Entrevista dada por Jose Sette ao jornalista Paulo Ernesto, presidente do cineclube Osvaldo de Oliveira da cidade de Itu em SP, para ser publicada na sua revista de cinema. 1 - Como surgiu o gosto pelo cinema
Meu pai, um médico nascido no interior de Minas Gerais, tinha três paixões em sua vida: Mulher, Fotografia e Política. Sua mãe, minha avó, gostava de música e de poesia.
Até os meus 10 anos (1958) eu já tinha descoberto o meu amor pela sétima-arte. Meu pai possuia um projetor 16mm e tínhamos sessão de cinema em casa. Depois morava eu em Ipanema e havia dois cinemas na minha rua: o Cine Pax e o Pirajá. Passei a minha infância e adolescência nas salas de cinema vendo qualquer filme, muitos de roliude e alguns filmes brasileiros, as chanchadas da Atlântida cinematográfica principalmente. Aos quinze anos estava em Minas Gerais, Belo Horizonte, e me envolvi um grupo de jovens que me apresentaram um novo cinema, viamos do neo-realismo italiano aos filmes do cinema novo, que naquela época dava os seus primeiros passos e ai veio o golpe militar, soube da quartelada quando assistia pela primeira vez aos filmes revolucionários franceses da nouvelle-vague - Godart, Truffaut, etc. Só no final dos anos sessenta foi que me apaixonei pelos filmes do extraordinário artista que foi Orson Welles. Durante o primeiro e único Festival de Cinema na capital mineira eu conheci e passei a conviver com os dois cineastas brasileiros com quem me identifiquei de imediato, assisti e não gostei de Barra Vento, o primeiro filme do Glauber Rocha, mas gostei de pronto do Bandido de Rogério Sganzerla e Cara Cara de Julio Bressane, seus primeiros filmes e fiquei amigo dos dois “enfant terrible” do cinema nacional. Neste mesmo ano, em sessenta e oito, produzi o primeiro filme do cineasta mineiro Neville de Almeida e terminei de escrever o meu primeiro roteiro de longa metragem. No início da década de setenta, exilado, fui frenquentador assíduo da cinemateca francesa. Em 1975, já de volta ao Brasil, aos 27 anos, produzi, realizei e exibi, mesmo sem o certificado de censura, o meu primeiro filme em 35mm de longa metragem intitulado Bandalheira Infernal.
2 - Como o Senhor analisa a produção cinematográfica nacional?
A indústria do entretenimento cinematográfico nacional corre, há muito tempo, atrás do prejuízo, buscando desesperadamente o sucesso de público e de se afirmar como uma indústria rentável e dominante. Com o auxílio hoje do dinheiro público, de algumas leis e muitos editais e principalmente da TV Globo, ela vem conseguindo alguns grandes sucessos individuais sem, no entanto, se afirmar como indústria. Mas não é esse o cinema que eu faço, não estou preocupado em entreter ninguém com novelas pseudorealistas da vida como ela não é. Faço do cinema poesia e da poesia cinema. Se eu e o cinema brasileiro vamos conseguir atingir os nossos objetivos só o futuro dirá.
3 - Recentemente participou de um encontro em Minas onde pode rever alguns amigos. Conte-nos como foi este encontro.
Fui convidado, juntamente com o Andrea Tonnaci, Sylvio Lanna, Eliseu Visconti, Geraldo Veloso, Luis Rosemberg, para exibir alguns dos nossos filmes durante o Festival de Inverno de Ouro Preto. Foi uma semana agradável na belíssima cidade histórica de Minas. Tenho um diário completo desta viagem publicado, com vídeo, fotos e texto, no meu blog.
4 - Neste ano o senhor lançou o filme AMAXON. Como foi a produção e como esta sendo a receptividade do filme onde passa?
Ainda não consegui lançá-lo. Estou, para isso, ainda em conversa com a RioFilmes. Mas tenho feito algumas sessões para convidados e Amaxon tem se comportado bem. De sua produção eu só posso dizer que neste filme não entrou dinheiro nenhum de editais e nem de leis de incentivo. Foi feito com suor e lágrimas. Uma grande epopéia para um artista sexagenário como eu.
5 - Nos anos 70 lançou seu primeiro filme chamado Bandalheira Infernal em 35mm. O Senhor acha importante esta nova tecnologia digital no audiovisual?
Ela viabilizou Amaxon. Embora a película tenha uma textura própria, inigualável, o vídeo tem os seus macetes, filtros e recursos digitais, que se bem utilizado, podem transformar a imagem linear e fria da gravação em uma nova textura, belíssima e ainda não experimentada. Isso aconteceu com a fotografia de Amaxon quando o vi projetado em mídia DVD em uma tela grande do cinema Vila Rica de 300 lugares na cidade de Ouro Preto. Não é incrível? Bandalheira Infernal foi rodado em película 35mm, PB, em uma semana, no ano de 1975, e por outras histórias, que de tão longas não vale a pena serem contadas, perdeu-se o negativo, som ótico, etc. Se não fosse essa nova tecnologia eu não teria hoje uma cópia betadigital do meu filme.
6 - Me parece que fora do cinema o senhor tem algumas atividades. Gostaria que falasse destas atividades. Que me parece ser a pintura e a literatura.
Gosto de trabalhar com a luz, com enquadramento, com a fotografia aliada a um pincel e sua mise-en-scène e outras vezes com uma caneta correndo sobre o papel rabiscando poemas, romances, roteiros, dramaturgia. Mas não julgo que praticando essas outras atividades artísticas estaria deixando de fora o cinema. O cinema que eu faço envolve-se com todas as boas manifestações artísticas captadas pelas minhas antenas experimentais e de invenção, sendo o mais importante que só a ele devo alguma explicação. É mais difícil fazer cinema ou escrever um livro?Pintar um quadro ou um poema?O poeta Murilo Mendes dizia que um artista pinta sempre um mesmo quadro, um poeta escreve sempre o mesmo poema, e eu digo que um cineasta faz sempre o mesmo filme.
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