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segunda-feira, 30 de março de 2015

ARTIGO

O poder da papelada    
Por Orlando Senna

As primeiras utilizações da palavra burocracia aconteceram no século XVIII, na França, quando alguém teve a ideia de juntar a palavra francesa “bureau”, que significa escritório, mesa, escrivaninha (e posteriormente também repartição pública) ao sufixo “cracia”, derivado do grego kratos, que significa poder. O poder do escritório, o poder do funcionário público. Já naqueles idos de 1700 a conotação da nova palavra era negativa, relacionada à ineficiência do funcionalismo estatal na monarquia absoluta e desperdício de recursos. Na verdade o excesso de leis e regras e a utilização da parafernália legal por funcionários desonestos é bem mais antiga do que a palavra, remontando ao início do Império Romano.
Podemos supor a presença das garras burocráticas no episódio da crucificação de Cristo, no jogo de empurra-empurra entre o poder judeu (Herodes) e o poder romano que dominava a região da Palestina (Pôncio Pilatos). Com o correr do tempo os burocratas tentaram justificar e enaltecer a burocracia como essencialmente necessária à estrutura jurídica do Estado, à organização dos procedimentos da administração, afirmando que, por ser difusa e manipulada por muita gente, a prática garantia a “impessoalidade” no trato da coisa pública. Uma falácia que ainda encontra defensores na atualidade.
O jurista alemão Max Weber, considerado o pai da sociologia moderna e um dos mais argutos estudiosos do assunto, chamou a atenção para o fato de que o princípio básico da administração burocrática é a hierarquia, é o controle que os funcionários superiores exercem sobre os inferiores. Um controle que permite a classificação de documentos em várias categorias de acesso e, em consequência, o conhecimento de alguns desses documentos apenas por poucos funcionários. Esse mecanismo é praticado, desde muito tempo, também nas empresas privadas. É o que está acontecendo neste momento no Brasil, no escândalo dos desvios de dinheiro e propinas na Petrobrás e em grandes empreiteiras, envolvendo funcionários, políticos e empresários.
E não só no Brasil, já que a chaga burocrática, geradora de corrupção, espalha-se pelo Ocidente e Oriente, na rede bancária mundial, em regimes autoritários e regimes democráticos. As vítimas são os cidadãos honestos, enganados e roubados pelas artimanhas das papeladas, driblados pelos atalhos e labirintos legais inventados pelos cidadãos corruptos (que nem deveriam merecer o título de cidadão). Na década passada muita gente acreditava que a informática, com a sua possível transparência e comunicação objetiva, poderia ser uma inimiga ativa da burocracia e de sua filha dileta, a corrupção. Até o momento essa ação de barragem, esse movimento civilizatório, não aconteceu, a não ser na sua utilização como veículo de comunicação para organizar manifestações contra a prática criminosa. Mas ainda pode acontecer, não sei como já que a cibernética também atua como veículo de crimes e enganações.
A menção a labirintos legais me leva às vítimas da burocracia e a Kafka e seu romance O processo, de 1920, e também à sua transposição para o cinema por Orson Welles em 1962, narrando as profundas angústias e o surrealismo perverso pelos quais passa um homem comum e honesto. Joseph K, esse é seu nome, é preso e sofre um longo e tortuoso e misterioso processo por um crime que ele não sabe qual foi. A genialidade de Kafka e de Welles criam uma atmosfera de desorientação, ambiguidade e absurdo que oprimem Joseph K até os limites da confusão mental. No Brasil, neste momento de bilhões e bilhões de reais roubados através da burocracia, me sinto como o personagem kafkiano, em meio a outros 200 milhões de Josephs Ks.

quarta-feira, 25 de março de 2015

REFLEXÃO LITERÁRIA


Do trabalho à corrupção como método
Por Eliana Cardoso.

"Eu sou eu e minha circunstância e, se não a salvo, não me salvo", escreveu Ortega y Gasset em "Meditações do Quixote" (Livro Ibero Americano). Não me condene por repetir a citação tão conhecida, meu querido. A maioria das pessoas se limita à primeira parte da sentença, seguida da interpretação de que as circunstâncias compõem nossa moral e situam nossa liberdade. Minha intenção é lembrar que Ortega y Gasset, além de filósofo, também atuou como jornalista e ativista político e não podemos nos desfazer da segunda parte da sentença.

A reflexão não se limita às primeiras palavras, que estabelecem o livre-arbítrio como vítima de condicionamentos culturais e de traços hereditários. A segunda parte da frase importa. A minha salvação depende do meu engajamento na melhora do mundo que me cerca. A citação se encaixa bem ao momento atual com os brasileiros na rua contra a corrupção.

Como este espaço pertence aos livros, vale investigar como neles se retratam o indivíduo e suas circunstâncias. Franco Moretti explora a evolução da figura do burguês na literatura desde a época medieval numa obra fascinante: "O Burguês: Entre a História e a Literatura" (tradução de Alexandre Morales, editora Três Estrelas). Moretti adverte o leitor sobre sua perspectiva histórica e deixa claro que não pretende analisar o presente. Mesmo assim, meu querido, a narrativa de Moretti vale cada linha.

Historiador literário, ocupado com o burguês refletido pelo prisma da literatura, Moretti pergunta, por exemplo, como a palavra "conforto" delineia os contornos do consumo. Ou como o ritmo dos romances se ajusta a mudanças nas regularidades da vida em sociedade. E assim por diante.

Bom começar pelo entendimento do que significa o termo "burguês". A palavra "bourgeois" surgiu na França no século XI para designar o habitante da cidade medieval, homem livre, isento da jurisdição dos feudos. No começo do século XVII, a acepção jurídica do termo ganhou dimensão econômica, valendo para aquele que, não pertencendo à nobreza nem ao clero, possuísse recursos próprios. A burguesia consistia então, na sua maior parte, de pequenos empreendedores autônomos, como artesãos e donos de hospedarias. Cem anos depois agregava empregados de colarinho-branco e servidores públicos. O termo francês foi traduzido para o italiano, o espanhol, o português e o alemão. O inglês preferiu falar de uma "classe média" à qual pertencia quem não era nobre nem servo.

