O LIXO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL
Os problemas enfrentados pelas gerações
atuais são cada vez mais dinâmicos. O mundo muda rapidamente e, para transpor
seus novos desafios, cresce a demanda por pessoas que realmente pensem. Pessoas
capazes de olhar para os problemas e imaginar soluções. Capazes de criar,
inovar e reinventar. Pessoas que construam a mudança que o mundo precisa.
Contraditoriamente, logo nos primeiros anos de vida, inserimos as crianças em
um sistema educacional que tenta convertê-las em adultos consumidores, e não
criadores de conhecimento. Adultos que deixam seus talentos de lado para se
tornarem simplesmente medianos. Colocamos as crianças em um ambiente há muito
tempo ultrapassado e esperamos que ele proporcione a elas alguma educação.
Eis algumas razões pelas quais o
modelo educacional vigente é obsoleto e quais são as sequelas que ele deixa em
cada um que passa por ele.
Ambiente
escolar totalmente desfavorável
Conforme observado pelo
especialista em educação Ken Robinson, as escolas são indústrias. Essa
afirmação talvez não seja tão imediata, mas pare para pensar. As escolas
agrupam os alunos em turmas, que nada mais são do que lotes. Em uma sala de
aula, cada lote passa por uma rotina repetitiva, na qual profissionais
especializados — os professores — desempenham seus papeis de maneira bem
segmentada — cada um ensinando o conteúdo específico que lhe cabe, mesmo que na
verdade todo o conhecimento esteja entrelaçado, e não dividido em disciplinas.
Sirenes tocam indicando que é hora da aula atual ser interrompida para dar
lugar à próxima. Após vários anos de repetições diárias desse ciclo, os alunos
recebem o rótulo de “formados”, o que indica que o lote está pronto para ir
para o mercado.
Infelizmente, não para por aí.
Além de uma fábrica, as escolas também possuem características de um presídio.
Elas cerceiam a liberdade dos alunos. Todos têm hora para entrar, hora para ir
para o pátio e hora para sair. Há inspetores vigiando os estudantes e uma série
de punições — advertências, suspensões e expulsões — para os que tiverem mau
comportamento.
Esse conjunto de medidas
faz com que as escolas suprimam o desejo de aprender, ao invés de despertar a
curiosidade e estimular a inteligência. Tomo emprestada a metáfora do fascinante educador
Rubem Alves, afirmando que a maioria das escolas são gaiolas, quando na verdade
deveriam ser asas.
Escolas que são gaiolas
existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados
são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde
quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros.
Porque a essência dos pássaros é o voo.
Escolas que são asas não
amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em voo. Existem para
dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem fazer,
porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O voo não pode ser ensinado. Só pode
ser encorajado.
- Rubem Alves
O modus
operandi que norteia
o funcionamento de praticamente todas as escolas é o mesmo há muitas décadas.
As poucas mudanças que aconteceram não foram de caráter educacional, e sim
cultural, como o surgimento das escolas mistas e o fim dos internatos. Fora
isso, as escolas em que você estudou seguem os mesmos paradigmas das escolas em
que seus avós estudaram.Salas de aula, lousas, cadernos e a velha
relação dual: “o professor ensina e o aluno aprende”.
Foco na
memória, e não na habilidade de pensar
Ao invés de ensiná-los a pensar,
as escolas apenas obrigam os alunos a digerir grandes quantidades de
informações. Transmite-se o conhecimento em aulas puramente expositivas.
Posteriormente, o conteúdo é cobrado em provas, que são a forma que as escolas
encontraram para avaliar se os alunos realmente aprenderam. Isso é bastante
curioso, porque as provas, em geral, exigem que os alunos apenas reproduzam o
que lhes foi “ensinado”, e não que desenvolvam seu raciocínio, senso crítico e
a habilidade de relacionar fatos para tirar conclusões. Basicamente, na escola,
os alunos são treinados para memorizar informações e despejá-las em avaliações
escritas.
Inibição da
criatividade
As escolas instituem desde o
começo que serão feitas perguntas, e que cada pergunta admite apenas uma
resposta correta. Se o aluno não responde exatamente o que lhe foi ensinado,
ele errou. E é bom que não erre muitas vezes. Caso contrário, ele não passará
de ano. O aluno aprende que ele não tem liberdade para pensar fora da caixa.
Conteúdos
nem sempre relevantes
O cenário em uma sala de aula é,
quase sempre, o mesmo: alunos sentados durante várias horas anotando o que o
professor ensina. Não importa se o assunto lhes interessa ou se terá utilidade
no futuro. Na verdade, a escolas desperdiçam boa parte do tempo e da energia
dos alunos com assuntos desnecessários, quando poderiam estar desenvolvendo
habilidades relevantes para a vida pessoal e profissional.
As escolas ensinam que a
democracia surgiu na Grécia Antiga, mas não despertam nos alunos o pensamento
crítico para avaliar o nosso cenário político e tomar melhores decisões. As
escolas ensinam conhecimentos matemáticos nada triviais, como logaritmos, mas
não instruem sobre noções básicas de economia ou finanças pessoais. As escola
ensinam o que são dígrafos e sujeitos desinenciais, mas não formam pessoas que
saibam utilizar bem a linguagem na hora de se comunicar com clareza.
Padronização do
ensino
O ensino é o mesmo para todos. Um
aluno que se interessa mais por uma determinada área não tem, dentro da maioria
das escolas, a oportunidade de se aprofundar nela. Alunos com capacidades e
interesses distintos são agrupados simplesmente por terem idades iguais,
freando o desenvolvimento dos que têm mais facilidade e ignorando as
necessidades especiais dos que possuem dificuldades. Além disso, as escolas
conduzem o ensino sempre da mesma maneira, ignorando o fato de que cada aluno
se adapta melhor a um tipo de aprendizado: visual, auditivo, cinestésico, entre
outros.
Ao passar por todas as falhas desse modelo
educacional, as crianças não ficam ilesas de suas consequências: redução da
capacidade criativa, desprezo pelo ato de estudar, pouca habilidade para pensar
por si próprias, estresse e acúmulo de muitas informações dispensáveis.
É por isso que já passa da hora das escolas
serem reinventadas. Ao invés de doutrinar os alunos para se tornarem cidadãos obedientes
e passivos, elas precisam estimulá-los a pensar de maneira inovadora e lidar
com problemas reais — que são muito diferentes de um enunciado aguardando uma
resposta decorada. Quando isso acontecer, chegaremos ao cerne da resolução de
boa parte dos problemas contemporâneos.
E, quiçá, de uma verdadeira
revolução.
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