paraíso, satanização/deificação que envolve as distintas visões sobre a sociedade cubana desde a Revolução de 1959. 
O diretor é Rigoberto López, documentarista super premiado que se aventura por segunda vez na ficção (a primeira foi Roble de olor, 2003), apoiado em textos do ensaista acadêmico Julio Carranza e da trepidante romancista Wendy Guerra, autora de Posar desnuda en La Habana (no Brasil Posar nua em Havana, Editora Benvirá). O filme conta o envolvimento entre uma francesa que viaja a Havana para conhecer seu pai cubano e um fotógrafo cubano que está em trânsito, voltando da África para seu país. Encontram-se no aeroporto de Paris e ficam juntos porque o voo é transferido para o dia seguinte e, por fim, chegam ao destino. 
É uma longa discussão, às vezes tensa, às vezes amorosa, entre a francesa que vê Cuba como uma ditadura e o cubano que afirma que seu país é outra coisa, tentando esclarecer o significado de uma revolução permanente. Ele expõe as dificuldades e os avanços sociais, os descaminhos e as retomadas, as dores e as alegrias, os erros e acertos da Revolução. Principalmente, ele afirma seu pertencimento ao país e à sua cultura, defendendo a ideia de que nesse pertencimento está incluído o “ser revolucionário”, o revolucionar-se todos os dias da vida. Ela tenta trazer a discussão para a “realidade”, para a censura, para o descumprimento de direitos humanos. Ele se apoia na vivência, ela se apoia na mídia.
Discussão aberta, sem papas na língua, os autores almejam todo o tempo a sinceridade, inclusive sem esconder as dúvidas e as inseguranças dele ou dela. Em seguida à exibição aconteceu um debate que, surpreendentemente, repetiu na plateia a esgrima político-filosófica que está no filme. De outro jeito, sem a tensão de discordâncias políticas entre namorados, mas na mesma linha. Perguntou-se como um filme com aquele conteúdo podia ser cubano se existe censura em Cuba e Rigoberto López teve de informar que é uma produção da empresa estatal de cinema, com apoio do Ministério da Cultura.

Perguntou-se se era uma exceção. Explicou-se que o cinema cubano (como o teatro e a literatura) sempre teve um viés crítico com relação ao governo, ao regime, aos costumes. Que uma das principais manifestações cinematográficas da Cuba revolucionária é a chamada Comédia Crítica. O que é visível, basta lembrar Morango e chocolate (Fresa y chocolate) e Guantanamera, ambos de Tomás “Titón” Gutierrez Alea, considerado o maior cineasta cubano. Vi algumas pessoas boquiabertas quando Rigoberto mencionou o movimento do Cinema Independente, fato mais chamativo da atualidade cinematográfica cubana, com filmes de sucesso internacional (exemplo: Juan de los Muertos, de Alejandro Brugués, prêmio Goya da Espanha). Cinema Independente em uma ditadura socialista? Como? Pois é, Cuba é mesmo difícil de entender e, por isso, seria salutar que Vuelos prohibidos e outros filmes made in Cuba fossem lançados comercialmente no Brasil e outros países. O cinema é uma via de entendimento, como se sabe. 

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