Embora "classe média" e "burguesia" denotassem a mesma realidade social, os dois termos criavam diferentes implicações. Estando "no meio", a classe média não podia se responsabilizar pelo estado de coisas. As "baixa", "média" e "alta" classes médias pareciam exibir (em contraste com a mobilidade mais difícil entre o proletariado, a burguesia e a nobreza) maior mobilidade entre seus estratos, quando no século XIX a figura da burguesia proprietária e instruída passou a ocupar mais espaço em toda Europa ocidental.

O livro de Moretti explora exemplos da figura do burguês em diferentes períodos. O primeiro capítulo, "Um senhor que trabalha", faz uma leitura original de "Robinson Crusoé" (Daniel Defoe, tradução de Sérgio Flaksman, Penguin Companhia). Aqui se vê o burguês antes da tomada do poder, homem sozinho numa ilha, desligado do resto da humanidade, que começa a encontrar as palavras para expressar o padrão de sua existência: aventura, empreendimento, fortuna. Quando Robinson Crusoé, em sua segunda viagem, conduz a bordo uma pequena "adventure", o termo não denota um acontecimento, mas uma forma de capital: a aventura como investimento de risco. E, ao longo da aventura, surgem as palavras-chaves: "útil", "eficiente", "confortável".

No capítulo seguinte, "O século sério", a ilha já se transformara em meio continente. O burguês expandira sua influência pela Europa ocidental. Estamos diante do grande momento da literatura burguesa com invenções narrativas, consistência estilística e inúmeras obras-primas.

E vamos em frente, meu querido. O burguês perde o brilho no período vitoriano, quando sua hegemonia está em causa. Aberta, despudorada e direta, a burguesia realizara obras miraculosas, inteiramente diferentes das pirâmides egípcias ou das catedrais góticas, aglomerando a população e centralizando os meios de produção, dizia o "Manifesto Comunista". Mas o burguês, tendo perdido a clareza de sua visão e conquistado o poder na esfera econômica, não se firmou como presença política nem propôs uma cultura geral. Na literatura, o exemplo é o protagonista do best-seller de Dinah Craig, "John Halifaz, Gentleman". As palavras-chaves passam a ser "influente" e "franco" (no lugar de "sério").

O sol começa a se pôr no século burguês e chegamos a suas metamorfoses. Moretti compara episódios de dois romances que ilustram como o burguês remunera o desempenho de alguém pelo menor valor possível. O livreiro, no romance "Ilusões Perdidas", de Balzac, procede à avaliação do manuscrito que o herói lhe entregara. Constatando que o autor vive de pão e leite numa mansarda, reduz o preço que vai oferecer pelo manuscrito. Mas Brás, no romance de Machado de Assis "Memórias Póstumas de Brás Cubas" - refletindo sobre qual moeda dar ao almocreve que conseguira deter sua mula desembestada -, se deixa levar pela arbitrariedade pessoal, ao contrário do livreiro de Balzac.

Machado ataca o princípio de realidade burguês fazendo a crônica das derrotas burguesas e apresentando a desarmonia entre os valores burgueses como relativamente inofensiva em comparação com o romance russo, que leva as ideias ocidentais às suas últimas consequências. Turguêniev, em "Pais e Filhos" (tradução de Rubens Figueiredo, Cosac Naify), muda o sentido da palavra "útil". Ela perde o sentido concreto e pragmático que tinha em "Robinson Crusoé" e assume o sentido utilitarista da teoria econômica. O protagonista, Bazárov afirma que "um químico honesto é vinte vezes mais útil do que qualquer poeta" e transforma a ciência alemã em niilismo implacável.

Fundamentando do homicídio em "Crime e Castigo" (Dostoiévski, tradução de Paulo Bezerra, Editora 34) - no qual Raskólnikov pesa "de um lado uma velha estúpida, imbecil, inútil, doente [...]. Do outro lado energias jovens, frescas" - está o utilitarismo. Raskólnikov conclui que vale a pena trocar uma vida por mil vidas salvas da miséria e da ruína. A aritmética de Bentham fundamenta o crime mais famoso da literatura.

Nos anos subsequentes, o ciclo realista de Henrik Ibsen oferece uma radical autocrítica da burguesia. Desfeita a camuflagem de classe média, a burguesia já não se encontra à sombra de outra classe acima dela. Ela é agora a classe dominante e as coisas estão como estão porque ela as deixou assim.

Nesse mundo, a competição entre os burgueses se torna implacável, desleal, sinistra, mas raramente ilícita. Nessa área cinzenta as coisas surgem graças a oportunidades imprevistas como um incêndio fortuito ou a perda de documentos pelo adversário. Maquinações, manipulações, moralidade flexível e destruição criativa definem a área cinzenta.

A honestidade, virtude burguesa, passa a ser retrospectiva: o homem honesto não fez nada errado no passado. Mas como ser honesto no futuro? O que é uma previsão honesta da taxa de câmbio? Moretti não se ocupa da figura do burguês na literatura do fim do século XX aos dias de hoje. Falta a discussão do período em que evoluímos da área cinzenta para a corrupção galopante, com bancos suíços lavando qualquer tipo de dinheiro, fornecendo ao depositante contas secretas para fraudar impostos, ajudando empresários e políticos a assaltar os cofres públicos e os contribuintes. Assim se completa a trágica deformação que a megalomania impõe à honestidade burguesa. Se você quer ver a superação desse desvio, meu querido, não basta mudar de presidente. Terá de batalhar pela melhora de nossas instituições.


