Eu me esqueço
sempre nessa hora linda loura
Fábio Carvalho
Um dia
perguntei ansioso e confiante à minha estrela favorita,que
brilha modestamente no firmamento:- Que
dizes do meu futuro, do meu destino?Ao que
me respondeu tímida e tremeluzente:- Que posso te dizer? Sou apenas uma
estrela. Carlos de Alencar
Qual o gênero
desta música? Se é que isso importa, nem precisamos responder. Foi só para
começar. Qualquer um morreria para saber o que se passava na mente de Rimbaud
quando ele escreveu “Le Bateau Ivre”, ou de Mozart, quando ele compôs sua
sinfonia “Júpiter”. Qualquer um como nós, digo eu. Adoraríamos conhecer aquele
processo secreto que guia o criador por entre suas arriscadas aventuras.
Agradecidamente, o que é impossível ver na poesia ou na música, não é o caso da
pintura. Para saber o que está acontecendo na mente de um pintor, a pessoa só
precisa olhar para sua mão. Aqui está o que o pintor está sentindo. Ela está
progredindo, começando com traço firme. Está seguindo uma curva a direita, um
ponto à esquerda. Se ele errar e faltar sua harmonia, tudo estará perdido. O
pintor falha como um homem cego na escuridão das telas brancas. A luz que
lentamente aparece e paradoxalmente é criada pelo pintor que pinta uma curva
negra após outra. Pela primeira vez, o drama particular e diário do gênio cego,
será nos mostrado publicamente. Pablo Picasso concordou em mostrar isso hoje,
na frente de vocês, com vocês. Bonita é ela, ando com certeza e com as
incertezas. A rosa na glória. Com o texto falado acima começa um estranho filme
do cineasta francês Clouzot. Não imagino para que, ainda me fiz cumprir mais
esta etapa agora, revendo em seqüência alguns de seus inexplicáveis trabalhos
fílmicos de chapéu verde na poltrona nova. Luz de Guignard. Também filmes não
precisam de explicações, vou voltar a mim. Só quero e desejo chegar até o
Renoir. Ainda acredito que além da imaginação como disse minha fonoaudióloga,
passearei onde flana a bela excelência vocal com bastante conhecimento de
causa. Ela falou isto depois que me deu uns canudinhos de pirulito, para
exercitar minha prega vocal direita doentinha. A boca na forma de um beijo. Apenas
como um selinho falando um u longuinho, sem esforço, não devemos cansar nossa
emoção ou se ela merecer posso me esforçar um pouquinho mais. Devo estar
pensando no Vinícius de Moraes, só tenho me referido as coisas e as pessoas no
diminutivo. É bom pensar como fosse Vinícius. Portanto vou pensar agora no
filminho que estou fazendo, que é o que me apetece neste momento, se bem que
também algumas libélulas me atribulam, duvidando de mim naquele estado de
êxtase só um tiquinho. Por vezes elas estão nos ouvidos ou no dedinho. Tenho
que arriscar, afinal de contas, cinema sempre risco e ilusão e a longa escapada
esperta para a Jamaica, não deixa de ser uma possibilidade entre mil, é lógico
e ilógico ao mesmo tempo. Sempre detestei a lógica como o mais extraordinário
Campos de Carvalho. Que tímpanos maravilhosos são esses, cruzo com todos os
doidões pelos caminhos e ainda converso temporais com um por um, num
aprendizado que jamais terminará. Para que tentar mais uma vez. Para que
lembrar aquela vez. O que você Bebel me fez. Bonita. Tira essa saia logo ao
vento. Começo a assobiar naturalmente sem controle, é melhor do que tentar
entender Isabela. A narrativa não quer dar. Não vou insistir por enquanto, a
sinfonia da milimétrica trova elaborada e lambida por mim, escamoteia para uma
nova versão mais tenra. Sem endereço certo durante a mobilidade interna do
carro movimentando-se na direção hidráulica do superior carinho vindo lá de
cima das nuvens. Trepidando. A partir de agora, após esta música estou ferrado,
o mundo já sabia enquanto de novo tocava: Autumn Leaves. Arranjo complicadinho
apenas feito na cintilancia da luz da lua azul de maio, myself. Claro está,
querendo ela a controversia, só por este inicio de noite depois sem mim se
espalhará nas botas vermelhas enfiadas na bolsa marron da mamãe. Feito eu, para
não dizer outra coisa diante de tantas que ela ampara, quebrando a esquina com
suave tranqüilidade e desfaçatez. Aonde anda meu amigo negão. Gostei deste novo
encontro e sem demonstrar, quero de novo. Sem facilidades. Vamos ao cinema.
Subindo mais uns degrauzinhos bem subidos encontraremos o Roberto. Não menos
que o Rossellini. Agora pintou uma curva e que curva, meu! Perdi minha rota e
achei mais um filminho. Fui ao bar da luz vermelha ouvindo e vendo as cantoras
do Sérgio Mendes no Youtube. Cada uma mais bela que a outra. Especialmente a
que me colocou no lance imediatamente e dei mais uma aprendidinha com os velhos
naquela curva tão conhecida, de novo uma manhã de carnaval com uma esperada
encorpada tristezinha junto outra alegria leve incandescente. Vamos nos banhar
e lavar os cabelos. Meu que resistência essa minha amiga domina. Parando um
pouquinho com brincadeirinhas dessas palavrinhas, chegamos aos filmes para a
televisão, feitos na busca da transmissão do conhecimento pelo mestre
Rossellini, aí sim voltei a pensar então. Agostino D’Ippona, para nós Santo
Agostinho. Sem se esquecer que Agostinho era africano nascido na cidade de
Hipona e ensinou retórica em Roma e Milão. Sofisticado filósofo viveu o mundanismo
e como o próprio Roberto, suas obras influenciaram muito o pensamento das
respectivas matérias internamente: teologia e cinema. Pois bem, antes de falar
do filme vamos ouvir algumas frases do Santo como ilustração de uma vaga
pesquisa. “Certamente estamos na mesma categoria das bestas; toda ação do mundo
animal diz respeito buscar o prazer e evitar a dor. Se você acredita no que lhe
agrada nos evangelhos e rejeita o que não gosta, não é nos evangelhos que você
crê, mas em você. A verdadeira medida do amor é não ter medida.” O Santo e o
Vazio da Noite, quando fiz este filme ninguém viu muito bem, nem eu. Hoje sei
que em todos esses belíssimos filmes da série dos pensadores realizada sem
maneirismos por Rossellini, que já vi e revi, dormi muito bem e sonhei. Como
ironizava em uma poltrona do lado oposto, Luis Bunnuel: os bons filmes te
proporcionam um bom sono. Ainda para terminar vou transcrever aqui a fala do
músico Luís Bonfá que vi novamente no Youtube, precedendo uma jóia rara de
interpretação da nossa lady negra Eliseth Cardoso de Manhã de Carnaval. Assim
ele diz: “o início da parceria com Antônio Maria foi com o nascimento do Orfeu
Negro. Não no teatro e sim na versão cinematográfica. Eu procurei o Rubem
Braga, a pedido do diretor Marcel Camus que tinha pressa de ver a letra pronta
para uma melodia encomendada à mim, que mais tarde se chamou Manhã de
Carnaval. Então o Rubem Braga me disse: olha, eu sou muito lento para escrever,
telefona para o gordo. Eu não tinha feito músicas ainda com o Antõnio Maria,
não tinha composto com ele. Assim nasceu nossa primeira parceria. Esta é a
história real deste encontro.” Não sei bem por que essa pequena narração muito
me agradou. Vou dormir.
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