Fotos de José Sette
Nothing Hill Gate – Paris
Zeus, o que é isso ? Essa merda, isso tudo, são palavras estrangeiras? Soluços impessoais, solos grotescos. Somente você Maria Gladys, revolucionária da espécie, sente o doente deleite estando em Lancaster entre os negros das colônias inglêsas. Peles negras e Mangroves com sobremesa de banana e sorvete com uma vela acesa na janela. Na noite escura um sarro em Noting Hill Gate. No Brasil, lá distante, o milagre financeiro e o sangue quente são derramados no arame farpado da ditadura militar. No corredor encurralado e estreito a tortuosa tortura. No labirinto da cidade de brinquedo que é Londres eu me perdi quando cheguei. No orgasmo do medo todos nós nos perdemos. Histórias sem vida, morte sem glória. Londres é o meu degredo e o meu segredo e agora o que faremos? Eu vou voltar para casa, retornar ao lar, ao abrigo atlântico, ao verdadeiro, ao Maracanã. Aqui não posso mais ficar, inglês do após guerra, coisa de otários. Sou um homem comum, um Zé ninguém. Cultivo os sentimentos humanos e só lá, na minha terra, posso me fazer entendido. Maria a Globo te espera. A palavra vingança se pronuncia depressa. Como passa o tempo e no ano que vem o dinheiro também. Ácido, droga de exportação, para nos dar prazer e mil brigas de morte. Neste festão cinéreo, os viajantes, os nossos amigos, burocratas do sistema, estigmatizados pela estupidez, não entram e nem passam pela porta. Mas também renunciar a toda retribuição do amor é um sacrifício que só o ódio está pronto a oferecer. Todos nós seremos vingados na hora e no tempo certo. Não se deixe incrédula diante da miséria insurgente. Aqui ela existe mascarada de nobreza pelos becos mais sombrios. Lá, com nosso povo sofrido, pelo menos dá samba. A violência ainda não subiu os morros da cidade e ninguém nos conhece, aqui é tal qual a Madri de Franco, o generalíssimo em guardas de quarteirão, todos me chamam pelo nome, e sabem onde me encontrar. Maria é hora de voltar, não resta mais dúvida. Pego hoje mesmo um avião..., e a prisão ? Você se esqueceu? Todos se esquecem muito fácil de suas histórias, não eu ! Tenho ainda que descascar muitas bananas até recuperar toda a minha dignidade. É preciso retirar as ferraduras que machucam as patas da besta para que ela paste novamente e se torne selvagem, bela e livre e todo o resto volte a normalidade. Brigadeiros, Almirantes, Generais retirem os cascos para o país voltar a sua normalidade democrática. As intrigas foram longe demais e destruímos a cada hora nossos tesouros ainda escondidos numa juventude valorosa aqui perdida nas mesas do rei Artur. Neste rico país tem um povo pobre mas ainda feliz, não deixem que isto se acabar. Não deixem o samba morrer. O rock só é bom para quem aqui viu que merda que é o rock. Deixem que nós todos possamos voltar à praia que tanto amamos, aos bares e rodas de chopes que nos mata de saudade dos amigos que ficaram. Que falta sinto de uma empadinha de galinha e de uma pata de caranguejo. Do arroz com feijão e do angu com quiabo e de uma franguinha mineira. Aqui não tem isso não. São as mulheres mais feias do planeta. Uma merda. Que palidez meu poeta esconde na face tua. Zeus me tira daqui!Chega de exploração. Pirataria moderna, testas de ferro desta ilha miserável. Nossos hospedeiros são nossos algozes e estão cansados de tamanha marcha e contra marcha desses latinos bárbaros. Eu to fora desta conjuntura falida de idéias e atos, aqui nada dá e ao contrario de lá onde tudo deu para quem nada fez e vive rico como um rei e ainda assim esmolamos o nosso exílio. Não vou mais ao cemitério visitar o túmulo de Marx, já que não posso mais ficar aqui, vou pra Paris, lá me sinto feliz. Adeus Maria! Zeus! O meu país perdidos em Lancaster rod.W3 fumando Number one. Guloise! Aqui vou eu. Londres março de 1970
Nenhum comentário:
Postar um comentário