Eliana Cardoso, economista e escritora. 

terça-feira, 17 de março de 2015

GAZUA GERAL


A ARTE DE FURTAR

O regime do capital a qualquer preço faz parte do inconsciente coletivo do homem brasileiro. Não vai ser uma devassa nas grandes empresas do país, uma verdadeira caça as bruxas, que irá limpar o serviço público dos corruptos. Para isso ter algum valor é preciso modificar as relações entre o capital e o trabalho. O Brasil precisa de uma reforma geral e não jogo de cena política protagonizada por novos políticos sedentos de poder.
O regime do capital a qualquer custo leva as melhores pessoas a cometerem loucuras. Assim que surge a oportunidade do ilícito passam a sofrer do desequilíbrio áurico e se expõe ao opróbrio. São homens estudados, empresários, políticos, que mergulham na esbórnia esquecendo-se que tudo neste mercado tem o seu preço, surrupiar  onde o pior é o melhor, provoca a cobiça é o seu maior valor em um regime onde tudo que está acima de zero é lucro.
O verbo tergiversar é o mais usado hoje nas rodas dos burocratas em todas as relações com as elites aglomeradas dos bem sucedidos. Eles são homens que tem o perfeito conhecimento de onde se confabula, tramita e transita o ilegal, sempre se colocaram impunes e se sentem intocáveis.
Foi Brizola que criou o aforismo do saco de caranguejo de onde se puxa o primeiro e o resto sai todos agarrados, uns aos outros por seus fortes quelópodes.  
Acredito que só um governante que não tem nada a temer, pois não está envolvido em nenhum saco de caranguejo e que age com as cartas abertas, “como nunca antes aconteceu na história desse país”, proporcionando transparência nas apurações dos ilícitos dos petroboys, “doa a quem doer”, é quem pode propor as reformas necessárias para colocar o país novamente no rumo certo.
Agora, é preciso avisar aos congressistas eleitos, aos políticos aliados e outros que desejam se alinhar, das metas propostas por um governo que se quer transformador da sociedade brasileira. Um Governo das Reformas.
Podemos ter quatro anos de desenvolvimento para passar o país a limpo. Uma coisa de cada vez e assim não se estancando tudo de bom que já vem acontecendo.  
Agora parar com tudo para uma devassa da Petrobras, levando ao total descrédito a única grande empresa estatal que não foi ainda privatizada é inadmissível.  É isso que os mentores do caos querem que aconteça, pois só assim conseguirão atingir seus objetivos de privatização da estatal, “dita por eles de corrupta”, que descobriu uma das maiores reservas petrolífera do mundo, o Pré-sal, e entregá-la depois de um golpe ao capital financeiro internacional.
A elite empresarial brasileira será atingida a qualquer custo e pagarão caro pela soberba.  Ora! Eles não acreditam neles mesmo, acham o povo, os trabalhadores assalariados, os funcionários públicos, os profissionais e os pequenos empresários, uma coisa menor no país, que se engana fácil com qualquer trocado, pois querem crescer a qualquer custo.
Hoje a maioria dos brasileiros, que foram educados sem conhecimento e amor a cultura do seu país, são os figurantes de um novo pensamento moralista, conservador, religioso e por isso mesmo falso e ultrapassado, eles não tem discernimento social entre o certo e o errado, entre o bom e o mau e assim, para sobreviver, viram empregados ou funcionários de grandes empresas ou do estado,

e por fim, tornam-se velhos e miseráveis, morrendo desamparado em algum hospital do subúrbio, pois eles, massa de manobras, e a maioria desafortunada, não tiveram a capacidade e muito menos o conhecimento da arte de furtar.

sábado, 14 de março de 2015

HISTÓRIA BRASILEIRA


JOÃO GOULART, 13 DE MARÇO DE 1964

Há exatos 51 anos, o então presidente João Goulart fez um comício na Central do Brasil, a maior estação de trem do Rio de Janeiro. Alvo de uma campanha brutal da oposição, com o único objetivo de desconstruir os avanços de seu governo e preparar o ambiente para um golpe, Jango discursou longamente sobre a democracia, fez um balanço das reformas de base que vinha conduzindo e defendeu não apenas o direito de manifestação, mas também a Petrobras e seu projeto de país, com reforma agrária e distribuição de renda. Seu lema, lançado na ocasião, seria "progresso com justiça e desenvolvimento com igualdade". Lendo esse discurso hoje, nem parece que ele foi feito há 51 anos.

Discurso do Jango

Devo agradecer em primeiro lugar às organizações promotoras deste comício, ao povo em geral e ao bravo povo carioca em particular, a realização, em praça pública, de tão entusiasta e calorosa manifestação. Agradeço aos sindicatos que mobilizaram os seus associados, dirigindo minha saudação a todos os brasileiros que, neste instante, mobilizados nos mais longínquos recantos deste país, me ouvem pela televisão e pelo rádio.

Dirijo-me a todos os brasileiros, não apenas aos que conseguiram adquirir instrução nas escolas, mas também aos milhões de irmãos nossos que dão ao brasil mais do que recebem, que pagam em sofrimento, em miséria, em privações, o direito de ser brasileiro e de trabalhar sol a sol para a grandeza deste país.

Presidente de 80 milhões de brasileiros, quero que minhas palavras sejam bem entendidas por todos os nossos patrícios.

Vou falar em linguagem que pode ser rude, mas é sincera sem subterfúgios, mas é também uma linguagem de esperança de quem quer inspirar confiança no futuro e tem a coragem de enfrentar sem fraquezas a dura realidade do presente.

Aqui estão os meus amigos trabalhadores, vencendo uma campanha de terror ideológico e sabotagem, cuidadosamente organizada para impedir ou perturbar a realização deste memorável encontro entre o povo e o seu presidente, na presença das mais significativas organizações operárias e lideranças populares deste país.

Chegou-se a proclamar, até, que esta concentração seria um ato atentatório ao regime democrático, como se no Brasil a reação ainda fosse a dona da democracia, e a proprietária das praças e das ruas. Desgraçada a democracia se tiver que ser defendida por tais democratas.

Democracia para esses democratas não é o regime da liberdade de reunião para o povo: o que eles querem é uma democracia de povo emudecido, amordaçado nos seus anseios e sufocado nas suas reinvindicações.

A democracia que eles desejam impingir-nos é a democracia antipovo, do anti-sindicato, da anti-reforma, ou seja, aquela que melhor atende aos interesses dos grupos a que eles servem ou representam.

A democracia que eles querem é a democracia para liquidar com a Petrobrás; é a democracia dos monopólios privados, nacionais e internacionais, é a democracia que luta contra os governos populares e que levou Getúlio Vargas ao supremo sacrifício.

