Crônicas Caiçaras
Faz três anos que eu observo, com a devida distância, os acontecimentos políticos e administrativos da cidade de Cabo Frio, principalmente aqueles que são concernentes as ações culturais dos seus governantes.
Quando chego a um lugar desconhecido, faço como qualquer pessoa educada e de bom senso: primeiro vejo, ouço e só depois falo e expresso a minha opinião a respeito dos fatos.
Nesses anos tenho ouvido e lido sobre os detentores do poder desta rica e bela região e nada de bom eu vi ou li, nada que mereça de minha parte alguma reflexão, ou algum louvor. Vejo, leio e ouço quase sempre atônito, os maiores e inimagináveis absurdos praticados pelos detentores do poder municipal. São de conhecimento de toda a cidade os processos que correm na justiça por gastos indevidos, corrupção, desmandos, etc. São tantas as acusações que daria para encher páginas e páginas deste prestigioso jornal.
Mas acho que ainda não posso externar um julgamento preciso e verdadeiro quanto à conduta desses senhores, por mais paradoxal que possa ser a verdade, porque esses senhores obtiveram o poder democraticamente no sufrágio expressivo da vontade popular e nenhuma acusação grave foi ainda julgada pelo Superior Tribunal de Justiça. Mas o povo quer saber e eu posso perguntar ao governo do PSDB desta cidade, sem cometer nenhuma injustiça: O que foi feito com R$ 1.600.000.000,00 (um bilhão e seiscentos milhões de reais), com todo esse dinheiro arrecadado no período de 2005 a 2008, cerca de 33 milhões por mês, aos cofres da prefeitura? Porque com todo esse dinheiro nada aconteceu de bom na cidade? Não vejo nas ruas nenhuma obra pública; nos bairros nenhuma nova escola, creches, casas populares, saneamento básico; nenhuma proposta de melhoria na saúde, na segurança, na criação de novos empregos, na valorização dos salários dos professores das escolas municipais, ou mesmo na promoção de acontecimentos culturais que incentivem o turismo, realizando, por exemplo, grandes festas culturais que atraem os turistas, a mídia nacional e internacional, etc. Não vou entediar o leitor com tudo aquilo que já poderia ter sido feito.
Meus amigos, qualquer administrador, pouco estudado, mas honesto, como um governante que eu conheço de uma cidadezinha perdida e pobre do interior das minhas Minas Gerais, com bom senso, criatividade e comando político, sabe realizar, com transparência, o que é preciso fazer para melhorar a vida de seus habitantes, podendo promover, com quase nada, uma significante transformação social no seu município. O que será que anda acontecendo com essas cabeças estudadas e experientes que dominam o poder municipal a mais de 12 anos em Cabo Frio? Prepotência perdulária aliada à impotência criativa? Falta de talento político? Demérito de um governo individualista, avaro e autoritário? O fato é que eu sinto a cidade, que conheço desde 1958, avançando inexoravelmente para trás, amargando um futuro não muito promissor com o fim das reservas de petróleo, e o povo vivendo no compasso de espera do que pode ainda acontecer. O quê pode acontecer? Uma nova eleição ou uma cassação? Não sei não!
A cidade está sem rumo em busca de um eterno retorno e assim mantendo-se, enquanto gira a roda oculta do destino, recuada, estagnada, sem graça, aculturada, sem identidade e autofágica, ou seja, alimentando-se de si mesma.
É preciso cobrar do poder municipal, estadual e federal, com urgência, uma política desenvolvimentista para toda região. Essa é uma região rica e privilegiada pela natureza! Venho do interior de Minas, meu pai foi prefeito de sua cidade e eu sei o que é governar sem recursos. Sei o que o talento e a criatividade podem fazer quando não se tem quase nada. Mas aqui, ao contrário, tem-se de tudo que o velho petróleo pode oferecer, muito dinheiro jorrando do mar e simplesmente nada acontece, é incrível! Não é o turismo a vocação cultural e a identidade econômica da cidade de Cabo Frio e de toda a região dos lagos? O que se faz e o que poderia ter sido feito durante todos esses anos, com todo esse dinheiro, para incrementar aqui a indústria do turismo? Pergunte a você mesmo, meu caro leitor-eleitor, o que o atual governo tem acrescentado de novo a cidade? O que os políticos, escolhidos por vocês, geralmente em troca de pequenos favores eleitoreiros, tem feito de bom para a cidade e seus habitantes? Eles poderiam pelo menos inovar na aplicação desta fortuna, aplicando essas gordas verbas no binômio - educação e cultura, que é a ponta de lança de qualquer projeto turístico e desenvolvimentista que se queira simplesmente programar como meta de governo.
Em Juiz de Fora, cidade mineira onde eu vivi uma década, a câmera dos vereadores criou e aprovou a lei Murilo Mendes, que obriga o governo municipal, que sabemos de poucos recursos, disponibilizar do seu orçamento um milhão de reais por ano para incentivar projetos culturais. Porque a cidade de Cabo Frio, cem vezes financeiramente mais poderosa, trata tão mal os seus artistas? Onde estão e o que fazem os vereadores, legisladores e fiscalizadores do bem público desta rica e bela cidade? Quem trata mal ou despreza as artes desconhece o seu povo, vive sem luz, não sabe o que é liberdade, tropeça na memória desgastada, perde o bom caminho e mergulha no caos.
Quando aqui cheguei, eu fiquei amigo de um casal cabo-friense de bom gosto e de fino trato: Jacob e Jô Mureb. Jacob era conservador, por tradição de família, mas tinha uma visão única, de artista, sobre a cidade e seus desafios. Inteligente e criativo, espirituoso e culto, ele me apresentou a cidade e mostrou-me, através das suas histórias caiçaras, que regava os nossos encontros, os problemas que a municipalidade vinha enfrentando e quais eram as soluções possíveis e alternativas, em sua visão empreendedora, para a cidade avançar... Impressionado com sua alegria e seu carisma, insistia para que ele mergulhasse de cabeça na política - vereador, prefeito, quem sabe?... Jacob, você com suas histórias, suas ironias e principalmente com o seu otimismo, esta fazendo falta a roda dos amigos. A sua cidade está triste e sem rumo.
Hoje, meus amigos, além de tudo, uma insegurança financeira localizada e municipal provoca o isolamento do cidadão. A classe média que se refugia nas suas parcas economias, não sai de casa; não se diverte; não consome a sua cultura; vivem sem liberdade, amedrontados e infelizes - não há felicidade para aquele que não tem a certeza do que pode acontecer no dia seguinte.
Precisamos urgentemente, nós, o povo, reclamar, manifestar, exigir e redobrar a vigilância sobre os nossos dirigentes, cobrando com veemência, se necessário, as explicações para todos os descalabros administrativos e todas as difamações que eles, os políticos de plantão, vêm sofrendo calado e no mais profundo silêncio. A cidade está adormecida. É hora de ir para as ruas, fazer passeata, abaixo-assinados, sem medo de represália e exigir, de todos eles, explicações claras e precisas do que vem acontecendo no paço municipal.
Um comentário:
Zé,
Perfeita a sua análise. Pior e sintomático é o silencio da cidade que - espero está certo - pode explodir a qualquer momento de insatisfação ou de imensa alegria. Lamento não termos tido condições financeiras de montar o texto Querelas Liras e Jagunços, (que você precisar ler) que trata alegoricamente de uma Cabo Frio de 2009, que ainda se repete, cem anos depois.
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