Ainda ontem, eu afirmava, envolvido pelo calor do entusiasmo de milhares de trabalhadores no Arsenal da Marinha, que o que está ameaçando o regime democrático neste País não é o povo nas praças, não são os trabalhadores reunidos pacificamente para dizer de suas aspirações ou de sua solidariedade às grandes causas nacionais. Democracia é precisamente isso: o povo livre para manifestar-se, inclusive nas praças públicas, sem que daí possa resultar o mínimo de perigo à segurança das instituições.

Democracia é o que o meu governo vem procurando realizar, como é do seu dever, não só para interpretar os anseios populares, mas também conquistá-los pelos caminhos da legalidade, pelos caminhos do entendimento e da paz social.

Não há ameaça mais séria à democracia do que desconhecer os direitos do povo; não há ameaça mais séria à democracia do que tentar estrangular a voz do povo e de seus legítimos líderes, fazendo calar as suas mais sentidas reinvindicações.

Estaríamos, sim, ameaçando o regime se nos mostrássemos surdos aos reclamos da Nação, que de norte a sul, de leste a oeste levanta o seu grande clamor pelas reformas de estrutura, sobretudo pela reforma agrária, que será como complemento da abolição do cativeiro para dezenas de milhões de brasileiros que vegetam no interior, em revoltantes condições de miséria.

Ameaça à democracia não é vir confraternizar com o povo na rua. Ameaça à democracia é empulhar o povo explorando seus sentimentos cristãos, mistificação de uma indústria do anticomunismo, pois tentar levar o povo a se insurgir contra os grandes e luminosos ensinamentos dos últimos Papas que informam notáveis pronunciamentos das mais expressivas figuras do episcopado brasileiro.

O inolvidável Papa João XXIII é quem nos ensina que a dignidade da pessoa humana exige normalmente como fundamento natural para a vida, o direito ao uso dos bens da terra, ao qual corresponde a obrigação fundamental de conceder uma propriedade privada a todos.

É dentro desta autêntica doutrina cristã que o governo brasileiro vem procurando situar a sua política social, particurlamente a que diz respeito à nossa realidade agrária.

O cristianismo nunca foi o escudo para os privilégios condenados pelos Santos Padres. Nem os rosários podem ser erguidos como armas contra os que reclamam a disseminação da propriedade privada da terra, ainda em mãos de uns poucos afortunados.

Àqueles que reclamam do Presidente de República uma palavra tranqüilizadora para a Nação, o que posso dizer-lhes é que só conquistaremos a paz social pela justiça social.

Perdem seu tempo os que temem que o governo passe a empreender uma ação subversiva na defesa de interesses políticos ou pessoais; como perdem igualmente o seu tempo os que esperam deste governo uma ação repressiva dirigida contra os interesses do povo. Ação repressiva, povo carioca, é a que o governo está praticando e vai amplia-la cada vez mais e mais implacavelmente, assim na Guanabara como em outros estados contra aqueles que especulam com as dificuldades do povo, contra os que exploram o povo e que sonegam gêneros alimentícios e jogam com seus preços.

Ainda ontem, trabalhadores e povo carioca, dentro da associações de cúpula de classes conservadoras, levanta-se a voz contra o Presidente pelo crime de defender o povo contra aqueles que o exploram nas ruas, em seus lares, movidos pela ganância.

Não tiram o sono as manifestações de protesto dos gananciosos, mascarados de frases patrióticas, mas que, na realidade, traduzem suas esperanças e seus propósitos de restabelecer a impunidade para suas atividades anti-sociais.

Não receio ser chamado de subversivo pelo fato de proclamar, e tenho proclamado e continuarei a proclamando em todos os recantos da Pátria – a necessidade da revisão da Constituição, que não atende mais aos anseios do povo e aos anseios do desenvolvimento desta Nação.

Essa Constituição é antiquada, porque legaliza uma estrutura sócio-econômica já superada, injusta e desumana; o povo quer que se amplie a democracia e que se ponha fim aos privilégios de uma minoria; que a propriedade da terra seja acessível a todos; que a todos seja facultado participar da vida política através do voto, podendo votar e ser votado; que se impeça a intervenção do poder econômico nos pleitos eleitorais e seja assegurada a representação de todas as correntes políticas, sem quaisquer discriminações religiosas ou ideológicas.

Todos têm o direito à liberdade de opinião e de manifestar também sem temor o seu pensamento. É um princípio fundamental dos direitos do homem, contido na Carta das Nações Unidas, e que temos o dever de assegurar a todos os brasileiros.

Está nisso o sentido profundo desta grande e incalculável multidão que presta, neste instante, manifestação ao Presidente que, por sua vez, também presta conta ao povo dos seus problemas, de suas atitudes e das providências que vem adotando na luta contra forças poderosas, mas que confia sempre na unidade do povo, das classes trabalhadoras, para encurtar o caminho da nossa emancipação.

É apenas de lamentar que parcelas ainda ponderáveis que tiveram acesso à instrução superior continuem insensíveis, de olhos e ouvidos fechados à realidade nacional.

São certamente, trabalhadores, os piores surdos e os piores cegos, porque poderão, com tanta surdez e tanta cegueira, ser os responsáveis perante a História pelo sangue brasileiro que possa vir a ser derramado, ao pretenderem levantar obstáculos ao progresso do Brasil e à felicidade de seu povo brasileiro.

De minha parte, à frente do Poder Executivo, tudo continuarei fazendo para que o processo democrático siga um caminho pacífico, para que sejam derrubadas as barreiras que impedem a conquista de novas etapas do progresso.

E podeis estar certos, trabalhadores, de que juntos o governo e o povo – operários , camponeses, militares, estudantes, intelectuais e patrões brasileiros, que colocam os interesses da Pátria acima de seus interesses, haveremos de prosseguir de cabeça erguida, a caminhada da emancipação econômica e social deste país.

O nosso lema, trabalhadores do Brasil, é “progresso com justiça, e desenvolvimento com igualdade”.

A maioria dos brasileiros já não se conforma com uma ordem social imperfeita, injusta e desumana. Os milhões que nada têm impacientam-se com a demora, já agora quase insuportável, em receber os dividendos de um progresso tão duramente construído, mas construído também pelos mais humildes.

Vamos continuar lutando pela construção de novas usinas, pela abertura de novas estradas, pela implantação de mais fábricas, por novas escolas, por mais hospitais para o nosso povo sofredor; mas sabemos que nada disso terá sentido se o homem não for assegurado o direito sagrado ao trabalho e uma justa participação nos frutos deste desenvolvimento.

Não, trabalhadores; sabemos muito bem que de nada vale ordenar a miséria, dar-lhe aquela aparência bem comportada com que alguns pretendem enganar o povo. Brasileiros, a hora é das reformas de estrutura, de métodos, de estilo de trabalho e de objetivo. Já sabemos que não é mais possível progredir sem reformar; que não é mais possível admitir que essa estrutura ultrapassada possa realizar o milagre da salvação nacional para milhões de brasileiros que da portentosa civilização industrial conhecem apenas a vida cara, os sofrimentos e as ilusões passadas.

O caminho das reformas é o caminho do progresso pela paz social. Reformar é solucionar pacificamente as contradições de uma ordem econômica e jurídica superada pelas realidades do tempo em que vivemos.

Trabalhadores, acabei de assinar o decreto da SUPRA com o pensamento voltado para a tragédia do irmão brasileiro que sofre no interior de nossa Pátria. Ainda não é aquela reforma agrária pela qual lutamos.

Ainda não é a reformulação de nosso panorama rural empobrecido.

Ainda não é a carta de alforria do camponês abandonado.

Mas é o primeiro passo: uma porta que se abre à solução definitiva do problema agrário brasileiro.

O que se pretende com o decreto que considera de interesse social para efeito de desapropriação as terras que ladeiam eixos rodoviários, leitos de ferrovias, açudes públicos federais e terras beneficiadas por obras de saneamento da União, é tornar produtivas áreas inexploradas ou subutilizadas, ainda submetidas a um comércio especulativo, odioso e intolerável.

Não é justo que o benefício de uma estrada, de um açude ou de uma obra de saneamento vá servir aos interesses dos especuladores de terra, quese apoderaram das margens das estradas e dos açudes. A Rio-Bahia, por exemplo, que custou 70 bilhões de dinheiro do povo, não deve bemeficiar os latifundiários, pela multiplicação do valor de suas propriedades, mas sim o povo.

Não o podemos fazer, por enquanto, trabalhadores, como é de prática corrente em todos os países do mundo civilizado: pagar a desapropriação de terras abandonadas em títulos de dívida pública e a longo prazo.

Reforma agrária com pagamento prévio do latifundio improdutivo, à vista e em dinheiro, não é reforma agrária. É negócio agrário, que interessa apenas ao latifundiário, radicalmente oposto aos interesses do povo brasileiro. Por isso o decreto da SUPRA não é a reforma agrária.

Sem reforma constitucional, trabalhadores, não há reforma agrária. Sem emendar a Constituição, que tem acima de dela o povo e os interesses da Nação, que a ela cabe assegurar, poderemos ter leis agrárias honestas e bem-intencionadas, mas nenhuma delas capaz de modificações estruturais profundas.

Graças à colaboração patriótica e técnica das nossas gloriosas Forças Armadas, em convênios realizados com a SUPRA, graças a essa colaboração, meus patrícios espero que dentro de menos de 60 dias já comecem a ser divididos os latifúndios das beiras das estradas, os latifúndios aos lados das ferrovias e dos açudes construídos com o dinheiro do povo, ao lado das obras de saneamento realizadas com o sacrifício da Nação. E, feito isto, os trabalhadores do campo já poderão, então, ver concretizada, embora em parte, a sua mais sentida e justa reinvindicação, aquela que lhe dará um pedaço de terra para trabalhar, um pedaço de terra para cultivar. Aí, então, o trabalhador e sua família irão trabalhar para si próprios, porque até aqui eles trabalham para o dono da terra, a quem entregam, como aluguel, metade de sua produção. E não se diga, trabalhadores, que há meio de se fazer reforma sem mexer a fundo na Constituição. Em todos os países civilizados do mundo já foi suprimido do texto constitucional parte que obriga a desapropriação por interesse social, a pagamento prévio, a pagamento em dinheiro.

No Japão de pós-guerra, há quase 20 anos, ainda ocupado pelas forças aliadas vitoriosas, sob o patrocínio do comando vencedor, foram distribuídos dois milhões e meio de hectares das melhores terras do país, com indenizações pagas em bônus com 24 anos de prazo, juros de 3,65% ao ano. E quem é que se lembrou de chamar o General MacArthur de subversivo ou extremista?

Na Itália, ocidental e democrática, foram distribuídos um milhão de hectares, em números redondos, na primeira fase de uma reforma agrária cristã e pacífica iniciada há quinze anos, 150 mil famílias foram beneficiadas.

No México, durante os anos de 1932 a 1945, foram distribuídos trinta milhões de hectares, com pagamento das indenizações em títulos da dívida pública, 20 anos de prazo, juros de 5% ao ano, e desapropriação dos latifúndios com base no valor fiscal.

Na Índia foram promulgadas leis que determinam a abolição da grande propriedade mal aproveitada, transferindo as terras para os camponeses.

Essas leis abrangem cerca de 68 milhões de hectares, ou seja, a metade da área cultivada da Índia. Todas as nações do mundo, independentemente de seus regimes políticos, lutam contra a praga do latifúndio improdutivo.

Nações capitalistas, nações socialistas, nações do Ocidente, ou do Oriente, chegaram à conclusão de que não é possível progredir e conviver com o latifúndio.

A reforma agrária não é capricho de um governo ou programa de um partido. É produto da inadiável necessidade de todos os povos do mundo. Aqui no Brasil, constitui a legenda mais viva da reinvindicação do nosso povo, sobretudo daqueles que lutaram no campo.

A reforma agrária é também uma imposição progressista do mercado interno, que necessita aumentar a sua produção para sobreviver.

Os tecidos e os sapatos sobram nas prateleiras das lojas e as nossas fábricas estão produzindo muito abaixo de sua capacidade. Ao mesmo tempo em que isso acontece, as nossas populações mais pobres vestem farrapos e andam descalças, porque não tem dinheiro para comprar.

Assim, a reforma agrária é indispensável não só para aumentar o nível de vida do homem do campo, mas também para dar mais trabalho às industrias e melhor remuneração ao trabalhador urbano.

Interessa, por isso, também a todos os industriais e aos comerciantes. A reforma agrária é necessária, enfim, à nossa vida social e econômica, para que o país possa progredir, em sua indústria e no bem-estar do seu povo.

Como garantir o direito de propriedade autêntico, quando dos quinze milhões de brasileiros que trabalham a terra, no Brasil, apenas dois milhões e meio são proprietários?

O que estamos pretendendo fazer no Brasil, pelo caminho da reforma agrária, não é diferente, pois, do que se fez em todos os países desenvolvidos do mundo. É uma etapa de progresso que precisamos conquistar e que haveremos de conquistar.

Esta manifestação deslumbrante que presenciamos é um testemunho vivo de que a reforma agrária será conquistada para o povo brasileiro. O próprio custo daprodução, trabalhadores, o próprio custo dos gêneros alimentícios está diretamente subordinado às relações entre o homem e a terra. Num país em que se paga aluguéis da terra que sobem a mais de 50 por cento da produção obtida daquela terra, não pode haver gêneros baratos, não pode haver tranquilidade social. No meu Estado, por exemplo, o Estado do deputado Leonel Brizola, 65% da produção de arroz é obtida em terras alugadas e o arrendamento ascende a mais de 55% do valor da produção. O que ocorre no Rio Grande é que um arrendatário de terras para plantio de arroz paga, em cada ano, o valor total da terra que ele trabahou para o proprietário. Esse inquilinato rural desumano é medieval é o grande responsável pela produção insuficiente e cara que torna insuportável o custo de vida para as classes populares em nosso país.

A reforma agrária só prejudica a uma minoria de insensíveis, que deseja manter o povo escravo e a Nação submetida a um miseravel padrão de vida.

E é claro, trabalhadores, que só se pode iniciar uma reforma agrária em terras economicamente aproveitáveis. E é claro que não poderíamos começar a reforma agrária, para atender aos anseios do povo, nos Estados do Amazonas ou do Pará. A reforma agrária deve ser iniciada nas terras mais valorizadas e ao lado dos grandes centros de consumo, com transporte fácil para o seu escoamento.

Governo nenhum, trabalhadores, povo nenhum, por maior que seja seu esforço, e até mesmo o seu sacrifício, poderá enfrentar o monstro inflacionário que devora os salários, que inquieta o povo assalariado, se não form efetuadas as reformas de estrutura de base exigidsa pelo povo e reclamadas pela Nação.

Tenho autoridade para lutar pela reforma da atual Constituição, porque esta reforma é indispensável e porque seu objetivo único e exclusivo é abrir o caminho para a solução harmônica dos problemas que afligem o nosso povo.

Não me animam, trabalhadores – e é bom que a nação me ouça – quaisquer propósitos de ordem pessoal. Os grandes beneficiários das reformas serão, acima de todos, o povo brasileiro e os governos que me sucederem. A eles, trabalhadores, desejo entregar uma Nação engrandecida, emancipada e cada vez mais orgulhosa de si mesma, por ter resolvido mais uma vez, pacificamente, os graves problemas que a História nos legou. Dentro de 48 horas, vou entregar à consideração do Congresso Nacional a mensagem presidencial deste ano.

Nela, estão claramente expressas as intenções e os objetivos deste governo. Espero que os senhres congressistas, em seu patriotismo, compreendam o sentido social da ação governamental, que tem por finalidade acelerar o progresso deste país e assegurar aos brasileiros melhores condições de vida e trabalho, pelo caminho da paz e do entendimento, isto é pelo caminho reformista.

Mas estaria faltando ao meu dever se não transmitisse, também, em nome do povo brasileiro, em nome destas 150 ou 200 mil pessoas que aqui estão, caloroso apelo ao Congresso Nacional para que venha ao encontro das reinvindicações populares, para que, em seu patriotismo, sinta os anseios da Nação, que quer abrir caminho, pacífica e democraticamente para melhores dias. Mas também, trabalhadores, quero referir-me a um outro ato que acabo de assinar, interpretando os sentimentos nacionalistas destes país. Acabei de assinar, antes de dirigir-me para esta grande festa cívica, o decreto de encampação de todas as refinarias particulares.

A partir de hoje, trabalhadores brasileiros, a partir deste instante, as refinarias de Capuava, Ipiranga, Manguinhos, Amazonas, e Destilaria Rio Grandense passam a pertencer ao povo, passam a pertencer ao patrimônio nacional.

Procurei, trabalhadores, depois de estudos cuidadosos elaborados por órgãos técnicos, depois de estudos profundos, procurei ser fiel ao espírito da Lei n. 2.004, lei que foi inspirada nos ideais patrióticos e imortais de um brasileiro que também continua imortal em nossa alma e nosso espírito.

Ao anunciar, à frente do povo reunido em praça pública, o decreto de encampação de todas as refinarias de petróleo particulares, desejo prestar homenagem de respeito àquele que sempre esteve presente nos sentimentos do nosso povo, o grande e imortal Presidente Getúlio Vargas.

O imortal e grande patriota Getúlio Vargas tombou, mas o povo continua a caminhada, guiado pelos seus ideais. E eu, particurlamente, vivo hoje momento de profunda emoção ao poder dizer que, com este ato, soube interpretar o sentimento do povo brasileiro.

Alegra-me ver, também, o povo reunido para prestigiar medidas como esta, da maior significação para o desenvolvimento do país e que habilita o Brasil a aproveitar melhor as suas riquezas minerais, especialmente as riquezas criadas pelo monopólio do petróleo. O povo estará sempre presente nas ruas e nas praças públicas, para prestigiar um governo que pratica atos como estes, e também para mostrar às forças reacionárias que há de continuar a sua caminhada, no rumo da emancipação nacional.

Na mensagem que enviei à consideração do Congresso Nacional, estão igualmente consignadas duas outras reformas que o povo brasileiro reclama, porque é exigência do nosso desenvolvimento e da nossa democracia. Refiro-me à reforma eleitoral, à reforma ampla que permita a todos os brasileiros maiores de 18 anos ajudar a decidir dos seus destinos, que permita a todos os brasileiros que lutam pelo engrandecimento do país a influir nos destinos gloriosos do Brasil. Nesta reforma, pugnamos pelo princípio democrático, princípio democrático fundamental, de que todo alistável deve ser também elegível.

Também está consignada na mensagem ao Congresso a reforma universitária, reclamada pelos estudantes brasileiros. Pelos universitários, classe que sempre tem estado corajosamente na vanguarda de todos os movimentos populares nacionalistas.

Ao lado dessas medidas e desses decretos, o governo continua examinando outras providências de fundamental importância para a defesa do povo, especialmente das classes populares.

Dentro de poucas horas, outro decreto será dado ao conhecimento da Nação. É o que vai regulamentar o preço extorsivo dos apartamentos e residências desocupados, preços que chegam a afrontar o povo e o Brasil, oferecidos até mediante o pagamento em dólares. Apartamento no Brasil só pode e só deve ser alugado em cruzeiros, que é dinheiro do povo e a moeda deste país. Estejam tranqüilos que dentro em breve esse decreto será uma realidade.

E realidade há de ser também a rigorosa e implacável fiscalização para seja cumprido. O governo, apesar dos ataques que tem sofrido, apesar dos insultos, não recuará um centímetro sequer na fiscalização que vem exercendo contra a exploração do povo. E faço um apelo ao povo para que ajude o governo na fiscalização dos exploradores do povo, que são também exploradores do Brasil. Aqueles que desrespeitarem a lei, explorando o povo – não interessa o tamanho de sua fortuna, nem o tamanho de seu poder, esteja ele em Olaria ou na Rua do Acre – hão de responder, perante a lei, pelo seu crime.

Aos servidores públicos da Nação, aos médicos, aos engenheiros do serviço público, que também não me têm faltado com seu apoio e o calor de sua solidariedade, posso afirmar que suas reinvindicações justas estão sendo objeto de estudo final e que em breve serão atendidas. Atendidas porque o governo deseja cumprir o seu dever com aqueles que permanentemente cumprem o seu para com o país.

Ao encerrar, trabalhadores, quero dizer que me sinto reconfortado e retemperado para enfrentar a luta que tanto maior será contra nós quanto mais perto estivermos do cumprimento de nosso dever. À medida que esta luta apertar, sei que o povo também apertará sua vontade contra aqueles quenão reconhecem os direitos populares, contra aqueles que exploram o povo e a Nação.

Sei das reações que nos esperam, mas estou tranqüilo, acima de tudo porque sei que o povo brasileiro já está amadurecido, já tem consciência da sua força e da sua unidade, e não faltará com seu apoio às medidas de sentido popular e nacionalista.

Quero agradecer, mais uma vez, esta extraordinária manifestação, em que os nossos mais significativos líderes populares vieram dialogar com o povo brasileiro, especialmente com o bravo povo carioca, a respeito dos problemas que preocupam a Nação e afligem todos os nossos patrícios. Nenhuma força será capaz de impedir que o governo continue a assegurar absoluta liberdade ao povo brasileiro. E, para isto, podemos declarar, com orgulho, que contamos com a compreensão e o patriotismo das bravas e gloriosas Forças Armadas da Nação.

Hoje, com o alto testemunho da Nação e com a solidariedade do povo, reunido na praça que só ao povo pertence, o governo, que é também o povo e que também só ao povo pertence, reafirma os seus propósitos inabaláveis de lutar com todas as suas forças pela reforma da sociedade brasileira. Não apenas pela reforma agrária, mas pela reforma tributária, pela reforma eleitoral ampla, pelo voto do analfabeto, pela elegibilidade de todos os brasileiros, pela pureza da vida democrática, pela emancipação econômica, pela justiça social e pelo progresso do Brasil

quinta-feira, 12 de março de 2015

O ESSENCIAL


 “ MELHOR TERIA SIDO/ SE TIVESSE OUVIDO SILENO/ E MEU VOTO NÃO TIVESSE NASCIDO.” 

Sileno é Mito Grego. Perguntado sobre tanta coisa sobre o ser humano disse: “Melhor não ter nascido”. 



A DIALÉTICA HEDIONDA DA MÍDIA

PARA: ANA PAULA NOGUEIRA & RAISSA PENICHE

Marx, na Mais Valia nos deixa claro e incontestável que o Capital nasce da moeda, do dinheiro. E só depois vira arma. Da espada ao míssil! E só mais depois vira política. Como excedência e poder. Para deixar o trabalhador morto/vivo, sonhando Democracia. Para produzir mais, se aproximar mais, ser mais periferia e gerar mais capital. E mais política. E mais Partidos. E mais mortos/vivos!
E não nos enganemos Marx, Hegel e Nietzsche continuam os gênios da tragédia. Na psique e nas patologias. Na economia, na política, na sociologia. Na arte. E em toda nossa utopia. De Fourier, Owen e Walter Benjamin. A política, essa que metaforizamos Democracia, nossa mais rica alegoria, tornou-se a arma dos meios de produção, do Capital e de todos os domínios. Dos mais vivos. E dos mais mortos! Os mortos/vivos. E o mundo é sempre o mesmo. Real ou virtual. Num processo de suas transformações e evoluções. Da pobreza e da riqueza. Da nobreza à aristocracia até ao imperialista individual e globalizado, ao monopólio imperializado. Com poucas variantes entre a propriedade e os deuses. Ibtocáveis! E nós, o baixo clero, somos só a massa que fermenta ou que fica solada dependendo do artesão, da arte ou da entropia. Dificuldades de assá-la na padaria.
É claro que neste contexto, existem forças em evolução como nossos míseros classe média Mas sem qualquer solução de capital, de política e de formação/informação e cultura. Nossa grande maioria, como relação Senhor/Escravo. Compensada e domada. E depois de tanta luta, de tantas revoluções: Industriais, Burguesas, Científicas, Cibernéticas e outras tantas de conceitos e consertos, continuamos quase na mesma. O resultado nunca vai além. E por que será?
Nunca vamos às causas, às origens, só aos sintomas. Nos falta origem, formasção, profundidade, investigação! Nossa Mídia de origem é muito rasa. Estamos sempre à procura de um barômetro a nos guiar, ascendido de crenças e vamos atrás, atraídos como os ratos do Flautista de Amelin. E acabamos sempre no abismo! Esta é a nossa cultura. Uma prisão de sempre. Nos forma para a prisão. E buscando sempre uma saída. Mas como? Se a chave está sempre com o Capital, a política, os donos da prisão? Com tudo nos sendo negado como agora, os Conselhos Populares, o Plebicito, as Reformas?
E sobre a Mídia, nem falar. É casa de marimbondos de fogo, como nossa cultura. Cultura dominada e que nos aprisiona desde a origem. Da Senzala à fábrica. As escolas do capital e da Mídia, dos deuses e da política. Sem saída, começamos a apelar para os mortos. Em situação como a que estamos vivendo, até os mortos reclamam.


SINDOVAL AGUIAR & LUIZ ROSEMBERG FILHO

RJ, 2014

domingo, 8 de março de 2015

IGUALDADE


A ESCRAVIDÃO NO BRASIL

Charles Darwin já esteve no Brasil. Em seu diário de viagem durante a expedição no navio Beagle ele fala sobre a escravidão em nosso país.

“Perto do Rio de Janeiro, minha vizinha da frente era uma velha senhora que tinha umas tarraxas com que esmagava os dedos de suas escravas. Em uma casa onde estive antes, um jovem criado mulato era, todos os dias e a todo momento, insultado, golpeado e perseguido com um furor capaz de desencorajar até o mais inferior dos animais. Vi como um garotinho de seis ou sete anos de idade foi golpeado na cabeça com um chicote (antes que eu pudesse intervir) porque me havia servido um copo de água um pouco turva… E essas são coisas feitas por homens que afirmam amar ao próximo como a si mesmos, que acreditam em Deus, e que rezam para que Sua vontade seja feita na terra! O sangue ferve em nossas veias e nosso coração bate mais forte, ao pensarmos que nós, ingleses, e nossos descendentes americanos, com seu jactancioso grito em favor da liberdade, fomos e somos culpados desse enorme crime.”

(Charles Darwin, A Viagem do Beagle)

quinta-feira, 5 de março de 2015

QUEM É QUEM NA AMÉRICA DO SUL


A desgraça da América Latina é que para cada Pepe Mujica existem 50 Antonios Ledezmas
Paulo Nogueira (Diario do Centro do Mundo)

Sabotador da democracia
A desgraça da América Latina é que para cada Pepe Mujica existem 50 Antonios Ledezmas, o prefeito de Caracas detido sob acusação de conspirar contra a democracia.
Ledezma, 59 anos, é aquele típico político latino-americano cuja ação predatória ajuda a entender por que a região é recordista mundial em desigualdade social.
É um predador.
Seu apelido é Vampiro. Ele foi um dos homens que comandaram o massacre de venezuelanos miseráveis que se insurgiram em 1989 nos protestos que ficaram conhecidos como o Caracazo.
Ledezma tem um histórico golpista notável. Ele foi um dos homens que apoiaram a fracassada tentativa de derrubar Chávez em 2002.
Na ocasião, nas poucas horas que durou o golpe, ele quis tomar a prefeitura do município de El Libertador, na Grande Caracas. Perdera nas urnas, mas não aceitara a derrota.
Recentemente, em fevereiro de 2014, ele estimulou publicamente a violência nos protestos contra Maduro. Morreram 43 pessoas graças a este tipo de conduta.
Agora, pouco antes de ser preso, ele vinha exigindo a renúncia de Maduro. Pior ainda, ele estava publicando articulando um “governo de transição”.
Isto é tramar contra a democracia, isto é tentar um golpe que fraude o desejo do eleitorado que escolheu Maduro – e isto é crime político.
Ledezma sabota a democracia e despudoramente se diz vítima de uma “ditadura”.
A jornalista americana Eva Golinger, radicada na Venezuela, nota uma semelhança entre o que está ocorrendo no país hoje e o que aconteceu no Chile em 1973.
A mídia, diz ela, fabrica uma situação aterrorizante. Fotos de protestos em outros países são usadas para ilustrar o alegado descontentamento do povo.
O objetivo, afirma Eva, é semear uma atmosfera que chancele um golpe.
(Se você vê alguma semelhança entre a atitude da imprensa venezuelana e a conduta da imprensa brasileira, você está certo.)
A Venezuela – como todos os países do mundo, aliás – enfrenta uma crise econômica. Esta é particularmente agravada pela queda abrupta dos preços do petróleo, maior fonte de divisas do país.
Não é diferente o que ocorre na Rússia, outro grande produtor de petróleo.
A questão é que a mídia local tenta atribuir cinicamente ao governo de Maduro toda culpa pelas dificuldades – que de resto aparecem amplificadas.
Isso se chama desestabilização.
Como uma democracia lida com um destruidor como Ledezma?
Façamos um exercício.
Nestes mesmos dias, documentos desclassificados – que perderam a confidencialidade com a passagem do tempo – mostraram a frenética ação de Roberto Marinho contra a democracia brasileira.
Suponha que, alguns meses antes do golpe de 1964, cientificado das ações de Marinho, o presidente João Goulart o tivesse detido Jango estaria fazendo o quê? Agindo como um ditador ou defendendo a democracia?
A mesma lógica vale para Ledezma.
Um golpe contra Maduro teria, certamente, consequências. Se a velha elite ligada aos Estados Unidos o abomina, é grande seu prestígio entre as massas chavistas.
Homens como Ledezma, numa guerra civil, a gente sabe o que fazem: voam para Miami.
Ele é, sim, um golpista. E como tal que responder perante a lei.
É um anti-Mujica.
E então repito: a desgraça latino-americana é que para cada Mujica existem 50 Ledezmas.